Às vezes questiono-me se existe mesmo a tal linha ténue que nos separa do mais selvagem dos animais, da mais tonta das galinhas, ou do mais promíscuo dos porcos. O que se tem passado em Hong Kong nos últimos dois dias a propósito do lançamento das notas comemorativas dos Jogos Olímpicos de Pequim pelo Banco da China é vergonhoso. Pior que vergonhoso. Faz-me pensar que o materialismo e o oportunismo ultrapassam toda a lógica e toda a razão, e transformam o ser humano numa criatura vil e reles, sem moral ou qualquer pingo de vergonha na cara.
Milhares de pessoas apinharam-se desde ontem de manhã à porta das sucursais do BOC da RAEHK para adquirir as colecções de notas de 10, 20 e 50 dólares, com preços que variam entre os HK$138 e os HK$1388. O BOC vai colocar as notas à venda entre amanhã e o dia 31, numa primeira fase, e depois entre o dia 8 e 22 de Agosto. Cada cliente tem direito a apenas um exemplar de cada colecção. A edição “limitada” fez com que coleccionadores e afins perdessem completamente a tramontana, e a isto juntou-se a habitual dose de especulação.
As situações embaraçosas foram mais que muitas. As autoridades foram chamadas ao algumas sucursais para resolver disputas e impedir “fura-filas”, para anotar idas à casa-de-banho (!?), para serenar os ânimos em geral. Muita gente alternava as horas de espera com os familiares, algumas pessoas usavam jornais, sacos e outros objectos para marcar o lugar. Nem as chuvas fortes que caíram ontem à noite em Hong Kong os demoveram. As primeiras pessoas começaram a formar fila 40 horas antes da venda das notas. Um idoso de quase 70 anos queixava-se do tempo que tinha de esperar, e desejava que se optasse “por outro sistema”. Epá, tá bem. Quem o obrigou a ficar ali qual cavaleiro da triste figura?
E não se pense que em Macau o caso muda de figura. Esta tarde eram já centenas que aguardavam à porta do Banco da China. Comportamentos análogos não são assim tão raros. Basta ver o que acontece no Largo do Senado, à porta dos Correios, cada vez que é lançada a edição de selos comemorativa do Ano Novo Lunar, ou aquando do primeiro dia de venda de bilhetes para o Festival de Música de Macau, ou todas as manhãs em vários pontos do centro da cidade onde se faz a distribuição gratuita de jornais. Não muito diferente é o comportamento que se verifica quando correm boatos da escassez de um bem, seja água, arroz ou outra coisa qualquer, e se dá a corrida aos supermercados. Só me resta rezar. Rezar aos santinhos todos para que não haja um dia fome na região. Senão...
12 comentários:
Leocardo o blog pau para toda obra diz que vem aí outro jornal do redinha
O Ponto Final dizia o mesmo na sua edição de hoje.
Eu acho que isto está relacionado com o gosto por filas desta malta. Não interessa para quê, por quê nem durante quanto tempo. Havendo uma fila é certo e sabido que os gajos metem-se lá e passado pouco tempo procuram passar à frente. É mais ou menos como a faixa da direita nas estradas. Alguém lhes disse que aquilo é a faixa rápida e de ultrapassagem. Para não correrem o risco de serem visto como lentos ou enganados metem-se lá. Todos. E a malta calmamente ultrapassa pela esquerda. Um sucesso.
Eu acho que fazem filas para terem o prazer de as furar...
filas ... fronteira... autocarro... camada de palhacos sem educaçao...
Eu acho que é psicológico. Podem não ter nada para fazer, mas tentam passar à frente como se estivessem com pressa para ir tirar o pai da forca.
Pois, é mais ou menos o que já todos disseram: sem uma grande fila, não se pode dar o "golpe" perfeito.
Todos os comentários revelam ignorância. Há que pensar numa longa tradição de fomes, numa luta contínua de sobrevivência num mundo de centenas de milhões. Virem por favor a vossa objectiva do olhar europeu para o olhar asiático.
hunqh
Ah, e porque há uma longa tradição de fome, é normal agora qualquer um se achar mais esperto do que os outros e passar-lhes sempre à frente. Todos os animais evoluem. Só estes é que não? Onde é que está, afinal, a ignorância?
Na verdade para além da ignorância há o seu intrínseco racismo. Vá-se embora daqui.
hunqh
Se acha que chamar os bois pelos nomes é racismo, está muito enganado. Se soubesse as coisas que já disse sobre muitos portugueses... Isso, pela sua perspectiva, então, é ser racista contra mim próprio. Não me vou embora porque conheço muitos chineses que são gente. Quanto aos outros de que falei, são autênticos animais, sejam chineses ou de outra nacionalidade qualquer.
Assim retratado já é outra coisa. Eu tinha esses preconceitos e ao longo dos anos e convivendo muito mais com eles, principalmente do Continente, do que com os nossos compatriotas, cheguei à conclusão que todos sosmos iguais. Há chineses e portugueses bons e chineses e portugueses maus.
hunqh
Enviar um comentário