segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Que rica manjedoura


Agora que entrámos em pleno no Ano do Cavalo, rebentaram (e vão rebentar mais) panchões, e por toda a parte se escutam os mais sinceros desejos de muitas "proximidades" para o novo ano, deixo-vos com o artigo da última quinta-feira do Hoje Macau. Continuação de boas férias para quem ainda está de férias, e os meus sinceros pêsames para os outros.

Celebremos a chegada do novo Ano do Cavalo! Eis que chega a hora do mundo ficar completamente transformado, pois chega mais um Ano Novo Lunar e a magia anda no ar! Nada como dessa magia provar (e aprovar) do que ir até a um dos muitos, muitos, mas mesmo tantos que não daria para mencionar todos, casinos do território, onde com esta lava vulcânica de “feng-shui” que agora jorra é simplesmente im-po-ssí-vel perder. Esta é uma época em que os casinos perdem a cabeça, e oferecem rios de dinheiro, como se fosse uma caixa de granadas prestes a rebentarem-lhes na cara. Seria impensável deitar fora esta oportunidade de enriquecer, e levar a nota toda a essa fábrica de multiplicar notas que é o casino. Não acredita? Aqui fica o testemunho de alguns personagens que hoje são estupidamente milionárias (bilionárias, se for em dongs vietnamitas ou rupias indonésias) graças a esse maná que é o jogo. Qualquer semelhança com pessoas ou factos reais é meramente intencional, e os nomes foram alterados para proteger os indecentes.
O sr. Zhao, empresário da China continental, 42 anos, vem a Macau duas ou três vezes por ano. Traz consigo 20 milhões de renminbis, e em cinco ou seis dias que cá fica deixa metade desse valor no casino, enquanto a outra metade é gasta em bens de luxo, jantaradas onde a mesa é desinfectada antes com um dos mais caros conhaques VSOP, e estadia num dos melhores quartos de um dos melhores hotéis com, ahem, tudo a que há direito. Certamente que a quantia investida pelo sr. Zhao nessa fotocopiadora da fortuna que é o casino lhe trará ganhos incalculáveis.
O sr. Lao é natural de Macau, tem 51 anos, e passou quase metade da sua vida com o bicho da jogatina no corpo. Como qualquer “rato-de-casino” endividou-se até aos olhos, alienou família e amigos. Quando liga para alguém mandam-lhe dizer que “não está”, e os conhecidos fingem que ele é invísivel, ou mudam de passeio sempre que o avistam na rua. Quando trava amizade com um incauto que ainda não o conhece, arquitecta uma teia de mentiras para lhe extorquir quinhentas, ou mil patacas que sejam para alimentar o seu “bicho”, que já começou a morder. O que todos estes ingénuos descrentes nem sonham é com a fortuna do sr. Lao. Todo este dinheiro empatado todos estes anos no casino vão torná-lo no homem mais rico do mundo, um dia. É tudo uma questão de tempo. Nesse dia todos os que lhe viram a cara vão ento bater-lhe à porta, com um sorriso de orelha a orelha. Aí levam-no em ombros e aclamam-no seu rei. E vão parecer tão ingratos...
Peggy Lei, 22 anos, natural de Hong Kong, estudante universitária. Num fim-de-semana alargado veio com duas amigas a Macau, fazer comprinhas nos hotéis e “abanar o capacete” nos clubes da moda. Ao contrário das amigas, mais ajuízadas, Peggy foi dar um pulinho à sala de um dos casinos, onde foi avaliar o que pensam dela os deuses da sorte e da prosperidade. Não convencida com a primeira experiência, voltou lá outra vez no dia seguinte, logo de manhã, e depois outra vez à tarde, e mais uma vez à noite, dessa feita até à manhã seguinte. Na hora de voltar a Hong Kong diz às amigas que “vai mais tarde”, até porque tem vergonha de lhes pedir o dinheiro do bilhete, que acabara de perder minutos antes. E agora, sozinha em Macau, sem conhecer ninguém, sem lugar para ficar ou dinheiro para comer? Simples, fica-se pela porta dos casinos, metem conversas com estranhos, vão beber um copo com eles, e mais o que for preciso para sacar trezentas ou quinhentas patacas que dêm para mais uma volta, mais uma viagem na roda da fortuna. Não vai ser vergonha nenhuma quando lhe sair o prometido jackpot, e “está quase a sair”. É que o dinheiro fala sempre mais alto.
Cheong tem 24 anos, está desempregado, e no seu tempo de lazer faz aquilo que há em Macau para fazer em matéria de lazer: joga. Um dia combina uma esquema com dois amigos: estes ligam aos seus pais, dizem que o raptaram e obrigam os velhos a depositar 200 mil patacas na conta de um deles, e ficam com esse capital para poder “multiplicar”. Às vezes pode dar certo, não sabemos bem, pois os casos que ficamos a saber são aqueles em que as autoridades chegam primeiro, e “abrem o caso ao meio”. As razões que levaram o jovem a fazer isto com os próprios pais podem ser muitas, mas vão sempre levar ao tapete do casino, onde o dinheiro iria ser investido num plano maior, e os retornos chegariam um dia, e trariam a esta negra história um final feliz. Eles é que não o compreenderiam, nunca. É que a magia da multiplicação das fichas não está ao alcance dos olhos de qualquer um. É só para os sobredotados.
Zhao, Lao, Peggy Lei e Cheong são ricos, milionários, têm tanto dinheiro que já perderam a conta de quanto têm. Um dia destes vão até esse grande banco místico dos néons, das luzinhas a piscar, das campaínhas a tocar, dos dados a rolar e das roletas a roletar. Pode ser que nos cruzemos com um deles um destes dias em que a sorte anda mesmo a desafiar, a badalhoca. Feliz Ano do Cavalo. Kung Hei Fat Choi, e saudinha! (sim, porque “kung hei” é “felicidade” e “fat choi” é “prosperidade” – nada a ver com a saúde, que também faz muita falta).

Sem comentários: