sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

H de Harmonia, H de hipocrisia



Chegamos a sexta-feira, e para encerrar a semana com chave de ouro, nada como o artigo de quinta-feira do Hoje Macau. Queria agradecer a todos os que leram na edição impressa e que disseram ter gostado muito, e convido-os a aguardar com antecipação o artigo da próxima quinta, "OS AMANTES". Nada nem ninguém vai deter o cavaleiro Leocardo na sua luta contra as forças do mal. Bom fim-de-semana!

A felicidade atinge-se quando tudo o que tu pensas, dizes e fazes estão em perfeita harmonia.

GANDHI

Harmonia, uma palavra que nos habituámos a escutar com frequência por estas bandas, que apenas pela sua sonoridade já indicia que se trata de algo positivo. Todos queremos harmonia, concordância, cooperação, com todos a puxarem para o mesmo lado, ou a empurrar na mesma direcção. Mas a harmonia é uma utopia; pode ser alcançada a alguns níveis, como quando a banda toca toda no mesmo tom, o vento assobia por um renque de árvores impecavelmente alinhadas, quando o pintor combina as cores e cria uma obra de arte. Uma harmonia onde existem excluídos, não é harmonia. Apelar à “harmonia” onde existe desarmonia é tapar o sol com uma peneira, uma estratégia suja de quem está a ganhar – ou pensa que está a ganhar. É como estar em vantagem a meio da partida e pedir ao árbitro que apite para o fim. É chegar a meio do livro de rescrever o fim que nunca foi lido. É abrir todas as portas da felicidade menos uma, e tentar convencer as massas de por detrás dessa não há nada que valha a pena. Os proxenetas da harmonia declaram a guerra, incitam ao ódio, cometem massacres, e quando chegam onde querem apelam à “harmonia”, com a esperança de não terem de provar do seu amargo veneno. Vetam ao ostracismo todos os que se opõem ao seu conceito corrupto de harmonia, apontando-lhes o dedo e convocando os mais ingénuos para que o sigam, fazendo-os acreditar que pode existir harmonia para uns e desarmonia para os outros que não lhe compram a banha da cobra. É uma paz podre. Podre como as pessoas que a tentam impingir.

Hipócritas! bem profetizou Isaías a vosso respeito, dizendo: Este povo honra-me com os lábios; o seu coração, porém, está longe de mim.

MATEUS 15:7,8

O hipócrita tem sempre uma agenda, e não dá ponto sem nó. O hipócrita não tem amigos: tem uma bolsa de valores, subindo ou descendo a cotação conforme lhes convém. Os que se cansam dos malabarismos do hipócrita viram-lhe as costas, e ele apressa-se a dizer raios e coriscos de quem lhe descobriu a careca, para ganhar vantagem numa eventual lavagem de roupa suja. Quem se cansa das piorreias do hipócrita veta-o ao desprezo, mas ele não entende isso, pois tem as vistas curtas e uma língua viperina. No processo não se inibe de exibir a sua dislexia, de que se orgulha, e não admite sequer que lha apontem.

Se alguém disser: Eu amo Deus, mas continuar a detestar o seu irmão na fé, é um mentiroso; porque se não amar o seu irmão, que está ali diante dos seus olhos, como poderá amar Deus que nunca viu?

JOÃO 4:20

O hipócrita não tem valores, convicções ou preconceitos, pois isso são conceitos que requerem o mínimo de coerência. Tanto beija um chimpanzé por o achar parecido com ele, como dá um pontapé a outro igual porque “tem o nariz esborrachado” – tudo depende que fim lhe pode o chimpanzé ajudar a atingir. O hipócrita vai ao funeral de alguém que sempre desprezou, faz uma cara de plástico, e lamenta-se pelo “coitado”, convencido que no fim os deuses lhe deram razão pelo simples facto dele continuar vivo, e o outro não. Diz cobras e lagartos de quem mal conhece ou de quem não o está para aturar, porque se recusa a prestar a devida vassalagem quando os seus caminhos eventualmente se cruzam. O hipócrita não é rei de coisa nenhuma, mas tem o rei na barriga.

Quando, pois, deres esmola, não faças tocar trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam a sua recompensa.

MATEUS 6:2

Os hipócritas, quando dão, fazem questão que todos fiquem a saber que dão, e que sem eles o objecto da sua pressuposta generosidade morreria de fome. Os hipócritas não dão sem segundas intenções, e julgam-se amos e senhores de quem estão a ajudar. Os hipócritas chamam de “ingratos” a quem ajudaram mas ficou farto da sua pantominice, mesmo que estes nada lhe devam ou que em tempos o tenham também auxiliado. Quando deve a alguém, diz as piores barbaridades dessa pessoa, mas sempre em surdina, pois tem complexos de inferioridade e de culpa mas não quer “parecer ingrato”. “Parecer” é o verbo que o hipócrita mais conjuga. Para o hipócrita, mesmo a pessoa que ele mais admira além dele próprio tem sempre um defeito, ou cometeu uma falta grave, que o hipócrita, “nunca nos dias da sua vida” cometeria. Como são hipócritas, os “dias da sua vida” já chegaram ao fim um sem número de vezes. Talvez por isso se julguem imortais.

Não tenho convívio com gente falsa nem com hipócritas.

SALMOS 26:4

Os hipócritas, tal como os mentirosos, deixam-se apanhar com facilidade, especialmente se forem maus hipócritas – e maus mentirosos. Têm uma soberba que os leva a pensar que conseguem enganar meio mundo, mas afundam-se ainda mais no lodo quando teimam em não dar crédito a quem tentam ludibriar. Os hipócritas julgam estar sempre no controlo da situação, mas deixam sempre ruir a frágil fundação da torre das suas farsas, muito devido à sua gritante falta de etiqueta e de bom gosto. Não sentem remorsos, até porque escrevem “remorços”, que rima com tremoços, que é o que lhes servem com cerveja, mesmo que tenham pedido caviar e champanhe: têm sempre o que merecem. Quando lhes cai a máscara reagem a quente e fazem uma fuga para a frente, pois não aceitam ser denunciados. Com a arrogância a sair-lhes em catadupa pelos poros da pele flácida, diz que “não devem satisfações a ninguém”. Não devem, nem dão. Satisfação é uma palavra que não entra no dicionário do hipócrita, assim como classe, humildade, respeito, graça, e muitas mais que não são da família de hipócrita.

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