segunda-feira, 19 de maio de 2008

A insustentável leveza do viver (em Macau)


Quando cheguei em Macau fazia pouca ou nenhuma ideia do preço da habitação, mas surpreendeu-me a facilidade com que os nossos expatriados mudavam de casa, sempre para uma melhor que a outra. Hoje, passados quase 17 anos, a situação é bem diferente, e se mudam não é porque querem, mas porque são praticamente obrigados a isso. As habitações sempre me pareceram ou demasiado exíguas ou grotescamente enormes. Lembro-me ter chegado em dia de tufão (claro, tinha que ser, não é?) e ter achado a cidade triste, o que me levou uma lágrima ao olho e pensar quando iria de novo ver a edílica lezíria ribatejana.

Vivi em várias zonas de Macau. A primeira foi algures na Av. Horta e Costa, com os meus pais, que tinham chegado uns anos antes para arrepiar caminho. Mas cedo desejei ter asas para voar sozinho, e arrendei uma casinha ali algures perto da Igreja de Santo António, junto ao Jardim Camões. Ainda me lembro da primeira renda que paguei, 2200 patacas, que parecendo que não, ainda era uma fatia significativa do cheque de pouco mais de 9 mil que auferia mensalmente. Sempre achei essa tendência para os nosso expatriados preferirem casas enormes, com salas do tamanho de um court de ténis, alguma espécie de complexo colonialista. Para mim um pequeno T2, onde podemos viver os dois (eh, eh) era mais que suficiente.

O facto da minha primeira moradia independente ser um prédio de cinco andares sem condomínio, e ter sido assaltado duas vezes, fez-me mudar para outro bem mais seguro ali à Francisco Xavier Pereira. Daí mudei-me para a zona onde nunca mais deixei de habitar, com a Penha como pano de fundo. Nessa vez que mudei contei com a amizade de um casal amigo, que me deixou ficar no seu luxuoso apartamento no Centro Internacional de Macau, enquanto gozavam licença especial no “sayong”, e eu tratava da respectiva mudança, limpeza e todas essas chatices pelas quais passamos quando andamos de casa às costas, qual proverbial caracol. Dá-me imensa pena ver o estado a que chegou aquele outrora luxuoso complexo habitacional, agora moradia de clandestinos, criminosos e sem-abrigo.

Mais cedo ou mais tarde deu-se o inevitável. Consciente de que Macau era mais que uma aventura passageira, decidi investir na compra de uma moradia. Confesso que já me tinha passado pela cabeça antes, mas como o amanhã nunca se sabe, decide adiar. Isto só até ao aparecimento da primeira das crianças, o que já se sabe, torna tudo mais complicado, e como diz o povo e bem, quem casa quer casa. E de facto é uma desculpa muito usada: “não sei se para o ano ainda cá estou”. No entanto isso só por si não representa problema, pois nada mais fácil do que encontrar um comprador em Macau. Em todo o caso hoje em vez do tal T2 já foi preciso um T3, onde podemos viver…os quatro.

É muito mais fácil e cómodo adquirir casa em Macau do que em Portugal. Especialmente porque aqui não estamos sujeitos à flutuação da moeda, ou ao tal aumento das taxas de juro (Deus me livre, nem sei o que isso é!). Os melhores anos para aquisição de moradia foram 1998, durante a crise asiática, e especialmente em 2003, durante o SRAS. O factor determinante para toda a especulação foi o da tal aquisição da residência através do investimento, que permitia que indivíduos da China Continental, cada vez mais endinheirados, e não só, possam ser residentes de pleno direito da RAEM em troca do investimento de um milhão de patacas, investimento esse que era feito no imobiliário, pois claro.

Os nossos compatriotas que não investiram na sua continuidade sujeitam-se assim ao aumento das rendas, ou ao eventual interrupção do contrato, visto que por vezes os proprietários conseguem propostas irrecusáveis para a venda das moradias. Alguns sujeitam-se a rendas criminosas (conheço um casal que paga dez mil de renda, na Taipa) ou muda-se para a zona norte da cidade, onde a habitação é (ainda) mais acessível. Nesse autêntico jogo do gato e do rato entre senhorios e inquilinos, respiram de alívio os que compraram. Muitos mais ambiciosos lamentam-se de "não ter comprado mais uma casinha quando o preço estava baixo". Nunca é bem uma questão de visão ou de perspectiva. É uma questão de sorte.

5 comentários:

Anónimo disse...

Eu que acabei de chegar, estou estupefacto com a especulação imobiliaria que se pratica por estas bandas.
De facto, essa treta da Euribor não faz falta nenhuma.

Anónimo disse...

É, aqui é mais Especulibor :-)

Anónimo disse...

Essa da aquisição de residência através do investimento foi uma "grande ideia" da administração portuguesa, não é verdade?

Anónimo disse...

Foi numa altura em que o mercado estava em profunda crise. Não tinha nada a ver com a situação actual.

Anónimo disse...

Gostaria que me dissesse se é fácil ir viver para Macau, se é fácil arranjar trabalho e se será fácil sobreviver como mãe solteira. Preciso mesmo da ajuda de alguém que conhece bem o país e como funciona. Obrigada.