Voltando ao New Yaohan. Falemos destes limões. Estes pobres limões que se viram e desejaram para cá chegar, como se assaz dizer. Três patacas e meia por cada um deles, murchos, pálidos, longe da viçosidade da juventude, de quando foram colhidos de um limoeiro sabe-se lá quando e sabe-se lá onde.
Será assim tão difícil arranjar limões grandes, arredondados, rugosos, daqueles que se apertam e sai deles um jacto de aroma de citrino? Aqueles a que basta uma nesga para fazer um espectacular carioca de limão (para quem gosta), que façam uma limonada capaz de fazer corar de inveja as Ocean Spray deste mundo, ou que tenham a categoria para aperecer com a casca entalada num pires de arroz doce.
Que saudades de um bom limão, meu Deus. Quem poderia estar interessados nestes limões moribundos, onde colam uma etiqueta tipo “Don Garcia” para lhe dar um aspecto de “qualidade” e outra etiqueta que diz $3.50. Vive no Lakeview Garden e precisa urgentemente de um limão para temperar os filetes de tamboril do almoço do dia seguinte? Tem visitas inesperadas e precisa de fazer uns Gins Tónicos? Aí está, $3.50 por um limão já quase liofilizado, é pegar ou largar.
E não são só os limões que me fazem suspirar. Já alguma vez conseguiu encontrar um molho de coentros em condições? Daqueles espevitados, perfumados e bonitinhos? Não. Só se apanham os de raíz castanha, desolados, com ar de que já nem uma aspirina os salva. E já experimentaram comprar alfaces no mercado? Quando se chega a casa e se tiram os vegetais daquele saco preto (super-inestético por sinal) encontra-se sempre uma água preta e pegajosa, indicativa da podridão.
Basta deixar uma cenoura no lava-loiça mais de 10 minutos para começarem a surgir aquelas mosquinhas microscópicas que aparecem quando se fica sem lavar os pratos umas duas horas. E as laranjas, que por muito que procure não consigo encontrar umas que não pareçam a bola de um jogo do Hull City, rematada para a frente e para o ar centenas de vezes. A única excepção são talvez aquelas laranjas vermelhas que vêm da Austrália. Também pudera, a quinze patacas a peça.
De que horta e pomar longínquos virão os legumes e as frutas que consumimos em Macau? O que aparenta ter qualidade vem de muito longe, com um ar cansado da viagem. Ontem vi um convidativo repolho no Park’n’Shop (a 60 patacas, por sinal) que era alegadamente de França, e que de facto só lhe faltavam os carimbos com os vistos naquela embalagem de plástico em que vinha confinada. As amoras, que em Portugal apanhava dos arbustos com indiferença que hoje seria transformada em alegria, vêm também hermeticamente empacotadas, com as de baixo já a começarem a transformar-se em sumo.
Às vezes vou comprar uma couve, e vejo umas todas ratadas, mas a senhora da loja assegura-me sempre que “está boa”. Como se diz em chinês “então come-a tu?”. É que não basta andar a dar dentadas a medo por causa da melamina, do pesticida ou da mosca-da-fruta. É preciso ser vivaço para não se andar aí a comprar gato por lebre. E não é que se calhar o deputado Pereira Coutinho tinha razão quando disse que Macau se estava a tornar no caixote do lixo do Sudeste Asiático?
Temos o direito de exigir carne, peixe, fruta e legumes frescos. Estou cansado de tirar os litros de lixo, terra, merda ou lá o que é aquilo que se forma à tona da água cada vez que fervo um pé de porco ou um naco do lombo. Não haverá um candidato às próximas eleições que tenha na agenda estes assuntos? É que mais do aquilo que se passa nos corredores do poder, interessa-me mais o que se passa nos corredores dos mercados. E na minha barriguinha, é claro.
3 comentários:
Pronto. Aqui está 4a razão pela qual deixei Macau. A podridão está a tomar conta da região "mais especial" da RPC... e arredores.
Fico triste em saber.
E os camaradas do blog A Conquista da China, também já deixaram Macau? É que o blog desapareceu de vez.
Candidato para eleições lá percebe alguma coisa disto, come no restaurante qualquer coisa disfarçada como comida e prontos. 60 patacas um repolho? Estás a brincar não? 99 cêntimos e já refilamos que está caro. Vai ser só matar saudades da boa comidinha no Natal não é?
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