Ouvia hoje o programa Visão Global da Antena 1, via Rádio Macau, e falava-se, como não podia deixar de ser, da queda do muro de Berlim. A certa altura oiço um senhor dizer qualquer coisa como “foi um momento difícil para os alemães de leste, uma vez que se tiveram que adaptar à vida no Ocidente, a uma sociedade de consumo”. Coitados, ficaram traumatizados com o choque de poder comer mais que duas refeições por dia, ter a capacidade de comprar o que quiserem e comer bananas, coisa que não existia na ex-RDA.
Na altura, faz agora 20 anos, lembro-lhe dos velhos a comentar no café da esquina da rua onde eu vivia em Ourém: - “Zei, viste aquilo que aconteceu lá no Muro do Bralim?” – “Vi! Bem feito para aqueles comunas dum raio!”. Os “comunas de um raio”, que um ou dois anos antes ainda acreditavam piamente no paraíso socialista, andavam muito caladinhos, reservados, e a começar a pensar em virar a casaca. A Associação de Amizade com os Povos Socialistas, decorada com motivos da RDA e da URSS, fecharia no final de 1990.
Contudo, o que mais recordo da queda da cortina de ferro foi a confusão que aquilo tudo fez na minha cabecinha. Era barra a Geografia, e orgulhava-me de saber os nomes das cidades das ex-URSS, da ex-Jugoslávia e da ex-RDA. Depois demorou-me anos a aprender os nomes das capitais das repúblicas todas. E nem fazia ideia de que existia uma Bósnia, que mais parece uma mistura de bosta e de hóstia, salpicada com gosma. E eu que sempre pensei que "Macedónia" era um sabor de gelado. E juro que nunca tinha ouvido falar da Eslovénia.
Lembro-me de ainda há pouco mais de 20 anos o Boavista ter jogado na Taça UEFA com o Karl-Marx Stadt, uma equipa com um nome giríssimo, vinda da ex-RDA. Karl-Marx voltou a chamar-se Chemnitz, e as equipas daquele campeonato andam hoje todas pelas divisões secundárias da Alemanha unificada. Tinham todas nomes assim bué duros, bué industriais, tipo "Dinamo", "Energie", "Motor". Havia (e há, atirado para a terceira divisão) o Carl Zeiss, de Jena, cidade conhecida pela indústria das lentes de contacto que deram o nome à equipa.
Lembram-se como a União Soviética era tão gira? O campeonato de futebol soviético, por exemplo, disputado pelas equipas de Moscovo, o Zenite Leninegrado, o Dinamo Kiev, o Dinamo Tblissi, o Dinamo Minsk, etc. Depois Leninegrado mudou para São Petersburgo (pff...não melhorou nada, antes pelo contrário), e os Kiev, Tblissi, Minsk e outros foram cada um à sua vida, nas repúblicas da Ucrânia, da Geórgia e da Bielorrússia, que mais parece o nome de uma doença de pele.
E a selecção da URSS que disputou a final daquele Euro 88, na Alemanha? Dassaev, Kuznetsov, Rats, Mikhailichenko, Litovchenko, Belanov, Protassov, Zavarov e outros. Todos altos, elegantes, verdadeiros artistas da bola, que corriam com umas camisas vermelhas onde se lia CCCP, a designação em círilico do nome do país. Haviam lá ucranianos, russos, georgianos, armenos ou letões. Eram todos soviéticos. E como era bonito vê-los jogar, sob a batuta do saudoso Valery Lobanovsky, que afinal era ucraniano.
Quando me lembro dos Jogos Olímpicos de Seul, em que a URSS liderou a lista de medalhas por uma margem enorme, recordo-me da ginástica, por exemplo. O ouro, a prata e o bronze pendurados no pescoço daqueles jovens russos, bandeira vermelha com uma foice e um martelo no topo, e aquele hino lindíssimo a encher de orgulho o peito. Claro que tudo isto debaixo de fortes suspeitas de doping e manipulação genética, mas isso a gente não via no tapete ou nas argolas. Tempos em que se estava longe de imaginar que dois ou três anos depois tudo aquilo deixava de existir.
Antes os russos eram obrigados a exceder-se e a dar duro pelo seu país, enquanto hoje têm a opção de se embebedar e cometer actos de hooliganismo. Uma miséria. Claro que tudo isto foi bom para os povos destes países, que passaram a ter uma opção de viver a sua vida da forma que bem lhes apetecer. Por exemplo, passaram a poder comprar coca-colas e comer Pizza Hut. Antes eram "os povos", hoje são grupos de dois ou três milhões com "identidade". Bem dizia o Gordon Brown a propósito do aniversário da queda do muro: "Uma prova que os regimes maus não duram sempre". Nem mais, Gordon. Nem os maus, nem os bons, nem os mais ou menos.
11 comentários:
Uma coisa é verdade. A União Soviética tinha de longe um dos mais belos hinos nacionais que alguma vez ouvi.
Para quem não conhece:
http://www.youtube.com/watch?v=W3z0thc8Sh4
Tinha e tem. Agora ainda é o hino da Rússia.
Cumprimentos.
"mistura de bosta e de (h) óstia" na cabeça do Leocardo. Hoje fico-me por aqui, mas...
Mas...nada. Não fique por aí. Diga lá o que lhe vai na alma, vá lá. Estou cheiinho de medo.
Ui, que já aí vêm todos outra vez bater-lhe! Então não bastava ter misturado na mesma frase Jesus e testículos, agora também mistura hóstia e bosta? É desta que enviam um abaixo-assinado para o Vaticano a queixarem-se do Leocardo. Realmente, está a exagerar. Qualquer dia tem o desplante de misturar religião e liberdade na mesma frase.
Eu não quero meter medo. Mas você não tem direito de chocar. Deixe o Catolecismo em paz. Ignore-o. Não ficou chocado quando tocaram na sua família? Por que não aceita que, nós, católicos, que respeitamos tudo o que se refere com a nossa religião, fiquemos chocados cada vez que o Leocardo gratuitamente a insulta. E não diga que misturar o Corpo consagrado de Cristo (hóstia) com bosta não é um insulto.
Para estes idiotas, insultar a nossa família, gente do nosso sangue e que eles nem sequer conhecem, é o mesmo que tocar na religião "Católeca". Por essa ordem de ideias, em vez de falar da religião, mais valia mandá-los para a puta que os pariu.
P.S.: Já agora, deixem de falar mal do comunismo, porque eu sou comunista e também tenho o direito de ficar chocado com as vossas opiniões.
Ó Idiota-Mor, uma coisa é dizer mal, criticar, outra coisa é insultar. Eu, felizmente, não sou comunista, mas nunca disse que comiam criancinhas ao pequeno-almoço ou coisas do género.
"Hóstia", "bosta" e "gosma" é um jogo de palavras que me vêm à cabeça quando penso em "Bósnia" (reparem que para ter "hóstia" e "bosta" basta mudar duas letras). Se calhar devia-se chamar um nome mais agradável ao Corpo de Cristo. E que tal, "Corpo de Cristo"?
Pela enésima vez, não tenho nada contra os católicos nem para a Igreja Católica. Menos quando mentem, que é o que fazem muito.
Cumprimentos.
Cumprimentos.
Quando é que mentem ?
Anónimo das 8.59: tirando hoje, todos os dias.
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