terça-feira, 4 de outubro de 2016

Adeus, Mário Wilson



O futebol português está de luto: faleceu Mário Wilson. O futebol e não só, pois o antigo jogador e treinador moçambicano era o patriarca de uma família cuja notoriedade na sociedade portuguesa se estendeu para lá dos relvados; a sua filha Ana foi Miss Portugal em 1982, e o seu filho Pedro é actor, tendo feito parte do elenco da Rua Sésamo na versão portuguesa.


Mas sim, foi sem dúvida no futebol que o apelido Wilson foi inevitavelmente associado com este verdadeiro gigante, que veio para Portugal em 1949, no ano em que o meu pai nasceu, directamente do Desportivo de Lourenço Marques jogar no Sporting dos cinco violinos, e após ser campeão na segunda época foi para Coimbra, onde se viria a tornar uma referência para a Académica, onde jogou 15 épocas e deu início a uma carreira de treinador onde viria a ter ainda mais sucesso.


Foi em 1966/67 que Mário Wilson conduziu o plantel da briosa à sua melhor época de sempre, terminando o campeonato em segundo lugar a três pontos do Benfica, e eliminando os encarnados nos quartos-de-final da Taça de Portugal, indo eventualmente perder a final no Jamor por 2-3 contra o V. Setúbal. Depois de passagens pelo Belenenses, Tirsense e V. Guimarães, chegaria ao Benfica em 1975/76, onde ficou uma época antes do Major Valentim Loureiro, então recém-eleito presidente do Boavista, o levar para o Bessa. Nessa primeira época na Luz venceu o campeonato, e cunhou uma frase que viria a imortalizar-se: "Quem treina o Benfica arrisca-se a ser campeão". No Bessa obteve um quarto lugar em 76/77, mas regressaria a Guimarães no ano seguinte, e em 1978 foi nomeado seleccionador nacional, cargo onde não foi feliz, falhando a qualificação para o Euro 1980. Acumulou ainda o cargo de treinador do Benfica, mas nem aí a época lhe correu bem, terminando num 3º lugar atrás do Sporting e do Porto de Pedroto.


Os anos 80 marcaram a curva descendente na sua carreira como treinador. Voltou à Académica, na altura rebaptizada "Académico" depois do conturbado período do PREC, mas seria despedido à sexta jornada da época 1983/84, acabando a temporada a treinar o Estoril. Seguiu-se outra temporada incompleta no Boavista, e em 1987 chegou a treinar o Cova da Piedade de graça. Pelo meio ficou uma fugaz passagem pelo Louletano, onde teve a chance de trabalhar com o seu filho Mário Wilson Jr., que fazia parte do plantel do clube algarvio. Treinou o Águeda no ano de estreia da Divisão de Honra, mas não conseguiu evitar a descida, e já nos anos 90 esteve em Marrocos a treinar o FAR Rabat, antes de regressar ao Benfica, onde conduziu a equipa durante um período atribulado da sua história.


Foi na terceira jornada da época de 1995/96 que o "Velho capitão", assim chamado pela forma paternal com que orientava os seus jogadores, começou a escrever a sua última grande página no futebol português. Assumiu o comando da equipa principal à 4ª jornada, depois do despedimento de Artur Jorge, e terminou o campeonato em 2º lugar, atrás do Porto de Bobby Robson, tendo no entanto vencido a Taça de Portugal, derrotando o Sportig por 3-1 no Jamor - o seu último título. Na época de 1997/98 levou o Alverca pela primeira vez à divisão maior do futebol português, e ainda teve tempo para voltar a fazer de "apaga-fogos" no Benfica, treinando a equipa durante três jornadas após o despedimento de Manuel José, e antes da chegada de Graeme Souness. Chegaria depois a comandar o Alverca no ano de estreia no escalão principal, mas colocaria o seu lugar à disposição à 24ª jornada da época 1998/99, depois de uma derrota em casa com o Benfica. Foi o último acto de Mário Wilson como treinador, tinha então 69 anos.


Mário Wilson deixou-nos ontem, a poucos dias de completar 87 anos. Uma carreira que teve dois grandes actos, na Académica e no Benfica, e que se prolongou por cinco décadas. O legado fica agora a cargo do seu neto Bruno Wilson, formado nas escolas do Sporting e actualmente ao serviço do Braga "B", onde joga a central, tal como o avô. Com 19 anos e um percurso por todas as selecções jovens de Portugal, o jovem Bruno tem umas botas muitos grandes para calçar, pode-se dizer.


Partiu um homem que representou o lado positivo do desporto-rei, e que na sua vida dedicada aos pontapés na bola e à formação de outros que como ele galgaram os relvados por esse Portugal fora só deixou amigos, e todos o recordam com carinho. Paz à a sua alma. 


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