quarta-feira, 14 de abril de 2010

Crítica de arte (ou da falta dela)


1) Escutei com mais ou menos atenção a entrevista com António da Conceição Júnior no programa da tarde na Rádio Macau. Falou-se como não podia deixar de ser nas indústrias criativas, nos artistas locais, e na velha ladaínha da "desmotivação" e da "falta de apoios". A certa altura Hélder Fernando disse qualquer coisa como "se em Macau os turistas compram lulas assadas, porque não podem comprar também arte?" ou qualquer coisa assim. Aqui o jornalista da RM tocou na ferida: os turistas gastam dinheiro nos casinos, nos restaurantes da treta, nos pastéis de nata, na carne seca (ngao yuk kon) ou nos bolinhos de amêndoa, mas não gastam dinheiro em arte, não lhes interessa investir em arte, e não há arte, pura e simplesmente, em Macau. Perdoem-me o tom pessimista, mas o que existe em Macau são tentativas de arte, e vá lá, alguma boa vontade. Existe alguma boa produção literária em português (desconheço o que se passa do lado chinês, mas penso que se resumem a publicações de académicos), nenhuma produção cinematográfica de relevo, os (poucos) talentos são mal aproveitados, não existem publicitários dignos desse nome, enfim, uma desgraça. Quanto aos artistas plásticos aspirantes, aprendam como se diz "artista plástico" em cantonês, identifiquem-se como tal a um cidadão médio se este vos perguntar a profissão, e vão ver a cara com que levam. As indústrias criativas são um sector em que se tem que apostar, naturalmente, visto que nem só de pão vive o homem, mas aqui continua a estar longe de ser uma prioridade. Não há liderança, não há estratégia, e não basta só dizer "vamos apostar nas indústrias criativas" sem se apostar primeiro na educação da população, na sensibilização, e depois na qualidade. Nunca é tarde demais para se começar, mas parece ser a mentalidade do "man-man" que aqui impera. Macau sã assi, artisticamente falando: um deserto.

2) O Jornal Tribuna de Macau começou a publicar a partir de hoje uma série de fotografias de Franck Regourd, fotógrafo francês radicado no território há vinte anos. Tenho o prazer de conhecer pessoalmente o Franck, um homem intelegentíssimo, trabalhador, um verdadeiro poliglota (fala correctamente português, inglês, cantonense e francês), um cavalheiro, e é uma verdadeira sorte podermos contar com ele por cá. Uma iniciativa de louvar por parte do JTM, portanto. Pode ler aqui a primeira apresentação do "homem com o chapéu de palha".

3) Ainda no JTM, e a propósito da crónica semanal de Luís Machado, esta semana intitulada Por este Rio das Pérolas acima!, deparei com um parágrafo que me chamou a atenção: "E já agora, passe a publicidade, até podem petiscar e dizer em "maquista chapado" - "Ui ui di sabroso!" no restaurante do nosso conterrâneo Carlos Batalha, aqui bem pertinho (na localidade de Sam Yong!)". Permita-me discordar. Conheço o restaurante em questão, que penso chamar-se "O Batalha" (ou "O Carlos", não tenho a certeza) comi lá uma vez, e está muito, mas mesmo muito longe de dignificar o nome da comida portuguesa na China. Não sei se foi só no dia em que lá estive, mas o bacalhau estava tão salgado que era intragável, as espetadas caíam do espeto (!), e a ementa em geral não diferia muito daquilo que se pode encontrar naqueles restaurantes de comida portuguesa de imitação onde os turistas de Hong Kong são enganados em Macau. Umas rodelas de chouriço, umas azeitonas e umas couves cozidas com azeite não são a "comida portuguesa" por excelência. E para que não pensem que tenho aqui algum problema mal resolvido (que é logo o que vem à ideia quando não se fala bem de qualquer coisa em Macau), não conheço nem tenho nenhuma relação directa ou indirecta com o sr. Batalha. É só a minha opinião. Se quiserem vão lá exprimentar, e façam bom proveito.

Sem comentários: