quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Coutinho, aquela máquina


José Pereira Coutinho é o homem de quem se fala da política portuguesa daqui e dalém mar. Deputado da Assembleia Legislativa de Macau eleito pela "Nova Esperança", uma lista composta por elementos da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau (ATFPM), que como o nome indica representa os interesses dos funcionários públicos no território, o seu nome extravasou os limites da pré ou pseudo política que por aqui se vai fazendo, e chegou aos corredores da Assembleia da República, em Portugal. A associação existe desde o tempo da administração portuguesa, passando pela transição, e já em plena RAEM e com Coutinho ao leme, retirou das entranhas da própria administração pública, agora chinesa, os votos suficientes para sentar no hemiciclo da Praia Grande não um mas dois deputados, ele e...aquele rapaz que não me percebe muito bem o que está ali a fazer, coitado. A ATFPM não é bem um sindicato, pois em Macau não existe lei sindical que permita esse tipo de organizações, mas é como se fosse: mobiliza as massas quando quer e na ordem dos milhares, se necessário, é odiado pelo poder, atende a todos os "lobbies" e não é esquisito na hora de se deitar com as forças partidárias: qualquer uma serve, desde que sirva - a ATFPM e especialmente o seu líder, lá está.

Quando falo de Coutinho, falo apenas do que sei, do que conheço dele e do que ele me dá a saber, e nesse particular ele não se inibe na hora de sair da pele do cordeiro manso que representa a região Macau, China, Hong Kong e Tailândia no Conselho das Comunidades Portuguesas, para se transformar no "lobo" que tem um apetite devorador por eleições. Para ele uma vitória sabe sempre a pouco, e não há eleição para que ele seja elegível que não tenha ambições a ganhar. É um verdadeiro "animal político", no sentido da palavra, e apesar de não me rever no seu estilo  - e nem preciso, nem eu nem ninguém, pois isso parece irrelevante face à imagem que ostenta, que leva a que eleitores que nem sabem para o que estão a votar ponham a cruzinha ao lado do seu nome. O seu pragmatismo leva mesmo a que se certifique que alguns votantes menos experientes não se enganam na hora de cumprir com o dever cívico, especialmente se não entenderem uma única palavra no boletim de voto. É a política "à Macau", seja ela para consumo doméstico, ou para exportação, mas é Coutinho que parece incomodar as "aves reais" portuguesas aqui do burgo, muito por culpa daquela sua mania de ganhar eleições sem dar cavaco a ninguém, sem definir cor política ou sem convidar essas altas individualidades para seu número 2 - ou número 1, porque não? Vejam só isto:



Domingo foi a eleição para o Conselho das Comunidades Portuguesas, e tal como há cinco anos a lista de Pereira Coutinho concorreu sozinha, elegendo os três conselheiros da região a que se candidatava. Há cinco anos foi a mesma coisa, mas em 2003, no primeiro sufrágio realizado em Macau para este organismo, existiam 4 listas. A lista de Coutinho saiu vencedora com mais votos que as restantes todas juntas, mas o ambiente no Consulado Geral de Portugal, onde se realizou o acto, esteve longe de ser pacífico. Mesmo pisando o risco aqui e ali, a verdade é que Coutinho venceu e venceria sempre, contando com o apoio da sua "máquina eleitoral". E olhem que não são apenas os funcionários públicos; não ha idosa ou sopeira detentora de nacionalidade portuguesa que não pense imediatamente em Pereira Coutinho na hora de resolver qualquer assunto relacionado com o passaporte ou o Cartão de Cidadão - que diabo, até desconfio que olham para ele como a "entidade emissora".

Recomendo que vejam este vídeo, que dependendo da perspectiva, pode ter tanto de hilariante como deprimente. Quase no início recorda-se uma reunião ao mais alto nível entre algumas das tais "individualidades" da comunidade portuguesa para se chegar a "um consenso" sobre a eventualidade da formação de uma "lista única" para estas eleições, que "congregasse os interesses de toda a comunidade". Com licença: ahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahah!!!! Peço desculpa, especialmente se me estiverem a ler fora de Macau, em Portugal, por exemplo, mas eu explico. Estão a ver aqueles tipos que nas reuniões camarárias, ou mesmo de um simples condomínio, gostam de falar, falar, falar, e no fim quando acabam de dizer tudo o que querem e toda a gente lhe dá razão, vão-se embora? Aqui é mais ou menos assim com uma grande diferença: aí ainda há mande calar esses cromos, aqui isso é logo visto como "um ultraje", e noutros tempos podia valer mesmo uma viagem de avião para Portugal, só de ida. Em suma, não se chegou a consenso porra nenhuma, pois a cagança é tão altiva que é impossível meter nestas cabecinhas tão cheias de "sapiência" que nem ficou lugar para mais coisa nenhuma que só pode existir um número um, e não...quantos é que estiveram nessa reunião, mesmo?

A maior parte da reportagem recorda o acto eleitoral propriamente dito (do qual eu participei, tendo sido o único até hoje), e é aqui se fica a entender melhor o "problema" que Pereira Coutinho representa para qualquer outro candidato a...uma eleição onde Pereira Coutinho participe? Sim, só pode ser isso, e por muito que se critique a postura, o comportamento e a cara de pateta (leia-se "de político") que são apanágio do candidato Coutinho, ele faz aquilo que dá votos, e que no fim é o que interessa. E vendo bem as coisas, já que os políticos são todos a mesma m..., e se mesmo se insiste em votar em eleições, porque não fazê-lo em alguém acessível e popular, mesmo que a atirar para o "pimba"? É um facto que Coutinho aparenta ter cometido diversas irregularidades naquele dia, e os seus adversários não se cansaram de referir esse facto, mas não foi por isso que o resultado final sofre qualquer contestação - foi uma vitória esmagadora de Coutinho. (Para quem estiver a perguntar com os seus botões, não, não votei nele).

Curioso como a um certo ponto durante a reportagem recorda-se um incidente decorrido na sexta-feira antes do acto eleitoral, quando Pereira Coutinho e outro candidato faltam a um debate na Rádio Macau, previamente marcado para esse dia, alegando "estarem de luto" pelo desaparecimento nesse mesmo dia de uma figura respeitada da comunidade portuguesa. Os dois candidatos que se deslocaram aos estúdios da Rodrigo Rodrigues ficaram aborrecidos com a "confusão" entre prioridades - e atenção que nunca é demais salientar que Coutinho não foi o único ausente. A verdade é que com ou sem debate, o resultado do escrutínio dificilmente se alteraria. Ainda a esse respeito, um jornalista que fez na altura a cobertura dessas eleições chama a atenção para o facto de Coutinho ter comemorado a vitória no Domingo seguinte "com champanhe", isto apesar da tal personalidade falecida dias antes "ainda não ter ido a enterrar". Sem querer estar a apontar o dedo a ninguém - e quem quiser veja o vídeo e tire as suas próprias conclusões - acho isto tão desnecessário quanto ridículo. Juro pelas alminhas todas que não fazia ideia que existia um protocolo que estabelece que só se pode deixar de fazer cara de enterro...depois do enterro. E este tipo de tricas beneficia quem, exactamente? Ninguém, e também não prejudicam Coutinho, que segue cantando, rindo e ganhando. Pode ser que dê alguma consolação aos seus críticos, e muitos deles deviam era estar agradecidos pelo deputado não vir à praça pública explicar as verdadeiras razões de tanto azedume. E mais não digo, até porque há assuntos mais importantes que queria ainda abordar, e este artigo já saiu mais longo do que a encomenda.


E aqui está, o sabor do mês neste final de Verão: Pereira Coutinho candidato à Assembleia da República Portuguesa pela plataforma "Nós, cidadãos!", concorrendo pelo círculo eleitoral de fora da Europa. Só podia ser mesmo assim, claro, e para Coutinho serve que nem uma luva, cai que nem ginjas, e até aposto que ele deve estar a pensar na cor da gravata que vai usar no primeiro dia como deputado na AR. Mas primeiro vamos ver o que está aqui em jogo:


E pronto, com a cortesia da Comissão Nacional de Eleições, aqui está o mapa eleitoral do próximo dia 4 de Outubro, quantos mandatos para cada círculo, e quantos eleitores registados em cada um dos mesmos. Para o círculo de fora da Europa, onde Coutinho concorre a um dos dois lugares, estão recenseados mais de 164 mil eleitores. Agora, por um minuto vamos fingir que está tudo maluco, as couves nascem de cabeça para baixo e as pessoas mordem nos cães: em 160 mil eleitores, nunca em circunstância alguma Coutinho ia arranjar 80 mil velhinhas chinocas com passaporte português que fossem votar nele - nem que as desenterrasse do cemitério. Só que, "surprise, surprise"...


Nestas coisas a abstenção anda na ordem dos 90%, ou quase. Foi assim há quatro anos, há oito, e não estou em crer que os mais de 40 mil novos eleitores recenseados neste círculo vão de bom grado eleger os gajos que em muitos casos os obrigaram a emigrar. Note-se como o número de votos nulos é quase tanto como o número de votos obtidos pelo PS. Isto é gente que se dá ao trabalho de ir até à mesa de votos desenhar caralhadas nos boletins onde aparecem estes tipos que os "desgovernam". Agora, com o PSD A eleger os dois deputados com pouco mais de oito mil votos, quem me diz que Pereira Coutinho não arranja do dia para a noite cinco mil "soldadinhos de chumbo", como o outro lhes chamou (um fanfarrão e um invejoso, e dos maiores), e é eleito suavemente, ficando o nº 2 do PSD a "chuchar no dedo". Olha, pelo menos não é obrigado a "emigrar", ah ah. E esta forte possibilidade que Coutinho tem de ser eleito conforme o que nos dizem estes números, não é assim tão irrelevante quanto isso. E não sou só eu quem o diz:


E aqui está um artigo do Expresso, da autoria de Cristina Figueiredo, que tem tanto de oportuno, como de realista. Destaco algumas partes, nomeadamente as de que falam de 3500 novos recenseados em Macau, e da forma como Coutinho e Macau passaram a estar na ordem do dia no debate político em Portugal. Fico mesmo com sérias dúvidas se o PSD e o PS, as maiores forças políticas e as únicas com uma possibilidade realista de eleger um deputado por este círculo tão disperso desprezaram  mesmo Pereira Coutinho, ou se a plataforma "Nós, cidadãos!" se antecipou, vendo que estava ali uma "mina de ouro" (ou de votos) prontinha a deitar as mãos. Fala-se de uma contra-reacção da parte do PSD, que se arrisca a perder um deputado, e que se tem "mexido" no Brasil, onde até hoje votava a maioria deste eleitorado. Se Coutinho se lembra de meter a "máquina" a trabalhar a todo o vapor, ainda vamos ver o seu nº 2, o simpático Gilberto Camacho, também de malas aviadas para Portugal.

Caso se concretize esta eleição de Pereira Coutinho - e não é nenhum disparate afirmar que as possibilidades disso acontecer rondam os 50%, senão mais - é possível que em Macau os seus inimigos políticos do lado chinês se vejam livres dele. Já se fala nos bastidores da incompatibilidade em exercer os dois lugares de deputado, e mesmo que tecnicamente não seja bem assim, é muito difícil provar que não há mesmo problema nenhum em representar os orgãos legislativos de dois países diferentes. Mas isso são contas de outro rosário, pois agora as que se seguem são estas. Para Pereira Coutinho, pelo menos o mérito de tornar as legislativas de 4 de Outubro interessantes, isso já ninguém lhe consegue tirar.

1 comentário:

Anónimo disse...

Coutinho Coutinho :)