domingo, 29 de maio de 2016

Estúpridos



Se eu fosse descrever o Brasil em termos de liberdade sexual baseando-me apenas naquilo que me é deixado saber (o mesmo que toda a gente, claro), diria que é "precocemente emancipado" - e já com o tempero do "politicamente correcto" incluído. Digamos que no vocabulário da sexualidade é uma das poucas coisas, senão a única, em que "precoce" não tem necessariamente um sentido negativo. Não quero falar do que não sei, porque nunca lá estive, mas os brasileiros não se parecem preocupar nada com a imagem que se passa para o exterior de país onde o deboche e a libertinagem são serventia da casa. É certo que se trata de um país quente, uma democracia, pelo menos oficialmente, com 250 milhões de habitantes, pobreza a dar com um pau, criminalidade elevada, quase a bater no tecto, em suma, são mais ou menos como as Filipinas, para usar um exemplo próximo, só que mais populoso (as Filipinas tem 100 milhões de almas), mais rico, mais tudo. Ajuda a explicar muita coisa se juntarmos a tudo isto o facto do Brasil ser um dos roteiros do turismo sexual, cortesia de americanos e cia., e em troca de dólares há de tudo no cardápio, dos 8 aos 80, da confissão homo e hetero, da preferência mono, bi, tri e multi, tudo, mas mesmo tudo.


Um amigo meu dizia-me que chegando ao Brasil, um turista arrisca-se "a ser violado logo no aeroporto". Escusado será dizer que este meu camarada também nunca lá esteve, mas faz a sua representação pessoal daquele país com base em filmes como este, "Turistas", que obrigou os seus produtores a apresentar um pedido de desculpas aos brasileiros. Bem, suponho que na base dessa retracção estará o apelo mais ou menos directo a que não se faça turismo no Brasil, o que, pensando bem, é sacanice da grossa. Agora quanto ao enredo propriamente dito, ufa, desculpem mas fico-me por considerar "exagero". Completamente falso? Nem chego perto da fogueira, quanto mais meter lá as mãos. A verdade é esta: o Brasil não é um país seguro, antes pelo contrário. Um exemplo: diz quem mora em S. Paulo que se nunca se foi assaltado naquela cidade, a mais populosa do Brasil, "é apenas uma questão de tempo" que aconteça. Um senhor macaense que tenho na minha lista do FB desabafou que "adora ver fotos" nas redes sociais, uma vez que ele próprio é um amante da fotografia, mas como vive em S. Paulo, "não se recomenda andar com a máquina fotográfica na rua" - nem precisou de explicar porquê. Exagero ou não, não são raras as vezes em que damos conta de notícias de tiroteios entre "gangues" rivais com o monopólio do tráfico de droga como pretexto, massacres levados a cabo por bandidos sem coração que imaginam as formas de matar mais demoradas e dolorosas, personagens como "Fernandinho Beira-Mar", um bandido que é uma espécie de celebridade, em suma, uma Arca de Noé "dread" em vias em naufragar no mar dos danados. E agora isto:


Pois é, o que ali vêem é uma mensagem de um babaca qualquer no Twitter, onde se nota o gozo enorme do camarada após divulgar um vídeo onde uma jovem de 16 anos aparece mal tratada depois de ter sido violada em grupo por 30 homens. Sim, trinta, o triplo de dez, e segundo as últimas notícias que actualizam este lamentável incidente, a polícias diz que "podem ter sido mais; 33, ou até 36". A polícia já recolheu o depoimento da vítima, e duvido que ela tenha o número exacto - desconfio a certo ponto terá perdido a conta, se é que começou a contar. Antes de continuar vou cometer uma inconfidência: isto não me chocou, de todo, sabendo aquilo que sei. Interpretem isto da maneira que quiserem, mas tenho visto muita indignação vinda de gente que se anda a fazer de "distraída". Se forem a qualquer dos muitos (centenas, talvez) sítios de pornografia grátis na rede, e escreverem no campo de busca frases como "putinha novinha na suruba", "novinha libera geral", "safadinha dando para todo o mundo", "putaria na favela", "socando a rola na novinha" e outras "coloridas" expressões desta estirpe, vejam que vídeos aparecem, e talvez "túnel na mina para a passagem do trem marreta" fique mais fácil de digerir. O palerma que exibe a vagina ensanguentada da pobre moça pode tê-lo feito parcialmente por achar aquilo uma coisa "normal". Muitos desses vídeos a que fiz referência são o que chama de "amateur porn", vídeos amadores, caseiros até, onde muitas vezes as imagens são recolhidas sem autorização de uma ou mais partes, e normalmente aquelas que se aprestam ao papel de "elemento passivo". Muitas aparentam ser menores de idade, outras aparecem inebriadas, ou mesmo inconscientes,  e independentemente da sua autenticidade não faltam aqueles em que um pateta alegre qualquer dá a entender que leva a namorada para casa, e filma a "festa" com uma câmara oculta, e sem que esta imagine sequer que se vai tornar uma "celebridade". Portanto não me venham com essa de "nova barbárie", porque "barbárie" pode ser que seja, agora novidade...por favor. Ah, mas mesmo assim...


...não podiam faltar as polémicas da ordem (ou "polêmicas", como eles dizem e escrevem lá). Nesta temos o músico Lobão a associar a libertinagem que grassa no Brasil com os casos de estupro - a propósito, esta palavra não é uma brasileirismo: é portuguesa "de gema". Nós é que não a usamos, optando antes por "violação", o que eu acho pouco prático. Até em alguns desportos, como no andebol, por exemplo, existe a figura da "violação", e fala-se da "violação das regras de trânsito" ou seja, "estupro" é muito mais preciso que "violação". Agora que já está feito este parêntesis, voltando ao caso em análise: este Lobão é parvo. Deve ser o Pedro Abrunhosa lá do sítio, que quando abre a boca sem ser para cantar (e mesmo assim...), debita um chorrilho de disparates de levar as mãos à cabeça, e ainda convencido que está a ser "incisivo", e "directo", e "retardado", porra pá, as verdades são para ser ditas, mas há coisas que nem se deviam pensar sequer. Isto de culpabilizar as vítimas de violação tem muito que se lhe diga, e não é para ser atirado assim sem mais nem menos, justificando-se com o guarda-chuva da "liberdade de opinião". Já falei disto aqui mais que uma vez, sou um tanto ou quanto reticente quanto à promiscuidade que se tem feito entre "violação" ou "estupro", e "relação não-consentida". Quantos pobres patetas foram para à choldra por terem dado uma queca sem a tipa lhes ter passado uma autorização autenticada no notário com duas testemunhas para dar o uso que quiser à sua crica. Ai a menina "estava demasiado bêbada para dar consentimento", ou deu e não se lembra, mas na hora da verdade qual delas vai optar por dizer que é uma badalhoca e logo à noite você pode também ser um contemplado? Claro que prefere dizer que é um "anjinho", que foi aliciada por aquele "monstro" para ir até à sua casa, e onde ele "abusou" dela. Só que neste caso em particular...


...foram mais de 30 "fregueses", 33 no mínimo. Vamos supor por instantes que no início aquilo até era para ser mais um "rolê responsa", e já não era a primeira vez. Pronto, eu sei, é cruel, mas a juntar a esta "salada", temos ainda um dado importante: tudo ocorreu num desses locais "problemáticos" onde são realizados os tais vídeos "amadores", que de "amador" no sentido "daquele que ama" nada têm. A própria linguagem está muitíssimo longe de se recomendar para uma senhora. É chungaria, pronto, resumindo e concluindo. Mesmo que fosse uma "suruba", nunca seria com 30 ou 33. Possivelmente nem 10, e ainda para mais com uma adolescente de 16 anos? E vão conseguir convencer alguém de que ela "pedia mais", quando ainda convalesce no hospital com uma rotura na bexiga? Mesmo que fosse a maior ninfomaníaca da Terra, e aposto que os tipos que levaram a cabo esta empreitada não estariam exactamente a "fazer amor" com a jovem. Sabendo o que a casa gasta, seguravam-na pelos cabelos, enquanto um ia os outros batiam-lhe com os membros na face, e tudo ao som de epítetos como "cachorra", e "safada". Outra vez, assumindo que a coisa foi premeditada deviam ter parado quando ela deixou de incentivar com "vai, gostoso, me f..." - isto mais uma vez fazendo fé nas películas deste género tão peculiar de cinema caseiro. E não façam essa cara, bolas, não disse nada que não seja facilmente verificável. Nem quero imaginar o que seria...


...se eu sugerisse que "ela pediu", ou "gostou". E claro que não, que coisa absurda, mas olha aí o que acontece quando se mobilizam os grupos que se dedicam a esta forma de "lobbyismo". Aposto o que quiserem que no meio de tanta gente (justificadamente) chocada com o incidente e preocupada com a segurança dos seus estão os moralistas, os falsos púdicos, as lésbicas, que odeiam homens e queriam que fque estes não pudessem olhar para as mulheres sequer, quanto mais lhes tocarem, em suma, os extremismos do costume, e o inevitável debate sobre "de quem é a culpa, afinal". Ora bem, já tivemos algo assim semelhante no México aqui há tempos, quando o então presidente Vicente Fox queria proibir as mini-saias, alegando que eram "um convite aos violadores", o que causou indignação...para uns. Outros há que concordam e manifestam essa concordância, e outros que preferem não se pronunciar, e se o mundo está como está, uma das razões é que há demasiados destes - a tal "maioria silenciosa", que eu diria antes ser uma "maioria lingrinhas" - "ai eu não sei, não tenho opinião, não quero cá confusões para o meu lado". Patético. Eu pessoalmente considero que as mulheres são livres de usarem o que muito bem lhes apetecer, e agora aqui vai: não são todas umas burras que não saibam distinguir decência de badalhoquice, e sabem respeitar pais, familiares, a vizinhança ou o companheiro, se o têm - é só usar o tal "senso comum", que por muito que digam que as mulheres não sabem usar, eu acredito que sabem, e na maior parte das vezes usam. Contudo...


...temos estes números, que dão conta de uma vítima de estupro a cada 11 segundos. Agora pode ser que haja quem desconfie desta estatística, e se forem "violações" como aquelas que aconteceram na passagem de ano em Colónia, na Alemanha, que consistiram não de 33 gajos a malhar numa pobre coitada mas em "beliscões" e "apalpões", pode ser que se trate de um "exagero". Ah sim, podia agora armar-me aqui em imbecil e questionar se o Brasil é um país islâmico, ou se em cada 11 segundos é um "refugiado" que comete estes crimes, mas só mesmo uma cabeça de alho-chocho é que vai associar esta lamentável forma de violência a uma religião. Ou ainda tentar branquear (ou desvalorizar, vá lá) os crimes a pedofilia cometidos por padres católicos com o argumento de que a pedofilia "não acontece SÓ na Igreja" (lol, a sério, juro). E como se resolve isto? Os políticos já se sabe: dali só vem merda. Uns colocam-se no campo dos que ficam revoltados, e quando este estiver "sobrelotado" de políticos com quem dividir o eleitorado, não se importam nada de culpar as mini-saias ou os bailes "funk" pelos elevados números do estupro, contando que isso lhes dê votos. O que eles dizem não se escreve, e quanto às autoridades, já se sabe, não fazem mais porque não estão para se chatear, e nem eu estaria, se fosse para levar para casa um ordenado que dá para pagar as contas e pouco mais, e arriscar-se diariamente a regressar na vertical, dando a entender para lá de quaisquer dúvidas de que depois disso não vai chegar mais nenhum cheque. É um problema muito mais complexo, e que pouco ou nada vem a propósito deste caso. Ah sim, e os brasileiros de um modo geral detestam a polícia.


Não é a toa que os estrangeiros têm do Brasil uma ideia que pode muito bem estar errada, de que os brasileiros não pensam em mais nada senão sexo, e que estão muito mais receptivos a praticá-lo com alguém que não conhecem ou conhecem mal, ou ainda que alinham numa relação casual sem muitas reservas. Temos o Carnaval, por exemplo, que aos olhos de quem não aprofundou os seus conhecimentos sobre o significado do Carnaval ou as origens da sua variante brasileira, não passa de uma "international fair" de chicha, que depois basta ir até lá e provar. Por mais que alguns afirmem todos cheios de certezas parvas que o Brasil é a capital mundial do deboche, há ali pessoas que não estão para aturar a boçalidade alheia, e por incrível que pareça, nós portugueses também conseguimos ser bem rústicos quando calha. Basta ver a disposição com que alguns "machos lusitanos" vão visitar o Brasil pela primeira vez, ostentando um sorrisinho pateta mal tiram os presuntos do avião, esfregando as mãos e balbuciando "eh eh, elá, opá!", julgando que o hotel oferece um serviço em que uma mulata desnudada sacode a bunda em frente à sua tromba enquanto espera para fazer o cadastro. Recordo o lamentável episódio que ocorreu em 2001, quando um grupo de empresários portugueses encontrou a morte em Fortaleza, depois de confiar num tal Militão, também ele um português, só que radicado, que os sequestrou e eventualmente matou, apenas para lhes ficar com o dinheiro. E qual foi  a primeira coisa que lhes ocorreu quando chegaram ao Brasil? Putas. Até parece alguma condição sine-qua-non para atestar a masculinidade, ou que chegar ao Brasil e não dar uma queca na primeira meia hora depois de se chegar é como ir a Roma e não ver o papa. Eu se fosse brasileiro ficaria ofendido com esta estereotipagem tosca. Mas então e aquela "febre dos trópicos" que por ali anda, como se explica?


Escolhi um exemplo que pode muito bem ilustrar certas concepções que se tem do Brasil e dos brasileiros, e que custam um pouco mais a assimilar a quem não nasceu no país Tropical, etc. etc. Fui ao arquivo "pescar" este artigo de Dezembro de 2012 que dediquei a uma série que tinha acabado de passar na TDM: "Engraçadinha - seus amores e seus pecados". O argumento era da autoria de Nélson Rodrigues, um dos grandes, senão o maior argumentista de ficção brasileiro, e reparem no que escrevi na altura a propósito deste seu trabalho em particular:

"(...) É uma produção bastante audaz, como nos têm habituado tantas séries brasileiras, mas que aqui "corre a galope" sem qualquer tipo de preconceito, qual Lady Godiva. Temos o líbido, a sensualidade, a paixão carnal e a nudez tratados de forma directa e sem rodeios, com interpretações e diálogos a condizer. Agrada-me especialmente a forma como nos é dado a conhecer o monólogo interior dos personagens, aquilo que estão a pensar. Surpreendeu-me a qualidade mas não a natureza do argumento, não fosse o próprio Nélson Rodrigues um autor orgulhosamente "brasileiro"; o homem que um dia disse que "A Europa é uma burrice aparelhada de museus". A sua audácia é tenaz, pois apesar de ter nascido em 1912, defendia que "Todo tímido é candidato a um crime sexual". Um homem muito à frente do seu tempo, que lia bem a natureza humana e oferecia-nos o sensual e o erótico sem cair no facilitismo da libertinagem.(...)".

E mantenho tudo, palavra por palavra, e aproveito ainda para reiterar a mesma ideia. Os brasileiros não são debochados, fáceis ou descartáveis: são livres - não libertinos. E parece que se orgulham disso, porque é uma qualidade (sim, qualidade) que "marca a diferença", e fazem o que fazem melhor que ninguém, e só eles sabem "o que é que a baiana tem". Seria uma tragédia se de repente se ficassem restringidos pelas amarras do conservadorismo. Há um sem número de brasileiros que iniciam a sua vida sexual aos 16 anos, ou até mais cedo, e quando as coisas correm de feição dão graças por viver num país onde podem expressar fisicamente a sua imensa paixão, e nem querem imaginar o que seria se não pudessem. Agora é preciso é encontrar um ponto óptimo, que não passa certamente por estacionar o furão na primeira toca que estiver a mão sem bater primeiro à porta. Pode ser que a culpa seja do Guaraná, do açaí, do vatapá, do candomblé, do bumba meu boi, sei lá, mas entrar sem ser convidado é muito feio, ó "mermãos". Vamos lá atinar com isso de uma vez por todas, que a "barra dura" nunca é a melhor solução. Valeu?


1 comentário:

Anónimo disse...

seus textos são horriveis ,cara . enfadonhos ,prolixos ,confusos , mau jnformados etc,etc . desiste de escrever ,por favor.