terça-feira, 19 de maio de 2009

Eleições limpas


É heróico o esforço que se tem feito em Macau para que as eleições do próximo dia 20 de Setembro sejam "limpas". Em tempos de higienismo absoluto, máscaras cirúrgicas, desinfectantes e toalhetes para as mãos, não há nada mais importante que assegurar que as eleições, essas também, sejam "limpas". Não importam os resultados, mas que sejam limpinhas e transparentes como um saco da ziplock. Tudo para que o eleitor não volte para casa com a sensação de estar todo sujo de sebo, a cheirar a bedum e com um peso enorme na consciência.

Mas estou confiante que as eleições vão ser mesmo mais limpas e transparentes. Pior deve ser impossível. Aliás chegou mesmo a haver uma acusação formada e um julgamento relacionados com a prática de corrupção eleitoral nas eleições de 2005. Um caso que ficou mais ou menos famoso. Isto deve significar que desta vez vai haver menos descaramento da parte de quem tenta comprar o voto do pobre cidadão. Isto do voto tem muito que se lhe diga. Porque será tão fácil fazer que fulano vote em outrano, sem sequer leh dar grande coisa em troca (um jantarinho, um lai-si, uma boleia...)?

O que falta, de base, é cultura democrática. Uma grande e muitas vezes decisiva fatia do eleitorado está muito mal informada quanto a isto de eleições e de votos. Primeiro porque pensam são obrigados a votar em quem se comprometeram com o voto, e segundo porque não acreditam que o seu voto possa mudar o que quer que seja. Este tem sido o problema com a maior parte das democracias, mesmo as ocidentais. O eleitor deixou de acreditar que o seu voto, só um voto, possa fazer a diferença no desfecho das eleições. De tanta gente que diz "não vale a pena ir votar, porque mesmo que vote em A, é B que ganha", fico a pensar: quem afinal votou em B?

Em Macau não é bem assim. Um voto é como um cupão do McDonald's: vale uma refeição, ou um brinde. Não sei se existe alguma forma de abrir a cabeça do eleitor mais desinformado para que ele perceba que não existe nenhuma forma de alguém saber em quem ele votou. O voto é secreto, e mesmo aquela contabilidade de mercearia que alguns dos chamados "angariadores do voto' faz é falaciosa. Os angariadores de uma das listas mais "competitivas" assegura que em tal mesa a sua lista vai ter 100 votos. E se só tiver 50? Não há forma de saber quem faltou ao prometido.

Outra forma de sensibilização ideal passa por explicar ao eleitor que caso não vote no seu empregador ou numa lista apoiada por este, não perde automaticamente o emprego, nem significa que não vai ter aumento este ano. Finalmente era óptimo que as listas condenadas por corrupção eleitoral fossem excluídas do sufrágio seguinte. Simples e barato, "mánada". Cortava-se o mal pela raíz. Pelo menos fez-se uma coisa bem feita: acabou-se com o cartão de eleitor, que como se sabe, originou uma maré de problemas.

Acho interessante que o CCAC - entidade-mor no combate à corrupção eleitoral e afins - ache mal que se paguem jantaradas, bolinhos e bolachas aos eleitores, mas considere "normal" que as associações concorrentes ao sufrágio providenciem transporte aos "seus eleitores" no dia das eleições (isto a propósito da tal conversa entre o Dr. Sabedor e o Quesito, que mais parece o nome de um queijo mexicano, que pode ser lida no boletim trimestral do CCAC).

Esta é, para mim, uma das irregularidades que urge combater. Os eleitores deviam ser capazes de se deslocar às urnas pelo próprio pé, e a única excepção devia ser dos trabalhadores dos sectores privados que trabalham no dia das eleições. O que mesmo assim é reprovável, pois os trabalhadores deviam pelo menos usufruír de um período de folga para poder exercer o seu direito cívico. O Comissariado defende que "não faz mal" desde que os eleitores não sejam aliciados durante a viagem à urna. E será mesmo assim? Existe alguma forma de fiscalizar?

Ao contrário de outras eleições por esse mundo fora, onde existe um período de reflecção e a campanha tem um data para terminar, aqui faz-se campanha até ao fecho das urnas. Isto é mau, e nem o tal "aspecto cultural" justifica. A única forma infalível de prevenir a corrupção eleitoral seria se a malta ficasse toda fechadinha em casa durante o fim de semana, e viesse o pessoal do CCAC bater à porta de cada um recolher os boletins. Uma espécie de "quarentena eleitoral". Mas para isso, valeria mesmo a pena realizar eleições?

7 comentários:

Joao Vasco disse...

uma pequena duvida de um leitor assiduo do bairro do oriente, as eleicoes em Macau sao para todo o povo ou sao restritas para apenas alguns eleitores?
obrigado

Leocardo disse...

As eleições para a Assembleia Legislativa (as tais que se realizam a 20 de Setembro) são para todo o povo, enquanto as eleições para o Chefe do executivo são através de um Colégio Eleitoral.

Cumprimentos.

Anónimo disse...

O Leo esqueceu-se de dizer que as eleições para a Assembleia " para todo o povo", só elegem cerca de um terço dos deputados.
Outros são nomeados por diversas associações e ainda outros nomeados pelo Chefe do Executivo.

Joao Vasco disse...

ok, thanks!

Anónimo disse...

Todo o povo não! Só para residentes permanentes...

Leocardo disse...

Só para residentes permanentes não! Só para residentes permanentes recenseados! Vá lá, deixem-se lá de minhoquices. Para bom entendedor, meia palavra basta.

Zé Picuinhas disse...

Só para residentes permanentes recenseados não! Só para residentes permanentes recenseados que vão votar!