Vi ontem (enésima repetição?) a entrevista de Judite de Sousa a Cristiano Ronaldo, a propósito da conquista do troféu de melhor jogador do ano da FIFA. O segundo jogador português a merecer esta distinção. O que eu vi foi um Ronaldo contente, orgulhoso, com cara de quem quer mais, e de que não vai ficar por aqui. Por outro lado vi um Ronaldo rapazola, um pouco tímido, deslocado, qual automato proferindo os habituais clichés do mundo do futebol, e que para tal até gaguejava.
Temos a terrível mania de tomar os feitos individuais como colectivos. Quem venceu foi Cristiano Ronaldo, e não Portugal. O país não ganhou nada, mas absolutamente nada com a vitória de Ronaldo. Quem ganhou foi Ronaldo, e graças à época no Manchester United. Nada a ver, portanto, com a selecção nacional. A lógica é simples: cada português tem quota parte no sucesso do jogador madeirense. Porquê? Sei lá, podia ser ele em vez do Cristiano a ter jogado nos Andorinhas do Funchal. De dez milhões há ali um que é o melhor jogador do mundo, portanto estamos todos “entre os melhores jogadores do mundo”.
Quando mantemos o futebol dentro das quatro linhas ou dos média destinados ao efeito, até tem a sua piada. Agora quando o futebol transborda por tudo o que é lado, e em todos os aspectos da vida social, torma-se uma nuisance. O pior é quando nem é o jogo em si a entrar-nos pela casa, mas aquela espécie de culto da personalidade que é feito a Ronaldo (sem que ele tenha a culpa, coitado). Ficamos completamente elucidados da quantidade de cabotinos que rodeam o jogador, desde o primeiro professor de Educação Física, ao gajo do café da esquina, ou o marreco que enchia as bolas na loja de bicicletas. Depois toda a gente na Madeira é primo, colega ou amigo de C. Ronaldo, da sua família, andou com ele ao colo, os professores dizem que era bom menino, etc, etc. C. Ronaldo é o Pai Natal dos quinze minutos de fama daquela gente toda.
Depois o aspecto que me leva a pensar que os problemas andam com os gostos estragados, ou sérios problemas de visão: o aspecto físico. Cristiano Ronaldo sempre teve para mim ar de puto reguila, daquele que rouba pastilhas e chocolates das prateleiras dos supermercados. Considerá-lo um Adónis vivo, ou até um sex-symbol, é perfeitamente ridículo. Que raio de brinco é aquele que nem lembrava à minha avó? E aquele cabelo à Superman? E que raio é aquela marca CR7, e quem é foleiro q.b. para comprar o que quer que seja dali? Que as mulheres gostem dele até se compreende (as mulheres sentem-se atraídas por fama e dinheiro), agora ter homens a apreciar o corpo musculoso do jogador naquelas revistas em que ele aparece de cuecas, é no mínimo estranho. Mas atenção, que são muito machos, e entre umas jolas e umas alcagoitas soam a qualquer coisa do género:
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Epá o CR é um gajo bestial, já viste como ele cuida do corpo?-
Sim senhor, aquilo é um rapaz que trabalha o cabedal.Quando na verdade, e sem recalcamentos de qualquer espécie, a conversa devia ser:
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Ai aquele Ronaldo…papava-o to-di-nho.-
Vai prá bicha! Vai prá bicha!Sabem o que se calhar fazia um sucesso do caraças? Uma imagem de gesso do C. Ronaldo em miniatura, com um falo em tamanho real. Aquilo é que ia ser um sucesso, e não ia ser só entre as meninas. Fica aqui a ideia.
É possível que alguns dos leitores pensem “estás é com inveja”. Certo, certo. Do talento naquilo que melhor sabe fazer? Sim, tenho. Da poesia que dita com os pés nos relvados e não tanto quando abre a boca? Certamente. Do facto da família mais próxima depender toda dele financeiramente e não precisar de suar as estopinhas neste mundo cão? Sim, um pouco. Mas agora do resto, nem pensar. Paneleirices não, obrigado.
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