sexta-feira, 30 de agosto de 2013

No escurinho do cinema, parte V: XXX


Quando era menor de idade sonhava com o dia em que completaria 18 anos e podia ir ver qualquer filme (poder votar era outro dos meus sonhos de maioridade, imaginem). Quando se pensa em “filmes para adultos”, pensa-se imediatamente em pornografia, mas não era par aver pornografia que ambicionava poder ser admitido em qualquer filme – pelo menos no meu tempo ainda havia filmes para maiores de 18 que não eram pornográficos. Não me quero aqui armar em erudito ou pregar sermões a ninguém, mas não considero pornografia “cinema”. Os filmes ou as cenas de pornografia servem apenas de auxiliar à auto-gratificação, quase sempre masculina, e isso é cada vez mais verdade à medida que a idade vai avançando, e nos começa a faltar imaginação.

No Montijo, onde vivia, os filmes pornográficos passavam à meia-noite de sexta-feira no Cineteatro Joaquim D’Almeida, já referido na primeira parte desta rubrica. Tinha um amigo que era aficionado do género, e que amiúde convidava o resto da malta a ir com ele. Fui um dos últimos a aceder a este convite “picante”, e numa sexta onde não me apetecia ir para casa e não tinha nada melhor que fazer, lá fui com o pornógrafo e outro amigo ver a sessão de pinocanço daquela semana – e nem foi preciso atingir a maioridade, pois teria apenas 16 ou 17 anos, não me recordo ao certo. O nome do filme também se varreu da memória, mas isso era o menos importante – que diferença faz? Era um filme pornográfico, iguais aos outros todos. Posso garantir que era Americano, pelo menos.
Do que me recordo era do ambiente antes do início da sessão. A plateia, que seria menos de meia-casa, era composta 100% por homens, 80% deles idosos, alguns já bem entrados na casa dos 70 anos. Dizem que “alguns casais vão ver este tipo de filmes juntos”, mas isso são tretas. Nenhuma mulher decente e no pleno uso das suas faculdades mentais mete ali os pés, nem por engano.

Os senhores no Cineteatro naquele dia e àquela hora tinham todos um ar carregado, como se aquilo fosse uma coisa muito séria, mas eu próprio fiz um esforço tremendo para não me desmanchar a rir.
Quando o filme começou foi notório que os espectadores procuravam a forma mais confortável de se sentarem na cadeira. Nesta fase já estava arrependido, e só fazia figas para que ninguém levasse longe algum eventual “entusiasmo” durante o filme. Filme esse que foi, como seria de esperar, degradante. O pior foi a reação dos idosos, que vocalizavam a sua satisfação perante as cenas de sexo explícito a que assistiam, e que constituíam 90% da chanchada. Ouviam-se comentários do tipo “dá-lhe, toma!”, “ela quer levar com ele todo”, “geme, filha, ai como dói”, ou o melhor de todos “o daquele gajo é parecido com o meu”.

No fim senti-me duplamente enganado. Além da tortura que foi assistir aos tristes espectáculos – o filme e o comportamento dos gimbra – a sessão não durou sequer uma hora, e pelo preço de um bilhete normal! Pelo menos ninguém se masturbou, se bem que evitei a todo o custo fazer contacto visual com alguém ou sequer mexer a cabeça, não fosse isso mal interpretado. Agradeci ao meu amigo a experiência (ele adorou, como sempre…) e jurei para nunca mais. Mesmo num filme normal sinto-me embaraçado cada vez que existe uma cena amorosa mais gráfica. Nunca falta um engraçadinho que exteriorize a sua insegurança, assobiando, rindo feito parvinho ou berrando “elá!”, para ver se algum dos outros espectadores que o têm que aturar o nomeia para comediante do ano.

Por muito que discordem do que vou agora dizer, eu insisto: os filmes pornográficos são todos a mesma merda. Há quem defenda que alguns filmes “têm argumento”, ou qualquer outra coisa que não seja cenas de sexo oral, vaginal e anal. Os tais filmes “soft-core”, ou eróticos, têm de facto um argumento e menos cenas de sexo explícito, mas esse argumento é uma cagada. Se fosse bom era usado num filme decente. E não, não considero “O Império dos Sentidos” um filme pornográfico ou sequer erótico. É um filme que contém cenas de sexo explícito, mas vai muito além disso. Pelo menos os filmes “hardcore” têm a sinceridade de oferecer ao espectador aquilo que estes vêm à procura: mais foda, menos conversa. Alguns filmes porno usam anões, mulheres obesas, gajos mascarados ou são inspirados em clássicos do cinema. Tem a sua piada, mas o resultado é o mesmo. Se eu estiver interessado em ver a “Branca de Neve e os Sete Anões”, não vou optar antes pelo “Puta das Neves e os Sete Fodilhões”.

Há quem considere a pornografia humilhante para a condição feminina, mas nesta indústria (sim, indústria) existe um certo “glamour”, e realizam-se mesmo cerimónias de entrega de prémios. Não será preciso referir aqui que as distinções de “melhor actor” e “melhor actriz” pouco ou nada têm a ver com dotes de representação. Algumas das actrizes são “super-estrelas”, e tornam-se milionárias graças ao seu “talento” – atrevam-se a chamar isso de “prostituição”, se puderem.

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