Este é um vídeo de uma publicidade a uma marca de detergente que vi passar ontem durante o dia todo no Facebook, normalmente acompanhado de comentários na sua maioria demonstrando indignação pelo "racismo" patenteado na mensagem do anúncio. Nele vemos uma jovem chinesa e o seu vizinho, um preto, africano, aquilo que lhe quiserem chamar (não há qualquer referência quanto à origem do indivíduo em questão). O sr. preto, que parece ter estado a pintar a casa de branco - isto fazendo fé nas manchas de tinta que ostenta na cara - encosta-se à porta da casa da vizinha, manda-lhe uns piropos (tem bom gosto, o tipo), ela convida-o para entrar e enfia-o na máquina de lavar, de onde sai um asiático alto e com umas cores que se não fosse pela (exagerada) maquilhagem descreveria como "saudáveis", no mínimo. Conclusão: o detergente em causa é uma espécie de Dr. Mengele dos detergentes, que através de químicos transforma a aparência dos indivíduos de uma etnia numa outra díspar.
Mesmo na rede YouTube, de onde extraí o vídeo, as mensagens eram, no seu geral, de indignação, revolta, e até "asco" - por um produto de limpeza, imagine-se. Nem valia pena exercer o contraditório, até sob pena de ser mal interpretado, mas parece-me que estes comentadores de tanto andarem a querer somar pontos para o seu "politically correct card" não tiveram sequer em conta que o anúncio foi feito na China. Parece que na hora de apontar as diferenças os chineses têm responsabilidades numas coisas, e não tanto noutras. Ironicamente, na hora de separar as águas, ouve-se dizer "os chineses estão bem é na China", mas quando toca a exigir que cumpram no seu próprio país as normativas dos padrões ocidentais, o caso muda completamente de figura. O anúncio é um bocado parvo, sim, para a nossa maneira de entender as coisas, mas de "racista" não tem nada - quem é a vítima aqui, afinal? O tipo que fez de preto no anúncio recebeu o "cachet" e foi à sua vidinha, e não consta que terá obstado à ideia. Agora não me digam que "não percebeu", que isso sim, seria mais "racista". Ou pelo menos "racista", do meu modo de entender o que vocês consideram a chinfrineira a que algumas pessoas se prestam para obter determinadas vantagens, ou abster-se de cumprir os deveres que cabem a todos, sejam eles brancos, pretos, amarelos ou azuis.
Na China existe ainda o culto da alvura como sinal de pureza, e passa de geração para geração como uma faca na manteiga no dia mais quente do Verão. Basta entrar numa dessas lojas de cosméticos que encontramos aos pontapés aqui por Macau, e notar como a maioria dos cartazes publicitários anunciam uma vasta gama de produtos que garantem "uma pele mais branca", mesmo os que prometem também "retardar o envelhecimento". Entre as minhas colegas chinesas, mesmo as mais novas, na hora de "cortar na casaca" de outra ou outras, já as escutei usar este critério: "fulana é preta", ou seja, neste caso tem a pele mais bronzeada que a sua. Isto explica-se facilmente com uma estratificação social que já vem da antiguidade; a realeza, as princesas, modelos de beleza e bom gosto, tinham a pele "branca como o leite", enquanto as camponesas, que trabalhavam de sol a sol, tinham a pele mais escura, bronzeada. E não é só na China, mas na Ásia em geral, e lembrei-me de um episódio que me aconteceu uma das últimas vezes que estive na Tailândia. Numa tarde em que fazia um calor de suar as lagostas, estava eu a ver umas camisolas numa tendinha em Bangkok, e reparei que a vendedora estava com uma t-shirt completa com mangas compridas daquelas que se tiram e põem, quase a tapar-lhe as mãos. Quando lhe perguntei se não sentia calor, ela respondeu-me que "não queria apanhar sol, para não ficar mais preta". Há alguém tão velhaco ao ponto de ver algum "racismo" nisto?
Os chineses são etnocentristas, e sempre foram, e isto não é de ontem, mas de há séculos, muito antes de se cunhar o conceito ocidental de "racismo", e se neste existe o factor da segregação, exclusão ou outro tipo de diferenciação, o etnocentrismo chinês não implica que exista um grupo étnico superior, e outro inferior - existem grupos "diferentes", isso sim. Quando se diz que a China "é outra cultura", convém usar essa medida para tudo, e não apenas para o que nos dá mais jeito, ou como pretexto para fotografar templos e pagodes, que alguns ocidentais contemplam como um boi que olha para um palácio, para surpresa dos chineses, que "estão fartos de ver aquilo". Contudo o que eles não vêem assim com tanta frequência são estrangeiros, e que se aplica para os pretos, serve para os brancos, também. Há casos reportados de desconforto na hora de lidar com os estrangeiros, especialmente os ocidentais, mas isso deve-se mais ao orgulho próprio do que a uma forma de rejeição. Os chineses conhecem-se "de gingeira", e sabem o que esperar de um camarada seu, mas não como lidar com um estrangeiro, e temem sobretudo "perder a face". Quem esteve na China, reparou certamente que os chineses que não falam inglês são muito mais reservados, um pouco ariscos, até, enquanto os que falam pelo menos o suficiente para se fazerem entender são mais desinibidos, e em alguns casos são capazes de aproveitar qualquer pretexto para "se meterem" com um ocidental. Ser capaz de comunicar com um ocidental é sinal de educação esmerada, e isto deixa os pais orgulhosos, mesmo que estes não sejam capazes de dizer mais do que "yes" e "no".
Há chineses que se mesclam com estrangeiros, claro, e quanto ao exemplo que vemos aqui no anúncio, há casais compostos de mulheres chinesas e homens pretos. Porquê? Porque gostam, e se permitem o aparte, tenho um caso destes na minha própria família (na da minha esposa, entenda-se). Algumas mulheres chinesas oprimem os sentimentos por imposições de índole cultural, outras há que mandam as convenções à fava, e a modernidade vai tornando as coisas menos complicadas. De um modo geral, os chineses convencem-se que a sua natureza de unicidade leva a que os relacionamentos só resultarão entre eles, com outros da sua etnia e "background" cultural, e uma jovem que opte por ter um namorado ou marido preto, arrisca-se a ser considerada "extravagante", mas nos dias que correm, raros serão os casos em que se dá rejeição por parte da família. Isto depende de muito mais do que a "cor dos bois", se me faço entender; uma jovem que seja diligente, esforçada, boa filha e sem antecedentes que levem a considerá-la remotamente "problemática", convence sem dificuldades os pais de que sabe muito bem o que faz, e estes normalmente confiam nela. Caso contrário, desconfiam de qualquer um, mesmo que seja um chinês "a cheirar a notas de conto" (ou de "yuan", ao câmbio local). Pode ser que desconfiem de algum tipo de deslumbramento da parte da moça (será que existe uma palavra para "jungle fever" em chinês?), mas certamente que não lhe precisam de explicar a "bagagem" cultural que ela própria carrega, ou de alguns obstáculos que a sua opção podem vir a trazer. Se os restantes familiares ou amigos da família "estranham"? Claro que estranham, e o camarada que se amancebar com a moça terá que estar preparado para ser durante algum tempo o centro das atenções. Depois habituam-se, e até consideram ter uma vantagem nesse sentido, comparativamente com as famílias mais puristas. Os filhos podem até ser azuis às bolinhas lilás, que se nascer na China, leva com uma educação chinesa como qualquer outro - isto é, se os pais não optarem por um colégio internacional ou algo do género, mas isso já são detalhes.
Contam-se histórias de indivíduos de cor na China que são objecto daquilo que no Ocidente consideramos "discriminação", e já expliquei há dois parágrafos qual a razão disto acontecer, mas há que acrescentar um ou outro pormenor mais "exótico" - tenho um amigo preto aqui em Macau a quem chegou a acontecer ser abordado por uma jovem que lhe começou a raspar a mão com um dedo, para "ver se a tinta saía" (já agora ele contou-me isto rindo a bandeiras despregadas). Ora bem, pode ser que se dêem casos semelhantes, mas isto deve-se à ignorância, e aqui uso a palavra no seu sentido mais puro e inocente. É o mesmo que no caso do leitor não souber nadar, por exemplo, porque nunca aprendeu, nunca calhou, sei lá, tem fobia a piscinas e praias, pronto. Admite que o chamem "ignorante" por causa disso? Claro que não, coração, e é por isso que certas comparações acabam por cair no saco do absurdo. Falo de certos artolas que a propósito deste vídeo comentaram qualquer coisa como "se fosse na Europa", ou "se fosse no Ocidente". Mas que grande "se", este, e no caso de ainda não terem entendido bem a diferença - e é possível que não tenham, uma vez que muitos são debilitados de raciocínio - aconselho que consultem um mapa, uma vez que dar sermões de História é como chover no molhado. Já agora, para quem ainda tem dúvidas quanto ao "racismo" dos chineses, recordo neste link que a China e os chineses foram recentemente considerados os mais receptivos a acolher refugiados. E esta, hein?
Quanto ao anúncio, deve conseguir passar na perfeição a mensagem para o mercado a que se destina, e sabiam também que em chinês dizer que alguma coisa "é preta" pode significar que "dá azar"? A cor preto (ou tal como o branco, "ausência da cor", um mero preciosismo) já existia antes de se espetar com ela nas pessoas, e pior do que isso, para atingir fins...pouco claros? Parece um bocado esquisito, posto desta forma, mas não está mal. E a propósito, alguém se lembrou de apontar o dedo ao detergente OMO e ao seu "slogan" "OMO lava mais branco"? Eu não entendo muito bem o critério para se considerar algo que não interfere com a cidadania de alguém como "racista", mas os entendidos vão encontrar algum "racismo" ali, com toda a certeza.
1 comentário:
Anónimo
disse...
Mas és um hipocrita de merda, como todos da sua laia. Pro hipocrita as coisas são assim : _se é na china :é etnocentrismo. _Se é na Europa : é xenofobia.
1 comentário:
Mas és um hipocrita de merda, como todos da sua laia.
Pro hipocrita as coisas são assim :
_se é na china :é etnocentrismo. _Se é na Europa : é xenofobia.
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