Uma das saudades que mais sentimos aqui tão longe das origens são as saudades dos amigos. É uma dor que doi cada vez menos com o tempo que passa, mas um tanto ou quanto renovada cada vez que regressamos. Recordamos os dias livres e selvagens, dos jogos da bola, dos joelhos esfolados, das aventuras malucas, das primeiras bebedeiras. Não é fácil deixar quem cresceu junto connosco, quem nos viu e quem vimos crescer. Gostávamos de os ter todos aqui, se calhar, ou gostávamos de poder voltar para perto deles. Não fosse o facto de o dinheiro ou a carreira falarem mais alto. Os amigos que aqui achamos não são a mesma coisa. Todos têm a sua própria história, o seu passado, e é mais difícil ver através deles, sentir a sua alma.
O problema da comunidade portuguesa em Macau é que somos todos muito amiguinhos. Unidos não, amiguinhos. Macau deve ser o sítio do mundo onde existem mais portugueses “amigalhaços” uns dos outros. O amigalhaço é aquele gajo que nos cumprimenta sem sequer saber o nosso nome. Amigalhaços de toda a gente e amigos de ninguém. É aquele que por ser conhecido, aparecer nos jornais ou na TV regularmente (ou ter aparecido uma vez ou duas) cumprimenta todos quando chega às agremiações tugas do território. Quer manter a sua “popularidade” a todo o custo, é um “diplomata”. Por vontade dele, nem olhava para nós e dizia-nos “desculpe mas o senhor não é suficientemente importante para que eu me lembre de si ou do seu nome”. Quando nos aperta o bacalhau e pergunta “tudo bem?”, essa é uma pergunta retórica. Claro que temos que responder que sim. Se a resposta for negativa, ele não vai perguntar “porquê? Posso ajudar?” (a não ser que seja advogado e o problema for de natureza jurídica, ao que nesse caso nos dá um cartão).
Os amigalhaços só se dão com gente do seu meio, e só sabe o nome daqueles com que é obrigado a trabalhar. Precisamos de mais amigos, de gente mais simples. O problema é encontrá-los. Os amigalhaços não nos vão ver ao hospital, não nos mandam cartões de Natal, não nos acompanham nas bebedeiras, não nos dão bons conselhos, não provam o nossos cozinhados. Se for preciso sacrificarem-nos para manter o seu estatuto, não pensam duas vezes antes de fazê-lo. Se nos abraçam, o melhor mesmo é ter a certeza que não nos ficou uma adaga nas costas. Mesmo em ajuntamentos popularuchos do tipo arraial de S. João ou nos jogos da selecção (nem sei porque lá vão...), vestem fato e gravata. Não há cidade ou localidade no mundo inteiro com mais portugueses engravatados que Macau.
Não cantarolam nos concertos (porque os outros amigalhaços estão a olhar), mesmo que o cantor insista. Não são frontais, nem são capazes de falar mal à frente de ninguém. Só nas costas. Quando um dos seus co-amigalhaços se lixa, dizem "olha, paciência", e agem como se o mesmo nunca vá acontecer com eles. A frase favorita do amigalhaço é "cada um sabe de si". Passados uns tempos, quando já ninguém se lembra, recordam o incidente: "o Zé foi parvo...olha, lixou-se...". Todos acham que o seu trabalho é o mais válido, o mais importante, e sonham acordados com um mercado mais amplo. Um dia partem e vão à vida deles, e passamos todos a ser “os gajos de Macau”.
Editado em 27/11/2008
21 comentários:
Foi mesmo o que mais tive em Macau... amigalhaços!
Houve alguns especiais: beijavam-me de manhã, espetavam-me a faca nas costas à hora de almoço, pediam-me dinheiro emprestado ao lanche, ao jantar telefonavam a pedir para não dar a notícia que falava da sua corrupção e às duas da manhã punham-me as orelhas a arder...
Está bem descrito, mas trata-se de uma versão soft. É o darwinismo social em todo o seu esplendor.
" OS CAJOS DE MACAU (ou amigalhaços)
O título deste posta me `despertou a atençáo e o li nas calmas.
Eu sei que existem muitos portugueses em Macau, ams também sei que nunca houve uma união sólida entre a comunidade portuguesa, eu n[ao pertenço a associaçáo alguma e por vários motivos, descriminaçáo.
Antigamente quis tornar-me sócio do Clube Militar, a minha prosposta náo foi aceite, visto que o Clube Militar era somente para Oficias ou pessoas douturadas, como eu era somente um Sargenteco que me ficasse pela messe dos Sargentos, lá para os lados da Praia Grande.
Macau, sempre foi um apeadeiro, um lugar de passagem ou de comisssão de serviço, onde a maioria dessas pessoas lhes interessa mais manter o tacho do que cultivar amizades.
O meu velho conhecido Joáo Severino o disse o muito bem, pois ele sabe perfeitamente como decorriam as coisas em Macau.
Em Macau residem v[arios tipos de portugueses, os vindo de Portugal em comissáo de serviço, que passados uns dias no território já sabem mais dos que ali vivem ou sempre viveram, sáo os tais intelectuais que se expoem às camaras da tv!...
Depois temos os portugueses radicados, na sua maioria esquecidos por todos, mas foi graças a eles que Macau, com a sua participação se manteve segundo o rumo traçado pelo governo central.
Temos os portugueses nascidos em Macau,os chamdos macaenses, tais como os meus filhos, que são descriminados, pois assim o dizem altas figuras portuguesas, diferenciando portugueses e macaenses, como se estes não sejam portugueses da mesma forma.
Sempre houve tratamento diferenciado em Macau, e náo somos racista, se o fossemso então nçao sei o que seria!...
Amigalhaços, ou amigos de Peniche exitem em todo o lado, porrém am Macau a inveja é o maior mal que corrupe a sociedade lusa.
Basta ver os noticiários da TDM (Televisão de Merda) para vermos sempre as mesmas caras, assim o é nos programas da RTPi, sobre Macau.
Corrupção amigo Severino? vocé sabe do que fala, pois teve que se calar muitas vezes e ir à barra do tribunal eu sei, mas embora não havendo o artigo 23, na altura, a censura era como nós sabemos usada a todo o gás.
As companhais de navegação tem os dados dos contentores enviados para Portugal, daqueles que vieram com uma mão atrás e outra à frente rsrsrsrs.
O câmbio do escudo tinha duas vertentes, para os militares e outros em comissão de serviço os outros que se lixassem.
Bem ficou-me por aqui, pois muito teria que contar e poderia ferir sensibilidades, mesmos ajustadas à verdade.
Desculpem o incómodo de minhas sinceras palavras.
Peço desculpa pelos erros ortográficos, estou usando um teclado de um computador que tem vários idiomas e nem sempre é fácil teclar, principalmente na acentuação.
Confúcio disse: " A pessoa de bem espera que haja justiça, a pessoa vulgar só espera obter favores"
Palavras estas bem actualizadas!...
Isto é o que Macau tem de bom, e de mau, meus caros. É uma pequena "grande" aldeia. Todos se conhecem na comunidade, e sabem sobre as vidas dos outros. Todos sabem quando o marido trai a mulher, por exemplo (excepto, claro, a prória mulher) e vice-versa. Todos sabemos o que o individuo X gosta, e temos tendencia a fazer juizos de valores de pessoas baseados nos relatos dos "amigos" mais próximos. Escrevo "amigos" porque em Macau os portugueses do Continente normalmente apenas ficam por cá meia duzia de anos, com a mente virada para o regresso à sua terra. Desta forma, não há necessidade de se criar grande amizade com o próximo, pois imagina-se que no futuro não se precise de ver esse "amigo" no seu regresso à terra.
Infelizmente, isto é uma terra com uma massa intelectual mediocre. Aliás, verificamos essa mediocridade nas chamadas actividades "culturais', nos comentários dos jornais, etc, etc. É uma terra onde o intelectual se confunde com o "bem-falante". É natural, porque a lingua portuguesa ainda tem um estatuto em macau, e qualquer um que arranhe um bom português por aqui, com palavras dificeis e citações impressionantes, é já um grande intelectual, capaz de pregar juizos de valores aos outros. Esta malta é, curiosamente, uma malta "socialmente inteligente", ou seja, une-se intuitivamente para preservar este estatuto construido à volta da sua capacidade oratoria. Dado estarmos num sítio onde a massa critica é, lamentavelmente, praticamente inexistente, estes "reis" do bem falar e da política do croquete continuam a definir o comportamento e o desenvolvimento da comunidade. O pior é que os Chineses de Macau formados por esses mesmos bem falantes e que agora estão no governo, herdaram essa "tradição"
Bem, resmungos de um cidadão comum local...
O Senhor Anónimo, quero agradecer a compreensáo de minhas palavras, como dizia o saudoso Adé Macau sã assim!...
Qualquer dia irei despejar o saco, sabe, muita boa gente tal como o Bom (Mau) jardino, oq ue trouxeram de bom para Macau foi aliviar os cofres. No oriente no encontramos com os olhos bem abertos mas vimos menos que os outros com os fechados ou em bico rsrsrsrs.
Deixámos a nossa herança administrativa e como tal haverá que aguentar...
Dois amores
Alentejo terra minha,
terra que meu viu nascer,
foi madrasta foi madrinha
e lá me viu crescer.
Contigo muito aprendi,
muito tive que padecer,
em Évora sempre vivi
foi bom te conhecer.
Ensinamentos adquiri,
amor à porta bateu,
Évora não te esqueci
mas nunca mais serei teu.
Nunca serei emigrante,
bem cedo te abandonei,
sou um alentejo, um errante
que muito te dei e amei.
A Ásia tudo me deu,
seu amor e seu carinho,
de braços abertos me recebeu
quando eu andava sózinho.
Isso jamais esquecerei,
essa tão grande bondade
Évora te recordarei,
com nostalgia e saudade.
Muitos anos já passaram
desde que aqui cheguei,
meus cabelos branqueram
Macau sempre amarei.
Pois foi cá que aprendi
o que era a solidão,
amor a uma chinesa prendi
e liguei meu coração.
Português não esqueci,
aprendi bem a lição,
na China sempre vivi
com amor no coração.
Meio século quase passado,
novas raízes criei,
tenho o sangue já cruzado
vindo do amor que sempre amei.
Bonito.
Ass. Anónimo das 23:32
Sim senhor Cambeta esta última dos dois amores está excelente.
parabéns.
A vida é assim
Muitas coisas fiz na vida
agora já nada sou,
estou no fim da corrida
sendo já também avô.
As matas palmilhei
muitos lugares conheci
nos sete máres naveguei
mas Évora nunca esquecerei.
Quis Macau me conquistar
e ai passar a viver
e de tanto dele gostar
cá ficarei até morrer.
Amores os encontrei
flores viçosas fiz debruchar,
foi diáspora que formei
vivendo sabendo amar.
Aos Senhores Anónimo e Horta e Costa o meu obrigado pelos vossos gentins comentários.
Oh leonardo poupa-me! Nao me parece que alguem queira ser teu amigo.
Venho ca ler-te so para me rir um bocado.
Excelentes comentários de elevado calibre, e a contribuição sem igual do nosso "poeta" António Cambeta.
Ao último anónimo: dispenso a sua amizade. Quer saber o que lhe pode fazer rir ainda mais que este blogue? Um espelho.
Cumprimentos.
Pedido de clarificação sobre o post colocado.
Começa o post afirmado que "quase que me apetecia" gozar, evergonhar, ..., com uma pessoa que, aparentemente, não conhece.
Mas não o faz, explica no seguimento do post, porque ..."é que somos todos muito amiguinhos. Unidos não, amiguinhos."
Ou seja, voçe, se me permite a questão, é o exemplo do português que descreve como "amigalhaço"?
Felizmente, consegui fazer cá bons amigos. E em Portugal conheci muitos "amigalhaços".
Já vi partir alguns bons amigos. Tenho as mesmas saudades destes que tenho dos bons amigos que deixei em Portugal.
Nem tudo bom nem tudo é mau tanto cá como lá.
Não acho que se deva generalizar.
Muito perspicaz da parte do anónimo das 6:14. A primeira parte do post é de um outro artigo que ia (e vai) sair hoje. É o que dá guardar posts no congelador, às vezes as encomendas saiem trocadas. Prometo emendar a situação hoje mesmo. Obrigado e cumprimentos.
Perfeitamente de acordo. O Leocardo "retratou-se".
Este tocou-se. A carapuça serviu.
Ahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahaha!
Palhaço!
Este Leocardo deve julgar que é o dono de "Macau", às vezes calado dizia muito...
V. Exa. é que que julga que é o dono de Macau, com os seus "fica caladinho", "tem cuidadinho", "olha o respeitinho" e outros tiques de pidezinho.
Anónimo das 6:32, aqui ninguém generalizou. Ninguém (nem eu, nem os comentadores) disse que TODOS os portugueses de Macau são assim. Cada um entende o que quiser, e no caso destes últimos senhores, há quem fique tocado e ofendido, o que no fundo, me dá razão. Mais sais de fruta Eno, recomenda-se.
Cumprimentos
Há um princípio básico que convém ser aplicado para quem está a trabalhar e a residir fora do seu país : não dar a entender ou a perceber que só se pretende apenas ganhar dinheiro, garimpar apenas e ignorar tudo o resto, desprezar tudo, a cultura, a língua, a comida, as gentes, etc, etc,....há dois tipos de portugueses, os que ganham dinheiro e respeitam a terra e as suas gentes e os que ganham dinheiro e ignoram tudo inclusive os próprios compatriotas, é de alguns desses a que o Leocardo faz referência...
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