quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Alexandrina das Dores


Uma colega minha, católica devota, tem na sua secretária uma fotografia que me causou algum espanto. Era uma mulher com um ar pálido e mortiço, contudo sorridente. Fazia lembrar um daqueles cadáveres incorruptíveis, que se mantêm no mesmo estado de conservação durante anos sem a ajuda de conservantes artificiais, facto normalmente atribuído ao desígnio divino. Perguntei-lhe quem era, e a minha colega só me soube dizer que era “uma santa”, e que aquela imagem lhe havia sido oferecida por uma religiosa sua conhecida. Como sou um gajo curioso à brava, fui investigar nas páginas amarelas de santos, beatos e mártires, e encontrei a personagem em questão.

Trata-se de Alexandrina Maria da Costa, uma mulher que nasceu, viveu e morreu na freguesia de Balasar, concelho da Póvoa do Varzim. Alexandrina veio ao mundo em 1904, e foi acometida de febre tifóide aos 12 anos, o que a deixou debilitada de saúde. Aos 14 anos a sua casa foi invadida abruptamente por um grupo de assaltantes, e temendo pela vida saltou da janela do seu quarto, de uma altura de cinco metros, tendo caido mal e fracturado a coluna vertebral. Ficou completamente paralisada aos 21 anos, e ficou confinada ao seu quarto para o resto da vida.

Como sonhava ser missionária, rezava todos os dias à Virgem Maria pela sua recuperação, mas aos 28 anos resignou-se e atribuíu a sua condição a uma nova vocação: partilhar misticamente o sofrimento de Cristo, oferecendo-se como vítima pelos pecadores. A partir de 1938, e durante três anos e meio, superava a paralisia todas as sextas-feiras, saía da cama e arrastava-se pelo quarto durante três horas, recriando a Via Sacra e as estações da cruz, em visível agonia. Existe mesmo um video que comprova este martírio. Cristo aparecia-lhe em sonhos, e chamava-a “Alexandrina das Dores”. Um dia sangrou da cabeça, exactamente no local onde Cristo teria sido coroado com os espinhos.

Depois disto, deixou de comer e beber durante 13 anos, até à sua morte, vivendo apenas da comunhão diária. Apesar do jejum total, mantinha uma clarividência impressionante e até uma boa disposição fora do normal, sempre sorridente, apesar do infortúnio. Em 1943 foi internada no centro de paralisia infantil da Foz do Douro, onde foi observada durante 40 dias por um conceituado médico, que garantiu que durante esse tempo Alexandrina não comeu, bebeu, urinou ou defecou. Na fase final da sua vida pesava apenas 33 quilos.

Alexandrina viria a falecer em 1955, aos 51 anos, e deixou um espólio escrito de 5 mil páginas, entre autobiografia, cartas e diário, que foi estudado no Vaticano pelo padre Umberto Pasquale, que propôs a sua beatificação, confirmada a 25 de Abril de 2004 pelo Papa João Paulo II. A beata Alexandrina das Dores é hoje venerada na igreja matriz de Balasar, de onde, derivado da sua frágil condição, nunca terá saído. Uma história triste, uma vida vivida em vão.

1 comentário:

Anónimo disse...

"Uma história triste, uma vida vivida em vão."

Ou talvez não, quem sabe.