sábado, 2 de fevereiro de 2013

Entroikados e mal pagos


Surpreende-me como Portugal ainda não faliu, assumidamente. A crise que se agrava com a passagem dos anos ainda não deixou a totalidade da população desempregada e pobre, mas pelo que vejo nas notícias, já não falta muito. Cortes, impostos, contenção, postos de trabalho terminados e o apertar do cinto é a norma vigente, e basta pôr um microfone à frente desta gente para os ouvir dizer que “está tudo cada vez pior”, ou “não sei onde isto vai parar”. Não fossem estas apenas frases feitas e estaríamos perante de um cenário de fome que faria a famínia etíope parecer um faustoso banquete.

Quem nunca foi a Portugal e segue as notícias pensa que o país está mergulhado no caos e na anarquia totais. Um colega meu, chinês, perguntou-me se era verdade que os portugueses cobravam por uma simples direcção. Sim, do género: - “Olhe desculpe sabe onde fica a Rua da Prata?” – “Eu digo-lhe onde fica, mas passe para cá um eurozito”. Assaltos à mão armada temos sim, mas pelo menos ainda mantemos a nossa simpatia e hospitalidade. Além da dignidade, claro.

A situação é tão precária que um dia não será necessário esperar uma hora nas filas dos hiper-mercados, as marisqueiras deixarão de aceitar reservas e terão mesas vagas no Verão, os festivais de música terão bilhetes até ao último dia e as discotecas ficarão às moscas…apenas com 90% da frequência habitual. A sério, estou preocupado. Quando isto acontecer é sinal que os nossos compatriotas estão nas lonas, a necessitar de ajuda humanitária. Arriscamo-nos a chegar ao ponto dos grandes clubes de futebol não poderem pagar centenas de milhares de euros por mês a jogadores sul-americanos. É assim tão grave, meus amigos! Qualquer dia acaba-se aquele dinheiro imaginário que paga tudo o que referi acima neste parágrafo.

Os próprios Funcionários Públicos, que desde sempre se deitaram à sombra da bananeira do Estado, viram os seus subsídios volatirizarem-se, e arriscam-se a ir parar ao olho da rua, graças às sugestões da “troika” que exige que o país reduza a despesa pública através de “cortes nas gorduras do Estado”. Que graça, que sacanice. Como se vão dispensar estes FP, quais, e como se determinam os indispensáveis? Será através de sorteio? Deixarão de haver empregos nos cafés e “call-centers” para os recém-licenciados? Os verbos da moda são “reduzir”, “despedir” ou “sofrer”, as palavras do ano são “austeridade” ou o neologismo “entroikado”, que teria mais piada se não estivessemos mesmo….entroikados.

Assisto aos noticiários da RTPi que nos informar desta caristia e dou-me a olhar para os apresentadores com pena. Das duas uma: ou fazem aquilo praticamente de borla ou os seus empregos estão em risco iminente. A Dina Aguiar, que só dá notícias de falências e desgraças, já nem consegue sorrir, e não pensem que é por causa das rugas; estará legitimamente preocupada com a eventualidade de um despedimento. Agora até já acaba o seu “Portugal em Directo” – onde não tem boas notícias para dar – com mensagens de coragem para os mais desfavorecidos, acusando a pressão. É como um general que ordena de espada em punho que os seus soldados continuem a avançar para a frente de batalha de uma guerra mais que perdida.

Já nem sinto paixão ou entusiasmo nas carinhas larocas que nos entram todos os dias pela televisão. Locutores, actores de séries e telenovelas, apresentadores de concursos e outros programas de entretenimento devem ter uma capelinha privada onde rezam a todos os santos para continuar a reunir a preferência dos portugueses que ainda têm televisão ou conseguem pagar a conta da electricidade. É um país à míngua, e temo pela própria independência nacional. Volta Salazar, que estás perdoado. Mais vale “orgulhosamente sós” do que mal acompanhados. E entroikados!

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