terça-feira, 21 de abril de 2009

O número mágico


A Academia Chinesa de Ciências Sociais prevê que o crescimento da economia seja este ano de 8,3%, ligeiramente acima dos 8% projectados pelo Governo Central. Este número contraria as previsões do Banco Mundial e da OCDE, que prevêm o crescimento da economia chinesa entre os 6 e os 6,5%. Apesar das poucas constantes em tempos de incerteza, o Governo Central voltou a estabelecer a meta do crescimento nesse número, os 8%. Um número mágico para a economia do país mais populoso do mundo. O “8” é um número sortudo em chinês. Lê-se “bat”, que soa a “fat”, que significa prosperidade. Mesmo em Macau especula-se que o Executivo chegou a pensar em atribuír 8 mil patacas no tal subsídio anunciado a semana passada. Como era “muito”, e 7 é um número aziago (ahah), ficou-se pelas 6 mil patacas.

A China tem enfrentado de frente a crise económica, e o pacote de estímulos no valor de 565 mil milhões de dólares está a produzir os seus efeitos, assegura o Governo. A maioria dos especialistas em economia e seguidores da política chinesa acreditam que 8% de crescimento económico anual é o número necessário para manter baixo o desemprego e prevenir eventuais tumultos sociais. Os líderes da China, do seu presidente ao magistrado de aldeia, consideram de uma importância vital atingir os 8%, e trabalham arduamente nesse sentido, fazendo tudo o que está ao seu alcance para atingir esse objectivo. Não querem muito mais, nem muito menos. Mais significaria um aumento da inflação, e menos, desemprego e instabilidade social. É provável que a vontade e o esforço sejam tantos, que alguns números não correspondam à realidade, tanta é a vontade de agradar na longa linha descendente da hierarquia chinesa. Os exemplos do passado são mais que muitos.

Mas quando e como o 8% se tronou sacrossanto? Em todas as questões relacionadas com fé, é preciso olhar para o criador, neste caso o antigo líder Deng Xiaoping. No 12º congresso do PCC, em Setembro de 1982, Deng determinou quadruplicar o produto industrial e agrícola anual até ao fim do século. Antes do congresso, Deng perguntou ao então secretário-geral do partido, Hu Yaobang, como atingir este objectivo. Hu respondeu-lhe que um crescimento anual de 8% deveria resultar. E assim foi. Não foi necessário nenhuma equação milagrosa, ou nada baseado nos ensinamentos de Confúcio ou Lao Tzu. Em 1982, determinou-se que seria necessário um crescimento anual de 8% para quadruplicar a economia até 2000.

As autoridades chinesas precisam de manter um balanço entre a criação de postos de trabalho e a inflação. Quando os números da inflação atingiram os 20% em 1988, gerou-se uma onda de contestação que culminou nos incidentes da Praça Tiananmen em 4/6/89. Hoje em dia, a legitimidade do Governo não advém do problema dos trabalhadores migrantes, mas da inflação. Aumentar o preço dos bens de consumo terá um impacto nos cidadãos mais pobres, que ainda não conseguiram acompanhar e beneficiar com o desenvolvimento da economia. Não interessa à liderança da China que haja um grande número de insatisfeitos, nem interessa ao mundo que hajam tumultos na China.

O pacote de estímulos de Pequim serve bem o seu propósito: mantém o desemprego baixo e tenta resolver problemas domésticos, como a renovação do decrépito sistema de saúde. Os Estados Unidos e a China apresentaram dois dos mais robustos pacotes de estímulos económicos do planeta, e a confiança dos seus líderes nesses estímulos é fundamental para manter a confiança de consumidores e investidores. O mundo espera que ambos os países assumam a liderança na saída da recessão, e nenhum deles tem margem para errar. Pode até não ser viável, devido à conjuntura, que este ano se atingam os 8% de crescimento económico na China. Mas de uma coisa podemos ter a certeza: não vai ser por falta de vontade, ou de esforço.

1 comentário:

Anónimo disse...

"Os Estados Unidos e a China apresentaram dois dos mais robustos pacotes de estímulos económicos do planeta"? Então e o Sócrates? Cada vez que o ouço a falar dele próprio, fico com a impressão de que mete os EUA e a China a um canto.