domingo, 16 de agosto de 2015

Aos filhos o El Dorado


Quando vemos esta imagem de Macau, o que nos ocorre logo à ideia é que se está a dar qualquer coisa. Um cupão de 10 patacas valendo um hamburguer do McDonald's? Um jornal grátis de apenas 6 páginas composto quase inteiramente por anúncios? Ou quem sabe se estes idosos estão na fila para adquirir alguma edição comemorativa de selos ou moedas, e já ali estão desde as três da matina, incluindo aqueles que não querem selos nem moedas nenhumas mas vão vendendo o lugar a outros que chegam quando a fila já chega a dar duas voltas ao quarteirão? Não, desta vez é aquela associação que pede a "Reunificação das famílias", ou seja, que os filhos das residentes que nasceram na China possam vir para Macau viver de subsídios, uma vez que são pouco escolarizados, e de um modo geral já não têm idade para receber formação - e nem é essa a ideia, aparentemente. Esta associação manifesta-se amiúde, e de um modo geral pacificamente, sendo participação regular nas manifestações do 1 de Maio, e especialmente do 20 de Dezembro, mas na última quarta-feira fizeram chinfrim à porta da Assembleia Legislativa, onde era esperado Chui Sai On, Chefe do Executivo. Apesar da aparência frágil e inofensiva, estas velhotas são raçudas, vão à luta e principalmente "fazem-se ao penalty", podendo representar na perfeição um ataque de apoplexia, caso em jogo estejam 200 ou patacas, ou melhor ainda, uma quinhentola - por essa elas até entram em comatose. Como se recordam ainda há um ano Chui Sai On mal podia sair de casa, e um simples latido de caniche a vinte metros de onde passasse era suficiente para que seis guarda-costas sacassem logo da arma, e talvez ainda tenha algumas feridas, daí que foi a polícia, e não ele quem recebeu as mães dos filhos, que sonham vir para a terra dos filhos-da-mãe.


Pois é, o tempo não estava para passeatas, mas elas ali estavam: as mães da invenção, dispostas a vender cara a derrota caso não lhes fosse permitido ter uma conversinha com o CE. Noutras acções do género estas idosas chegam a fingir desfalecer (depois de se certificarem que alguém as segura, claro), e não há petição que vão entregar no Palácio do Governo que não tenha uma delas a entrar em transe, enquanto diz que "não quer continuar a viver se o filho não se juntar com ela em Macau" - por "filho" aqui entenda-se um marmanjão de 30 ou 40 anos, muito possivelmente desempregado e com a quarta classe como habilitações literárias. Ninguém a impede que vá em frente com o suicídio - afinal ninguém a está obrigar a nada - ou porque não vai ter com o filho na China, se são tantas as saudades? Mas isso é demasiado fácil para uma questão que é muuuuuuuiiitto complexa, como já vamos perceber.


Aqui a algazarra terminou com três pessoas a serem assistidas no hospital, e aposto que em duas até teve qualquer coisa a ver com o ácido úrico ou com hipertensão. A terceira, este velhote na imagem, estaria provavelmente aborrecido, mas não queria ir a pé para casa e pediu boleia à ambulância dos Bombeiros. Por muitos males que possam apontar aos agentes da autoridade, antes ainda pensam dez vezes antes de arrear num idoso ou numa idosa, prevalecendo quer o bom senso, quer o respeito pelo anciões. Mas os velhotes não perdoam, e basta que a polícia lhes dirija a palavra num tom mais alto  para se queixarem de "brutalidade" -  mesmo que em muitos casos os velhos se façam de surdos. 


Esta é Lei Iok Lan, líder desta tropa fandanga, que na sexta-feira deu uma conferência de imprensa a explicar que a manifestação era inicialmente "pacífica". Sim, não sei era necessário convocar um batalhão para deter uma mole de múmias ululantes, mas tudo bem, nunca questiono situações relacionadas com a segurança, e correram rumores de que alguns idosos abusaram do "pa fa iao" nesse dia (isso explica as máscaras dos bombeiros). Lei diz que foi detida "injustamente", e mostrou nódoas negras nos braços, alegando que a polícia "usou força sobre ela", e de seguida pediu "respeito pelos cabelos brancos". Ora aí está, se estavam à procura de uma vantagem em se ser velho: podem-se comportar como uns autênticos selvagens, ou ser tão rudes e chatos, como quem está mesmo a pedir um par de selos na testa, e nada acontece! 


Esta senhora diz que tem dois filhos - daí o gesto faz na imagem - "que estão na China", e mais uma filha em Macau. Só que "a filha não quer saber dela", segundo a própria idosa, e por isso a sua vida "é muito miserável". Ah...Esta razão para querer cá os filhos era um espectáculo, caso a filha da senhora fosse mesmo uma má criatura, e pelo menos um dos filhos fosse um enfermeiro registado. Mas afinal para que querem estas "cotas" trazer para cá os filhos, que já não encontram igualmente na flor da vida? 


Quem nos explica com sinceridade o principal motivo de todas estas saudades é esta senhora, aqui com, e segundo a própria, "a filha da sua filha" ao colo. E onde está a mãe da criancinha? Na China, claro, e não pode estar cá, buh uh - esta até chorava lágrimas de verdade, imaginem! Enquanto fica por explicar se o bebé foi raptado, ou até que ponto tem alguma relação familiar ou outra qualquer com esta senhora, ela dá-nos pistas sobre as razões de toda esta peixeirada; quando lhe perguntam o que responde às pessoas que lhe perguntam porque não se vai reunir com os filhos na China, dá-lhe um ataque de sinceridade: "Eu já vim para cá há mais de 30 anos, porque devia voltar para o continente? Toda a gente quer vir para Macau, pois aqui é que há dinheiro". Na mouche, apesar de ser evidente que esta senhora está muito desactualizada em relação à China - alguns destes "filhos da mãe" conduzem Ferraris, lá no continente!


Já esta outra senhora aparentada de mandril, vem dizer que "não há maneira de fazerem chegar as suas preocupações ao CE", e não sei que mais. Bem, este "problema" da reunião das famílias é uma daquelas "chinesices" onde todos ralham e ninguém tem razão. Estas senhoras, naturais do continente, foram mães relativamente jovens,  e os filhos ainda eram pequenos quando vieram para Macau trabalhar durante os bons velhos tempos da indústria do vestuário, e outra actividade fabril onde em Macau não existia mão-de-obra para responder à procura. Depois de sete anos a trabalhar legalmente no território, as operárias obtiveram o título de residente, e querem agora (e este "agora" já são uns bons 20 anos) que os filhos de juntem a elas, e igualmente como residentes de Macau. As duas únicas certezas que  temos são que não virão para cá trabalhar em nenhuma fábrica, e de que o Governo de Macau não tem nada a ver com o assunto - a vinda ou não dos filhos das residentes depende da autorização de Pequim. E de vez em quando lá tem o executivo de fazer de ama-seca, num filme com um guião muito mal escrito, e ainda pior representado.


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