Aqui estão três belos exemplares "homo futebollis", um da sub-espécie "africanus", e dois da "lusitanus", mas todos originários de "Ligus Portugalis", um povoado no extremo oeste da "Europis", conhecido por ser sempre uma grande "barafundis". Da esquerda para a direita temos Juary, Luisinho, e Marco Meireles, na imagem a segurar uma taça, que é respeitante à conquista do campeonato de...Macau??? Mas qual é a surpresa? De facto tempos houve que jogar no campeonato de Macau era praticamente sinónimo de decadência - nenhum jogador da "Ligus Portugalis" ia optar por Macau em vez de, sei lá, o Merelinense da antiga III Divisão, ou até um Carapinheirense na I divisão distrital da AF Leiria, mas com aspirações "de subir aos nacionais este ano", algo assim. Quando chegaram em finais de 2014 e inícios de 2015, altura que reabriu a janela de Inverno do mercado de transferências, vinham demasiado bem referenciados, os rapazes: Juary tinha passado dos juniores do Sporting à equipa "B" dos leões há menos de dois anos, e representava o Tirsense no Campeonato Nacional de Séniores, enquanto Luisinho era o artilheiro-mor do 1º de Dezembro do mesmo escalão, e vinha de um registo de 23 golos marcados em época e meia! Meu Deus, o que foram estes rapazes fazer para Macau, dotados de duas pernas funcionais e com (muito) menos de 35 anos de idade??? Teriam sido raptados de um hotel em Moscovo onde foram seduzidos, anestesiados e expedidos para o Oriente??? Passo o exagero, mas a minha noção do "futebollis macanesis" é datada de um paleolítico ainda mais inferior que o actual, pois de quando vez alguém se lembra de investir uns cobrezitos, e lá aparecem uns jogadores decentes a compor equipas mais ou menos decentes para jogar num campeonato completamente indecente. Com mais este "você aí, me dá um dinheirinho aí", lá apareceram uns rapazes mais jeitosos vindos não só da "Liga Portugalis", mas também alguns "homo futebollis" da variante "africanis", e especialmente "brasillis" (esses andam em toda a parte, como os "fillipinis non residentis"), e a maioria deles com muito sangue na guelra, com esperança de chegar ao emergente "futebollis chinesis", a dar os primeiros "Grandes Pontapés Para a Frente". Na falta disso podem sempre aspirar ao "futebollis hongeconguis", aqui ao lado, onde a malta leva tudo muito mais a sério, mesmo que os resultados sejam apenas "ligeiramente menos humilhantes".
Estes três em particular, Juary, Luisinho e Marco Meireles, têm em comum uma experiência que lhes valeu...perder uns meses? Bem, não foi assim tão mau, pelo menos em termos profi$$onais: jogaram no campeonato de Macau, pelo Benfica, e sagraram-se campeões. Melhor: foram pagos (e razoavelmente pagos, diz-se). Sim, alguns "clubis portuguesis" têm essa mania de...como vou dizer isto? É simples: imaginem que um tipo vos contratava para trabalhar, vocês vergavam a mola todos gulosos, a pensar na notinha, e no fim o bacano diz que ah, e tal, "moah". No fim ainda vos fica a engonhar com a lábia do "no mês que vem recebem tudo, de certeza", e enquanto esperam pela primeira tranche, olha, porque não trabalhar para a segunda? Entre os que ainda pagam (e a malta baza, foge dos malucos), há os que...bom, ficam a dever - mas deixem lá que há uma mão cheia deles que não podem pagar porque limpar as latrinas na prisa paga muito, mas mesmo muito mal. Mas custa ganhar a vida no futebol sem poder jogar futebol como deve ser, e por isso estes três mercenários mosqueteiros do chuto na bola foram procurar pastos mais verdes, onde o número de espectadores nas bancadas fosse superior a 50. Ou pelo menos onde o público ainda se consegue ouvir mais do que os atletas e técnicos a comunicar dentro do campo. Assim, depois de seis meses em Macau onde sempre arranjaram medalinhas para morder e encher a barriguinha, foram-se; Luisinho regressou ao 1º de Dezembro e levou consigo Juary, enquanto Marco Meireles...esperem, antes de falar de Marco Meireles:
Epá, o que é isto, um guarda-redes do...Chaves?!?! Sim, ou melhor, foi um guarda-redes do Chaves, depois de ter passado pelas camadas jovens do Esposende, Boavista e Salgueiros, antes de terminar a formação com os flavienses, onde ficou um ano como sénior, esteve emprestado no ano seguinte ao Cinfães, e então com 20 anos DECIDE VIR PARA MACAU! Sim, mais do que apenas isso: VEM FICANDO JÁ HÁ MAIS DE DOIS ANOS. Quem ainda não reconheceu, trata-se de Rui Nibra, dono e senhor das redes do Benfica de Macau, ao ponto de nem constar um suplente para a sua posição na lista do plantel de 2014. Não conhecendo pessoalmente ou tendo comunicado de outra forma com Rui Nibra, fico seriamente intrigado com os planos que este rapaz terá para o seu futuro, que como se sabe, em Macau, não existe. O guarda-redes referência do futebol de Macau, o nosso Zamora, Banks, Yachine ou Schmeichel, é um tal Domingos Chan, ainda no activo aos 45 anos, é para todos os efeitos o estafeta de um departamento governamental. Dependendo do futebol PARA COMER, teria que jogar até aos 100, e olha que ia ser preciso muita tinta loira para o cabelo. Depois de analisar o factor "qualidade do atleta" com "liga do clube que representa", temos a maior amplitude alguma vez registada. Isto era praticamente o mesmo que Cristiano Ronaldo ir dar "um pézinho" ao Estrela de Vendas Novas, ter "gostado das condições" (pagavam almoço e transportes, nada mau) e resolvido ficar por lá uma temporada e meia, e "depois logo se vê". Mas passando então ao Marco Meireles...
Do grupo que veio para Macau, o caso mais intrigante é o de Marco Meireles, que aos 25 anos é um autêntico "Globe Trotter" do futebol, sempre com a casa às costas. Nascido na Amadora, iniciou-se no Cultural da Pontinha, onde os seus dotes de pequenote lhe valeram logo no rasgar da adolescência a sua primeira longa viagem: o "Puéérto", onde ficou desde os juvenis até ao primeiro ano de júnior. Provavelmente ainda a recuperar do choque cultural que foi essa primeira mudança, passaria por outro ainda maior, quando aos 18 anos foi fazer a última etapa da sua formação na Madeira, ao serviço do Nacional. O jovem Marco prometia, mas uma lesão grave deixou-o afastado por seis meses, e quando foi tentar "recuperar a matéria perdida", deu por si a representar o Machico, também da Madeira, o Aljustrelense, nos confins do Alentejo, e finalmente o Ribeira Brava, já de volta à pérola do Atlântico, onde teve a sua primeira experiência de "amor à camisola" - ficaram por pagar seis meses de trabalho "para aquecer". Foi aí que deu um murro na mesa e disse: "F...-se esta m..., c..., p... que os pariu da grande c.., vou é para a Finlândia, c...!" (é possível que tenha pelo menos pensado em algo do género).
Mas foi mesmo para a Finlândia, que no fundo é um apanhado de Amadora, Porto, Funchal e Alentejo, mas muito mais frio, e com um público menos apaixonado pelo desporto-rei (gostam mais de vodka) ali disputado na variante "futebollis esquimmus". Mas pelo que se pode ver pelo seu entusiasmo, Marco estava como um peixe na água, neste caso uma pescada congelada. Jogar no campeonato finlandês é longe de ser tão mau como jogar em Macau, mas no terceiro escalão com um tal Sporting Kristina, e ainda tendo evitado por pouco a descida, é abusar um pouco desse conceito. Assim, 25 partidas realizadas e 3 golos marcados depois, Marco Meireles vai procurar pastagens mais verdes em prados mais quentes:
Depois de um ano a jogar para o Pai Natal ver, Marco teve um convite de um treinador amigo para representar, e agora vejam bem isto, um clube BRASILEIRO! Oui, oui, o Grêmio Barueri, e quem por acaso deixou de seguir o futebol brasileiro por volta de 2008 e 2009, vai achar que isto foi bestial: afinal o clube dos arredores do S. Paulo disputava por essa altura a Serie A, o campeonato principal do "futebollis brasillis", que como se sabe é "super legallis, obis!". Mas acontece que por alturas da chegada de Marco Meireles, o clube disputava a Série D, o quarto escalão, naquilo que se pode considerar "uma queda imparável e vertiginosa no abismo". Chegado ao clube, e depois de ter sido confundido e lhe dizerem que "não tinham pedido nenhum pão", Marco explicou ao que vinha, e ficou a saber que o objectivo ali era "a subida à Série C". Dizer que o objectivo "não foi atingido" é relativamente simpático, atendendo ao último lugar obtido num dos grupos da primeira fase, com uma vitória e sete derrotas em oito jogos disputados. Pelo menos deu para conhecer o Brasil. Suponho...
E depois veio Macau, onde após conquistar o título para o Benfica local, Marco Meireles partiu de novo para a Finlândia, mas desta vez para Mikkeli, quartel-general do Mikkelin Palloilijat, ou apenas "MP", que disputa - e sim senhor, assim sim - a II divisão do "futtebolis esquimmus". Mas não há bela sem senão, e o nosso rematador viajante foi encontrar numa espiral de resultados negativos, contribuindo até agora apenas para duas das cinco derrotas consecutivas que resumem o desempenho recente do MP, que se encontra no último lugar ex-aequo com outro bando de esquimós maus de bola, a nove pontos da zona de permanência, e a cinco jornadas do fim. Terá o Marco Meireles uma queda para o abismo, ele próprio? Ou é apenas um profissional que apenas tem que fazer pela vida, e para isso só tem a única coisa que aprendeu a fazer: jogar futebol. Sim, não esperem dele o esboço de um projecto para um futuro centro comercial, ou que traduza para Português as obras completas de Frans Eemil Sillanpää, mas antes um pontapé de canto, um passe longo para entrada da área, algo desse tipo.
Bom, enquanto um novo capítulo se escreve para Juary, Luisinho e Marco Meireles (que me deixou uma óptima ideia para outro "post"), no relvado da Taipa fica a promessa de desfilarem outros aspirantes a "ases da bola", e que cedo aprenderão que a dialéctica dos jogos casa e fora ganham em Macau uma nova nuance: todos treinam, jogam e ficam a perguntar "porquê" nos mesmos recintos, e assim também aproveitam para se conhecerem todos um pouco melhor no fim. Afinal Liedson nunca passou pelo futebol de Macau.