terça-feira, 30 de abril de 2013

As patinadelas da patinagem


Foi com interesse que li na edição de ontem do JTM a entrevista com António Aguiar, presidente da Associação de Patinagem de Macau (APM). A APM tem sido ao longo dos anos uma excepção honrosa no panorama do desporto no território, com a equipa de hóquei em patins a somar títulos asiáticos uns atrás dos outros. É indiferente que o desporto não tenha implantação na Ásia. Continua a ser a única modalidade em que Macau não obtem resultados que envergonham a sua bandeira. A selecção de hóquei patinado, comandada há vários anos pelo veterano Alberto Lisboa, disputou em 2005 o mundial “A”. Mais nenhum desporto praticado na região se pode orgulhar de ter disputado um campeonato do mundo. Quer se goste ou não do “pau com os ursos”, isto é um facto. Aconteceu mesmo, não foi um sonho. Tomem lá e embrulhem esta.

Lisboa “y sus muchachos” têm-se debatido com falta de condições derivadas de alguma indiferença dos corpos dirigentes responsáveis pelo desporto da RAEM. Pode soar um pouco a mania da perseguição, mas desde a criação da região administrativa desinvistiu-se no desporto que foi sempre considerado “dos portugueses”. É uma espécie de “cosanostra”. Atendendo aos resultados da selecção de hóquei em patins, estes atletas deviam ser motivados e acarinhados, e não ostracizados, como tantas vezes sucede. Em mais nenhuma modalidade o nome de Macau é temido pelos seus congéneres do Japão, Austrália, Inglaterra, Áustria ou Holanda. Imaginem o que seria um jogo de futebol entre o onze do território e a Inglaterra ou a Holanda. Um massacre horrendo e sem nome. Duvido que os jogadores de Macau tivessem sequer coragem de entrar em campo.

O pavilhão do Colégio D. Bosco é uma espécie de “santuário” do hóquei em patins de Macau. É aqui que treina a selecção e se dá a formação, todos os Sábados entre as 19:00 e as 20:30 – se os papás e mamãs que não sabiam isto e quiserem inscrever os pequenotes num desporto competitive e bonito, fica aqui a informação. Além do D. Bosco a selecção treina regularmente no Fórum, dependendo de factores de ordem burocrática que se prende com horários e tudo mais, em muitos casos esbarrando com uma evidente má vontade. Exemplo disso é a tal formação que se dá no D. Bosco aos Sábados, organizada pela Casa de Portugal. A agremiação lusa precisa de pagar o ar-condicionado durante os meses do Verão. Custava assim tanto ao IDM entrar com as 200 lecas ou lá o que é para que os miúdos dêm stickadas sem suarem em bica?

A comunidade chinesa ignora ou simplesmente desconhece este desporto. Os que tomam algum contacto inibem-se pelo facto de ser “violento” (alguém lhes devia explicar que o stick não é para bater em ninguém) e “caro” (um par de patins decentes pode custar qualquer coisa como quatro mil patacas). Tal como no hóquei em campo, o hóquei em patins contou sempre com uma adesão significativa da comunidade macaense. Apesar da selecção ser actualmente composta maioritariamente por expatriados portugueses, tempos houve em que os filhos da terra diziam presente, nomeadamente com a camisola do Lusitânia, o clube macaense por excelência. Se os chineses não jogam hóquei em patins, é porque não querem. Não existem condicionantes rácicas neste desporto. Quem começa cedo e se aplica com afinco pode também um dia ganhar um campeonato asiático, ou disputar um mundial.

O próprio hóquei em patins na sua globalidade sofre de uma certa marginalidade. Portugal e a Espanha são as maiores potências, Itália e Argentina intrometem-se de vez em quando, e todos os restantes países estão muitos furos abaixo. Equipas como a Suíça, França, Alemanha, Angola, Moçambique e Brasil produzem ocasionalmente uma geração de qualidade, mas nestes países a modalidade está muito longe de ser uma das mais populares. Em alguns países a modalidade tem um carácter regionalista. Na Inglaterra está praticamente limitado à região de Norfolk, e mesmo na Espanha é visto como “uma coisa dos catalães”, com o mítico Liceo da Corunha, da Galiza, a servir de excepção honrosa. Portugal deve ser um dos poucos países onde o desporto é popular de norte a sul e ilhas.

O facto do hóquei em patins não ser um desporto olímpico contribui para a sua pouca divulgação. É estranho que outros desportos como a esgrima, o hipismo e o caricato polo aquático sejam incluídos nas olimpíadas e o hóquei em patins seja excluído. Até o golfe, desporto elitista que não requer qualquer formação de raíz, vai passar a fazer parte das Olimpíadas. Foi modalidade de demonstração nos Jogos de Barcelona em 1992, e se a memória não me atraiçoa, foi um sucesso. O torneio foi bem disputado, com a Argentina a conquistar o ouro na final contra a Espanha, num jogo que foi a prolongamento e tudo. O hóquei em patins, que para quem o segue e aprecia é um desporto espectacular, viril e emotive, é uma espécie de parente pobre das modalidades. Está mais ou menos ao nível do corfebol ou da pelota basca.

Em Macau não resta senão aos responsáveis da modalidade continuar a gritar no deserto: “olhem para nós, estamos aqui a suar a camisola da RAEM e a ganhar títulos”. Os dirigentes desportivos do território, essa cambada de iluminados à luz da vela, continua a apostar no futebol, mesmo sem investir na formação ou levar esta aposta a sério. Até o badminton e o pingue-pongue são mais apoiados que o hóquei em patins. Se com as parkas condições oferecidas à Associação de Patinagem os resultados vão aparecendo, como seria se os atletas usufruíssem de condições compatíveis com a sua qualidade? Os ovos de ouro que a galinha da patinagem vai pondo são ignorados. Se calhar pensam que é apenas cobre.

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