domingo, 1 de fevereiro de 2009

Os pobres


Num destes dias do Ano Novo vinha voltando a pé do antigo Hotel Lisboa com a (numerosa) família, quando deparo com uma velhinha a pedir esmola ali junto à Escola Portuguesa. Dei-lhe uma pataca. A tia da minha mulher comentou: "só uma pataca? mais valia não lhe ter dado nada...". Ao que retorqui: "se toda a gente em Macau lhe desse uma pataca...", ela completou: "sim já sei, estava rica!". É verdade. E uma pataca faz pouca a nenhuma diferença a muita gente.

Nunca fui muito amigo de dar esmolas, principalmente aqui em Macau, que é uma cidade pequena e o sistema funciona, por assim dizer. Existem orgãos governamentais e associações onde quem tem fome pode sempre encontrar um prato de sopa quente, e quem vive na rua pode encontrar sempre um abrigo, pelo menos nos dias mais frios. Isto não serve de desculpa para não dar, mas é senso comum. Aliás basta visitar alguns países vizinhos para que se assista a situações de miséria absoluta, sem que hajam mãos a medir para que se preste auxílio.

E não se pense que acho que quem pede esmola é um parasita. Não sei como funciona nas outras culturas, mas o conceito básico de andar de mão estendida a pedir comida ou dinheiro a desconhecidos é provavelmente a maior forma de desespero, de humilhação imagináveis. Que muitas das vezes o facto de pedir esmola esteja intimamente ligado à doença mental ou ao alcoolismo é completamente irrelevante. São também pessoas que certamente preferiam ser membros funcionais da sociedade.

Só que não acredito que o acto de dar esmola ajude quem quer que seja. Serve apenas para um mero descargo de consciência, ou um fútil exercício de pena. Depois há as histórias que se contam na região sobre as esmolas. Que na China existe um gangue que decepa os braços e as pernas de jovens e os obriga a pedir esmola, e ao fazê-lo os piedosos cidadãos alimentam ainda mais essa indústria, e outras histórias de fazer pele de galinha nas pessoas mais sensíveis. E as tácticas parecem dar resultado. Quem não pensa em ajudar alguém sem braços e pernas que pede na rua?

Depois as doações. Não sei se já alguém reparou mas no centro da cidade estão umas senhoras filipinas a pedir donativos (às vezes de forma um pouco agressiva) com um saquinho que diz "Medical Help" ou qualquer coisa que lhes valha. Acho que sim senhor, que se devem apoiar as instituições de caridade, mas desde que muito bem identificadas, o que não é o caso. Existem mil e uma associações, desde a Caritas à Cruz Vermelha, passando pela Anima (para quem prefira os animaizinhos), onde se pode ajudar a tornar Macau uma cidade mais igual.

Finalmente, e o ponto fulcral da questão: quem deve ajudar? Não me parece que cabe ao cidadão médio encurtar o fosso entre os ricos e os pobres. Pode tentar, mas permitam-me a velha máxima do "os ricos que paguem a crise". No campo da proporcionalidade, por cada pataca que eu der a um pobre, há por aí muito boa gente que devia dar 10, 20, ou muito mais. E não dá. Ou pior que isso, dá mas sem antes se certificar que tem contrapartidas, em publicidade ou de qualquer outra forma. Quem dá aos pobres empresta a Deus, mas se Deus estiver a olhar, há quem fique muito mal na folha dos pagamentos.

1 comentário:

ANTONIO CAMBETA disse...

Estimado Amigo Leocardo,
Gostei do li neste seu artigo, dar esmola q quem precisa é um acto de caridade.
Mas repare numa coisa muito em voga em Macau, muitos desses pobres ou com deficiências motoras, são controlados pelas seitas, que os colacam em pontos estratégicos e depois lhe sacam as esmolas recebidas, direi que são pedintes profissionais.
Hoje em dia já náo existem tantos visto que as polícias tem posto cobro a esse tipos mafiosos mas era assim, muitos deles até vinham da China logo de manhãzinha e eram recolhidos e levados para China ao cair da noite.
Uma vez reparei numa velhinha que pedia esmola junto ao antigo Soi Cheong, em plena avenida Almeida Ribeiro, um dia a vi no Banco Veng Hang depositar uns bons milhares de patacas.
Um abraço amigo