segunda-feira, 6 de abril de 2009

Às voltas com os símbolos


Se há coisa que não falta em Macau são sinais da nossa presença de mais de 400 anos. Ora nas igrejas, nos monumentos, na própria arquitectura, e mesmo em alguns edifícios que ainda hoje são sede de algumas instituições públicas e privadas da RAEM. Assim temos o edifício da Capitania dos Portos, do IACM, das Santa Casa da Misericórdia, dos Correios, do BNU e por aí fora. Foi uma herança importante, e estes edifícios são da predilecção de turistas que não se cansam de os fotografar, de tão pitorescos e originais que são, no contexto da região e do próprio continente asiático.

Usei esta interessante imagem tirada nas antigas oficinas navais, junto ao Museu Marítimo, para ilustrar como é ainda possível encontrar as armas de Portugal em alguns locais deste território agora chinês. Quando se deu a transferência de soberania, alguns destes símbolos foram ocultados ou até destruídos. Este, por exemplo, chegou a ser tapado por umas tábuas de madeira que não resistiram às intempérides, e viriam a cair. Na noite da transferência de soberania o símbolo do topo do edifício do Leal Senado foi tapado. Nos meses que precederam a transferência, foi uma correria para substituir selos, carimbos e outros papéis oficiais para que a língua chinesa aparecesse em primeiro lugar.

Contam-se histórias muito engraçadas sobre os primeiros tempos do pós-1999. Conta-se por exemplo que um ouvinte do canal chinês da Rádio Macau ligou para a estação a reclamar do facto da bandeira portuguesa ainda estar hasteada no Hospital de S. Rafael, que para quem não sabe é onde funcionam as instalações do Consulado Geral de Portugal, adquiridas pelo Estado Português. Alguns dos nossos compatriotas começaram a queixar-se que “foram mandados para casa” por alguns motoristas de táxi mais “patrióticos”. Histórias que se contam em jeito de lenda urbana, no fundo. Sem qualquer tipo de significado ou consequência.

A presença portuguesa em Macau foi o que foi, e não há que o negar. Política e administração à parte, deixou um rol de especificidades únicas no contexto das cidades da grande China. Se Macau valesse pelos templos e pelos casinos, seria muito pouco interessante. Ninguém viria a Macau mais que uma vez para visitar o Templo da Barra ou as Ruínas de S. Paulo (outra “portuguesice”). Se o que foi feito (e bem feito) em termos da preservação do património continuar, então Macau poderá continuar a usufruír destes verdadeiros tesouros durante mais quatro séculos, pelo menos.

Nunca se podem esconder os símbolos sem que estes deixem a cauda de fora. São uma presença indelével da história, e sobretudo é preciso que não se tenham ressentimentos de espécie alguma. Não são uma ameaça à soberania de ninguém, nem uma bandeira portuguesa pendurada num restaurante qualquer é alguma espécie de sublevação. Os símbolos são no fundo uma parte da história de Macau. Tapá-los e destruí-los será tapar e destruír a História. Macau só ficaria a perder, tornando-se apenas "mais uma" das cidades da China, e logo uma das mais pequenas.

Mesmo os residentes do território têm consciência disso. Acarinham e têm orgulho do seu património, que torna a sua cidade tão singular. Posso assegurar por experiência própria que a malta até gosta de nós, e não se sente ou sentiu "humilhada" pela nossa secular presença. No fundo somos uns gajos porreiros, amigos de toda a gente, que não quer guerras com ninguém. Claro que poderão existir alguns que pensem o contrário, mas cada um é livre de pensar o que quiser, desde que respeite a lei e a liberdade dos outros. Os símbolos são assim mesmo, são um "fait-divers" sem importância. Andar a retirá-los, apagá-los ou ocultá-los é tempo e dinheiro que seria melhor utilizado em fazer qualquer coisa de mais útil por Macau.

5 comentários:

Anónimo disse...

Boa ideia seria obrigar esses chineses que querem apagar os símbolos portugueses a devolver o passaporte português. Quanto ao Consulado, adquirido pelo Estado Português, eles que não se preocupem, que não tarda nada será vendido como tudo o resto.

Anónimo disse...

Aconteceu que no dia de Natal de 1999 o meu carro foi alvejado com meia dúzia de baterias atiradas de uma janela (de uma torre de mais de 30 andares). A substituição do vidro traseiro custou 3000 patacas mas o que mais custou foi a impressão de estar a ser acossado... não por um motivo pessoal mas apenas por ser um símbolo do poder deposto. Ouvi relatos semelhantes (de danos materiais) de outros portugueses. Não são lendas urbanas, constam dos arquivos da Polícia.

ANTONIO CAMBETA disse...

A cidade de Macau é única no mundo pela sua originalidade, onde o Ocidente e Oriente se fundem numa união impar.

Não estou totalmente de acordo com os comentários dos senhores Anónimos, me perdoam, mas respeito a vossa opinião, certo que houve alguns momentos de ouferia por parte de alguns chineses, mas estes dois senhores anónimos não sabem a forma como os portugueses trataram os chineses até 1966.
Quem viveu nesses periodos se recordará por certo, pena é não haverem registo nas esquadras policiais desses acontecimentos.
Mudam-se os tempos mudam-se as vontades.
Macau e seus monumentos são um atractivo turistico e como tal eles irão permanecerem ainda bons muitos e bons anos.
Aprovieto para vos desejar que passem uma Santa e Feliz Páscoa.
Ao Senhor Leocardo e sua familia família lhes desejo igualmente que tenham uma Páscoa super feliz.
Ps. - o Meu blog é cambetabangkokmacau e Macaubangkok, por favor corrija.
Um abraço amigo

Leocardo disse...

Obrigado, sr. Cambeta. Está corrigido.

Exterminador Impecável disse...

O crime de apagar símbolos portugueses merecia, no mínimo, câmara de gás.