Realiza-se este fim-de-semana o arraial de S. João, uma tradição antiga que nos tempos da administração portuguesa assinalava o Dia da Cidade, com direito a feriado no dia 24 de Junho. Com a transferência de soberania o feriado municipal foi abolido, o Leal Senado mudou de designação para “Câmara Municipal de Macau Provisória”, e o actual Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) é o que resta da instituição camarária. O seu presidente – actualmente Alex Vong, sem substituição do agora suspenso Raymond Tam – é o que temos mais próximo de um edil. O facto de existir o IACM é visto como uma alternativa à extinção completa do histórico Leal Senado, que se chegou a temer.
Mas S. João continua a ser associado ao Dia da Cidade, e um grupo de resistentes persiste em manter viva a tradição sanjoanina que os residentes mais velhos recordam com carinho. Quantos bailes de S. João serviram de pretexto para uma farra e uma noite bem passada que rivalizasse com os Santos Populares lá em Portugal? Quantos casais se conheceram à volta com um prato de sardinha assada devorado debaixo dos balões e ao som das cantorias popularuchas? Quem não gosta de uma festarola animada cheia de animação, gente bem disposta e dançante, movida pelo calor do Verão acabadinho de chegar e mais desinibida depois de uns quantos refrescos? É a “premise” para mais que uma festa bairrista. É um cartaz turístico com um potencial difícil de ignorar, e não é preciso ser português ou venerar os santos para gostar da festa. Onde mais no continente asiático se vê qualquer coisa deste género?
O bairro do S. Lázaro é a sede do arraial há vários anos, e durante estes dias a Calçada em frente à Igreja com o mesmo nome é decorada com as barraquinhas de comes e bebes e o palco onde as danças folclóricas portuguesas dizem presente. A organização fica a cargo da Associação dos Macaenses (ADM), e muito dos seus associados dão o corpo ao manifesto em nome da tradição, para que não se deixe cair a natureza sanjoanina das gentes de Macau. A comunidade portuguesa corresponde ao chamamento, e mesmo quem conhece de perto o original, não dispensa um saltinho até a este S. João “dos pequeninos”, nem que seja apenas para matar saudades. De Sábado à tarde até Domingo à noite, S. Lázaro fica com um arzinho de Porto/Gaia, mesmo que em miniatura. Só faltam mesmo os martelinhos de plástico (era uma ideia a considerar).
Infelizmente estamos noutra latitude em relação à Invicta, e como tem sido habitual paira sobre o nosso S. João ameaça do mau tempo. A passagem pelo território da tempestade tropical Bebinca (que nome tão patusco) levou a que se içasse o sinal 1 de tufão, e apesar de não se prever que passe perto de Macau, não deixará de nos brindar com uma respeitável chuvada. É mais do que apenas coincidência que a primeira depressão tropical tenha chegado em vésperas do S. João, e isto dá que pensar. Teremos algum desaguisado entre a trindade junina dos santos populares que leve a que o S. Pedro estrague a festa ao S. João em Macau quase todos os anos, e tão pontualmente? Terão estes santos uma relação do tipo Florinda Chan/Pereira Coutinho? O S. João certamente não leva a mal, tão envaidecido que estará com a homenagem que as gentes do Porto e outros afilhados seus lhe prestam lá longe em Portugal para se ralar com a chuva que cai num cantinho do Oriente. Para nós é chato festejar com os pés molhados e de guarda-chuva aberto. Assim não há sardinha ou febra que resista.
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