Quem olhar para qualquer lista dos melhores ou mais vendidos álbums dos anos 80, vai quase com toda a certeza encontrar na maioria delas o título "Appetite for Destruction" (em português, "apetite pela destuição", nem mais), de uns tais Guns'n'Roses. Este grupo, apesar de ter tido a sua consagração no início da década de 90, foi formada em Los Angeles no ano de 1986 pela fusão de duas bandas já existentes, os L.A. Guns, onde pontificava um tal Tracii Guns, e os Hollywood Rose, liderados por um certo Axl Rose, nome artístico de William Bruce Rose Jr., que na juventude viria a adoptar o apelido do padrasto, passando a chamar-se William Bruce Bailey. Este personagem é um dos mais controversos da história recente do "hard-rock". Alegadamente vítima de abusos na infância, incluíndo os de natureza sexual (?), Bailey tinha um Q.I. acima do normal, e deve ser devido a esta combinação bizarra que se tornou num marginal com tendência para a psicose, e diagnosticado com transtorno bipolar. Ah sim, e era ainda heroínamo, e nem tinha piada se não fosse. Os restantes elementos dos Guns'n'Roses também não eram propriamente meninos de coro, e tinham uma aparência que convidava qualquer pessoa com amor à saudinha que estivesse num bar e os visse a entrar a pagar a conta e pôr-se a milhas. Depois da fusão que deu origem ao grupo, Tracii Guns foi empurrado borda-fora, e assim o elenco era composto por Axl Rose na voz, Saul Hudson, conhecido por "Slash", e Izzy Stradlin nas guitarras, Duff McKagan no baixo e Steven Adler na bateria. Slash, um britânico filho de mãe afro-Americana que era modista e tinha David Bowie entre a sua clientela, tornou-se na segunda figura do grupo, a par de Axl Rose, com o seu estatuto de "guitar hero". Em 1986 lançam o seu primeiro EP, "Live ?!*@ Like a Suicide", que contém quatro temas gravados ao vivo, apenas dois deles originais. Este EP viria a fazer parte do segundo álbum "G N'R Lies", que sairia meses depois de "Appetite for Destruction", juntamente com quatro temas acústicos.
Portanto, posto isto, o que tem "Appetite for Destruction" que o torna um dos albums mais vendidos e celebrados da década de 80, e discutivelmente o melhor do "hard-rock"? Como é possível ter chegado a nº 1 da Billboard, onde passou 147 semanas no top-200, tripla platina no Reino Unido, e na altura o disco em língua estrangeira mais vendido de sempre na Argentina (?). Como é que este indivíduos tão pouco recomendáveis venderam 28 milhões de discos na sua estreia, melhor que o disco de estreia das Spice Girls ou outros emblemáticos como "Nirvana" dos Nevermind ou "Like a Virgin" de Madonna? A explicação é simples de encontrar, tendo em conta a época em que saíu, sendo então considerado "revolucionário" quer no som quer na estética apresentados, combinando o "glam-rock" com o "hardcore", resultando num som pesado e ao mesmo tempo acessível. Além disso foi um dos primeiros a levar com a tal etiqueta que avisava para conteúdos obscenos ou material indecente, o que só por si já é suficiente para vender um ou dois milhões de cópias. Em "Appetite for Destruction" os Guns'N'Roses vulgarizam o uso da obscenidade, quebrando preconceitos e originando uma legião de imitadores. E a naturalidade com que Axl Rose o fazia era espantosa: para ele tudo era um "fucking" qualquer coisa, e a meio de uma canção atirava com um "fuck" qualquer como se fosse a assinalar uma mudança de parágrafo. A capa era também muito convidativa; na frente um desenho de um crucifixo com as caveiras dos cinco elementos da banda (no topo do artigo), e na traseira uma mulher acabada de ser violentada por um robô metálico, e uma criatura voadora semelhante ao monstro de "Alien" (em cima deste parágrafo - e esta era inicialmente a capa da frente).
Agora perguntam, o Leocardo gosta deste disco, que em português se chama "apetite para a destriuição"? Claro, e não me interpretem mal, especialmente o que vem a seguir. Adorei esta preciosa obra de arte. Ia dormir com "apetite para a destruição", acordava com "apetite para a destruição", ia para a escola com "apetite para a destruição" nos ouvidos, isto tudo salvo seja. Contudo não posso deixar de achar engraçado, 25 anos depois, analisar em detalhe o conteúdo desta estreia dos Guns'N'Roses, especialmente esse "cromo" tão singular e tão raro que era Axl Rose. Vamos portanto esmiuçar este trabalho que tornou estes cinco rapazes de Los Angeles milionários logo à primeira pescaria:
O disco abre com este "Welcome to the Jungle", e nem podia começar melhor. O título significa em português "bem-vindos à selva", e nesta selva está um porco-espinho, uma espécie de Tina Turner oxigenada, que nos diz a certa altura "You know where you are? You're in the jungle, baby...and you're gonna dieeeee" (Sabes onde estás? Estás na selva, filha...e vais morreeeer"). O tema é sobre as ruas circundantes à Hollywood Blvd., em Los Angeles, e de acordo com uma entrevista a Izzy Stradlin, "fiel à realidade". Não duvido, pois a quantidade de prostitutas e traficantes de droga que circulam por volta das "novelty shops" e os bares de "strip-tease" não devem tornar o lugar muito recomendável. A frase "Welcome to the Jungle" aparece no tema "Underwater World", da banda finlandesa Hanoi Rocks, que próprio Axl confessou "ser uma das grandes inspirações dos Guns N'Roses". A interpretação de Axl é interessante; a certo ponto produz gemidos semelhantes aos de uma relação sexual, mas no dá para entender muito bem se está na papel activo ou passivo da mesma. A canção, que foi o Segundo single dos G'N'R depois de "It's so Easy", aparece nos lugares cimeiros de praticamente todas as listas das melhores de sempre do "heavy-metal", foi considerada pela revista "Blender" a melhor canção sobre Los Angeles, e pela VH1 a melhor de sempre do "hard-rock". Dá para entender porquê, e à vigésima vez que Axl nos dá as boas vindas à tal "selva", dá vontade de perguntar: "não disseste que iamos morrer? então estás à espera do quê?". Torturar é que não vale...
"It's So Easy" é a segunda faixa do disco, e foi o primeiro single de sempre dos Guns N'Roses. Apesar da passagem discreta pelas charts - foi nº 84 no Reino Unido e no entrou no top-200 da Billboard - o tema chama a atenção pela temática e pela letra. Fala da vida como músico de "rock", e de como é fácil conseguir tudo o que se quer, mesmo não tendo dinheiro - especialmente sexo. O recurso à obscenidade e à vulgaridade são um dos temperos, claro. A Terceira faixa é "Nighttrain", que também seria editada em single, e que é sobre uma marca de vinho da Califórnia barato, "Nigh train express", e que Slash mencionou na sua auto-biografia como sendo "a canção que mais gostava de tocar ao vivo". Segue-se "Out ta get me", que fala dos problemas de Axl com as autoridades durante a sua adolescência, enquanto vivia no estado do Indiana. Estava ainda na faculdade do crime, portanto.
"Mr. Brownstone" é a faixa que se segue. Em primeiro lugar, queria pedir desculpa pelo videoclip, que é uma colagem de vários concertos dos G'N'R, e desculpas especialmente pelas partes onde Axl aparece com aqueles calções curtos pretos e aquelas calças brancas apertadas. Uma das razões porque não existe um videoclip oficial deve-se ao facto do tema nunca ter sido editado e single, aparecendo no lado B de outros dois singles: "Welcome to the jungle" e "It's so Easy". E é pena, pois este por acaso é um dos temas do grupo que mais gosto. Este "brownstone" (pedra castanha) é um calão para designar heroína, e foi pensado inicialmente por Izzy Stradlin numa tarde em que estava no apartamento da namorada, e ambos se lamentavam por serem "junkies". Numa das linhas da canção Axl canta: "I used to do a little, but a little wouldn't do, so the little got more and more" (eu usava um pouco, depois um pouco não chegava, então o pouco foi-se tornando cada vez mais), e no refrão escuta-se: "We been dancin' with Mr. Brownstone, he's been knockin', he won't leave me alone" (andamos a dançar com o 'sr. pedra-castanha', ele bate-me à porta e não me deixa em paz). Tão educativo quanto decadente. "Mr. Brownstone" foi notícia aquando do massacre do Virginia-Tech em 2007, levado a cabo pelo estudante sul-coreano Seung Hui-Cho, que matou 32 pessoas e feriu 17, suicidando-se de seguida. Nos seus apontamentos foram encontradas algumas notas, e entre elas uma pequena peça intitulada precisamente "Mr. Brownstone", e que contém passagens da letra dos G'N'R.
"Paradise City", o sexto tema do disco, seria uma canção perfeita se fosse dois ou três minutos mais curta que os 6:48 que dura, parte dos quais consistem em Axl a balir: "naa take me hoooomeee...take me hoooomeee....won't you please ta-ke-me-hoooo-meeeee". Quer dizer, porque é que não levam o homem de vez para casa e dão descanso aos nossos ouvidos? Uma curiosidade interessante relacionada com a composição do tema: a banda estava a beber (pois, "beber", a gente finge que acredita) na traseira da carrinha quando Duff e Izzy começam a tocar a melodia na guitarra, e foi então que Slash e Axl começam a improvisar a letra. Axl deu o mote com "take me down to the paradise city", e Slash a rima "where the grass is green and the girls are pretty", mas na segunda linha o guitarrista pensou em "where the girls are fat and have big titties" (onde as miúdas são gordas e têm mamas grandes), que o resto da banda votou contra - e outra coisa não seria de esperar. Apesar da "nega", Slash diz que esta é a sua canção favorita da banda. Talvez porque a revista "Total Guitar" considera que o seu solo de guitarra é o terceiro melhor de sempre. "Paradise City" é o quarto single de "Appetite for Destruction", foi nº 5 nos Estados Unidos, tornando-se o terceiro consecutivo da banda a chegar ao top-10 da Billboard, e foi nº 6 no Reino Unido. O vídeo foi realizado por Nigel Dick e filmado no estádio dos New York Giants, em Nova Jersey, perante 70 mil pessoas, e custou 200 mil dólares.
Este é um dos temas mais pesados do álbum, tanto na música como na letra. Uma excelente peça de "heavy-metal", sem dúvida, apesar de nunca ter saído em single. Conta-se a propósito da origem do tema que uma amiga da banda, uma tal Michelle Young, apanhava um dia boleia de Axl Rose, e no radio do carro ouvia-se "Your Song", de Elton John. Michelle confessou como seria fantástico que alguém lhe dedicasse uma canção a ela, e então Rose meteu as mãos à obra. A introdução é o que se segue: "Your daddy works in porno now that mommy's not around/She used to love her heroine but now she's underground/So you stay out late at night and you do your coke for free/Drivin' your friends crazy with your life's insanity". Tradução: "O teu pai trabalha em pornografia/Agora que a tua mãe morreu/Ela adorava a sua heroína, mas agora está na cova/Então ficas na rua até às tantas a dar na coca de borla/Enlouquecendo os teus amigos com as tuas maluquices". O grupo achou que não ficou mal, mas que a Michelle podia ficar ofendida, e mesmo assim resolveram mostrar-lhe para ver a sua reacção. A menina adorou a homenagem, uma vez que era cocaínomana, o pai trabalhava na indústria porno e a mãe tinha de facto morrido de uma "overdose" de heroína. Nada como nos dedicaram uma canção, e ainda por cima tão sincera. Que momento tão bonito.
A oitava faixa é "I Think About You", um tema de amor da autoria de Izzy Stradlin, e a seguir vem "Sweet Child O'Mine", a canção de maior sucesso do álbum e que catapultou os Guns N'Roses para o estrelato, e garantiu-lhes um público mais alargado - toda a gente gosta de ouvir uma balada como "Sweet Child O'Mine", que ainda por cima não contém obscenidades, O tema foi escrito por Axl e dedicado à namorada na altura, Erin Everly, filha do músico Don Everly, dos The Everly Brothers, um grupo de música "country". Penso que a moça devia andar aborrecida com o pai, para escolher um namorado do mesmo ramo,mas...Axl Rose? Mas pronto, também não ficaram juntos muito tempo. O que ficou muito tempo mas nos tops foi a canção, que chegou a nº 1 da Billboard - o único nº 1 dos G'N'R na tabela de singles norte-americana - e nº 6 no Reino Unido. Uma das razões que "Sweet Child O'Mine é inconfundível é pelo solo de guitarra de Slash, que no vídeo foi cortado em mais de um minuto para exibição na MTV, para o tornar mais "comercial". Bem podiam cortar antes a aflição urinária de Axl, com aquele "where did you go...where did you go now...where did you..where did you goo-ooo...uhhhh...where did you go, nananananananana, where did you gooooo...ohohoh...where did you go...mahahahahahaha...ohohohohoh". Será que alguém é capaz de indicar uma direcção qualquer ao gajo, que é para ver se ele se cala? Uma curiosidade: os Guns N'Roses tinham gravado outra balada, "November Rain" (ouviram falar?) que queriam incluir em "Appetite for Destruction", mas decidiram que uma era suficiente, e empurraram aquela para um disco seguinte. Isto é o que se chama "fazer o peixe render".
A faixa nº 10, "You're Crazy", que foi gravada numa versão acústica para o álbum "G N'R Lies", é mais um bom exemplo de como Axl estraga tudo com aquela gemideira inexplicável: "you know you're crazy...oh my...you're fuckin' crazy...oh chi-ild...uhhhh....yeah!...oh-oh-oh...oh yeah, oh yeah, oh yeah, no no no no no no no no no no...no, no, no...no, no, oh yeah oh yeah oh yeah....uhhhhhh". O penúltimo tema é "Anything Goes", e "Appetite for Destruction" fecha com "Rocket Queen", dedicada a uma miúda que queria formar uma banda a que queria chamar Rocket Queen. Perto do final é possível escutar o som de uma jovem prestes a atingir um orgasm (ou pelo menos a fingir...), que é uma forma interessante de encerrar o disco. Nos créditos ficamos a saber que a tal "rockeira" se trata de uma tal Barbi von Grief. Devia ser outra amiga dos rapazes.
Welcome to the jungle...sorry I ate all the monkeys.
Depois de "Appetite for Destruction" e "G N'R Lies" os Guns N'Roses confirmaram o estatuto de mega-banda com os dois duplos-álbums "Use Your Illusion" I e II, que além do já referido "November Rain", incluía ainda "Don't Cry", "Back off Bitch" e "You Could be Mine", todas gravadas durante as sessões do primeiro registo. Aí começaram os problemas, com Steven Adler a sair durante as gravações de "Use Your Illusion", devido ao consumo abusivo de estupefacientes (e eu a pensar que neste ramo ganham-se medalhas por isso), e Izzy Stradlin decide sair depois das gravações, queixando-se que Axl "demorou dois anos a graver as partes vocais, atrasando a saída dos discos". Foram substituídos por Matt Sorum e Gilby Clarke respectivamente, com o teclista Dizzy Reed a juntar-se ao grupo pelo meio. Em 1993, e sem canções novas para apresentar, lançam "The Spaghetti Incident?", um título estranho para um disco de "covers" de outras bandas. Posto isto Slash e Duff McKagan, dois dos fundadores, deixam a banda, dando a entender que os G'N'R iam acabar, só que Axl disse "não senhor", e em 1998 anunciou que ia sair um disco novo, com o título "Chinese Democracy". E lá sair saiu...10 anos depois, em 2008, com muitas saídas e entradas de elementos da banda à mistura, e 14 milhões em custos de produção. Aquele indivíduo na imagem não é Keke Rosberg, mas uma imagem recente de Axl Rose. Parece que depois do "Appetite for Destruction" ficou apenas o..."Appetite".
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