sexta-feira, 5 de junho de 2009

Os blogues dos outros


Os estudantes continuaram na Praça a desafiar a lei marcial durante maus duas semanas, até que na madrugada de 3 para 4 de Junho, a liderança chinesa decidia que, chegado este ponto, não havia outra solução que não a utilização da força, do exército. Com unidades vindas de fora da capital. O banho de sangue não tinha sido evitado. A imagem da China ficava manchada. As imagens correram mundo… em especial aquela imagem do jovem estudante que desafiava um tanque, impedindo a passagem. A seis de Junho, numa reunião de dirigentes do Partido, Deng Xiaoping dizia que se não se tivesse posto cobre à revolta contra-revolucionária havia o perigo de guerra civil… “Imaginem quantas pessoas teria morrido”, perguntou em jeito de afirmação…

José Carlos Matias, O Sínico

Como de costume, o IACM reservou o Largo do Senado para as comemorações do Dia Mundial da Criança, apesar de este ter lugar no primeiro dia do mês. Nem sequer podem usar a desculpa de a data ter calhado numa segunda-feira, dia de trabalho, porque hoje também o era. Assim, enquanto cerca de duzentas pessoas se juntavam em frente à igreja de São Domingos numa sentida vigília por aqueles que, há duas décadas, pagaram o preço mais alto na sua nobre luta por uma nação mais livre e justa (fotos abaixo), a curta distância, as criancinhas dançavam e cantavam noite dentro (!) num palco com música em alto som - uma instrumentalização bacoca e torpe de menores inocentes, num gesto de chocante desrespeito pela dor alheia. Não consegui deixar de sentir asco quando por lá passei!

Nuno Lima Bastos, O Protesto

Há 20 anos inventei notícias graves sobre a China. Peço desculpa por isso. Inventei que uns estudantes se manifestaram, se revoltaram e que foram assassinados pelos tanques do Exército Vermelho. Inventei que foram mortos milhares de estudantes e seus apoiantes. Inventei que foram enterrados corpos em valas comuns depois de serem queimados. Inventei que foram presos milhares de estudantes em todo o Império do Meio. Inventei que o ministro Zhao Ziang foi para a prisão domicialiária. Inventei que o regime tremeu. Inventei que o Governador de Macau e as mais altas figuras da sociedade macaense se manifestaram a favor dos estudantes e do movimento pela liberdade e pela democracia na China. Inventei tudo isso porque só pode. Ao longo dos últimos 20 anos só tenho assistido a todos os políticos de todos os quadrantes a assobiar para o lado e a indagar: "Tian' quê?"

João Severino, Pau Para Toda a Obra

Pela noite, numa tertúlia portuguesa, a discussão correu animada. Alguém dizia que o Maio de 68 chegara à China. Banho de sangue à parte, houve algumas semelhanças. Os efeitos na China é que só se começariam a fazer sentir uma década mais tarde. Antes disso, ainda assistiríamos à queda do muro de Berlim, ao desmoronar do império soviético e à queda das ditaduras chilena e argentina. Só conheci Pequim um ano mais tarde. Quase em surdina, comentávamos os acontecimentos daquele mês de Junho e procurávamos, em Tian An Men, vestígios do massacre. Dezoito anos depois voltei à China e a Pequim. Para constatar que a Internacional Consumista não necessitara de se sentar ao colo da democracia para invadir o país. O ocidente parece satisfeito. O importante é que, por aquelas bandas, se discutam as últimas novidades das novas tecnologias, se exibam modelos de grandes marcas do vestuário ou do sector automóvel. Essa coisa da democracia pode esperar.

Carlos Barbosa de Oliveira, Delito de Opinião

...e começa o verão de Junho! A comemoração é uma cerveja Tsingtao marca Local que custa 20 cêntimos. Restos de Pequim onde a inflação ainda não chegou... Amanhã pago a renda.

Maria João Belchior, China em Reportagem

Imagem da vigília realizada em Hong Kong para homenagear a memória dos que perderam a vida naquele trágico 4 de Junho de 1989 na Praça de Tiananmnen. Estima-se que tenham estado mais de 100.000 pessoas nesta manifestação. Descontando as diferenças demográficas, não deixa de ser sintomático que em Macau apenas se reúnam 200 pessoas para lembrar esta triste data….

El Comandante, Hotel Macau

Aqui na terra, há uma crescente – e mais do que legítima - preocupação com a saúde. O h1n1 é uma ameaça indesmentível, pelo que não há quem não tenha adquirido a sua máscara e esgotado o stock de antivirais da farmácia mais próxima. Podiam aproveitar o frenesim sanitário e deixar de escarrar na via pública. Era capaz de ajudar.

VICI, MACA(U)quices

Redigida por volta de 1685-1686, a Carta sobre a Tolerância foi publicada pela primeira vez em 1689, nessa mesma Holanda onde o seu autor, John Locke, procurara protecção. Nela se rejeitava terminantemente a ideia segundo a qual se poderia constranger alguém a crer, visando mostrar-lhe o verdadeiro caminho da salvação, e se defendia que as opções no campo do pensamento devem ser completamente indiferentes para as autoridades. Muito antes, durante as guerras de religião do século XVI, os Países Baixos tinham sido já uma ínsula de liberdade e de relativa paz numa Europa intransigente e a ferro e fogo. Aí encontraram refúgio milhares de judeus hispânicos e de protestantes de diferentes tendências, muitos deles a contas com os patíbulos do Santo Ofício se ali não tivessem buscado refúgio. Na década de 1960, Amesterdão transformou-se numa cidade plural e ali nasceram as primeiras comunidades contraculturais de jovens provos, aceites pelas autoridades apesar das suas posições radicalmente não-violentas e anti-sistema. Pois é nesta mesma Holanda que uma força da extrema-direita nacionalista e xenófoba - o Partido para a Liberdade do Povo Holandês, de Geert de Wilders - acaba de ficar em segundo lugar no decurso das eleições para o Parlamento Europeu, admitindo-se já a possibilidade de vir a ganhar as próximas legislativas. No ponto em que estamos, a situação dá bastante que pensar e recoloca um velho problema que os políticos europeus têm feito por varrer para debaixo do tapete: será legítimo integrar no jogo democrático e na arquitectura do bem comum os grupos e organizações que se destinam precisamente a contestá-los? Precisaremos de vê-los no poder para acordarmos e fazermos algo mais do que piedosas reprimendas?

Rui Bebiano, A Terceira Noite

Durante semanas muitas pessoas – amigos e bloggers – me recomendaram um vídeo no YouTube onde uma senhora chamada Susan Boyle (estranhamente parecida com uma lavadeira de Alfama) cantava I Dreamed a Dream, do musical Les Miserábles, no programa de televisão “Britain’s Got Talent”. Li, em páginas da Internet que frequento e respeito, declarações de profunda comoção; soube de gente com pele de galinha, cépticos de lágrima no olho, adultos de sentimentos à deriva, porque a senhora representava o “sonho”: um patinho feio que, quando abre aquela bocarra cheia de cáries, se transforma num cisne. Agora que a cruel realidade bateu à porta, deixem-me explicar-vos uma coisa. O talento, hoje, descobre-se com o método inverso ao de Robin Hood: rouba-se aos pobres para dar aos ricos. O “Britain’s Got Talent” repete sempre a mesma fórmula: vão a um pub qualquer no buraco mais remoto do país, desencantam o primeiro bêbedo que estiver na máquina do karaoke às quinhentas da matina com duas pints de cerveja na mão, arrastam-no para os estúdios e – depois de um par de bofetadas – metem-no defronte de um público sedento de emoções fáceis e de um júri sedento de fortuna. Por cada mil concorrentes há um que, por acaso, tem uma voz decente e que, quando comparado à devastadora miséria que o antecedeu e que o irá seguir, parece realmente um cisne branco a grasnar em Chernobyl. Não preciso de explicar mais nada sobre o programa, ou preciso? Tivemos milhentos destes concursos e outros em que nem sequer era preciso fazer nada (excepto bater numa gaja qualquer chamada Sónia). Que umas velhotas inglesas de Worcestershire se encantem com isto ainda vá; agora, os meus amigos? Os superiores, inefáveis e omniscientes reis da blogosfera? Susan Boyle tem 47 anos. Será mesmo possível que acreditem que um “talento” daqueles tenha passado completamente despercebido durante meio século? Que os produtores de um programa de televisão, visto semanalmente por 15 milhões de espectadores, a tenham deixado entrar em palco vestida como uma vítima do furacão Katrina só porque sim? Susan Boyle transformou-se na próxima vítima. Já está internada numa clínica com uma depressão pós-derrota. Mas vai continuar a ser explorada por Simon Cowell, um dos júris do programa, que lhe vai espremer discos de “covers” e concertos para a Rainha até a mulher ter uma trombose; e a culpa é de todos os que alimentaram o "sonho" no YouTube. Depois, largam-na como largaram o Zé Maria à beira da ponte com dois gatos debaixo do braço. A pobre inglesa esfarrapada, em poucas semanas, já foi a 100 programas de televisão, anunciou ao mundo que é virgem, e teve a oferta de uma produtora de filmes pornográficos americana para perder a virgindade em película. Por 750 mil dólares. Eu subo a parada para não ter de ver isso. E acrescento uns tostões se ela voltar para o karaoke.

João Tordo, Corta-Fitas

Amanhã posso escrever sobre as eleições? Posso falar de partidos e candidatos? Posso vir reflectir para o blog?

João Moreira de Sá, Arcebispo de Cantuária

4 comentários:

Anónimo disse...

Pois é, a melhor cerveja do mundo só custa 20 cêntimos!

Anónimo disse...

E eu pergunto ao Babiano de outra maneira e em resposta à sua tentação totalitária: o que é que terá levado a Holanda, esse modelo de tolerância, a eleger um partido da extrema direita para segundo lugar. O Babiano deve ir à Holanda e apanhar um taxi e ter a experiência que eu tive com um energúmeno de um motorista, marroquino ou turco, porque não tinha troco de 8 euros.

Anónimo disse...

O bebiano é daquelas luminárias de esquerda para quem a democracia só é válida quando é eleita a maralha que é apoiada por si que tão bem governam: Chavez, Morales, Obama, Socrates, Zapatero, Ortega e outros que tais.

O problema da esquerda sempre foi este, serem uma minoria na maior parte das vezes e não respeitarem que os povos podem e devem ter a liberdade de escolher. Isso é que não, onde já se viu, pois estão cá eles para nos ensinar a todos nós a alegria dos amanhãs que cantam

Onde andava esta besta do bebiano quando na Holanda um activista dos direitos dos animais assassinou em 2002 o político Pim Fortuyn, para o impedir de continuar a utilizar os muçulmanos como bodes expiatórios. Aí foi o que? Um exemplo de tolerância?

Como sempre, uns ridículos estes gajos que vivem ainda no tempo do PREC.

Anónimo disse...

Os dois anónimos anteriores têm toda a razão. Nenhum povo se volta para a extrema-direita se não tiver motivos para isso. E parece que na Holanda tem havido motivos de sobra.