O saudoso Campo dos Operários.
A maior parte da população actualmente residente em Macau estará tão habituada à cidade nova, aquela que se levantou nos últimos dez ou vinte anos, que certamente não sabe ou não se recorda de locais que fizeram história, e depois passaram à História. Eu próprio não sou uma excepção, e há locais no território edificados nos últimos anos que apagaram da memória o que lá havia antes. O Edif. Administração Pública, onde eu próprio trabalho, é um bom exemplo disto. Apesar de ter sido construído apenas entre 1998 e 1999, não me consigo lembrar do que lá havia antes daquele “centro de prestação de serviços”. Habituamo-nos tão rapidamente às novidades que se torna difícil lembrar mesmo o passado que não é assim tão distante. Já mesmo ali ao lado, no edifício recentemente ocupado pela Associação dos Operários, existia um centro comercial Chi Fu, e depois disso um restaurante da cadeia KFC. E por falar em operários, quem vive em Macau há pelo menos mais de 12 anos lembra-se certamente do Campo dos Operários, em frente ao velhinho Hotel Lisboa, e onde se situa actualmente o Grand Lisboa. O Campo dos Operários e a sua cantina anexa eram o local de convívio por excelência dos operários, como o próprio nome indica. Do proletariado, dos gajos suados, da massa bruta, do povo, pá! Infelizmente é o dinheiro e não o povo quem mais ordena, e em vez de um campo de terra batida e uma cantina onde se serviam sandes de costeleta de porco temos roletas e luxuosos “dim-sums”.
Os mais antigos, antes de mim, recordam ainda o Liceu Infante D. Henrique, que ficava em frente ao Hotel Lisboa, onde é hoje o Banco da China. Dessas memórias dos tempos de escola não posso dizer nada, uma vez que fiz a minha escolaridade em Portugal, mas recordo-me do antigo Liceu ser onde fica hoje o Instituto Politécnico, e a actual Escola Portuguesa funciona no edifício da antiga Escola Comercial Pedro Nolasco da Silva – com o condão do edifício se encontrar praticamente inalterado. Mesmo muito alterada foi a Escola Pui Cheng, na Av. Horta e Costa. Onde existe agora aquela estrutura da “era especial” havia um recinto mais humilde, onde era possível observar os alunos a brincar no patio ou a praticar desporto da rua, através do portão. A Universidade de Macau encontra-se no mesmo sítio desde que cheguei em 1993, mas prepara-se para mudar para o novo campus da Ilha da Montanha. Não sei o que vão fazer com a actual infra-estrutura, mas se a deitarem abaixo, as novas gerações rapidamente a esquecerão. E tudo se renova.
Há locais que pelo seu desenvolvimento mais recente, apesar de rápido, ainda fazem lembrar a sua forma no passado. Lembro-me ainda do COTAI antes da “strip” de casinos, do tempo em que corria água no istmo. O mesmo se aplica aos locais que hoje são ocupados pelo Wynn, MGM, Galaxy e outros que tais, que quando cheguei estavam ainda no início da fase de aterro. Quem chegou há pelo menos quatro anos ainda se lembra bem do antigo centro comercial Yaohan, que hoje é o casino Oceanus, enquanto o “New Yaohan” (já se chamava assim quando mudou) é actualmente na Praia Grande, ao lado do casino Emperor. Macau cresceu roubando espaço ao mar, exigência da fúria expansionista imobiliária, e não fosse a contenção trazida por um certo escândalo de corrupção há uns anos, e já seria possível ir a pé da peninsula até à Taipa sem atravessar a ponte. Recomendo a todos um olhar mais atento ao Macau que ainda vai ficando de outros tempos. Pode ser que amanhã já lá não esteja, e depois não faltará muito para que a nossa memória também se desvaneça num sopro.
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