sábado, 29 de junho de 2013

O que são as largadas?


Um dos eventos mais coloridos das festas dos santos populares que agora terminam são as populares largadas de touros. Este espectáculo curioso que causa a estranheza de qualquer estrangeiro civilizado e que causa repulsa nos defensores dos direitos dos animais consiste em fechar um conjunto de vias públicas, barricar o acesso às moradias com trincheiras ou outras barreiras, e como o nome indica, largar um touro. As largadas so especialmente populares no sul, nas zonas ribeirinhas do Tejo, sendo as mais conhecidas as realizadas no Montijo, Alcochete, Moita do Ribatejo ou Samora Correia, entre outras localidades menos urbanizadas. A forma varia de região para região. No Rosário da Moita, por exemplo, são célebres as largadas na praia. Nos Açores o touro fica com os movimentos delimitados por uma corda, fazendo mesmo assim um número considerável de estragos, como comprovam as imagens.

E qual é a finalidade deste evento tão bizarro quanto perigoso? Tradição, e não há mais nada que o justifique. Suponho que terão havido tempos em que as largadas serviriam para atestar a braveza dos tipos que se arriscam a enfrentar um animal chifrudo com meia tonelada de peso, arriscando a integridade física e até a própria vida. Seria mais fácil explicar tratando-se de algum ritual de iniciação ou de acasalamento, mas não. Quem se expõe a este tipo de perigo estará sob algum tipo de transtorno, psicose, ou simplesmente embriagado ao ponto de não avaliar as possíveis consequências das suas acções. Um touro não é um brinquedo, e com um ser humano pela frente, mesmo que acidentalmente, não se intimida e parte para o ataque. Não é possível negociar com um touro ou pedir-lhe que tenha “fair-play”. Ele avança, marra, destrói, dá coices. E o que mais seria de esperar?

As imagens destas largadas são bem ilucidativas dos indivíduos que nelas participam. Marialvas com tiques de machão, provavelmente copm necessidade de se afirmarem, ora porque têm um pénis atrofiado, ora porque querem impressionar alguma cachopa (não sei que mulher no seu perfeito juízo se impressionaria com isto), ora porque se calhar cresceram no campo, junto dos burros e das vacas, e o metanol do estrume lhes causou danos cerebrais irreparáveis. Mesmo assim ainda suspeito que o principal responsável pela néscia ousadia é o álcool. Só uma piela tão grande que paralize os neurónios ao ponto de não fazer uso do mínimo bom senso faz com que se fique no meio da rua à mercê de uma besta impossível de dominar sozinho e desarmado.

Entre os candidatos a partir umas costelas encontramos alguns jovens, talvez românticos, talvez analfabetos, bem como outros indivíduos com idade para ter juízo. Alguns carregam uma barriga que torna virtualmente impossível escapar às investidas do touro, que além de não enfardar até à obesidade, tem quatro patas e corre mais depressa. Alguns levam capas e guarda-chuvas, dão palmadas no focinho ou no lombo do animal, e em menos de dois segundos voam pelos ares. Outros encaram ou touro e dão passinhos de dança, como quem brinca à apanhada com uma menina. Todos fazem figura de palhaço depois de projectados pelos ares após um par de cornadas. Acho piada que alguns se levantem depois, como se não fosse nada, e sacudam o pó das calças. A roupa fica manchada na mesma, e o mais difícil mesmo é limpar as nódoas que ficam no orgulho. Essas nunca vão sair, nem com o melhor detergente.

Não consigo sentir pena dos tipos que levam marradas dos touros nas largadas. Quando vejo estas imagens, fico sadisticamente a torcer pelo animal, que no fundo é quem tem menos a culpa deste triste espectáculo. Os que têm a sorte de escapar com uns esfolões ou alguns hematomas fazem uma cara brava como de quem diz “tive azar…o bicho não vale nada”. Outros dão um pontapé na areia como quem ficou frustrado com a colhida, talvez esperando poder escapar da fúria do bicho que já de si está pior que estragado que o levem ali para fazer este frete. Quanto aos que ficam gravemente feridos ou morrem, o que dizer? Colheram o que plantaram. Deviam pensar nos filhos antes de arriscarem ir parar ao jardim das tabuletas. Já pensaram bem o que ficam a pensar as pessoas? – “O teu pai morreu? De quê?”. – “Olha, foi colhido por um touro numa largada…”. – “ A sério? O teu pai era uma besta”.

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