domingo, 26 de janeiro de 2014

Zheng vai de carrinho


Zheng Anting, deputado eleito nas legislativas de Setembro último pela lista União Macau-Guangdong, deu uma entrevista ao Hoje Macau, publicada na sexta-feira passada. Confesso que fiquei com curiosidade em saber mais sobre este "fenómeno" que se conseguiu eleger como nº 2 de Mak Soi Kun através de uma plataforma ligada ao sector empresarial. Nunca tinha ouvido falar dele até há seis meses, e a única impressão que deu até ao momento foi negativa; como se recordam Zheng foi o autor da famosa "gaffe" dos transportes públicos, quando defendeu que "apenas os residentes deviam poder andar de autocarro". Um princípio que até faz algum sentido na Terra do Nunca: uma vez que são os residentes a pagar impostos, porque devem os não-residentes usufruír desse serviço, incluíndo os descontos nas tarifas oferecidos através dos subsídios do Governo? Já agora devemos questionar porque diabo andam esses gajos de fora a consumir a nossa electricidade ou a tomar banho com a nossa água. Agora que sei mais sobre o sr. Zheng, já não acho que ele seja um pateta retrógrado e obtuso. É ainda pior do que pensava!

Começando por explicar essa confusão dos autocarros. Quando a jornalista Cecília Lin lhe pergunta se seria realista não deixar um turista apanhar um autocarro, Zheng explica que o ideal seria que existissem autocarros para residentes, e autocarros para turistas - ah sim, e já agora autocarros para os não-residentes, porque afinal "também fazem uma contribuição para a sociedade", coitados. Diz ainda que existindo autocarros exclusivos para turistas "ajuda-se a Direcção de Serviços de Turismo a saber quantos turistas precisam de apanhar o autocarro", uma vez que muitos deles andam sobretudo de "tour bus", e em muitos casos naquele novo serviço de carros de aluguer selectivos e inflacionados que um dia foram conhecido por "táxis". As coisas que vão na cabecinha deste rapaz. É uma ideia mais eficaz do que dotar os motoristas com um cartão com quadradinhos que riscam cada vez que entra um turista no autocarro. E como é que vão saber se é um turista? Simples, basta perguntar: "V. Exa. é turista?". No caso da resposta ser afirmativa, "tick", um risquinho no quadrado.

O que esta ideia pioneira de autocarros para residentes, outros para turistas e ainda outros diferentes para não-residentes me lembra é o apartheid da África do Sul que vigorava até há vinte e poucos anos, e onde existiam autocarros para brancos e autocarros para pretos. O que Zheng sugeere é isso mesmo, uma forma de apartheid. Já agora os autocarros para os TNR podiam vir com pedais, e eles que fizessem o veículo andar, para economizar combustível. Quando lhe perguntam como seria possível aplicar esta medida do separatismo rodoviário, Zheng faz a comparação que faltava para comprovar com um elevado grau de certeza que é um perfeito idiota: nos postos fronteiriços também há canais para residentes, não-residentes e turistas! Ora aí está...postos fronteiriços e autocarros...a mesma coisa, estão a ver? Penso que não preciso de dizer mais nada.

Mas não pensem que o sr. Zheng é alguma espécie de nazi racista e xenófobo, nada disso. É apenas tontinho. Por exemplo, diz que mandar os idosos para lares construídos no continente "é má ideia", e que a sociedade de Macau deve primar pela integração, independente do preço da habitação ou dos terrenos. Se fosse má rês, dizia que "os velhos só servem para queimar e fazer sabão". Diz ainda que a língua portuguesa "é uma vantagem para Macau", e que aprender português "traria vantagem para os chineses", como ele. De facto estando em Macau, atendendo a factores como a História, coiso-e-tal, ainda é mais útil aprender Português do que aprender Sueco, por exemplo - mas amanhã nunca se sabe, pronto. Mas atenção que Zheng nunca foi sempre desta opinião; foi preciso assistir à última conferência ministrial do Fórum Macau para mudar de ideia quanto à nossa língua, que se calhar antes considerava "uma infeliz herança do passado colonialista" e blá blá blá a mesma retórica da treta do costume. Realmente nada como ir até aos sítios ver como as coisas são, sr. Zheng.

Sobre ele próprio diz "não ter ligações ao sector do jogo", e eu acredito nele, mas apenas em parte. Não é preciso estar ligado ao jogo para ter ligações ao jogo; basta estar ligado a um dos sectores onde se pavoneia a nomenclatura, seja a construção, as telecomunicações, importação e exportação ou qualquer outro monopólio para fazer parte da grande roda que no fim é sempre oleada pelo dinheiro dos casinos. Diz ainda que "é imigrante desde os tempos que se seguiram à transição da RAEM". Não sei bem o que isto quer dizer, mas subentende-se que chegou ao território há menos de 15 anos? Sim senhor, portanto aqui está alguém que conhece Macau q.b. para saber do que fala, e que merece estar na AL a fazer leis para a malta toda cumprir. Palmas para o maravilhoso eleitorado que temos, e viva a democracia. No outro dia falava-se por aqui e noutro blogue de "pára-quedistas", e na altura abstive-me de comentar sobre esse particular. Mas queriam ver como é um pára-quedista? Aqui está ele. Como capacete e tudo.

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