Vícios privados

Gillian Chung Yan-Tung é uma cantora pop de Hong Kong, membro da famosa dupla "Twins", que fez um enorme sucesso no princípio da década. Em 2008 Gillian envolveu-se no célebre escândalo Edison Chen, outro cantor/actor do território vizinho quando foram divulgadas algumas fotografias comprometedoras da cantora. Numa delas podiamos ver Gillian a morder um lençol enquanto era gratificada por Edison. Quando rebentou o escândalo, Gillian começou por negar, mas perante as evidências veio assumir o sucedido, disse que "era jovem e não sabia o que fazia" (a desculpa mais velha do livro) e pediu desculpa. Já em 2006 Gillian tinha sido fotografada por um paparazzi dentro de um camarim, semi-nua. Só agora, quase dois anos depois do escândalo Edison Chen, a cantora faz uma tentativa para relançar a sua carreira.

Tiger Woods não é só um jogador de golfe; é a personificação do golfe. É difícil para quem não é seguidor do desporto do taco e dos buracos dizer o nome de outro golfista, ou de quem era o nº 1 antes de Woods. O golfista, de ascendência chinesa, africana, tailandesa e holandesa, tem um currículo impressionante, com 71 vitórias no PGA Tour e 14 títulos mundiais, e é considerado pela crítica da especialidade o melhor golfista de todos os tempos. Em Novembro de 2009 o seu mundo desabou, com alegações de infidelidade, e a surpreendente revelação de que teria mais de uma dúzia de amantes.

John Terry, 29 anos, é capitão do Chelsea e da selecção inglesa. Um dos defesas mais seguros e tecnicistas do futebol mundial, Terry preparava-se para capitanear a Inglaterra no mundial deste ano na África do Sul. O jogador, que já teve o seu quinhão de comportamentos menos próprios para um atleta profissional (alcoolismo, desacatos com as autoridades), teve um caso extra-conjugal com Vanessa Perroncel, ex-namorada do seu ex-companheiro de equipa e amigo pessoal Wayne Bridge. Da relação com Terry, que é casado, Perroncel viria a engravidar e a abortar. O seleccionador dos "Three Lions", o italiano Fabio Capello, já anunciou que vai retirar a braçadeira de capitão a Terry.

O que têm Gillian Chung Yan-Tung, Tiger Woods ou John Terry em comum? São alegadamente "vítimas" dos tablóides, da imprensa cor-de-rosa, dos paparazzi. Queixam-se de invasão de privacidade, de devassa das suas vidas privadas, enfim, de tudo o que há de mais cruel, mesquinho e prevertido neste mundo. E tudo em troca de muitos milhões de dólares. Coitados. Sendo Gillian Chung, Tiger Woods e John Terry figuras públicas, não têm direito à privacidade, pois já há muito que a venderam. Passo a explicar.

Eu e o estimado leitor, que acordamos todos os dias às sete da manhã para ganhar a vida dentro de um escritório qualquer, cidadãos anónimos deste mundo, temos direito à nossa vida privada e à defesa do nosso bom nome, e tomamos como certo que ninguém nos vai fotografar ou filmar em situações comprometedoras, ou intrometer-se na nossa vida profissional ou familiar. Se amanhã eu me tornasse um cantor pop ou vencesse um óscar da academia para melhor actor, era natural que os meus milhões de fãs quisessem saber mais sobre a minha vida, o que faço, onde vou, com quem ando, e até o meu passado.

Gillian Chung diz-se "uma vítima", e que não sabia o que fazia, mas quem olhar para as fotografias em questão apercebe-se que a menina está longe de ser "inocente", e de não saber o que fazia. Tiger Woods foi internado numa clínica (caríssima, diga-se de passagem) para se curar do "vício do sexo". Muitos de nós gostavamos de ter o mesmo sucesso com as mulherers, mas a nós chamam-nos "tarados". John Terry é um porquito e Perroncel é uma pêga, com o handicap de serem ricos e famosos. Caso contrário o mundo inteiro estava-se nas tintas.

É interessante como os três casos em análise sejam bastante mais desinibidos e desconstraídos em frente às câmaras em campanhas publicitárias, em que juntam mais milhões às suas vastas fortunas, do que quando são surpreendidos em situações comprometedora. Estes artistas têm responsabilidades perante os seus fãs, alguns deles bastante jovens, e que olham para os seus ídolos como um exemplo, como verdadeiros heróis, que seguiram o seu sonho. Querem privacidade e anonimato, vão trabalhar num escritório ou numa repartição qualquer, e sofram, como todos os outros.