Em tempos vivia na aldeia de Mong-Há um homem muito sábio, proprietário de algumas terras, chamado Lou Wong. Sendo um homem muito sábio, todos o procuravam e colocavam-lhe questões de todo o tipo. Perguntavam-lhe qual a melhor altura para fazer as colheitas, e Lou Wong sorria, e depois respondia. Perguntavam-lhe se os ventos traziam fortuna ou bom casamento, e Lou Wong sorria, e depois respondia. Perguntavam-lhe o melhor caminho para o Templo de Kun-Iam, e Lou Wong apontava com o dedo e respondia: “É mesmo ali, estúpido”.
Lou Wong tinha uma filha, A-Kam, a luz dos seus olhos. À medida que muitas luas passavam, A-Kam crescia a olhos vistos, o que vale por dizer que a certa altura a moçoila era já boa como o milho, roliça, rabinho empinado, na pujança dos seus vinte e tal anos. Os restantes habitantes da aldeia do Mong-Há avisavam o sábio Lou Wong para a eventualidade da A-Kam um dia levar com o tarolo e dar de frosques. Lou Wong sorria e debitava mais filosofia de taberna chinesa: “a A-Kam ainda não está preparada; ainda tem muito que aprender sobre as estações, de como cheirar o Inverno e a Primavera, de como sentir os ventos e as tempestades”.
Para Lou Wong trabalhava um rapaz chamado A-Heng. A-Heng tinha chegado lá um dia a Mong-Há, esfomeado, sujo e cheio de piolhos, vindo de alguma aldeia pobre da China. Lou Wong tratou-o quase como um filho, dando-lhe tecto, comida e roupa lavada (bem, na altura, digamos que lhe deu a roupa mais lavada que se podia arranjar…), e como forma de retribuição, A-Heng trabalhava que nem um cão. Lou Wong confiava a A-Heng as melhores terras para trabalhar, ensinava-lhe a não tirar da terra mais do que ela podia oferecer, e como resultado, as colheitas eram sempre fabulosas.
Mas A-Heng não conseguia tirar os olhos de A-Kam, e A-Kam retribuía os olhares. Os dois jovens estavam, portanto, apaixonados. O povo avisava Lou Wong, que ignorava, reafirmando que a menina “não estava preparada”. Certo dia A-Kam e A-Heng encontraram-se debaixo da ameixoeira, e o rapaz segurou as mãos finas e delicadas da menina com as suas mãos grossas, frias e hirsutas. Trocaram olhares, disseram um monte de palermices um ao outro e depois pimba, em linguagem literária, A-Heng encheu A-Kam do seu amor. Em linguagem mais simples, aconteceu entre os dois desalmado chavascal.
Passados uns tempos, o ventre de A-Kam estava redondo como uma colina na Primavera (ena!), e quando Lou Wong soube, a sua sapiência transformou-se em ira, e mandou chamar A-Heng. Chamou-lhe todos os nomes, de ingrato a traidor, e lembrou-o de como o tinha acolhido e ajudado, e que não merecia aquilo dele, etc, etc. A-Heng lembrou o patrão que ele e A-Kam “estavam apaixonados”, e que a menina levava agora no ventre o neto de Lou Wong. O velho, que tinha tanto de sábio como de besta, espumava pela boca e não queria ouvir A-Heng.
Disse-lhe que criou a filha como se fosse uma princesa, e que A-Heng, um “pedinte”, nada tinha para lhe oferecer. Como resolver o problema? Lou Wong, que tinha uma costela japonesa, rogou uma praga a A-Heng, disse-lhe que o expulsaria e que nunca mais alguém lhe ofereceria uma tigela de arroz que fosse, e que a sua morte era a única saída honrosa. Desiludido com tudo isto, A-Heng voltou a encontrar-se com A-Kam debaixo da ameixoeira.
Contou-lhe o que o pai dela lhe tinha dito, e a menina, ingénua e burra, pensou que talvez se se matassem os dois, o seu amor perduraria para sempre, lá no infinito, onde não haviam pais e patrões. E então, e apesar de não existirem ainda bandas de heavy-metal, fizeram um pacto de suicídio. E assim foi, partiram para o paraíso onde podiam à vontade (esta foi subtil…).
Lou Wong, quando soube, ficou posesso. Os seus gritos e lamentos ecoaram por Mong-Há por anos e anos. Entretanto passaram muitas Primaveras (detesto esta expressão; em Macau não há Primavera) e foram construídos mais templos, mais casas, e os habitantes de Mong-Há passaram a poder dormir descansados.
Ainda hoje perto do templo de Kun-Iam existem duas árvores no local onde A-Meng e A-Kam decidir perder a vida. Os transeuntes interrogam-se (mentira, ninguém quer saber) porque são os ramos daquela árvore entrelaçados, e tão fortes que nem o mais forte dos machados consegue cortar. São as árvores do amor dos dois jovens. Talvez um dia as Obras Públicas as cortem.
4 comentários:
"...roliça, rabinho empinado..."?!
Entao chinesa nao era concerteza.
nao e'as obras publicas que cortam as arvores e'' o IACM e os seus capangas dos jardins e vias.
Por exemplo:
voce e'comerciante e tem uma arvore publica no passeio publico á frente do seu negocio privado, faz um requerimento pro IACM paga 15 mil patacas e eles que sao muito bem mandados vao logo la'no dia seguinte e cortam a arvore publica que incomoda o negocio privado.
e'assim que funciona aqui as instituicoes publicas, sempre a favorecerem os investimentos privados, nao sabias?! ficas a saber aqui no site do IACM
http://www.iacm.gov.mo/admin/fa_main_p.htm
vai ao jardins e zonas verdes n.22 e 24 (estes f..p..a)
"Lamentamos, mas o blogue em terrasdooriente.blogspot.com foi removido. Este endereço não é válido para blogues novos."
É isto que aparece quando clico no link para o blogue A Conquista da China. O Leocardo não acha que é altura de o retirar da sua lista?
Existem outros blogues "mortos" na lista. Um dia quando fizer uma limpeza, removo-os.
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