segunda-feira, 3 de março de 2008

É de toda a gente, não é de ninguém


Mais do que a inflação ou o incomportável preço do imobiliário, o que mais me preocupa hoje em dia em Macau é a forma como os nossos cidadãos estão cada vez mais egoistas e individualistas, ao ponto de começarem, por vezes, a perder o discernimento. Desta vez a Associação de Mútuo Auxílio dos Moradores da Avenida Almeida Ribeiro (ufa!), através do seu presidente Lei Chek Kuan, vem manifestar-se contra a presença de filipinos no Largo do Senado.

Reparem na última frase daquele último parágrafo: "vem manifestar-se contra a presença de filipinos no Largo do Senado". Eufemismo utilizado: apela às autoridades que tomem medidas contra a concentração de imigrantes nos bancos do Leal Senado. Não que os imigrantes tenham cometido algum crime ou incomodem o normal funcionamento das instituições ou estejam a atrapalhar o trânsito ou o comércio, não. Simplesmente porque estão ali a mais, pronto.

Segundo Lei Chek Kuan os moradores queixam-se da falta de locais para se sentarem e conversarem. Coitados. Isto realmente é preciso agir, e com urgência. Quando estes residentes compraram uma moradia, apartamento ou água-furtada na Av. Almeida Ribeiro, estavam também a comprar uma fatia ou talhão do Largo do Senado. Isto como se não bastassem os parquímetros ou o exagerado preço do parque automóvel em Macau, eis que agora é preciso pensar duas vezes antes de sentar o bronzeado rabinho (o dos filipinos, gostaram?) numa das cadeiras do San Ma Lou.

Não que esta associação esteja contra os tais imigrantes. Nada disso. Também os moradores do Helen Garden nada têm contra os velhos, nem eu tenho nada contra as baratas que aparecem cá em casa, só que quando as vejo, piso-as. Só que estes filipinos são da espécie mijanaestradus, já observada também lá para os lados das Ruínas de S. Paulo, e são facilmente reconhecidos pelo rasto de urina que deixam quando passam.

É que assim não dá. Os filipinos deixam lá lixo e "fazem barulho de madrugada". Sem ofensa, senhor Lei, mas o senhor é mesmo mentiroso, pá. É neste momento uma da manhã e desafio-o a ir ao Largo do Senado procurar um filipino que esteja a fazer barulho. Ah pois, sugere "mais policiamento" e aconselha as autoridades a patrulhar intensivamente a área de modo a fazer cumprir os regulamentos. Oh, oh, oh. Imaginem só, os senhores guardas de pauzinho em riste a garantir que cada cidadão não cospe ou deita lixo para o chão.

Mas é que isto pode até criar preconceitos nesta terra maravilhosa onde convivem tantas raças e credos em perfeita harmonia, diz Lei. Por causa de meia dúzia de filipinos mijões, a população pode pensar que nas Filipinas é hábito mijar-se na traseira dos Correios, como se de um ritual se tratasse. É engraçado, no outro dia fui ao Colégio D. Bosco assistir ao jogo de basquetebol do primo dos meus filhos, e fiquei estupefacto com a quantidade enorme de lixo que lá ficou depois do jogo. Juro que se tivesse levado o bate-chapas registava o momento. Mas ainda posso vir a fazê-lo, para a próxima.

E quanto à imagem do Largo do Senado, ex libris do território? Fica mal ter lá uns filipinos sentados todo o santo dia na amena cavaqueira? Eu preocupo-me mais com a imagem que passamos para os milhares dos turistas que nos visitam e observam aquele pobre velho que está de pé junto do Starbucks enalando um intenso cheiro a urina. O que se passa neste caso? Atracção turística? Património mundial? E o que faz esta associação da treta? Trava uma guerra contra os filipinos motivada por preconceitos racistas. Nada mais do que isso.

E depois o que sugere o presidente desta associação? Que se faça "uma divulgação mais eficaz de conceitos de educação cívica" entre os imigrantes, e que se "apazigue as saudades que têm de casa, dinamizando a cultura das comunidades locais". Noutras palavras, toca a educar os indígenas e atirá-los para guetos onde possam exercer livremente os seus actos de canibalismo ou lá o que é. Mas sabe uma coisa, sr. Lei? O Largo do Senado não é seu. É independente, é de toda a gente, não é de ninguém. E onde é que já ouvi isto?

7 comentários:

Anónimo disse...

o que o pessoal devia protestar era contra a labregada que vem do lado de lá das portas do cerco para encher qualquer canto de macau com fumo de tabaco, escarros e lixo por todo o lado, sejam eles turistas ou trabalhadores nao-residentes. por mim podem vir mais filipinos, tailandeses, malaios, kwai-lous, pretos, o que quer que seja, pois de certeza que serao mais civilazados que os " ah-chaan"

Anónimo disse...

civilizados

Anónimo disse...

Pois, mas os incivilizados labregos são, ou sentem-se, como os verdadeiros donos de Macau. Agora aturem-nos. Aliás, não tardará muito tempo que estejam todos aculturados aos usos e costumes dos labregos que entram pelas porta do cerco.

Anónimo disse...

Parece que os chineses estão muito mudados: não se sentam nos bancos, nem ficam horas numa jogatina qualquer; não fazem barulho, nem levantam a voz para uma simples conversa; não cospem na rua, nem deitam nada para o chão. Muito mudados mesmo...

Leocardo disse...

Gostei do seu apontamento sarcástico, meu caro j.c.

Anónimo disse...

Aliás, é pena que a "civilização mais antiga do mundo" tarde a aprender alguma, pouca, vá lá, civilidade. E se tratassem antes de resolver assuntos como, por exemplo:
- o encontrão brutal/fatal;
- os berros de quem estabelece comunicação com Marte por via da goela (estão, portanto, explicadas as avalanches recentemente verificadas naquele planeta);
- o "civilizadíssimo" hábito de atirar lixo em todas as direcções assinaladas na rosa dos ventos; e
- claro, o culto do arroto fúnebre (que de tão profundo e tenebroso, parece que alguém acaba de se finar por via de explosão).
Ora, Sr. Coiso da Associação Não Amiga dos Filipinos, comece lá por discutir e resolver estas questões, que depois a malta une-se na luta contra os vertedores d'água na via pública.

Anónimo disse...

Ah, esqueci-me de um outro produto inolvidável da "civilização mais antiga do mundo", evidentemente digno de apreciação: a galharda escarreta verde, sempre atirada à queima-roupa!