domingo, 9 de fevereiro de 2014

Os sons dos 80: UB40


Foi a 11 de Maio de 1981 que o mundo recebe a notícia da morte de Bob Marley, vítima de cancro. Aos 36 anos desaparecia o grande nome do "reggae", um género musical originário das Caraíbas com raízes nos cânticos negros africanos, com uma forte componente religiosa e uma mensagem de paz, que Marley transpôs como ninguém para um apelo à igualdade entre todos os homens, independente da sua cor, origem ou crença - sendo isto variável com a interpretação de cada um, lógico. Mas com ou sem o peso da mensagem, Bob Marley era o expoente máximo deste género musical, e não viria a aparecer um sucessor à sua altura. O "reggae" mais puro, o que se fazia na Jamaica, não se traduzia numa linguagem comercial que lhe pudesse valer uma recepção a nível global, e os restantes artistas com projecção internacional não chegavam aos calcanhares do "Natty Dread". Peter Tosh, companheiro de Marley nos Wailers, não tinha o mesmo carisma ou disciplina, e viria a sua carreira encurtada em 1987, vítima de homicídio, e Ziggy Marley, filho da lenda, nunca conseguiu arrancar para uma carreira que fizesse justiça ao seu apelido. Outros artistas incluíam Jimmy Cliff, que teve um êxito apenas com "Raggae Nights", que os mais puristas recusaram chamar "reggae", e outros como Billy Ocean ou Bori Gardiner optaram por um som mais "pop" e generalista, traíndo as "roots, rock, reggae" originais de Marley. Quem viria a carregar a herança do "reggae" durante todos os anos 80 e depois disso seria um grupo de rapazes de Birmingham, Inglaterra: os UB40.


Formados em 1978 e com Bob Marley como grande referência, Brian Travers formou com os amigos e músicos Astro, James Brown, Ali Campbell, Robin Campbell, Earl Falconer, Norman Hassan e Mickey Virtue os UB40. O nome, que se lê "iu-bi-forty", foi retirado do formulário de inscrição para o fundo de desemprego: Unemployment Benefit, form 40. O grupo começou a tocar em bares na sua Birmingham natal e arredores, e chamou a atenção de Chrissie Hynde, a vocalista dos Pretenders, um grupo "pós-punk" inglês que já gozava de alguma popularidade, e convido-os a fazer as primeiras partes dos seus concertos. O primeiro single, "Food for thought", saía em 1980 através de uma editora completamente desconhecida, a Graduate Records, e surpreendentemente chegava ao nº 4 do top do Reino Unido. No mesmo single estava incluído o tema "King", uma homenagem a Martin Luther King, e ambos seriam incluídos no primeiro álbum do grupo, "Signing Off". Apesar de se revesarem entre os seus elementos nas partes vocais, seria Ali Campbell o vocalista principal durante toda a carreira dos UB40.


Depois da estreia auspiciosa, seguiam-se mais dois álbums compostos por material original: "Present Arms" (1981), com o single "One in ten" a chegar ao nº 7 no Reino Unido, e "UB44" (1982), que apesar de não ter nenhum single nos "charts", chegava a nº 4 do top de álbums. Seria em 1983 que os UB40 ganhavam reconhecimento tanto a nível doméstico como internacional, com "Labour of Love", um disco composto inteiramente de canções de outros artistas adaptados para a sonoridade "reggae". O álbum chegava a nº 1 no Reino Unido, assim como o single "Red, Red Wine", com a nuance de atingir também o primeiro lugar da Billboard nos Estados Unidos. O grupo atingia o "jackpot" com este original de Neil Diamond, gravado em 1968, mas que em 1969 já tinha recebido um tratamento "reggae" pelo artista jamaicano Tony Tribe. Contudo seria com os UB40 que o tema chegaria ao conhecimento do grande público. Só este video tem já mais de 18 milhões de visualizações no YouTube.


Depois do estrondoso sucesso de "Labour of Love", os UB40 voltaram a gravar material original, e em 1984 saía "Geffery Morgan", com uma recepção menos cálida, mas que mesmo assim teve o single "If It Happens Again" no top-10 do Reino Unido. Para o seu quinto registo, "Baggiridim", que sairia em 1985, o grupo pensa em algo de diferente, e convida uma série de artistas, na maioria nomes do "reggae", como Dillinger, Gunslinger ou Pato Banton. Contudo seria com a sua "madrinha", Chrisie Hynde, que voltariam ao nº 1 do top doméstico, graças ao dueto "I Got U Babe", um original de Cher e Sonny Bono, o seu primeiro marido. Curiosamente a reacção do outro lado do Atlântico não seria tão entusiástica; o original de 1965 tinha chegado ao topo da Billboard, enquanto a versão dos UB40 e Hynde não passaria de um discreto nº 28.


Em 1986 chega "Rat in the kitchen", mais um disco inteiramente composto de originais, que chegava a um sólido nº 8 no Reino Unido. Os dois singles que suportaram o disco são marcos na discografia do grupo: "Rat in mi kitchen", um tema acentuadamente "reggae" e com Astro a assumir o papel de vocalista conta com Herb Alpert no trompete, e chega ao nº 12 do top britânico, enquanto este "Sing our own song", que subia a nº 5, tornava-se um dos temas mais emblemáticos do grupo. Este vídeoi foi gravado durante um concerto em 1988 que apelava à libertação de Nelson Mandela, onde os UB40 foram convidados entre outros artistas de renome. Entre este registo e o seguinte, os UB40 tocavam na URSS, em pleno "glasznost", tornando-se um dos primeiros grupos ocidentais a fazê-lo. Em 1987 sai um novo álbum, intitulado simplesmente "UB40", que contém o sigle "Breakfast in Bed", um original de Dusty Springfield que marca mais uma colaboração entre Ali Campbell e Chrissie Hynde. Ao contrário da anterior, esta não vai além do nº 6 no top do Reino Unido.


Em 1989 os UB40 voltam à carga com mais um disco de "covers", dando o seu toque a temas já popularizados por outros artistas, e tentando repetir o sucesso que obtiveram seis anos antes, chamam ao novo projecto "Labour of Love II". Este segundo "Labour of Love" é mais inspirado nos temas da "reggae" e da "soul" que o primeiro, e produz três singles. "Here I Am (Come and Take Me)", um original de Al Green, e "The Way You Do the Things You Do", das Temptations, dirigidos ao público Americano, chegam ao top-10 da Billboard, enquanto "Kingston Town" chega ao nº 4 do Reino Unido. Este tema, um original dos anos 60 da autoria do jamaicano Lord Creator, é na minha opinião o melhor dos UB40. Perdoem-me a arrogância, mas fosse todo o trabalho do grupo do nível deste "Kingston Town", e seriam uma das minhas bandas favoritas. O original de Lord Creator, apesar do som mais cru, não fica muito atrás deste, mas foi de génio a escolha em renovar esta canção para a modernidade. Obrigado, UB40.


Assim se resumem os anos 80 para uma das bandas mais criativas da década. Nos anos 90 os UB40 obtêm mais um estrondoso sucesso com "I Can't Help Falling in Love", um original de Elvis Presley, retirado do álbum de 1993 "Promises and Lies", onde é curiosamente o único tema "roubado". As tentativas de reatar o sucesso do passado foi quase sempre debalde, apesar de terem surgido um terceiro e um quarto "Labour of Love". O álbum mais recente da banda saíu o ano passado, intitulado "Getting Over the Storm", que não foi além do nº 29 no Reino Unido. Esquecidos? Tiveram o seu tempo. O que diria Bob Marley dos maiores continuadores da sua obra? "It's a'right, men. It's all gud". Ele está em paz com Jah, e com os UB40.

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