Vieram e Forum-se

Este excelente cartoon de Rodrigo Matos no Ponto Final é bem ilustrativo do que se passou no Fórum Macau, ou Forum de Cooperação e Desenvolvimento entre a China e os países etc, etc, onde está incluído Portugal. Entre promessas de cooperação e a palavra “lusofonia” repetida um sem número de vezes, ficou a curiosidade do anúncio de que Timor-Leste vai comprar dívida portuguesa. Uma notícia surpreendente, mas é preciso não esquecer a dívida que Timor tem com Portugal, pelo menos nos últimos vinte anos – em todos os sentidos. Só é justo que Timor faça o mesmo (na medida que puder) quando é Portugal que passa por uma crise.

Visitaram o território durante o fim-de-semana personalidades como José Socrates, primeiro-ministro de Portugal, o seu homólogo chinês Wen Jiabao, ou o presidente de Timor-Lorosae, José Ramos Horta, o que levou a apertadas medidas de segurança que condicionaram o trânsito, os acessos e tido mais em Macau durante os últimos dois dias.

Comecemos pelo último. É uma vergonha que Ramos Horta tenha dito o que disse do dissidente chinês e Prémio Nobel da Paz, Liu Xiaobao. O presidente timorense, ele próprio um Nobel pela mesma causa, disse “não conhecer” o dissidente, justificando o facto de não se querer alongar sobre o assunto por “respeito” aos hospedes chineses, que como se sabe consideram Liu um criminoso e um inimigo do estado. Bastava a Ramos Horta dizer que “não comentava”, mas “não conhecer”, é completamente diferente. Foram feitas comparações a declarações semelhantes proferidas recentemente por José Pereira Coutinho na AL, sem razão, a meu ver. Sobre o presidente da ATFPM e deputado não recai o ónus da hipocrisia, e é livre de dizer o que quiser. Começo a acreditar cada vez mais que o Nobel da Paz 1996 ficou bem entregue ao bispo D. Ximenes Belo, mas que Ramos-Horta terá sido como que “agrafado ao processo” por motivos políticos.

O primeiro-ministro Wen Jiabao foi sem dúvida a grande estrela deste Forum. A imprensa deu mais importância ao facto de ser a primeira visita do nº 2 do Governo chinês ao território do que propriamente a sua intervenção do Forum. O “premier” chinês aproveitou para conhecer Macau, conviver com a população e reiterar o apoio do governo central no projecto de Macau como região administrativa especial, governada pelas suas gentes e com um elevado grau de autonomia, e tudo mais a que estamos (felizmente) habituados. Wen Jiabao é um exemplo como político e diplomata. Uma pessoa suave, afável no trato, um verdadeiro cavalheiro. A sua eloquência na língua oficial deixou os intérpretes locais baralhados, já que algumas expressões do primeiro-ministro continham termos literários e filosóficos difíceis de expressar em qualquer outro idioma. Macau ficou a ganhar com a visita de Wen Jiabao.

De José Socrates viu-se muito pouco. Sabe-se que esteve cá, que fez jogging à volta do hotel onde ficou instalado, e que se reuniu com os amigos na residência oficial do cônsul-geral de Portugal, no Hotel Bela Vista. Em Portugal as pessoas estão agora com pouca disposição para falar de Macau, ou lembrar Macau. Pelo menos desta vez têm uma desculpa.

O Brasil foi representado pelo vice-ministro para Assuntos Económicos e Tecnológicos do Ministério das Relações Exteriores, Pedro Luiz Carneiro Mendonça. Enquanto os restantes países apostaram em trazer a equipa “A” (Moçambique e Guiné-Bissau levaram o primeiro-ministro e Angola o ministro da Economia), o Brasil foi representado pelos suplentes da equipa de reservas dos juvenis “B”. Pedro Mendonça justificou isto pelo facto do actual governo encontrar-se em transição devido à recente eleição de Dilma Rousseff, mas eu não acredito. O Brasil dá-me a entender, assim como a muita outra gente, que gosta de participar onde está a China, mas não gosta muito de misturas. E nisto da Lusofonia, já se sabe, o Brasil não suporta ser 2º para Portugal. Historicamente falado, claro.

Saiba mais sobre o Fórum Macau e a visita de Wen Jiabao aqui e aqui, no JTM, e leia o editorial do director José Rocha Dinis. No Ponto Final leia a excelente reportagem de Maria Caetano na edição de ontem, e o editorial de hoje de Isabel Castro. (Antes que digam que me esqueci de alguém, a edição online do Hoje Macau não estava actualizada à hora que redijo esta posta).