segunda-feira, 23 de maio de 2016

"Espanhóis" (yeah, right)



"Espanha", aquilo que comummente se designa por "país", ou "nação", que nem um hino com letra se digna a ter. Sim, desengana-se quem quando assistia aos jogos de futebol da "roja" pensava que nenhum dos jogadores sabia a letra do hino: o hino não tem letra. Razão? Bem, é complicado encontrar um consenso quanto  a uma letra que agrade a todos, quando a ideia do hino é que a nação no seu todo se identifique com ele. Imaginem que Portugal era uma manta de retalhos - e recordo que em área somos seis vezes mais pequenos, e com quase um quinto da população da Espanha - com os alentejanos cheios de ressentimento com os lisboetas, e um passado sangrento de confrontos entre o Porto e Trás-os-Montes. Puxem pela imaginação, e esqueçam-se que agora se chega de um destes sítios ao outro em menos de nada. O que aconteceria quando se escutasse o hino? "Nação valente e imortal? Isso é ideia vossa, seus fanfarrões da capital", "Contra os canhões...essa foi para quem? Para nós? É de nós, que estão a falar". Era mais ou menos a rivalidade norte-sul, com os primeiros a chamarem "mouros" aos outros, mas elevada à máxima potência. A propósito, sabiam que os tipos de Viana (do Castelo, ou "Biana") dizem que Braga "é em Marrocos"? Ainda é um esticãozinho, pá. Mas voltando aos espanhóis.


Aqui temos outro mapa, agora legendado com as principais províncias, ou "Comunidades Autónomas", como são designados. No fundo é isto que Portugal seria também se a tal Regionalização tivesse ido em frente, o que seria um tremendo disparate, dado o paradoxo entre o nosso caso e o caso de "nuestros hermanos". Basicamente a Espanha resume-se a isto: todos os outros odeiam Madrid e Castela, e sabendo disto, os castelhanos resolveram dar "mais autonomia" a cada região, o que estes interpretam como "manter o nariz longe dos seus assuntos". E há assuntos mil em cada uma das comunidades, si si, me gusta. Nós os portugueses, que conhecemos menos a Espanha do que julgamos conhecer, convencemos-nos que "são todos espanhóis, ponto". Errado. Ora se por uma lado a Andaluzia, com as suas sevilhanas, sangria, sol e "toros" se aproxima mais do ideal de "Espanha" protelado no sul de Portugal, já no norte os morcões identificam-se mais com a Galiza, onde xe fala axim, como ox ratinhoz falam (já desenvolvi este interessante fenómeno neste post). E de facto assim é, porquanto na Andaluzia, Estremadura, sul e centro de Espanha, e pode-se dizer com alguma segurança, na quase totalidade da Comunidade Valenciana se fala castelhano, temos oito (!) outros idiomas reconhecidos como oficiais em todo o país. Enquanto o galego, a que já fiz referência, é "Portuguex axim", e outros idiomas, casos do aragonês ou do asturiano, são demasiado próximos do castelhano, há dois exemplos que nos levam a crer que "estes gajos não são espanhóis. O primeiro até dá vontade de rir, e o segundo é de pasmar, e perguntar "esquê???". Ora lá vai o primeiro, então.



Mira l'exemple de Catalunya, on no es parla espanyol, et...oops, deixei-me entusiasmar, e quase que mamava este flán catalán todo sozinho. Ora bem, se calhar têm ouvido por aí dizer que a Catalunha quer a independência e não-sei-quê, e não é para menos, pois além de historicamente esta ter sido uma das últimas regiões a integrar a "Espanha" (e geograficamente formam uma espécie de "terra de ninguém" antes da França, verdade seja dita), fala-se ali...catalán! É o que se pode ver ali no recorte que publiquei da Viquipédia (a Wikipedia catalá) dedicado a Barcelona. É fácil de entender algo como "Barcelona és la ciutat més poblada del Principat i l'onzena de la Unió Europea" - é como o Jorge Jesus fala, mais ou menos (será que afinal o Jorge Jesus é catalão?), atendendo depois a certos preciosismos, como "l'onzena", que quer dizer "décima-primeira". Não é difícil, pois não? Eu tinha um amigo na net (e tenho, mas faz um tempão que não o contacto) que é catalão, adepto ferrenho do Barça, e que nos idos anos 90 do século passado veio de visita a Macau, e por simpatia até me trouxe uma camisola 7 do Barça, ostentando o nome do "nosso" Luís Figo - isto portanto anteriormente à traição do dito cujo, e quando ainda nem se ouvia falar de C. Ronaldo, entenda-se. Mas o mais interessante era como ele insistia que eu falasse português com ele, pois "entendia-se", por "ser muito semelhante ao catalán". Não achei nada, mas que se lixe, que se há coisa que me irrita é ter que falar português como o palhaço Batatinha, pronunciando exactamente as mesmas palavras, só que com as vogais mais abertas. Igual ao Cristiano Ronaldo, no fundo, que depois de tantos anos em Espanha, a única palavra que aprendeu a dizer foi "acostumbrado" (juro, vejam esta entrevista, se não acreditam). Mas mudemos de poiso, e aqui é que a "Espanha" acaba, e começa...


...o...bom, já lá vamos. Primeiro reparem nesta imagem, onde podemos vislumbrar quatro cidades "espanholas", três delas entre as dez maiores do país: Donostia, Gasteiz e Iruña, além da castiça Lizarra, que se pode equiparar a Monsanto, em Portugal, em termos de interesse. Nunca ouviram falar? Devo estar enganado, ou a tentar fazer-vos de parvos, usando vilarejos nos arredores de Badajoz para vos confundir? Ah! Ignorantes, é o que sóis, se não souberdes que Donostia é San Sebastian, Gasteiz é Vitória, Iruña é nada mais que Pamplona, e aquela tal Lizarra é mais conhecida por Estella. As duas primeiras ficam localizadas no Euskadi, ou País Basco, e as restantes em Navarra, que é igualmente reclamada pelos bascos como território originalmente parte do Euskadi, e onde se fala...Euskara, ou Basco. Este idioma tem deixado estudiosos da linguística perplexos, pois apesar de se localizar na mesma região das línguas indo-europeias, o basco não deriva de qualquer outro idioma. Ora toma! Teorias que expliquem isto há inúmeras, é claro, e entre as mais plausíveis está o facto daquela região ficar isolada pelos Pirinéus e densas florestas, o que permitiu aos bascos preservar a sua língua primitiva. Mas hoje em dia apenas um terço, ou menos, dos bascos falar Euskara, isto muito por culpa...


...de Francisco Franco, o generalíssimo também conhecido por "el caudillo", que proibiu o uso do idioma, de modo a unificar de vez o país - afinal sempre há um culpado a quem se pode apontar o dedo. O franquismo levou ao recrudescimento do nacionalismo basco, que no seu lado mais negro tinha o grupo terrorista ETA, que devia muita da sua popularidade ao ditador. Deixou de ter uma razão de ser uma vez que Franco se eclipsou, e os bascos em geral estão satisfeitos com o grau de autonomia que lhes é conferido. Ou pelo menos não expressam violentamente o seu descontentamento. Contudo, e apesar da minoria de falantes do basco, estes conseguem entender o resto dos espanhóis, pois é o castelhano que se aprende nas escolas, mas o contrário já não é bem verdade: um natural de Madrid não entenderá uma palavra de basco. Uma curiosidade interessante tem a ver com os nomes e apelidos no País Basco e Navarra. Se vos pedirem para dizer um nome espanhol, o que vos ocorre? Paco García? Juan Mendoza? Pablo Sánchez? Qualquer coisa do género, aposto. E que tal...


...Jon Elorriaga Berrojalbiz? Ou Xiker Ozerinjauregi Mendikoetxea, que mais parece um trava-línguas, ou Mikel Murgoitio Lejarreta, e ainda o meu favorito, Iker Amorrortu Andrinúa? Não só estes rapazes perdoaram os pais, como ainda lhes agradeceram, e é com orgulho que ostentam estes nomes "espanhóis". E sim, recorri a jogadores da bola, na falta da lista telefónica de Metro Bilbau (a maior cidade do País Basco, já agora), e isto também serve para explicar o que fazem na selecção espanhola no meio dos Sánchez e dos Domínguez nomes como Zubizarreta, Goikotxea ou Illarramendi: são bascos, não têm a culpa. Basco era ainda o nosso saudoso maestro Secondo Galarza, radicado em Portugal, onde veio a acabar os seus dias, e no caso de Macau temos Miguel (Mikel) Larrea, um "pilotarien" (jogador de pelota basca) que por aqui assentou arraiais e criou raízes. Pilota, zure bidez orok euskaldunak bagarelako famak dituzte erantzunak, zuk eginak gaituzu denen ezagunak, asko zor dauzu zuri gure nortasunak.  


Concluindo: será que se pode falar de "Espanha" como conceito, ou numa perspectiva "marota" diria-se antes que tudo aquilo não passa de gatos metidos no mesmo saco? Não me levem a mal, acho aquilo o máximo, e se há coisa que nunca me podem acusar é de "não gostar de espanhóis" - como podia eu gostar ou não gostar de uma coisa que nem existe? Me fué! 

1 comentário:

Anónimo disse...

e depois ? ao que parece ,podem e devem discriminarem pelo idioma .Mas pelo sangue jamais ,não é !? todo esse ódio-oriundo de um nitido complexo de inferioridade- pelas identidades européias se dá pelo fato de sua familia nao pertecer a alguma?