domingo, 10 de janeiro de 2010

A gritar no deserto


Depois de ver a entrevista com Carlos Morais José na TDM, cheguei à conclusão que o CMJ consegue ser ainda mais naife que eu. E chamo-lhe naife com o mesmo carinho com que chamaria naife ao meu pai, mãe, irmão ou melhor amigo. Acompanho e respeito o que CMJ tem feito em nome da literatura no território, o seu trabalho no Hoje Macau (tenho pena que não escreva mais), e enfim, cada vez que fala parece saber o que diz.

A cultura ocidental não é o Starbucks ou o McDonald’s nem a cultura oriental são os casinos ou os croupiers, mas Macau é pequeno, não existem matérias-primas, o saldo da balança comercial é equiparado ao de países do terceiro mundo, não há espaço nem pessoas para desenvolver um interesse pelas artes e pela cultura. É portanto natural que a população se preocupe mais com o saldo da conta bancária do que com a riqueza do programa cultural.

Esta é uma visão realista, mais que derrotista ou pessimista. Quem queria realmente fazer qualquer coisa deu a corda aos sapatinhos há muito, e outros que por aqui passam tiram rapidamente a radiografia, e pouco se demoram. Daí que a produção artística no território esteja entregue a pessoas que, se tivessem mesmo muita qualidade, tinham batido as asinhas e voado para prados mais floridos.

É verdade que a economia de Macau depende apenas do jogo, mas helas, pelo menos de cabeça vazia, mas de barriga cheia. É difícil conversar com a malta chinesa sobre qualquer coisa que não seja “prática” ou próxima. No outro dia estava a explicar a uma colega onde ficava a Somália, e outro colega disse-me que “saber onde fica a Somália não dá dinheiro”. Aliás isto é um reflexo daquilo que se ensina nas escolas do território; tudo muito directo, muito pragmático, muito "útil".

Uma vez estava a explicar a um colega porque se fala português e espanhol na América do Sul, e este acusou-me de ter “pesquisado a informação na internet e decorado para depois lhe dizer”. Mesmo que isso fosse verdade, pelo menos era um esforço pela procura de informação a que eles próprios não se dão, uma vez que só usam a internet para joguinhos infantis no Facebook ou para ler notícias autorizadas pela nomenclatura.

A “cultura” em Macau resume-se aos concursos televisivos da TVB Pearl, ou a um ou outro documentário sobre o café ou a culinária. No outro dia a minha mulher ficou surpreendida quando soube através de um desses documentários que na Etiópia existem pessoas que não estão no deserto a morrer de fome. Mas por falar em deserto, tiro o chapéu ao CMJ. É no imenso deserto de Macau que ele vai gritando.

7 comentários:

Anónimo disse...

Caro Leocardo, o mal de Macau e dos seus criativos não está na sua qualidade em si, mas na mentalidade não só do publico e também dos chamados lideres de opinião e "investidores". Esta é uma herança forte dos portugueses. Aliás, posso encontrar um paralelo à mediocridade dos criativos e dos "fazedores de cultura" locais com o que se passa em Portugal: tudo o que vem de fora é que é bom. Porém, quando alguém vinga lá fora, aí sim, já passa a ser um artista de qualidade, já passa a ser um trabalho "bom". Infelizmente, um artista não precisa de ser meramente "bom" para ter reconhecimento- precisa de toda uma equipa de marketing, que engloba media, "intelectuais" lideres de opinião, galeristas, distribuidores e investidores... Arte, aliás, é também, e primeiramente, um negócio, não meramente económico, mas de "atatus" e de criação e estabelecimento de uma "balança" social que separa a elite intelectual erudita da "plebe". Como disse o seu amigo que não sabia onde era a Somália, a verdade é que é necessária toda uma máquina para fazer com que determinado artista ou obra seja "interessante" e que se baseia, principalmente, no "negócio" . É claro que o artista ou obra terá que respeitar determinados "critérios" para ser considerado como tal- ter escola, tradição, e ter uma cultura geral e linguagem capaz de impressionar a "alta sociedade" - vender o peixe, por assim dizer- são ingredientes fundamentais para se conseguir destacar. Num espaço como Macau, sobrevive o artista que se sabe colar ao poder, que sabe vender o peixe e que tem paleio para arranjar subsidios. É verdade, muitas vezes, o rei vai nu, mas o que interessa é que o artista destaque a qualidade do investidor ou da instituição que o apoia, e se desdrobe em elogios. Com esses apoios, consegue exibir lá fora em festivais onde relacionamentos institucionais permitem a sua selecção. Isto, porém, é lugar comum em Portugal. Paises com outra mentalidade, menos "provinciais" porém, como Inglaterra, Estados Unidos- sim, Estados Unidos!- França ou Alemanha já tem uma cultura e estrutura de desenvolvimento selecção mais desenvolvida. Evidentemente que os ingredientes atrás referidos também são importantes, mas existe sempre espaço para o verdadeiro talento aparecer.

Acredito que existe talento de qualidade em Macau. Porém, é necessário que se dê possibilidades e apoio ao artista por parte de quem opina e atribui apoios. E sim, também é necessário que o artista local procure fazer mais e que tenha coragem de mostrar e desenvolver o seu trabalho. Mas será necessário que se acabe com o estigma de que o que vem de fora é que é bom e que se comece a apoiar o que se faz por cá.

Quanto ao Carlos Morais José, concordo consigo, Leocardo. É um grande escritor e excelente contador de histórias. Resta saber porque não escreve ficção e romances pois, como já o confessou nos seus artigos, considera Macau uma cidade de inumeras histórias. Grandes filmes são muitas vezes baseados em bons livros, Carlos!

Anónimo disse...

"status", não "atatus"- e que o corrector residente perdoe as gralhas do post. É o "speed writing", ou "preguiça de posta online".

Anónimo disse...

Nao tenha medo de o dizer: o problema de Macau é a mediocridade. Com o que fazem aqui, os tais "fazedores de cultura" locais nao conseguiam sobreviver no mundo civilizado. Aqui se pode ser bebado e caloteiro, fazer merda, ir a tribunal, etc, e depois andar a lamber botas e ainda conseguir subsidios do governo... The difference is Macau!

E concordo, o CMJ é um gajo culto, inteligente e até brilhante por vezes.

Anónimo disse...

O CMJ nao representa os intelectuais, e um CROMO!!! Assim como o leo tambem nao e um intelectual, e outro CROMO!

Anónimo disse...

Macau precisa de mais CROMOS s.f.f.

Anónimo disse...

Macau precisa de mais sapos k andem a lamber botas. Nisso, o CMJ peca por defeito!

Anónimo disse...

Está enganado. Por excesso... o CMJ mama mais do que você pensa.