domingo, 14 de junho de 2015

Provar o improvável


Sempre que tenho tempo e paciência (e têm-me faltado ambas) dou uma vista de olhos por um pouco do que se faz na blogosfera, com primazia para a produção local, e nesse particular o grande Hugo Gaspar tem-se destacado pelo esforço que aplica no seu "Blogue do Firehead", com uma notável frequência na actualização do mesmo, bem como uma respeitável variedade quanto à escolha dos tópicos. Está de parabéns, e naquilo que em geral podemos estar de acordo, penso que não será necessário dizer nada: em equipa que ganha não se mexe, n'est pas? Contudo, naquilo em que discordo, deixo-o saber até que a senhora gorda cante (aportuguesamento da expressão anglo-saxónica "until the fat lady sings") - ou "nem que a vaca tussa", se preferirem. Não o faço por despeito, uma vez que adoro o Hugo (e ele sabe disso), além de manter a minha discordância dentro dos padrões do respeito pelo direito ao contraditório (já o contrário...). Se o faço é apenas porque discordo de uma forma tão veemente e esclarecida que me toma os sentidos de assalto, e estaria a prostituir os meus valores pelas esquinas fétidas do conformismo se me deixasse quedar pelo silêncio. Posto isto, são dois os destaques desta semana na tasca do Firehead, qual deles o mais picante.



O artigo "Hunting South Africa" chama a atenção para uma página no Facebook e um canal no YouTube com o mesmo nome, da autoria de indivíduos que se dedicam à caça grossa, chegando a inclusivamente a pendurar as cabeças das peças que capturam na parede como troféu. Pancada desta gente, enfim, que escolheu um passatempo de todas as forma reprovável, condenável e lamentável. Claro que concordo com o Hugo e seja com quem for que ache um disparate falar-se de "preservação dos ecossistemas", quando o que se está a fazer é eliminar de modo artificial a fauna desse ecossistema. Reparem que eu disse "artificial" e mais à frente explico melhor. Entretanto a indignação do Hugo Gaspar (ou isso ou embarcou na carroça do politicamente correcto que caminha para o abismo do disparate) e de muitas outras pessoas que devem ter entrado em pane no dia em que perceberam que os animais são seres vivos e a maior parte deles sente dor (os que têm um sistema nervoso minimamente desenvolvido, o que não é o caso dos caracóis ou dos bichos-da-seda), e então amaldiçoaram todos os bifes que tinham comido até esse dia, e muito democraticamente acharam que toda a gente devia fazer o mesmo que eles. Porquê? Bem, a única explicação lógica que encontro para essa tomada de consciência seguida de impulso revolucionário com tiques de autoritarismo é uma "ego trip" qualquer, do tipo: "epá, bolas, cheguei à conclusão que comer carne é horrível, pois implica que os animais sofram, coitadinhos, e eu que sempre pensei que eles doavam voluntariamente as costelas e a pá num centro de colheita de peças de bovino, e que "Matadouro" era assim chamado por ser localizado numa MATA perto do rio DOURO; agora que tomei esta decisão pessoal e que a só a mim diz respeito, vou tratar de a impor e obrigar toda a gente a fazer o mesmo, senão comporto-me como uma peste, insulto tudo e todos e posso mesmo cometer pequenos actos de terrorismo! e isto porque sou um semi-deus, e quem não fizer e pensar exactamente como eu merece morrer - duh, of course!"

Na constância desta presunção CRIMINOSA de que é correcto cometer actos que provoquem danos patrimoniais a terceiros, ou até físicos e que coloquem em risco a vida desde que seja em nome dos direitos dos animais (a sério, quem foi o Rasputin arraçado de Estaline que se lembrou desta?), fica "bem" insultar, ameaçar, coagir e invadir a privacidade alheia. É "fixe", até: vou salvar o planeta nem que para isso tenha que o destruir. Porque senão vejamos: estas pessoas estão em falta, não é? O que estão a fazer é horrível, certo? Concordo - atenção - concordo, reprovo e condeno, mas e agora? Não sendo eu uma autoridade, não me cabe a mim agir no sentido de usar métodos coercivos, ou mesmo cometer crimes, como a ameaça, a agressão ou a devassa da privacidade, como sugerem estes libertários ecologistas, e em alguns casos passando mesmo aos actos. Então como é? Chamamos a bófia e os "assassinos" vão de cana ou quê? Ah? O quê, não é ilegal??? Porra, como é possível, que num estado dito democrático não possamos ser capazes de impor os nossos princípios sobre todos os outros cidadãos, quer eles aceitem quer não, pois são os princípios que eu defendo, e portanto os mais correctos? Logo vi que isto ia dar bronca quando o partido em que eu votei não ganhou - e ainda estou para saber como foi isso possível, não ter toda a gente votado no partido em que eu votei, o único que devia existir, aliás.

Portanto não sendo isto ilegal e sendo mais complicado andar a puxar o saco aos governos para tornar a caça desportiva ilegal porque andam enfiados nos gabinetes e andam em carros do estado (pagos por nós), e se chegamos perto deles os matulões dos seguranças enfiam-nos os cartazes onde está escrito "meat is murder" e o camano pelo olho acima (o do trás, entenda-se), toca a molestar os tipos que apesar de serem umas bestas insensíveis e nada recomendáveis como visita de casa (ainda podem empalhar o gato e ainda pensam que nos estão a fazer um favor) não estão a fazer nada de ilegal! Yupi! Agora esquecendo o que fazem eles que nós não gostamos e passando para o campo da legalidade, que é o que nos rege a todos e à sociedade em geral e determina o que é não é permitido, que tal fazermos todos uma lista das coisas que gostamos de fazer, submete-la a uma apreciação geral, e se houver uma (1) pessoa que ache qualquer das nossas actividades reprovável, ou que a ofenda de uma forma ou outra, devemos imediatamente cessá-la, sob o risco de...esperem lá que isto de ser hipócrita é fácil e não aleija...ah sim: sob o risco de ser linchado em público pelos restantes. Ai pois, e não me venham com essa de que "não se compara" blá, blá, blá. Os tipos estão a matar girafas, linces, camurças e o tanas, não é? As vossas girafas? As de quem? Ai esse não se importa? Então porque carga de água, porque raio e que bardamerda é esta de perder tempo e ainda agir como um maníaco e à margem da lei em nome de uma coisa que quem se devia realmente importar se está nas tintas e ainda a facturar com esta palhaçada toda? Ah e finalmente...

Lembram-se quando eu disse ali em cima "eliminar de modo artificial a fauna"? Ora bem, isso leva-me a questionar os tipos da PETA e afins que defendem "direitos iguais" para os animais porque não intervêm no sentido de convencer o sr. leão e deixar o terrível hábito de ferrar as garras na sra. gazela e de seguida dilacerá-la com as presas numa orgia de sangue, carnificina e horror? A sério, pois para quem usufrui de uma "inocência" e "integridade como ser vivo" e que não merece ser vítima da crueldade dos humanos devia, sei lá, dar o exemplo? Abster-se de tanta "violência"? Sabem uma coisa, os matadouros, ou os galinheiros onde os frangos não têm espaço para se expressarem, ler um livro, cheirar uma flor, recitar poesia, ir com as frangas jantar fora, e comer...pato, pronto, não são bem aquilo que se pode chamar de "crueldade a céu aberto", quer dizer, não andam por aí tipo biblioteca itinerante a esfolar os bichos à nossa frente, como faz o tal sr. leão, que também não se inibiria de abocanhar uma criancinha de cinco anos (ou um adulto) caso este tropeçasse num bocado de merda deixado no chão pelo sr. chimpanzé e caísse dentro do covil. Direitos iguais, pois então. Upa, upa.

Ah e para concluir, o que sugere o grande Hugo Gaspar para terminar com esta violência toda? Mais violência! Para cima dos gajos! Ai mataste? Então morre também, toma! Leva com violência para aprenderes que a violência é uma coisa horrível, e que nunca é a solução para nada. Ai ainda mexes, apesar de estares aí indecentemente a exibir as vísceras à frente das senhoras? Leva mais, para ver se pelo menos o teu óbito cessa com todo esse movimento e expressão facial de horror. E reparem estamos aqui a falar de alguém que se opõe liminarmente ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, e também acha que esses estavam bem era a fazer de combustível à fornalha das locomotivas! E os partidários do aborto, os não-católicos e a "esquerdalhada", como ele lhes chama - e olhe que estes tipos da caça têm toda a pinta de serem partidários de muitas das suas convicções, e arrisco mesmo a dizer que "esquerdalhada" é que eles não são, com toda a certeza. Parabéns, pois mais uma vez a coerência abunda por aqui tanto quanto cabelo tem o Pedro Abrunhosa na cabeça.



Outra notícia tem ainda a ver com as aparições de Fátima, tema especialmente querido ao Hugo Gaspar e a todos que, não convencidos eles próprios do logro a que foram levados a acreditar (não viram, não estavam lá, portanto "pegou-se", por assim dizer) acham que é mais fácil mandar calar toda a gente do que discutir o assunto - discussão que para mim se cinge à semana que antecede o 13 de Maio, e se observam aquelas lamentáveis demonstrações de "religiosidade", nada mais. Este artigo em que se levanta novamente a lebre de Fátima dá pelo título Maya repreende padre excomungado, e aproveito já para elogiar o Hugo pela escolha dos títulos para os seus artigos, que apesar de não serem propriamente muito sedutores e/ou criativos, entregam exactamente aquilo que o menu propõe. O pior é que mais uma vez isto não só não contribuir para a sua causa, como a danifica ainda mais- e eu a pensar que isso nunca seria logisticamente possível, partir uma loiça que já se encontra esfarelada. Vamos ver porquê.

Vi o vídeo e cheguei à conclusão que 1) aqueles apresentadores são uma merda, 2) está tudo maluco e 3) a Maya que meta a bola de cristal pela peidaya acima. Primeiro não entendo qual é a finalidade de chamar ali aquele tipo que parece que veio com a roupa com que dormiu e comeu sopas de cavalo-cansado antes de ir para ali só para o expor ao ridículo. E qual ridículo? "Não acredita nas aparições de Fátima", e com isto deixa a apresentadora de boca aberta, espantada com tal ousadia. E logo ela, que a caminho do estúdio onde aquilo foi gravado perguntou as horas à mãe de Cristo, quando esta lhe apareceu pela terceira vez neste dia. Ainda por cima o homem "escreve livros", o pulha, folhas com coisas escritas, em oposição ao espectro divino da mãe do salvador que apareceu ali, naquele determinado sítio e depois disso mais nenhum, naquele exacto momento e após esse nenhum outro, com labrostas analfabetos como testemunhas, de uma idoneidade acima acima de qualquer suspeita a afirmar que sim, que viram, tudo corroborado pelo Estado Novo que em conjunto com a igreja inaugurou um culto que lucra milhões por ano, e ainda não acredita? E chama a isto falácia, uma coisa tão normal como o desabrochar dos miosótis em finais de Março? E depois escreve livros, que as pessoas lêem, e depois acreditam se quiserem, pois o tipo é uma ex-padre e não um hipnotista ou um bruxo?

Quem é um "bruxo", ou arraçado de bruxo, neste caso bruxa, é a tal Maya, que segundo o Hugo Gaspar "até ela, que faz adivinhações, práticas proibidas pela Igreja, sabe defender que isto tudo é verdade, verdadinha". Oh, oh, oh. Quer dizer "até ela", ou "especialmente ela", já que estamos aqui a falar em farsantes que lucram e ganham o sustento à custa da superstição alheia? Para mim ela estava era a mandar o homenzinho ir com a mangueira regar o jardim para longe das sardinhas que ela estava ali a assar, isso sim. Claro que isto sou eu a ser velhaco, pois segundo o Hugo Gaspar, sendo eu agnóstico, não tenho para me pronunciar sobre estas questões do divino, portanto não me resta senão aceitar que a virgem apareceu lá e não sei quê, apesar disto não ter qualquer importância para mim ou para qualquer outra pessoa. Não mexe com as estações do ano, não altera o horário dos cacilheiros, não desmancha o penteado da tia...e já agora, o que é que essa intrujona da Maya está para lá a ladrar com essa conversa do "respeito a Fátima" e não sei quê, acusando o homem de se estar a rir, quando ainda por cima era o único que NÃO se ria (os outros riam-se enquanto troçavam dele, note-se)? Mas aquilo foi alguma tragédia, tipo o Holocausto ou o 11 de Setembro ou o bi-campeonato do Benfica, para que seja imperativo colocar um ar de enterro quando se toca no assunto? Ai que grandes santinhos da tanga que me foram aqui sair.

Portanto, recordemos a bitola do Hugo Gaspar para quem não acredita que Maria, mãe de Jesus, "elle meme", surgiu do nada no topo de uma azinheira numa aldeola remota na parvónia, e quem o garante são os campónios analfabetos que por ali andavam: são estúpidos. Se não acreditam, são umas bestas - e agora o clímax desta pantomina toda - e se não aconteceu, provem! - que eles não precisam de provar nada, subentende-se, portanto. Ora bem, como é que se prova que algo não aconteceu ou que não existe? Que aconteceu ou que existe é fácil, e às vezes basta apontar com um dedo. Isto leva-me a concluir então que um dragão roxo com bolinhas azuis, asas de borboleta, nariz de batata e botas de lavrador com cachimbo de bolhas de sabão SÓ PODE EXISTIR. Claro, como é que vou provar que isto que acabei de descrever não existe, se...não existe? Que livros é preciso não ler para que não se prove isto? Será preciso desaprender alguma coisa em particular ou basta uma lobotomia frontal? Se a moda pega, a bófia enfia um gajo qualquer na jaula, e quando este inquirir sobre este estranho facto e alegar que nada fez, respondem-lhe: "ai não cometeu homicídio? então chame aqui as pessoas que não matou para que possa provar o que afirma?". Parece simples. Provar que a mãe de Jesus apareceu a brilhar em cima de uma azinheira em Ourém em 1917? Pfff...canja. Tivesse eu acesso à agenda da senhora e teria nascido 70 anos antes para poder eu próprio presenciar aquilo que realmente aconteceu "porque sim", e não é necessário provar, "porque não". E quem pensar o contrário é um idiota. Dixit Hugo Gaspar.

Por muitos defeitos que o sistema que nos dota de instituições e autoridades tenha, esta é a alternativa, meus amigos. Não se queixem (ou queixem-se na mesma, tanto faz, eu não vos vou chamar de idiotas por isso...).


3 comentários:

Anónimo disse...

Esse Firehead é anedótico, das coisas boas que a crise Portuguesa têm, é por gente dessa daqui para fora o homem é um tolinho. Felizmente ainda restam muitos!!!

João Nobre disse...

Esse Firehead é um fanático religioso sem emenda possível. Acho que nunca li tanta idiotice como as que ele escreve, ainda bem que foi para Macau, pois já temos malucos desses que cheguem em Portugal...

João Nobre disse...

A pessoa que me foi chamar "merda" para o blog do Firehead, não precisa de o fazer lá. Podem ir ao meu blog e chamar-me merda lá, porque eu ao contrário de muitos auto-proclamados "democratas", não faço uso da censura.

Pessoas que vêm por bem, não se escondem atrás do anonimato...