segunda-feira, 24 de março de 2008

O que não mata...


Certo dia estava um senhor num restaurante, quando lhe chega o empregado trazendo o polegar dentro da sopa. Ao que lhe pergunta o senhor, com um ar revoltado:
- Então é assim que me traz a sopa? Com o seu dedo lá dentro?
- É que tenho uma infecção no dedo e o médico disse-me para mante-lo num lugar quente. – Respondeu o rapaz.
- E porque é que é que não o enfia no cú? – Pergunta o cliente furioso.
- E onde é que pensa que estava antes de o pôr na sopa? – Remata o empregado.


E “prontos”, deu-se a súbita constatação do óbvio: muitas, talvez a maioria das tasquinhas e casas de pasto de Macau funcionam sob condições de higiene duvidosas. Segundo o deputado Pereira Coutinho, e conforme noticiado na edição de hoje do HM, as condições sanitárias de muitos restaurantes deterioraram-se desde que a Direcção dos Serviços de Economia (DSE) deixou de ter autoridade e competência criminal para fiscalizar e penalizar os estabelecimentos de comidas em infracção. Enquanto em Portugal toda a gente se queixa do “excesso de zelo” da ASAE, em Macau os ratos, baratas e outras pestes enchem a barriga à custa do pobre consumidor.

Já dizia a minha avózinha que “o que não mata engorda”. Mas a velhinha entrava por vezes em contradição quando dizia também “não mata mas mói”. É possível que não seja muito comum encontrar casos gritantes de intoxicações alimentares no território, mas a quantidade de micróbios e bactérias que entram para o bucho terão certamente as suas nefastas consequências no futuro. Aliás, muitos dos leitores já terão certamente experimentado esta ou aquela indisposição acompanhada por esta ou aquela diarreiazita, que normalmente uma Coca-Cola resolve, e que vai com um comentário do género “deve ter sido qualquer coisa que comi”. Qualquer coisa e em qualquer sítio, lógico.

Aliás basta olhar para as cozinhas destes ditos estabelecimentos para perceber que não se trata do Ritz Carlton. Indivíduos que cozinham de tronco nú (if you can’t stand the heat…como dizia o outro), de cigarro no canto da boca, que usam a mesma frigideira e o mesmo óleo (o tal que os chineses chamam “de mil anos”) para cozinhar todos os tipos de pratos, os fregueses descalços com os presuntos em cima das cadeiras, e se por acaso já tiveram a sorte (ou azar) de assistir ao almoço do pessoal da cozinha, que se dá lá pelas três da tarde, o cenário torna-se ainda mais aterrador. Não surpreende portanto que apareçam os habituais cabelos ou pestanas na comida, e em alguns casos mesmo uma barata morta no min, ou como já me chegou a acontecer, e juro que é verdade, uma unha no pão com costeleta, vulgo chu pa pao.

Talvez esta falta de fiscalização seja mais um dos efeitos colaterais do tal laisser faire de que tanto se fala por aí agora, que já fez até que a situação do mercado imobiliário batesse no fundo. Quem esfrega as mãos de contentes é a malta da restauração. Afinal porque teriam de ser penalizados se deixaram cair o pão no chão onde centenas pisam, se caiu um burrié no guisado, ou se por acaso a carne permaneceu no congelador muito além do prazo recomendável? E deitar comida fora, não é pecado? E os senhores lá em casa, nunca se esqueceram de lavar as mãos depois de trocar a fralda do puto enquanto faziam o jantar? E aquele nefasto hábito de levar a colher de pau à boca para saber se a sopa está boa de sal?

Como tudo aqui na Cidade do Santo Nome de Deus, parece que vamos ter que esperar uma tragédia ou algum caso grave de perigo para a saúde pública para que se tenha mão na situação. É sinal que somos felizes. Entretanto continuamos a depender da sorte para que não nos calhe um cozinheiro que tenha um dedo infectado como o rapaz da anedota, ou que não tenha um ataque de catarro enquanto faz a salada ou que não seja daqueles que “chove quando fala” enquanto nos frita as batatas. E não é que a minha avózinha talvez tivesse razão? O que não mata…

2 comentários:

Guimaraes disse...

Esta contou-me um muito velho inspector da P.J. de Macau.
Um dia foi chamado à cozinha de um conhecido restaurante de comida mais ou menos portuguesa na Rua do Campo. Tinham matado o cozinheiro com uma machadada na cabeça.
Confessou o bom do inspector que teve vómitos. Não por ver o homem com a machada espetada no crâneo, a isso já estava habituado, mas pelo cheiro e aspecto da cozinha...

Anónimo disse...

Não me parece que a higiene das cozinhas de Macau se tenha alterado substancialmente com o fim das funções policiais dos inspectores da economia.
Quem não se lembra do famoso «caixote de lixo» que nos alimentava às seis da manhã depois de uma noite no Mondial e Kruatek?