terça-feira, 5 de julho de 2011

Suicídio


Falar de suicídio é sempre perigoso. Peço desculpa se for dizer aqui algum disparate, mas é um assunto tão subjectivo que não dá para racionalizar. Daí que tenha optado intitular este post simplesmente “Suicídio”, pois acrescentar mais qualquer coisa é arriscar-me a objectivá-lo, o que é completamente impossível. Todas as teorias sobre o suicídio terão o seu loophole, e é um tema que tem fascinado sociólogos e psicólogos em geral. Primeiro porque o suicídio não se diagnostica, ninguém vai ao médico e sai de lá com uma receita contra “esse suicídio que tem na ponta do dedo do pé”. É uma doença súbita, um desiquilíbrio irremediável, e uma coisa sem jeito nenhum.

As tendências suicidas diagnosticam-se, sim, mas normalmente a outros casos psiquiátricos. Quem se quer mesmo suicidar normalmente não apregoa, mas fá-lo. Não anuncia, e muitas vezes nem dá a entender que a vida lhe corre mal. Suicida-se e pronto. Fico irritado quando vejo nas notícias que alguém “tentou suicidar-se”. Tentou e não conseguiu? E isso faz dele um quê? Um quasi-suicida? Um kamiquase? (Esta não é minha, já sei). Isto tudo porque o suicídio está outra vez na berlinda em Macau. Só ontem foram três casos, um deles absolutamente alucinante, em que a suicida se atirou do 10º andar do antigo Hotel Internacional. A maior pergunta é como conseguiu chegar lá a cima. Aparentemente trata-se de um caso de suicídio devido a dívidas ao jogo. Isto na cidade do jogo em si é normalmente minimizado. Se alguém se suicidou por dívidas ao jogo, está encontrado o “porquê”, e não é possível especular. Reparem como ninguém se ameaça suicidar devido a dívidas ao jogo. Alguns tentam, como nos casos em que se atiram ao rio e depois so resgatados pelas autoridades ou pelos bombeiros, mas esses não são suicidas a sério. São uns choninhas.

O caso muda de figura quando se tratam de agentes da autoridade ou jovens adolescentes, casos que têm sido bastante comuns, o que é mau, evidentemente. Os casos de suicídio dos agentes das Forças de Segurança de Macau, polícias ora no activo ora aposentados, levantam sérias dúvidas sobre o estado da segurança no território. Nunca pensei que um polícia se pudesse suicidar. Quando era mesmo muito novo, tão novo que nem me lembro quanto, admirava os polícias, e tinha deles a imagem de super-heróis. Quando via um polícia e o olhava para cima dos meus 1,30 metros, sentia-me descansado, estava ali alguém para me proteger do mal. Mais tarde percebi que não era bem assim, e que na verdade muita gente ia para polícia porque não sabia fazer mais nada. Foi uma desilusão que me fez perder o respeito à farda. Mesmo assim nunca pensei que um polícia se pudesse suicidar, assim sem mais nem menos. Sempre pensei que um polícia poderia, sei lá, colocar-se à frente de uma bala para salvar o presidente, morrer no cumprimento do dever, trocando tiros contra um perigoso violador de velhinhas, mas suicidar-se, isso nunca.

Os jovens são um caso mais triste. Nunca me passou pela cabeça suicidar-me quando era mais jovem, aliás a morte será a única coisa de que tenho medo, mas percebo o que se passa na cabeça da malta nova. Muitas vezes o suicídio pode ser uma forma de chamar a atenção, ou uma espécie de vingança: “quando eu morrer vão ter saudades minhas”. Isto é um pensamento imaturo, em primeira análise, mas é mesmo assim, estamos a falar de pessoas imaturas. Não é fácil abrir a cabeça a um jovem e introduzir o conceito de que o suicídio não resolve nada, é uma estupidez, e passado algum tempo já ninguém se vai lembrar, a não ser a família, talvez, mas mesmo assim a vida continua. Cometer suicídio não é acabar com o mundo. É apenas acabar com o nosso mundo, e isso ninguém merece. Se o mundo acabasse amanhã, ia-me sentir menos mal por morrer, portanto por enquanto quero continuar vivo.

E se o suicídio choca pela dimensão do desespero, choca ainda mais na forma. Em Macau é comum cometer o suicídio por defenestração, atirando-se de um edifício alto. Deve ser horrível morrer-se esmagado, ali com os miolos por toda a parte, e ainda a arriscar-se a atingir um inocente que nada tem a ver com a nossa maluquice. Não existe nenhuma forma realmente digna de cometer suicídio, e todas expõem as nossas fragilidades. Há quem opte por se suicidar tomando comprimidos, que sempre dá para ser encontrado a espumar da boca, com os olhos revirados e a língua de fora, e há quem opte simplesmente por um tiro na cabeça, que enche as paredes de pólvora e de sangue. E depois é sempre chato ter que tirar um morto do meio do caminho, e isso implica polícia, ambulâncias, uma grande seca.

Enquanto os psicólogos e sociólogos procuram respostas e vão oferecendo “Linhas suicídio” como única solução (“Olá boa noite, estou à beira da varanda do 19º andar, consegue convencer-me a não saltar?”) tudo o que posso sugerir a quem pense cometer suicídio é que não o faça. Todos temos dias menos bons, outros maus, outros péssimos, mas nada justifica que não se queira saber que outras surpresas a vida nos oferece amanhã ou depois. Quem sabe se a redenção não está mesmo ali ao virar da esquina?

4 comentários:

Anónimo disse...

Realmente é um tema complicado. Sem contar que além dos suicidas "verdadeiros", ainda existem os que fingem somente para angarias atenção, pena ou até admiração (sim, meio louco mas existe) das pessoas que os rodeiam. Acaba tornando ainda mais difícil identificar quem está prestes a cometer um!

Anónimo disse...

É natural que em Macau a técnica de suicídio preferida seja o atiranço pela janela. É cultural, em Macau as pessoas estão habituadas a atirar toda a porcaria pela janela. À gente normal que cá mora, aconselho apenas a andarem protegidos, caminhando de preferência por baixo das arcadas dos edifícios, que nunca se sabe quando lhes vai cair alguma coisa em cima.

Anónimo disse...

São decisões pessoais que devem ser respeitadas.

AA

Anónimo disse...

Há um provérbio chinês que reza assim : "Se quer morrer que vá para longe" Isso quer dizer quem quiser suicidar que suicide em paz,vá para longe e não chateia os outros