quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

O vinho e a muralha


Estava ontem a ver o programa “Portugal em directo”, dedicado ao tema dos vinhos (outra vez…), e falou-se de regiões, de tintos, brancos e verdes, com qual deles se acompanha cada refeição, a que temperatura devem estar os vinhos, o costume. Cada vez que se fala de vinho ouço tantas opiniões diferentes que já não acredito em nenhuma, mas como também não sou um grande apreciador, tanto fez. Deixo isto para aqueles tipos que percebem ou têm a mania que percebem, aos enólogos e todo o resto. Certamente que têm muito que falar (e beber) sobre o assunto.

O que me chamou mesmo a atenção foi uma pergunta que a apresentadora fez ao um produtor a propósito do mercado chinês. Ora quando se fala de “mercado chinês”, apontam-se os radares vindo de todas as direcções: a China é o sonho de qualquer empresário que se preze. Quem não quer investir na China nos dias que correm? Ainda mais se forem investidores europeus, pois como todos sabem, a nossa querida e velhinha Europa está de rastos. Falida e mal paga, coitadinha.

O produtor vinícola respondeu dizendo que a penetração no mercado chinês “é difícil”, uma vez que para entre o consumidor chinês existe ainda o conceito de que vinho é tinto, tinto é francês e é “Bordeaux”. É um “problema” característico de um mercado relativamente recente; duvido que até há pouco mais de 30 anos fosse possível encontrar uma pomadinha digna desse nome na China continental. Enquanto não se educa o consumidor chinês – e recorde-se que não existe uma tradição vinícola no país do Meio – são os franceses de Bordéus que vão esfregando as mãos de contentes. Existem vinhos de outras origens na China, óbvio, mas para o exportador português é complicado competir com o “pedigree” do vinho francês, italiano e até mesmo o australiano, que fez uma campanha agressiva e bem sucedida nos últimos anos.

A apresentadora referiu Macau no meio de toda esta conversa, e de como o território podia ser “uma porta” para fazer entrar o nosso produto na China. Aí está, quando se fala em “entrar” no mercado chinês, Macau vem logo à baila. É triste admitir isto, mas para sê-lo não basta parecê-lo. Durante os últimos anos da Administração Portuguesa nunca existiu uma vontade concreta de tornar Macau na tal “porta”, e isto aplica-se tanto ao vinho como para todo o resto . Para que isso acontecesse era preciso um investimento sério e demorado, e não é agora que a China se tornou um freguês apetecível que vamos bater na testa e dizer “ah pois é, temos ali Macau e tal”. Já não temos. Tivemos. Agora paciência.

Acredito que o vinho português tem qualidade, e para um consumidor médio pouco importa que o rosbife vá abaixo com a ajuda de um Quinta da Cachorra ou um Chatêau- qualquer-coisa. A diferença será o preço, certamente. Beber um tinto de 1000 patacas a garrafa não provoca nenhuma sensação diferente de beber um que custe apenas 100, e nem se podem sequer falar de benefícios para saúde – que não existem, claro. Resta aos produtores portugueses competir nesse mercado ao lado dos estrangeiros, e se quiserem triunfar terão que ser agressivos e trabalhar muito. Sem isto não há Macau ou outra “porta” que os valha.

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