Diz-se que os gostos mudam. Será mesmo verdade? Em Pequim, por exemplo, era impossível beber uma bica há 20 anos. Hoje são os Starbucks e derivados espalhados um pouco por aquela cidade. Isto para não falar dos restaurantes das mais variadas proveniências imaginárias. A malta de Pequim quer experimentar qualquer coisa de diferente, e quem pensa que se trata de uma cidade de múmias atrasadas ou saloios sem dinheiro…bem, toca a arrumar a guitarra e ir tocar para outra freguesia.
É difícil ser empresário em Macau, principalmente se se traz uma ideia nova, diferente, inovadora, que mexa com a tradição e o gosto da população do território. Basta olhar para a oferta no que toca a salas de cinema, a falta de uma loja que venda música a sério (lembram-se da CD Shop?), e principalmente, restaurante estrangeiros. Hoje já falei do Don Quijote e da Subway. Se no último caso o sucesso é garantido e o aparecimento deu-se timidamente (falta de interesse?), no caso do primeiro trata-se de uma exasperante falta de coragem para experimentar novos gostos, novos sabores, atravessar novas fronteiras. O Don Quijote é apenas um exemplo de entre muitos.
Abriu aqui perto de casa uma loja (brasileira?) de cachorros-quentes. Não sei como têm corrido os negócios, mas desconfio que não muito bem. A ideia é bem aproveitada; o Instituto Salesiano e o Colégio Estrela do Mar ficam mesmo aqui à mão de semear, mas aposto que não terá afectado o negócio do insípido (e mais caro, diga-se de passagem) McDonald’s localizado mesmo aqui à porta, na Rua de S. Lourenço.
Segundo a minha mulher, especialista em assuntos sínicos, o que está aqui em causa não é a qualidade, mas a quantidade. Um chinês de Macau não atenta ao facto de um quilo de batatas importadas da Austrália que custam 40 patacas o quilo no Supermercado Gourmet serem mil vezes melhor que as batatas que se vendem no mercado a cinco patacas o quilo, apesar destas últimas não servirem nem para dar aos porcos. Quando um cidadão médio come uma refeição num restaurante “estrangeiro” que custa mais de cem patacas por cabeça, pensa logo nos min e nas caixas de arroz que são cinco ou dez vezes mais baratos. Talvez isso justifique o facto de existirem cinco ou seis lojas de min em cada rua.
As razões históricas, do tempo em que o luxo estava ao alcance de poucos enquanto os restantes passavam fominha e suavam as estopinhas para alimentar as suas numerosas famílias serve de justificação para a falta de curiosidade. Não quero pensar que o problema seja regional, ou mesmo cultural, uma vez que em Guangzhou ou em Hong Kong existem mil e uma tasquinhas e restaurantes estrangeiros e todos vão sobrevivendo. O problema é mesmo de Macau.
Falta de mercado? Será um eufemismo dizer que Macau é uma “cidade internacional” e um “ponto de encontro de culturas” quando não existe um restaurante russo, turco ou africano, e os mexicanos, franceses, espanhóis ou de rodízio brasileiro cabem todos nos dedos de uma mão? Mesmo a moda dos kebab, já tão enraízada nas regiões vizinhas, começou a ter procura em Macau muito recentemente. As únicas excepções serão a comida portuguesa e macaense (não preciso de explicar porquê), italiana (cortesia da família Acconci), tailandesa ou japonesa, que parecem definir os limites do gosto do cidadão médio de Macau. Qualquer ideia estrambólica que não obedeça aos padrões normais está condenada ao fracasso, ou pior, à falência.
Voltando ao Supermercado Gourmet, o local oferece uma gama de produtos impossíveis de encontrar deste lado do delta do Rio das Pérolas. Claro que o preços não conseguem ser competitivos, até devido à falta de concorrência. Indo ao Gourmet e deparando com a variedade de queijos, presuntos, vinhos, iogurtes ou gelados, é quase como ir a um museu. No chega ser só uma cidade muito gira, com calçada à portuguesa, igrejas giras e monumentos altamente, é preciso oferecer aos visitantes o mesmo que eles conseguem encontrar nos seus países de origem,e já agora o mesmo que podem encontrar nos seus territórios de origem.
Com a oferta que aqui temos – e um custo de vida que nada se coaduna com essa mesma oferta – vamos continuar a fazer figura de parvinhos, de boca aberta à janela das Marks & Spencers, Sogos, Spaghetti House (melhor que o Pizza Hut) ou Jollybee (melhor que o McDonald’s) das vizinhanças. Se é verdade que os gostos mudam, também não é menos verdade que o consumidor de Macau é o último dos resistentes no que toca às novas modas. Vamos lá dar uma oportunidade à diversidade, pois afinal só se vive uma vez.
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