Hoje é dia de S. Martinho, um dia tão especial para nós, portugueses, que nem dá para perceber porque não é feriado. Neste dia é suposto praticar-se caridade, em homenagem ao santo húngaro que foi enterrado em Tours, França, faz hoje 1600 anos (ler
aqui a história de S. Martinho). Em Malta, por exemplo, as crianças comem nozes, avelãs e tanjerinas. Na Holanda e nas Filipinas há marchas de lanternas, e noutros países dá-se início à quaresma que antecede o Natal.
Em Portugal, graças a Deus, come-se e bebe-se bem. Não sei se dessa forma se faz justiça ao significado deste dia, mas quem disse que é necessário perceber exactamente o sentido religioso das romarias e feriados? O próprio Santo António, um santo intimamente conotado com os pobres, é pretexto para marchas populares, sardinhadas, bebedeira e folias mil. A própria Páscoa já não é o que era, e sinceramente quem cumpre os jejuns, vai à missa ou vê o Quo Vadis na TV?
Em todo o caso o S. Martinho é uma festa bem portuguesa, que tem tudo a ver connosco. Mais que o Carnaval pelo menos, e muito mais que o Halloween, de certeza. É um dia que me traz recordações interessantes. Ia a família toda e os vizinhos para o quintal da dona Emília, onde se realizava o magusto. A velhota, coitada, oferecia batatas doces cozidas, castanhas também cozidas, com âniz, e água-pé, que servia nuns copos de plástico, daqueles com que a malta lava os dentes. Era de boa vontade. Cá fora saltavam-se fogueiras, enquanto os mais velhos ficavam a cultivar a bebedeira com o vinho, a jeropiga e o vinho do Porto. Era um dia propício à sinistralidade rodoviária.
O frio convidava a que se ficasse à volta da fogo, dos amigos, dos familiares e do vinho. O que nos outros países é considerado “uma tragédia” na forma de alcoolismo infantil, para nós o vinho é uma brincadeira de crianças. Não faz mal em doses reduzidas – é como xarope. No dia seguinte, na escola, sofriam-se as mazelas da noite de S. Martinho. Todos molinhos, os miúdos, com ar de ressaca. Ainda me lembro bem da minha colega Rute, do 6o. ano, vomitar no caixote de lixo da sala de aula. Quentes e boas, as recordações, tal como as castanhas.
Em Macau o S. Martinho é ainda festejado em força pela comunidade portuguesa, e este clima semi-invernil que temos tido esta semana vem mesmo a calhar. Na Hovione realizou-se o tradicional magusto, uma tradição que resiste às mudanças que se verificam nos últimos anos nesta terra, e hoje a EPM levou os mais novos a Coloane para festejar este alegre dia. Um pouco por toda a parte a nossa comunidade celebra o dia, nem que seja no conforto do lar, com os seus, da forma que muito bem entender. Na falta de água-pé lá da terra, não falta uma gama de vinho tinto português de qualidade por onde escolher.
Cá em casa vamos ter castanhas assadas, batata doce frita em palitos (é mais fácil que assá-la em forno a gás) e vinhaça, da nova e da boa. Não sei o que me deu, sinceramente. Passaram mais de 10 anos desde a última vez que celebrei o S. Martinho. Espero que a nostalgia que me deu não seja grave. E já agora, será que a Hovione fabrica antídoto para a ressaca?
2 comentários:
Veiga, és tu o Leocardo?
Não, não é. É assim: é bom que não incomodem ninguém a perguntar-lhe se é o Leocardo, pois mesmo que me perguntem, eu desminto. Cumprimentos.
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