quinta-feira, 31 de julho de 2014
Leocardo fala aos bairristas (outra vez)
Terminamos assim mais de um mês de Bairro do Oriente, e apesar de Julho ter sido o mês com menos visitas em 2014 (menos de seis mil, destronando as 6152 de Abril como recorde negativo), tivemos nesta última semana artigos que mereceram a atenção dos leitores - e muito vos agradeço. O artigo Vocês em Macau... teve 354 visualizações, o artigo Quem se mete com o Afonso, leva foi o segundo mais popular, com 278 cliques, e o artigo do último Domingo dedicado ao grupo dos "vigilantes" do serviço de táxis, Que vergonha de táxis levou a "medalha de bronze", com 183 visitas. Isto não me adianta nem atrasa em termos de conta bancária ou sequer de ego, mas é sempre agradável saber que as pessoas lêem, gostam, partilham, comentam, enfim, o meu propósito é promover a discussão, chamar a atenção, apelar à reflexão. Hoje como sempre continuo aberto a críticas, sugestões, propostas, tudo o que nos leve à troca de pontos de vista e, o mais importante, que estimule a leitura. É importante ler, meus amigos. Não sou escritor, não estou a insinuar que escrevo bem, ou que o blogue é "uma referência", mas devemos encher a cabeça de conhecimento antes de pensarmos em dar certas "marradas", pois só assim não nos arriscamos a partir a tola e ficar a ver estrelas. Lede, lede ó criaturas de Deus.
A rede social Facebook tem sido cada vez mais um veículo de promoção do blogue, e neste momento a conta do Leocardo tem quase 1600 amigos e simpatizantes - cerca de mais meio milhar do que tinha no início deste ano. De vez em quando levo a cabo uma pequena angariação de leitores para o blogue, "convidando-os" para se juntarem ao clube de leitores do Bairro do Oriente. Cada vez que levo a cabo esta campanha opto por escolher os utilizadores do FB com que tenha pelo menos 40 amigos em comum (na maior parte dos casos de 70 para cima), dou preferência aos naturais ou residentes de Macau, e claro, que dominem a língua portuguesa, condição sine qua non para entender o que está aqui escrito, e apesar de não recusar o convite de ninguém, mesmo que não entenda a língua portuguesa, na hora de pedir amizade esse é um requisito indispensável. Mais uma vez, e por isso peço desculpa, evito enviar esse pedido a pessoas que se tenham demonstrado hostis ao blogue, ou que ainda não tenham recuperado do "trauma" que foi o anonimato que mantive desde 2006 a 2012, que os levou a olhar por cima do ombro cada vez que queriam cometer alguma inconfidência. Desculpem, ok? Por favor? Por misericórdia? Pretty please with fucking sugar on top?
Mas a mão que estendo em sinal de amizade é ainda mordida por quem não está interessado em se juntar à elite que recebe em primeira mão notificações sobre a actualização do blogue, que em vez de me ignorar, escolhe aquela opção chatinha do "não conheço este gajo", que leva a que os tipos do Facebook me suspendam temporiaramente de enviar novos pedidos. Eu até preferia que me insultassem, sei lá, pois assim pelo menos sabia quem eram, e não vos chateava mais. É que a rede social, apesar da sua semi-omnipotência, não me informa sobre quem não está interessado na minha simpatia. Se calhar têm medo que eu me vista de gaja, degole um caniche e a seguir vá atrás do tipo ou tipa que me rejeitou e faça um casaco ou um vestido com a sua pele (isto dava um filme candidato a Oscar...epá esperem lá, já deu...porra, esqueçam). Não, eu nunca faria isso, e como já deixei bem claro, não estou aqui a pedir amizade a ninguém para os "engatar", curar a solidão ou obter qualquer contrapartida - estou só a convidar à leitura do blogue, caraças. Tudo bem, aguento mais algumas "negas", e já sei que são uns gajos muito senhores do seu nariz, e que não querem nada com "gente que não conhecem de lado nenhum". Tiro o chapéu à vossa sociabilidade, ó trogloditas neandertáis.
Assim, e voltando ao tema que aqui me trouxe, acaba o mês de Julho, que apesar de ter sido passado no primeiro terço fora do território, deu para escrever 144 artigos, e além dos que mencionei como mais lidos, outros que também despertaram algum interesse aqui e ali, enfim, pois com excepção dos convites pelo Facebook, não faço qualquer publicidade, e permitam-me mais uma vez tocar esta cassete, que até parece que estou esclerosado: dá-me imenso gosto que leiam o blogue, escrevo-o para todos, agradeço a simpatia, recebo as críticas e respondo, ignoro os insultos a terceiros, especialmente família e derivados, e pronto, não me vou armar aos cucos e cometer o pecado maior da arrogância, dizendo que estou sempre certo e que tenho razão. Amanhã dia 1 é sexta-feira, vou actualizar o blogue como é hábito, e depois vou passear no fim-de-semana, mas mesmo assim vou tentar manter o fogo do Bairro do Oriente aceso, para quem quiser aquecer as mãos, o café, ou tostar um "marshmallow". Obrigado e fiquem deste lado. Bem hajam!
O que é Halal, afinal?
Já tinha falado da comida Halal(حلال) neste "post", de Maio de 2010, a propósito de um pequeno restaurante situado na Rua da Alfândega, propriedade de uma família iraniana radicada (parcialmente) em Macau, e que infelizmente encerrou devido à ditadura das rendas que vigora em Macau. Era uma delícia ir lá comer os "sheek kebab" de vaca ou de ovelha, as famosas "shawarma", a caldeirada de cabrito com arroz, o molho de beringela, perna de galinha com molho árabe, e dava para encher a barriguinha por menos de 50 patacas - com uma bebida e tudo.
No entanto há quem confunda o conceito de Halal com o método de chacina de animais conhecido por Dhabihah(ذَبِيْحَة), que consiste em matar um animal com um golpe na veia jugular enquanto este está ainda consciente, invocando o nome de Deus (que neste caso é Alá), e deixando-o sangrar até à morte - no fundo aquilo que fazemos com os frangos. Ninguém espera que os frangos adormeçam e depois lhes cortem a jugular, nem se aplicam as três injecções como nos condenados à morte por injecção letal, como nas cadeias dos Estados Unidos. Cortar a garganta do frango e assistir ao evaporar do seu sopro de vida pode parecer cruel, mas é um procedimento que nos separa de uma ave tonta que anda à cata do milho e um rosadinho a rodar num assador. Realisticamente, não existe uma forma "humana" de matar um ser vivo, pois morrem todos na mesma, e mesmo que pudessem não repetiam a experiência. Matar é matar, não gostam não comam.
E há quem não goste, e não coma: os vegetarianos, esses pequenos ditadorzinhos enfezados que "não comem produtos derivados de qualquer animal", ou na sua versão "hipocritus maximus", têm de vez em quando uma recaída. Mesmo assim afirmam que não concordam com os métodos assassinos de matança das vacas, e choram baba e ranho enquanto cortam um bife do lombo antes de o mergulhar naco a naco no molho tártaro e devorá-lo com um vulgar carnívoro, qual felino, tubarão ou crocodilo - e abutre, porque não. Como se já não bastassem estes paladinos da moral, carrascos das cenouras e dos repolhos, como se não fosse isso também "vida" (deviam era comer pedras), temos os que acusam uns de matar "pior" que os outros. "Ah e tal, o "dhabidah" (que a ignorância os faz confundir com o "halal" no seu todo) é crueldade, e os animais têm direitos, e vamos dar entrada a uma petição onde um borrego se queixa de estar muito bem a comer relva, e depois de lhe taparem os olhos dilaceraram-lhe a garganta, quando ele pensava que era uma borrega a brincar com ele às escondidas".
Ao contrário do que referiu o meu colega e amigo Hugo Gaspar, vulgo Firehead, no seu blogue, vegetais "halal" não são legumes "mortos enquanto conscientes". O que é afinal o Halal, então? Para quem se tenha dado ao trabalho de consultar algo tão fútil como a Wikipédia, ficava a saber que "halal" significa "permitido", oposto a "haram", que quer dizer "proibido", ou "interdito", ou ainda noutra versão, "impuro". Assim é "haram" tudo o que for produto derivado do suíno, da fermentação, onde entra o álcool bem como alguns tipos de queijo, tal como qualquer animal que tenha morrido de morte natural, asifixiado, espancado ou ferido de morte por outro animal, e que não tenha sido "morto em nome de Deus", e é aqui que entra uma das polémicas. Para quem acha que electrocutar porcos e vitelos antes de lhes enfiar uma faca na garganta, faz confusão que estes tipos falem "estrangeiro" no momento de limpar o sebo ao bicho; primeiro diz-se "Bismillah" (em nome de Deus), e depois "Allahu Akbar" (Deus é o maior). E com isto, segundo o entendimento de alguns, está-se a adorar Satanás.
Portanto "halal", significando "permitido", não está necessariamente relacionado com "carne", ou com o método de carnificina do animal em causa, deixando de parte o porco, obviamente. Outros produtos "halal", nos quais se incluem bebidas, vegetais, frutos secos, confeiteria, e até especiarias, significa apenas que são processados em locais onde não passa nada de "halal" - não se transforma produtos derivados do suíno ou de outros animais considerados impuros, produtos fermentados ou bebidas alcoólicas. Vegetais, duvido que exista algum dos mais comuns que seja "haram" - e não, a planta da coca, a papoila do ópio ou a mescalina não são "comuns". E de resto, quem é que se importa que os tipos digam duas ou três baboseiras que ninguém entende quando estão a ceifar a vida a um cabrito, ou a meter ervilhas num pacotes, a não ser eles próprios...e Alá?
É amanhã, dia 1 de Agosto
Mantendo uma das tradições do blogue, permitam-me assinalar o último dia de Julho, e recuperar este êxito dos primeiros tempos dos "nossos" Xutos & Pontapés, "1º de Agosto". Se há canções que só fazem realmente sentido um dia por ano, esta é uma delas, e esse dia é hoje. E não esqueçam: é amanhã dia 1 de Agosto, e tudo aqui é um fogo posto.
quarta-feira, 30 de julho de 2014
TUI sobre o referendo: "nim"
Confesso que aguardava com expectativa que o Tribunal de Última Instância se pronunciasse sobre a ilegalidade do referendo informal que os democratas querem realizar na última semana de Agosto, e toda a propaganda ao mesmo. A "premise" era bastante atractiva: ou se pronunciavam pela ilegalidade e ia ser uma carga de trabalhos para fundamentar a decisão com base legal, ou pronunciavam-se pela "não-ilegalidade" (em linguagem diplomática) e faziam o IACM e o Executivo "perder face". Inclinava-me para a segunda hipótese, mesmo que não estivesse a torcer por nenhuma delas - parecia-me a mais provável, apenas isso. Esta tarde saíu a pronúncia, que se decidiu pela...não pronúncia. Isso mesmo, as instâncias judiciais da RAEM viram as costas ao problema, sentam-se no muro, lavam as mãos e assobiam para o lado. "Quem disse que precisamos de nos pronunciar? Vocês que são pretos que se entendam", parece ter sido a palavra de ordem no TUI, que não quis ter nada a ver com esta polémica que parece subir cada vez mais de tom.
Jason Chao reagiu à decisão com um sorriso maroto, dizendo que "não se lembra de uma decisão deste tipo por parte das instâncias judiciais". Nem ele nem eu, nem muitos de nós, pois se existe uma instância a onde se pode recorrer para atestar a legalidade de seja o que for, os tribunais são essa instância. O que parece estar aqui em causa é a própria estabilidade política; é óbvio que os tribunais não se podem pronunciar pela ilegalidade de algo que não é, sensum strictum, ilegal. Só que isto é uma daqueles coisas que não se dizem, do tipo "ó pai, porque é que a avó tem bigode?". Lá ter tem, e pode ser até que saiba que tem, e que as pessoas reparam e comentam, mas ela própria está-se nas tintas para isso. Os tribunais já se decidiram contra o Governo noutros casos, mas aqui "pia mais fino", pois os democratas tocaram num nervo sensível: primeiro aproveitaram-se da indiferença dos dirigentes da RAEM por um assunto que parte do debate na sociedade civil, e depois cometeram a arrogância de pensar que essa mesma sociedade civil ficaria intimidada pela autoridade, e caso resistissem, bastaria dizer que "Pequim ficaria zangada" com tamanha insolência e desrespeito pelos trâmites estabelecidos por ela.
Pequim, ou neste caso o Governo Central, não se pronunciou logo após a questão do referendo ser posta como possibilidade. Podemos entender isto de várias formas; ou acharam que o Executivo teria capacidade para dissipar a rebeldia, fazendo ver que não era recomendável avançar com uma iniciativa deste tipo, ou acharam que os democratas tinham todo o direito de desafiar a nomenclatura, e no fim tiravam-se as devidas conclusões (a hipótese que chegou mais tida como provável, dado o nervosismo e desorientação patenteados por algumas das elites), ou finalmente que isto não lhes agrada mesmo nada, e estavam a evitar meter a colher nesta caldeirada, e passar a imagem de "tirano", e que o segundo sistema não passa apenas de uma fachada, de um faz-de-conta, e que o melhor era aproveitarem o recreio antes das coisas assumirem contornos de seriedade, e aí acabou-se a brincadeira - esta é uma leitura que os mais pessimistas fizeram desde a primeira hora, e que os restantes temiam: Pequim não achou piada nenhuma à ideia, e estava só a tentar evitar aplicar a "barra dura" do primeiro sistema no segundo, e lá se vai ao ar o "elevado grau de autonomia".
E parece ser um facto que o Governo Central veio pôr um ponto de ordem na controvérsia, mesmo que timidamente, e com a sua dose de hesitação. Se no início da polémica do referendo o Gabinete de Ligação local expressou apenas "apoio a Chui Sai On" nesta questão, evitando pronunciar-se sobre e eventual ilegalidade do referendo, veio agora uma instrução "de cima", com o presidente do Comité Permanente da Assembleia Nacional Popular (ANP), Zhang Dejiang, a vir dizer "que os princípios da China para Macau mantêm-se inalterados" e que "a estabilidade e prosperidade do território são baseados na implementação da Lei Básica" - ou seja, tudo o que não se insere no enunciado da Lei Básica que tenha qualquer relação com o articulado da mesma no que toca à soberania de Macau, e à eleição do seu orgão Executivo, só pode ser inerentemente considerado ilegal. Pasme-se, minha gente, mas este é o melhor argumento de todos os argumentos contra este referendo, mas mesmo assim não colhe - ali não se está a eleger o Chefe do Executivo, mas apenas uma recolha de opiniões, que leve o nome que levar, é um direito contemplado na própria Lei Básica.
É evidente, e cada vez mais os que inicialmente se vetaram à neutralidade e à indeferença ao tema começam também a entender, que os democratas aproveitaram um "vazio legal" que não os impede de brincar com coisas sérias. Mas quando se brinca com o fogo, mesmo mantendo uma distância segura, nada nos diz que as labaredas não se possam de repente soltar, a reclamar um dos olhos dos brincalhões, confiantes no cumprimento das regras mais básicas de segurança. O tempo começa a correr mais depressa, sexta-feira entramos em Agosto, e daí até às três semanas que no separam do referendo é um pulo. Temo que mais cedo ou mais tarde se levante a possibilidade de se considerar que quem participe no referendo, ou vote, estará a cometer uma ilegalidade. Chegando a esse ponto, tudo é possível, menos que as coisas tenham um final feliz. Se o problema é o nome, que começa irritar os mandarins, talvez Jason Chao e os restantes devessem considerar a mudança de nome, hipótese que aliás já tinham avançado, se for esse a único entrave. Sugiro que se mude para "aquilo", ou "aquela coisa", ou ainda "é segredo". Ou podem também optar pela estratégia que alguns contrabandistas na China adoptam para adulterar produtos de marca, e em vez de "referendo", chamam-lhe "refrrndo", ou algo do género. O que o orgão da RAEM parece estar a querer passar com este "nim" é para mim muito claro: da lei cuidamos nós, da política tratem vocês. E os burros são eles?
Inocente! Livre! Viva!
Raymond Tam Vai Man, ex-presidente do Instituto Para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM) foi declarado inocente do crime de prevaricação, de que arguido juntamente com três outros funcionários camarários. O acordão lido onde à tarde no Tribunal Judicial de Base (TJB) iliba os quatro arguidos por não ter indícios da autoria de prevaricação no infame "caso das campas", que "rebentou" quando Paulina Alves Santos, autora da acusação, alegou terem existido irregularidades na atribuição de dez campas definitivas no Cemitério de S. Miguel Arcanjo, envolvendo ainda a Secretária para a Administração e Justiça, Florinda Chan. Raymond Tam foi acusado de não ter colaborado com o envio dos documentos relativo ao processo das campas, foi constituído arguido em Dezembro de 2012, e suspenso do seu cargo no IACM em Junho do ano seguinte, sendo substituído por Alex Vong, vindo do Instituto de Desporto. Agora julgado inocente, está tecnicamente "no desemprego" - concerteza que se arranja qualquer coisinha por ter "dado o corpo ao manifesto". Paulina Santos, que tem estado praticamente sozinha nesta luta desde o início deste processo conexo ao das campas, diz que não vai recorrer na decisão, porque "já sabe o que a casa gasta" - noutras palavras, mas foi isto que deu a entender. À saída do Edifício Macau Square estavam alguns curiosos, que depois da leitura do acordão aplaudiram Raymond Tam, e vaiaram Paulina Santos. É bom saber que os cidadãos vibram com a justiça, e até fazem claque e tudo.
Silêncio, que se vai dar uma queca
Saul Hudson, mais conhecido pelo nome artístico de "Slash", e antigo guitarrista dos Guns'n'Roses, deu uma entrevista à revista de variedades TMZ onde fez algumas confissões, uma delas meio...estranha. Quando lhe perguntaram qual tinha sido a sua "aventura sexual mais louca", contou que "drogou a mãe da namorada, para poder fazer sexo à vontade". O quê?!?! Isto só assim até parece uma confissão, uma violação horrível, mas não é bem assim. O que aconteceu foi que bom do "Slash", quando "tinha 13 ou 14 anos" (eu lembrarme-ia da idade certa, mas com ele até entendo) colocou um soporífero na bebida da mãe da namorada para que esta adormecesse e o casalinho estivesse mais à vontade no sofá da casa dela, a fazer poucas-vergonhas. Ah...assim está bem, e até se entende. Drogar a sogra, e tal, tudo bem, ou em alternativa podia também tê-la sufocado ou trancando a velha na casa-de-banho, ou quem sabe acorrentá-la à cama. Uma "queca" é daquelas coisas que não se interrompe, 'cum diabo. Hudson, actualmente com 49 anos, nasceu na Inglaterra e foi em 1985 um dos elementos fundadores do grupo de "hard-rock" californiano Guns'n'Roses. Em 1994 saíu após desentimentos com o vocalista Axl Rose (nada de original aqui) e formou a sua própria banda, os Snake Pit. Em 2002 formou com outros ex-elementos dos Guns o grupo Velvet Revolver, e desde 2008 que prossegue uma carreira a solo.
terça-feira, 29 de julho de 2014
Islamização: a imposição do mito
Cristãos e muçulmanos celebram juntos a Primavera Árabe na Praça Tahir, Cairo, Egipto.
Abordei aqui no Domingo o tema da Islamização, mais precisamente o receio de que o continente europeu - onde o Islão se instalou praticamente desde o seu aparecimento e nunca o abandonou por completo - esteja ameaçado no que toca às suas liberdades, à sua cultura, e ao seu modo de vida. Acontecimentos recentes como a nova investida de Israel contra o Hamas ou o genocídio de cristãos no Iraque têm levantado uma onda crescente de animosidade contra o Islão em geral, muito por culpa de algumas imagens divulgadas nos média (nem todos de credibilidade acima de qualquer suspeita), que nos mostram decapitações, corpos ensanguentados, gajos de barba com aspecto ameaçador, o suficiente para os apologistas do "demónio do Islão" virem por aí fora e gritarem "lobo". O que seria se o tal avião da Malaysia Airlines fosse abatido por rebeldes islâmicos, e não separatistas ucranianos. Achei por bem fazer uma adenda ao artigo de Domingo, e mesmo assim não ficará sequer perto de abordar a temática na sua totalidade, tal é a sua complexidade. Pena que nem sempre a abordagem seja no sentido de encontrar as causas, e tantas vezes se opte pela via do segregacionismo e da rejeição completa de uma cultura, que quer queiramos quer não, precisará eventualmente de ser integrada na nossa. Agora depende apenas de nós se queremos isto feito de forma pacífica, ou se preferimos a escalada do ódio e da xenofobia.
Para as contas dos "islamófobos", pouco importam os negros que habitam, por vezes na totalidade, os bairros de lata - desde que não sejam muçulmanos, claro.
Vou começar por contar um episódio que aconteceu comigo no início dos anos 90, teria eu uns 15 anos. Um Sábado de Agosto fui ver um filme no velhinho cinema Quarteto, na sessão das 18:30, e no fim dei um "esticãozinho" até ao terminal de Entre-Campos, uma caminhada sempre agradável debaixo do fresquinho Verão lusitano. Aí apanhei o autocarro das 20:30 para Sacavém, onde nos arredores se situava a minha "segunda morada" na altura, ou algo assim, uma viagem de pouco mais de meia-hora. Nesse dia estariam dois terços do autocarro cheio, não ia ninguém de pé, mas o facto que mais me chamou a atenção foi o de ser o único passageiro branco. Já tinha reparado na animada conversa em crioulo no banco de trás, na senhora negra ao meu lado que olhava fixamente para a frente, como se tentasse evitar o contacto visual comigo, e o próprio motorista, um senhor mestiço, de bigode, na casa dos 50 anos, bem simpático por sinal, se bem que de poucas palavras. Nas duas ou três paragens antes do meu destino não saiu ninguém, e numa delas entraram mais dois passageiros, ambos africanos - ou descendentes de africanos nascidos em Portugal, não sei precisar, pois a certidão de nascimento não é um requisito para se apanhar o autocarro para Sacavém. Cheguei a casa já perto das nove e meia, e depois de ver um pouco de televisão sai para beber um copo e jogar matrecos com a malta do bairro. Podia ter optado por ficar no quarto atrás da máquina de escrever criando a minha própria versão do "Mein Kampf", questionando-me: "serão estes sacavenenses?", mas não me apeteceu.
Segregação: ontem, hoje e amanhã, sempre presente. Sejam negros, judeus ou muçulmanos.
Ninguém se incomoda ou alguma vez se incomodou muito com os bairro de lata nos arredores de Lisboa onde habitavam e habitam os imigrantes oriundos das ex-colónias africanas, ou de outros países desse continente, ou falou de uma eventual "africanização" pelo facto destes bairros serem inteiramente, ou quase, habitados por africanos. Estes são na maioria operários ou vendedores ambulantes, e vivem em autênticos "guetos" onde falta por vezes a luz eléctrica e a água potável. Não contam porque não se impõem, pois não têm dinheiro ou outros meios para fazê-lo. Quando mandam os filhos para a escola, estes vão para o ensino público, juntamente com crianças brancas, ciganas ou asiáticas, se as houver, da mesma área de residência. Pelo contrário, se a comunidade islâmica, composta por comerciantes que fazem questão de ter alguma qualidade de vida, cuidam que se mantêm algumas tradições trazidas dos seus, países de origem, seguem a religião, e todos os restantes pressupostos desde que não sejam contra as leis do seu país de acolhimento, isto torna-se "um problema", e fala-se logo de "islamização". O que posso mais entender desta lógica a não ser que um imigrante será sempre aceite desde que se remeta à sua situação de coitadinho e miserável, e não ouse sequer pensar em organizar uma comunidade onde possa pelo menos "matar" saudades de casa? Isto seria o mesmo que obrigar a comunidade portuguesa em França a comer bacalhau apenas no Natal, e tudo dependeria do nível de desconforto que os franceses sentiriram por eles.
Vegetarianos: os únicos que têm legitimidade para criticar qualquer método de chacina de animais.
O lado mais visível desta "islamização" que nos querem impôr como sabor da semana em matéria de pragas, vírus, pestes e outras ameaças é o lado visível: o das mesquitas, das lojas, dos bairros onde predomina o comércio e a arquitectura islâmica, e a partir daqui, o que "nos impõem". Aí entra a questão das diferenças culturais, e mais recentemente a polémica relacionada com o abate de animais segundo os rituais islâmicos - que curiosamente coincidem com os judaicos, o que deixa aqueles que apoiam o zionismo apenas como contraponto do islamismo meio baralhados. A notícia mais recente dá conta da proibição do abate de animais pelo método "halal" na Dinamarca, uma vez que a legislação local impede que os animais estejam conscientes no momento em que são degolados. Conscientes ou não, que diferença faz? Isto só nos leva a concluir que numa sociedade onde a maioria seja vegetariana ou "vegan" e as leis adaptadas a essa maioria, seja proibido consumir carne de todo. E se nos apetecer um bife ou um frango assado, ou até uma feijoada, onde o cadáver resultante da chacina se confunde no meio dos feijões e da couve? Somos uns "animais", "barbáricos" e "desumanos", é isso que somos. Rejeitar uma cultura diferente é habilatarmo-nos a que outra cultura ainda mais evoluída que a nossa nos considere passíveis de rejeição, também. E quem gosta de ser rejeitado?
Os talibã: é disto que têm medo? Têm visto muitos assim no autocarro? Na escola? Nos jardins públicos?
Tudo bem, estou aqui a apelar à compreensão dos hábitos culturais de uma cultura que consideramos inferior à nossa, ou de características "medievais", que não atende a princípios que são tidos como uma conquista da nossa civilidade, e cuja aceitação consideramos um passo atrás nesse progresso, um regresso ao passado. Para fundamentar estes receios, usamos exemplos de países de onde estas pessoas são originárias, onde vigora uma política da intolerância, do ódio, e onde o respeito pela diferença e o mínimo dos princípios da piedade e da misericórdia são ignorados porr completo. Claro que falo aqui dos principais bastiões do Islão, onde se pratica a "sharia", a lei islâmica, conhecida pela sua interpretação rigorosa e restrita do Islão, ou seja, seguem escrupolsamente um livro que foi escrito no tempo em que não existia electricidade, água potável , telefone ou jogo do Bingo - o cenário é mais ou menos aquele que seria se nas sociedades cristãs seguissemos a Bíblia. O exemplo mais extremo é o dos talibã, seita que leva este princípio ao extremo de proibir a música, a dança, o humor e a higiene pessoal mais básica. Segundo os apologistas da "ameaça" que representa a Islamização, é isto que nos vai acontecer se não fizermos algo que detenha esta imposição da barbárie. Para que possamos agir antes que seja tarde demais, duplicam e triplicam os números reais das estatísticas que para eles significam que estamos em vias de acordar um dia numa república islâmica:
- "Meu amor, onde é que estão os meus ovos com bacon?"
- "Bacon? Então não sabias que o ayatollah proibiu qualquer produto derivado dos suínos quando tomou posse ontem à tarde no lugar do nosso primeiro-ministro?"
- "Ah sim, já me lembro, agora cala-te, não sejas insolente senão levas com o chicote".
Mesquita de Tsim Sha Tsui, Hong Kong. É grande, imponente, fica no centro de Hong Kong, está ali há trinta anos. Qual é o problema?
Ninguém pensa por um segundo que estes imigrantes oriundos de países árabes onde não existe liberdade de culto, e onde se responde por crimes como a blasfémia, a apostasia ou o adultério sob o risco da pena de morte venham para o Ocidente um bocado fartos de tudo isso, e que procuram apenas um sítio onde possam ganhar a vida sem que ninguém os chateie. Mesmo que se mantenham fiéis à sua religião não vão certamente querer impôr os seus aspectos mais controversos, e quem sabe a razão pela qual deixaram o seu país. Escrevo para quem quiser ler, mas não posso deixar de ter em mente uma pessoa que tem como lema de vida "quem está mal muda-se", e é a ele que pergunto: se estes tipos estão bem onde estão, e aprovam o tipo de conduta que para nós é abominável, porque mudam? Se estiverem bem onde estão, e forem bem vistos pelos manda-chuvas do estado clerical que estrangula as liberdades individuais dos cidadãos desses países, certamente que ficariam muito mais felizes espezinhando os restantes no seu país do que tentando impôr do nada o mesmo modo de vida noutras paragens, onde existem leis e autoridade que os detenham.
Radicais islâmicos em Londres: se os empurram, é possível que eles empurrem também - são apenas pessoas.
O problema de muitos islamófobos é conhecerem poucas pessoas "normais". Entenda-se por "pessoas normais" quem tem outras prioridades na vida que não a religião, a salvação, o paraíso, as quarenta virgens ou tudo o que apenas fica acessível após pifar, bater a bota, ir desta para melhor. Existem mil milhões de muçulmanos em todo o mundo, e fossem todos uma "ameaça", como dão a entender os partidários da "Islamização", já tinhamos tido uma guerra santa, em que eles teriam saído vencedores. De facto uma das características que distingue o Islão das crenças ocidentais é o apego aos princípios da sua religião: não comem carne de porco, não bebem álcool, e talvez sejam um pouco mais contidos nas palavras e nos actos, mais humildades, ou até desconfiados, mas é claro que isto não serve de regra para todos. Veja-se o caso da comunidade indonésia em Macau, a esmagadora maioria composta por mulheres, quase todas elas islâmicas. Vestem-se como querem, comportam-se muito aquém do que é rigosoramente declarado na sua religião, e casam com homens não-muçulmanos, sem que nenhum dos dois se precise de converter a nada - o BIR vale mais que a fé, se quisermos colocar a questão nestes termos. O que quero dizer no fundo é que tal como existem católicos não praticantes, há também muçulmanos não praticantes. É só conhecer alguns para perceber isto, em alternativa a fugir deles com receio que puxem da cimitarra e nos cortem a nossa cabeça de "kaffir".
Situação precária, a dos cristãos no Iraque. É isto que queremos fazer com os muçulmanos na Europa?
É óbvio que não aprovo o que se passa em países como o Iraque, Irão, Paquistão, Afeganistão e outros onde as liberdades são atropeladas em nome da religião, mas também não é difícil de entender que estas práticas são levadas a cabo por elites, e têm fins políticos. Não me tentem convencer que alguém nasce terrorista, ou que existe um gene em certos povos que os predispõe a amarrarem-se de explosivos e rebentarem pelos ares. Os "mártires" do Islão não passam de vítimas do sistema onde, coitados, nasceram e lhes foi dada uma lavagem cerebral tamanha que não foram capazes de distinguir o certo do horrivelmente errado. Não sei se recordam o incidente com aquele jovem nigeriano que foi detido durante um voo de uma companhia norte-americana e lhe foram detectados explosivos na sola dos sapatos. Este era um jovem problemático, frustrado, assolado por um complexo de inferioridade e com uma auto-estima tão baixa que foi seduzido por promessas de martírio, heroísmo, fama, virgens no céu à sua espera, etc. São estes indivíduos mesmo maus, ou apenas fracos e facilmente manipuláveis? Se isto serve para jovens que reagem à rejeição juntando-se a más companhias e depois se metem na droga, porque não serve para estes? Se injecta para a veia como resposta ao isolamento e à solidão é um marginal miserável que mais vale cuspir em cima, mas se decide rebentar num centro comercial, é um perigoso terrorista, e todos parecidos com ele dão também potenciais bombistas-suicidas?
Muçulmanos franceses apelam à "sharia". Parecem chateados. Pudera, pedindo a "sharia" pode ser que pelo menos os deixem em paz.
E isto leva-me à questão da integração. Se os filhos dos muçulmanos, nascidos no pais de acolhimento dos pais, que adquiriram a cidadania de uma forma limpa, e estão perfeitamente inseridos no mecanismo da sociedade, não se sentirem integrados, há uma tendência natural para que se dispersem. Agora uma dúvida, em forma de pergunta que deixo no ar: os jovens muçulmanos de segunda e terceira geração, nascidos nos países ocidentais que assumem uma posição radical, mais ainda que os pais ou avós antes de emigrarem, são aliciados por quem? Portanto: 1) teme-se uma escalada do fanatismo islâmico na Europa; 2) os veículos desse fanatismo são na maioria descendentes de uma primeira vaga de imigrantes, que se radicalizaram; 3) apontei no parágrafo anterior uma possível causa: dificuldades de integração na sociedade do país onde nasceram, que os rejeita; 4) a tendência é para que o fanatismo suba de tom, e a resposta mais adequada segundo alguns é mais descriminação. E onde vão buscar eles a motivação? De onde parte a retórica que vais servir de base de sustenção deste fanatismo? Não dos pais, que como já se viu estão plenamente integrados, então de quem? Exacto, de quem mais tem a lucrar com tudo isto, os grupos extremistas sediados nos tais países que rejeitamos por serem anti-democráticos e pouco civilizados, mesmo apenas coexistindo com o nosso modelo de sociedade ideal. E não estaremos nós a fazer muito pouco para evitar que células desses grupos extremistas recrutem cidadãos que como nós são também europeus de pleno direito?
Crianças muçulmanas inglesas, apelando não à "sharia", mas o fim do racismo e da xenofobia.
Como se pode ver, é mais fácil fomentar o ódio do que apresentar soluções para o problema. Aqui entram os grupos tradicionalmente xenófobos, que à pala desta islamofobia recrutam pessoas até com alguma inteligência e discernimento, mas inebriados com uma "ameaça" que está longe de adquirir as dimensões que lhes são dadas a acreditar, temem a ameaça ao seu estilo de vida tradicional, ou o dos seus pais e avós - por vezes até chegam ao ponto de se esquecer do facto de que o mundo evolui. Para estes grupos, normalmente alinhados com a extrema-direita ou a direita conservadora, os muçulmanos tornam-se um alvo fácil, quer pela má publicidade dada pelos média, quer pelas acentuadas diferenças culturais, quer pelo aspecto exótico de alguns seguidores do Islão. É preciso não esquecer também que é mais fácil atirar pedras a um velhinho de barba e sandálias que volta da mesquita do que a um preto ou um cigano, que pode resultar em retaliação e respectiva carga de porrada aplicada nos cornos, ou num chinês, e depois lá ficam eles sem uma alternativa barata para comprar uma prenda à namorada no Domingo em que comemoram o aniversário, mas são tão broncos (e tesos) que se esqueçeram da data. A estes pouco importa de onde são os imigrante, ou naquilo que acreditam: querem-nos dali para fora e ponto final. Pegando nos números que apresentei no artigo de Sábado, que dão conta de um facto importante e grave, de 85% dos nascimentos na Europa nos últimos 20 anos serem de filhos de imigrantes. Sem crescimento populacional, o que propõe fazer quando forem precisos braços para trabalhar enquanto vocês "curtem" o modo de vida que tanto querem preservar mas sem aturar putos? Que tal o regresso da escravatura? Dava jeito, não dava? Certifiquem-se é que os escravos não se reproduzem ou se integram, e depois de os usar os mandam de volta à selva.
Tão amigos que eles são...
E esta história do barril de pólvora que é o Médio Oriente ter causas religiosas ou étnicas é uma treta em que só os inocentes acreditam. Os norte-americanos invadiram o Iraque com o pretexto de que ali existiam armas de destruição maciça, quando todos sabemos que era o petróleo que tinham em mente, e não a "libertação do país oprimido por um ditador sanguinário" - mesma desculpa que usaram para invadir o Afeganistão ou para embirrar com o Irão, ou que a Venezuela de Chávez usou para se opôr aos Estados Unidos. Se têm a mente os valores da democracia, da liberdade e tudo isso, o que os impede de intervir na Arábia Saudita, que é apenas o país onde o extremismo islâmico mais se faz sentir, e onde a "sharia" aplica penas como a amputação da mão direita para os crimes de roubo, ou da cabeça para o adultério, e ainda persistem práticas de execução e tortura medievais? Perguntem a qualquer ocidental imbuído deste preconceito alimentado pela ignorância se seria capaz de viver num país islâmico, e ele responderia "nem pensar". Depois acenem com um contrato de trabalho no Dubai, com um ordenado chorudo, e vão ver se ele reconsidera ou não. No Dubai pratica-se outra das formas mais rigorosas da "sharia", e muitos foram os estrangeiros que por "distração" sentiram na pele aquilo que outros apenas temem. Sim, e o Dubai fica nos Emirados Árabes Unidos, outra nação exportadora de petróleo onde os nossos amigos americanos acham bem não interferir.
Se escolherem não ter religião, óptimo, mas no caso de optarem por uma (carências afectivas?) não sejam totós: portem-se bem e sejam amigos, f...-se!
Ninguém escolheu o país onde nasceu, a sua nacionalidade, etnia, cor, e até religião, e afortunados os que como eu puderam optar pelas que existam, ou então por nenhuma. Valorizamos estas conquistas que tanto nos custaram a obter, como a liberdade de expressão, de culto, de escolha, enfim, somos uns privilegiados. O que não nos podemos dar ao luxo é de rejeitar alguém que à partida não teve a sorte de, como nós, gozar destes direitos, e que agora tenta recomeçar num ambiente que para ele é hostil, talvez como ele próprio é também "hostil" aos nossos olhos. É para isso que se fala do diálogo inter-cultural, e estender uma mão é sempre mais convidativo do que fazer com ela um gesto de repúdio, de rejeição. E isto serve para todas as culturas. Se não aceitamos ser catalogados à partida como portugueses, chineses, cristãos, protestantes ou muçulmanos quando nos encontramos num ambiente diferente do nosso, não devemos fazer o mesmo com quem nem sequer abriu a boca para nos julgar, condenar ou impôr o que quer que seja. As imposições normalmente chegam quando já não há possibilidade de diálogo e de entendimento. Pensem mais nisso, e menos nos pontos percentuais que "esticam", e com que justificam esta paranóia sem sentido.
José Lai e os turistas do templo
Foi uma das polémicas da semana passada (temos tido tantas, que foi só "mais uma"), e recebeu a censura da maioria da opinião pública, enquanto os que não desaprovaram, ficaram-se pela "compreensão" - poucos ou nenhuns apoiaram. Falo da decisão da Diocese de Macau em colocar um aviso à entrada da Igreja da Sé reservando o direito de entrada aos católicos praticantes, ou seja, "não-católico não entra". A mensagem era dirigida principalmente aos turistas do continente, que se comportavam no templo católico como se estivessem no zoo ou no cinema, e mesmo durante o horário reservado ao culto dos fiéis, o que causava a estes grande transtorno, pois interferia no seu diálogo com Deus, que apesar da Sua grandeza, fala muito baixinho e é necessário um ambiente onde reine o mais absoluto dos silêncios. Sei do que falo, pois das (muito poucas) vezes que fui à Igreja, qualquer desgraçado que tenha o azar de espirrar durante a oração é olhado pelos outros com um ar de reprovação que o deixa pendurado por um fio à beira do precipício que dá para as estalactices incandescentes do Inferno.
Apesar deste ambiente de velório que se impõe numa visita a uma casa de Deus, a proibição não foi bem recebida pelos fiéis. Dei a minha opinião como não-católico, e entendi perfeitamente a mensagem, e que mesmo que me apetecesse ir à Igreja, seria bem-vindo, pois sei qual o comportamento a adoptar. Por isso a má publicidade da imprensa levou a que o aviso fosse retirado no dia seguinte - ou no outro, não sei bem, mas pouco depois - e pensou-se que o assunto ficaria encerrado, e que não mais ficaria exposta esta forma de "descriminação", contrária ao discurso do próprio Papa Francisco, o segundo na hierarquia da Igreja Católica (o primeiro é...bem vocês sabem, o tal, que nunca se pronuncia nestas coisas nem noutras), que deu indicações no sentido da Igreja tem uma função integracionista, mostrando-se sempre aberta aos seguidores de outras fés ou de nenhuma que queiram saber mais sobre o catolicismo. Melindrados com a polémica, e com o bispo José Lai de férias, os seus imediatos retiraram o aviso, e durante alguns dias a Sé foi outra vez de todos, até dos que "achavam piada aos bonecos".
Mais eis que qual Deus julgador e vingativo, ressurge José Lai, que ordena que se interdite novamente a entrada aos turistas, ou que pelo menos fique claro que não são bem-vindos se não vierem para a adoração do Senhor, o melhor é irem até à travessa mais abaixo comer um gelado no Lemon Cello, que está calor para isso. Mateus tinha previsto esta indignação de José Lai no livro 21 do seu evangelho, cuja versão adaptada passo a reproduzir:
José Lai entrou na Sé e expulsou todos os que ali estavam fotografando e comendo. Ergeu a placa interditando a sua entrada e reservando as cadeiras aos crentes,
e lhes disse: "Está escrito: 'A minha casa será chamada casa de oração'; mas vocês estão fazendo dela um mercado, uma feira".
(passagem irrelevante sobre cegos e mancos que supostamente ficariam curados)
Mas, quando os chefes dos sacerdotes e os mestres da lei viram as coisas maravilhosas que José Lai fazia e as crianças gritando no templo: "Hosana ao Bispo de Macau", ficaram indignados,
e lhe perguntaram: "Não estás ouvindo o que estas crianças estão dizendo?"
Respondeu José Lai: "Sim, vocês nunca leram: "'Dos lábios das crianças e dos recém-nascidos
suscitaste louvor'"?
E, deixando-os, saiu da cidade para a sua residência anexa à igreja da Sé, onde passou a noite, sem antes deixar o recado: deixem aí a placa, se faz favor.
Palavra do senhor, amen.
Vai-te embora, jeitosa!
Esta que vemos na imagem é Sabina Altynbekova, uma jovem de 17 anos que faz parte da selecção de voleibol da categoria de sub-19 do Cazaquistão. Desconheço as suas qualidades como jogadora, mas Sabina foi notícia por ter sido considerada "demasiado bonita" para a equipa. Isto de acordo com o seu próprio treinador, Nurlan Sadikov, que a considera "uma distração". No mundo do desporto de alta-competição incutem-nos desde cedo o preconceito de que os homens são muito machos e de que as mulheres são lésbicas. Facto, e não me venham chamar de preconceituoso, pois desde miúdo que percebi que o Humberto Coelho, por exemplo, jogava "noutro campeonato" mais intenso que os que disputava nos relvados, enquanto nenhum homem no seu perfeito juízo queria ficar atrás da Rosa Mota ou da Aurora Cunha na bicha para o pão. O mesmo hoje acontece com os melhores jogadores de futebol do mundo em ambos os géneros. Contem quantas mulheres não se importavam de dar uma voltinha com o Cristiano Ronaldo, e depois o mesmo número de homens que arranjavam um "compromisso urgente de última hora" para evitar ir beber um café com a alemã Nadine Angerer, vencedora da Bola de Ouro da FIFA para jogadora do ano em 2013. Permitam-me que ilustre isto com uma imagem:
Penso que estão a ver onde quero chegar. No caso da pobre Sabina, que deu nas vistas (literalmente) no campeonato asiático de voleibol feminino realizado recentemente em Taiwan, está apenas a fazer o que gosta, e se faz parte da selecção do seu país é porque tem qualidade para isso. Quanto ao seu charme irresistível, tenho certas dúvidas. É bonita, sim, mas nada do outro mundo, e só quem anda a ver desportos de alta-competição com mulheres há muitos anos pode considerá-la uma "deusa" - anda desfazado da realidade. Ou isso ou então o tal Sadikov quis saltar-lhe para a cueca e ela deu-lhe uma tampa, e agora anda armado em fino, dizendo que a pequena impede que o sangue circule na cabeça de cima em vez da outra, e fique meio aparvalhado na hora de pensar numa táctica vencedora. Seja como for, isto é uma má notícia para todas as mulheres que queiram fazer uma carreira desportiva mas para o efeito não tenham como requisito serem feias, gordas ou esquisitas. Caso tenham as medidas certas, arriscam-se a ouvir coisas do tipo: "estás aí a bater bolas pra quê? devias era estar a render, ó filha!"
Sporting cede perante o Twente
Twente 2 - Sporting 0 Friendly 2014 by Tugasports
Já falei aqui de como vão as pré-temporadas de Benfica e FC Porto, e faltava-me falar do Sporting, que graças ao 2º lugar obtido na Liga Sagres na época passada, entra directamente na fase de grupos da Liga dos Campeões. Depois da saída de Leonardo Jardim para os franceses do Monaco, a equipa é orientada agora por Marco Silva, ex-treinador do Estoril, que levou a equipa da linha a um quinto e quarto lugares nas duas últimas épocas, vindo da 2ª Liga. Os leões estão a preparar a época na Holanda, e depois de resultados positivos contra equipas com pergaminhos inferiores, deram ontem com um "muro" chamado Twente FC, uma das equipas de topo dos Países Baixos, e saíram derrotados por 2-0. Luc Castaignos aos 5 minutos, e Quincy Promes já nos descontos fizeram os golos dos holandeses, que no passado terminaram a Eredivisie no 3º lugar. Veremos então como se comportará o Sporting nas partidas mais a sério.
Jovens portugueses na final
Como já é hábito nos escalões jovens do futebol de selecções, Portugal deixa-nos com o peito inchado de orgulho, e atingiu ontem mais uma final, desta feita a do europeu de sub-19, que se realiza na Hungria. No jogo das meias-finais, realizado na Pancho Arena, da Academia Ferenc Puskás, a selecção das quinas bateu a Sérvia no desempate nos pontapés da marca de grande penalidades por 4-3, depois de um teimoso nulo que nem o prolongamento resolveu. Portugal encontra a Alemanha na final de quinta-feira, depois dos germânicos terem goleado a Áustria na outra meia-final por 4-0. Boa sorte para os pupilos de Hélio Sousa, e que tragam pelo menos este "caneco" para casa.
segunda-feira, 28 de julho de 2014
Vocês em Macau...
Numa das vezes que fui a Portugal de férias, em 2004 se não estou em erro, lembro-me de uma conversa com um dos amigos da minha irmã, que tal como ela é uns bons nove ou dez anos mais novo que eu - eu estaria à porta dos 30, e ele mal chegado à casa dos 20, portanto. Com o ar de quem tudo sabe próprio de quem completou a adolescência, apesar de "lhe faltar uma cadeira para acabar o 11º ano", afirmava que "vocês em Macau têm a papinha toda feita". Isso mesmo, "a papinha toda feita". É chegar, ver e vencer, e só por algum mal-entendido estranho ou erro de tradução é que ninguém se apercebeu disso lá no rectângulo, senão tinhamos a população de Macau a aumentar subitamente na ordem dos dez milhões, e a de Portugal ficar reduzida a zero. Não exageremos, pois por lá ainda há uns 100 ou 200 mil que andam contentes da vida, ora porque fazem parte do elenco do grande saque nacional, ou porque são teimosos e parvinhos, e já lhes custa ir até à aldeia vizinha, quanto mais até ao outro lado do mundo.
Mas a convicção daquele jovem cidadão do mundo que nunca foi além de Badajoz ou com sorte passou um mês com os primos em Istres, na França, é a mesma de muitos portugueses que só ouviram falar de Macau, e pensam que isto é e sempre foi uma maravilha, e que quem vem para cá ou passou aqui muitos anos e mais tarde regressou a Portugal "teve cunha", e eles "se quisessem também tinham", mas são "gente séria", e "trabalhadora", que "não acredita em contos da carochinha". Imagino como devem ter sofrido alguns dos ex-residentes de Macau que optaram pela integração, e foram obrigados a aturar um certo tipo de burgessos e sopeiras, que primeiro enchem-no de perguntas do tipo "como é que era lá em Macau?", e mesmo que o entrevistado produza um relato fiel da vida na agora RAEM, arrisca-se a que lhe cortem na casaca - sempre pelas costas, claro - e mais cedo ou mais tarde começam a tratá-lo entre eles pela alcunha "não-sei-quê de Macau", ou "não-sei-quantas de Macau". O melhor mesmo é exagerar, ou contar histórias mirabolantes e mentir com os dentes todos. Se vai dar ao mesmo, que diferença faz?
Mas para quem tem de Macau a imagem que lhes foi transmitida por aqueles que passaram pelo território há vinte anos, saiba que isso é o mesmo que ter um globo terrestre ou um "mapa mundi" onde ainda se podem ver a Checoslováquia e a União Soviética. Muita coisa mudou desde o tempo em que chegavam aqui os "dândis" em comissão de serviço, com casa paga, motorista, emprego garantido para a mulher que se juntaria alguns meses depois, fosse esse o caso, e bilhetes de borla para Portugal pelo menos uma vez por ano. Se foi um dos filhos destes "quadros", que passou aqui parte da adolescência e depois de ir para a Universidade nunca mais pôs cá os pés a descrever Macau, ainda pior - nem toda a juventude "tinha mil patacas para gastar ao fim-de-semana", vinte contos na moeda antiga, que nos anos 90 era bastante dinheiro. Para esses o exílio foi um carrossel, um brinquedo, mas pouco importa se foi em Macau ou noutro sítio qualquer.
Portanto aqui vão umas emendas aos inúmeros dogmas que foram criados sobre a vida dos portugueses e outros expatriados em Macau, e que para quem não acompanhou a evolução da nova realidade, continuam actuais. Assim permitam-me que vos corrija cada vez que depois de "vocês em Macau" se siga uma ideia feita que não tem nada a ver com a actualidade; deixem-me que vos ofereça um atlas actualizado, com as novas repúblicas da ex-URSS e da ex-Jugoslávia incluídas, bem como checos e eslovacos cada um no seu cantinho, onde estão muito bem.
"Vocês em Macau" têm facilidade em arranjar emprego, sendo portugueses.
Já foi assim, mas vai sendo cada vez menos verdade que a nacionalidade portuguesa é meio caminho andado para garantir um emprego em Macau. Antes de 1999 bastava ser cidadão nacional português e uma declaração de que residia no território há mais de três meses confirmada por duas testemunhas para se obter o BIR, mas hoje em dia não só os critérios são mais rígidos, mas há também uma demora processual na autorização da residência que ninguém consegue explicar, e nem as autoridades justificam - é um mistério.
"Vocês em Macau" não se pode dizer exactamente que "trabalham", quer dizer, "vão ao emprego"...
Essa é talvez uma das maiores diferenças em relação ao período da administração portuguesa. Trabalha-se, sim, e quem está no sector privado nem pense "encostar-se à sombra da bananeira". Na hora de distribuir as atribuições, os portugueses não são menos que os outros.
"Vocês em Macau" têm como que "um desconto", ao contrário dos chineses ou de outros estrangeiros.
Tal como na presunção anterior a esta, nada disso. Quem está a contrato e "pisa na bola" vai parar ao olho da rua com a mesma facilidade, seja ele português, chinês, italiano ou outro qualquer. Chefes chatinhos como aí também há por estas bandas, com a agravante de ainda precisarmos de atender ao aspecto cultural, e para quem não domina a língua, pior ainda.
"Vocês em Macau" ganham bem...em "pataquinhas".
O mito da árvore das patacas é uma coisa do passado. Essa proverbial árvore, se realmente existiu , já há muito que secou; é verdade que se ganha melhor que em Portugal para as mesmas profissões , se fizermos o câmbio, mas as despesas são muito mais que no passado. A habitação, por exemplo, tem um peso na ordem dos 30-40% da despesa total, ou mais para quem opta por viver sozinho ou dividir a renda por menos pessoas. Quem tem casa própria ou atribuida pela empresa onde trabalha está mais à vontade, mas não deixa de sentir a subida galopante da inflação em muitos dos bens de primeira necessidade.
"Vocês em Macau" têm uma vidinha tranquila. É tudo perto.
Sim, de facto é possível a muitos (como eu próprio) deslocar-se a pé para o emprego, apesar de já ter sido mais agradável, quando não era inevitável andar aos encontrões e aos empurrões, já para não falar do calor e da humidade. Para quem precisa de apanhar transporte ou conduzir, as distâncias também não são as mesmas do que entre Lisboa e a Margem Sul, mas a qualidade do serviço de transportes deteriorou-se, e o trânsito passou a ser um dos problemas que demoram a resolver.
"Vocês em Macau" não precisam de se preocupar com a questão da segurança, dos assaltos...
Apesar dos números da criminalidade terem vindo a aumentar, ainda é possível andar a qualquer hora e em qualquer sítio sem recear os assaltos, pois aqui não existem bairros de lata, ou "problemáticos", como existem em Portugal. No entanto começam a surgir certas preocupações com algumas liberdades que em Portugal são praticamente "intocáveis", casos da liberdade de expressão, de associação, de opinião, e mesmo os critérios usados no mecanismo do despedimento começam a deixar para segundo plano o factor da "justa causa". Ah sim, e as penas pelos delitos relacionados com droga são muito mais pesadas que em Portugal - aqui não há lugar a certas "brincadeiras".
"Vocês em Macau" têm os casinos, que resolvem todos os problemas de fundo, enquanto aqui os políticos são uns aldrabões e não mexem um dedo.
Os casinos são uma fonte de receitas que muitas economias invejam, sem dúvida, especialmente as micro-economias, como é o caso de Macau. O problema é que não se sabe muito bem por onde andam essas receitas, que batem recordes atrás de recordes, e de como não estão a ser usadas para resolver problemas de longa data que têm vindo a agravar-se cada vez mais. Penso que isto já diz tudo quanto à qualidade dos políticos.
"Vocês em Macau" têm uma data de países à volta, praias paradisíacas, ilhas de sonho...é só passear!
É verdade, e é muito mais fácil a alguém ir passar um fim-de-semana prolongado à Tailândia ou às Filipinas do que a um português fazer o mesmo em Bruxelas ou Amesterdão, que ficarão mais ou menos à mesma distância de avião. E é muito mais barato, também. Mesmo assim não se queixem, pois se vivem no litoral, estão a meia-hora de carro de qualquer praia decente, enquanto para nós é necessário apanhar um avião.
"Vocês em Macau" agora queixam-se tanto...então o que estão ainda aí a fazer?
Parece uma provocação, ou uma pergunta parva, mas é pertinente. Há os que se fartaram e se foram embora, há os que não gostam mas não têm outra escolha porque em Portugal têm as portas fechadas, e há os que mesmo tendo a opção de regressar ou não, criaram aqui raízes, casaram com pessoas de cá, tiveram filhos e fazem aqui a sua vida. E para esses "queixar-se" quando as coisas correm mal é o mesmo que toda a gente faz quando quer o melhor para a si e para os seus. Esclarecidos?
Mas melhor que ouvir falar, e ainda por cima confiar em testemunhos que nada têm ver com o Macau do presente, era vir cá ver como isto é. Se não vos dá jeito, se é longe, caro, não vos interessa, ou não conhecem aqui ninguém e portanto acham que não vale a pena, paciência, só que antes de afirmarm com essa dose de certeza que aqui é uma espécie de "mundo do faz-de-conta", o melhor é informarem-se primeiro. Ouviram, ó "vocês em Portugal"?
Provedor do leitor
Recebi de um leitor anónimo um comentário relativamente a um artigo que tem já mais de dois anos: A Tuxa Separou-se, de 3 de Abril de 2012, pouco depois do meu regresso do "lost weekend" que teve início em Agosto de 2011. A notícia diz respeito a uma bicha louca que à boleia da legalização das uniões civis entre as pessoas do mesmo sexo resolveu casar-se, e meses depois pediu o divórcio, alegando que o marido "já não era o mesmo", e que "lhe batia", mais precisamente "dando-lhe com as texanas na cara. Na altura apontei para o ridículo da situação, e para o facto do casamento "gay" ser propício a que situações desta natureza fossem cada vez mais comuns, e que não faltaria quem com sede de mediatismo se sujeitasse a cenas humilhantes como esta. Mas de volta ao comentário, este reza assim:
És um otário preconceituoso, lá porque estes atrasados mentais façam este circo não quer dizer que todos os gays levem por tabela, o facto deles se casarem afecta-te alguma coisa? vais ao casamento deles? Provavelmente nem te queriam lá. Deixa de ser quadrado e respeita as diferenças e principalmente os direitos "ditos" de todos. Sai do poço!
Em primeiro lugar obrigado pelo seu contributo, e admiro a frontalidade com que inicia o seu comentário, com um "otário preconceituoso" - retribuo a gentileza em dobro. Só é pena que a frontalidade fique por aí, e que mais à frente escreva "o facto deles de casarem" em vez "o facto de nós nos casarmos", e "vais ao casamento deles" em vez de "vais ao nosso casamento". Quer dizer, por uma questão de coerência podia ter-se mantido no papel de larilas indignado, pois a prática ensinou-me que as pessoas tolerantes aceitam quer a opinião de quem se opõe a algo fracturante como é isto do casamento "gay", como daqueles que a apoiam, independente da sua própria opinião. Mas adiante que se faz tarde.
Já fui contra ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, sim, admito, mas hoje coloco-me numa posição que tecnicamente se define por "nas tintas". Ao contrário dos que se opunham por questões de moral ou de ética, que estranhamente abandonaram a luta (o que se torna legal hoje pode-se muito bem ilegalizar outra vez amanhã), eu não tenho receio de Deus fique zangado ou que a Virgem Maria venha revelar um quarto segredo, que seria "deveis evitar a rabetice, e desafiar e elasticidade do orifício destinado à evacuação através da acção semelhante à de tentar guarnecer uma tripa de porco com um salpicão" - a virgem falava desta forma tão vernacular a ambígua aos pastorinhos, e estes, apesar de serem crianças que frequentavam o ensino primário (ou nenhum, de todo), entendiam. O que me aborrece é a própria instituição do casamento ser metida ao barulho nisto da causa da emancipação "gay".
Como dizia mais em cima, já fui mais contra a união civil entre homossexuais. É uma daquelas coisas que primeiro estranha-se, depois entranha-se, como a cola do Pessoa. Desde sempre que os homossexuais foram oprimidos, perseguidos, descriminados, sujeitos a humilhações, desde tortura, electro-choques e violações em grupo por parte de indivíduos que se dizem "heterossexuais", mas que perante estes "desnaturados", encontravam uma forma de arrebitar a alheira para lhes "ensinar uma lição" - pois, pois, a gente acredita. Os próprios criacionistas, aqueles que acreditam que o homem é feito do barro e a mulher de uma costela retirada do boneco de barro, têm entre eles defensores da teoria de que a verdadeira razão pela qual Caím matou Abel foi por este se ter recusado a fazer de carruagem da frente quando o primeiro queria brincar aos comboizinhos, e que quando Caím puxasse os caracóis loirinhos do irmão, ele gritaria "tui! tui!".
Mas depois de séculos de homossexuais queimados na fogueira, pregados na cruz, arremessados em valetas cheios até a cima de sémen alheio e lobotomizados ao ponto de lhes restar apenas um terço do córtex cerebral, eis que obtêm o devido reconhecimento. Em qualquer país minimamente civilizado são aceites pelos restantes, contando que não precisem de beber pelo mesmo lado do copo que eles, e as campanhas de saúde pública recomendam que "usem o preservativo", como se fazia no passado com os marinheiros sifilíticos, esses grandes badalhocos. Agora isto do casamento, para quê? Eu sempre pensei que os homossexuais se divertiam muito mais sem a nem sempre consensual vertente da monogamia imposta aos "hetero" pela instituição do casamento. Afinal também eles queriam ser tão miseráveis como nós. Tentámos avisá-los, levantando uma barreira que eles entenderam como preconceito, mas era apenas para poupá-los. Não entenderam, paciência.
O que esta instituição do casamento representa é, na prática, um "passe" para a badalhoquice e para a pouca vergonha. Até no Islão, que ninguém gosta de ver usado como exemplo, "tudo é permitido na santidade do casamento". Repare-se no uso das expressões "tudo é permitido" e "santidade" na mesma frase, uma contradição em termos. É uma licença para procriar, se quiserem. Uma mulher que goste muito de crianças e diga "quero ter filhos" é recebida pelos pais e outrros familiares com um "o quê???", mas se corrige para "quero casar e ter filhos" sente-se na sala o vendaval causado pelos suspiros de alívio. Uma mulher que queira ter bebés sem que isso implique precisar de aturar um gajo que deixa as meias no chão, cabelos no ralo da banheira, ressone e encha-a de beijocas de manhã com a boca a cheirar a retrete pública é tida com uma "devassa", uma "perdida", que anda aí pelas esquinas a esfregar-se nos homens até que um deles a engravide. Para os homens este preconceito funciona um pouco como a fava do bolo rei: - "se engravidou a menina, "tem que casar com ela?", diz o paladino da moral e dos bons costumes; - "mas porquê?", retorque o apreciador de uma boa queca, mas com reservas. Não existe uma resposta para esta pergunta, e fica à imaginação de cada um. O que eu penso? Sei lá...se não casarem o miúdo nasce sem orelhas?
Mas calma lá, que há aquela coisa do regime de bens, das partilhas, das heranças e de todas essas regalias que os casais têm, e que os homossexuais usaram como razão oficial para todo o aquele chinfrim. Ora essa, se é "protecção legal" que querem, podem sempre celebrar um contrato e depositá-lo num notário, ou comprar um seguro. E nem era isso que se lia nos cartazes durante as manifestações a favor do casamento "gay"; o que se lia era "eu amo quem eu quiser", e viam-se os tipos à beijocada cada vez que deparavam com uma câmara de televisão, mesmo que não lhes apetecesse por aí além. Quer dizer, estes tipos são na realidade muito corajosos, ou então o pináculo na evolução da espécie do "amante", que quer submeter o seu amor ao supremo teste do casamento - e eu que sempre pensei que a vantagem da "promiscuidade" de que tantas vezes acusam os casais homossexuais era nunca precisar de cair na rotina. Ter o poder de dormir com quem quiser sem precisar de dar satisfações a ninguém e exigir " os mesmos direitos" das pessoas casadas é como ser cidadão de Roma e exigir "os mesmos direitos" que os cristãos, e ser atirado aos leões no circo.
E isto leva-me à questão principal, o amor, ou "o direito de se amar quem quiser". Já nem falo da poligamia, que é permitida em alguns países por "razões culturais" (estão a ver como é fácil encontrar uma boa desculpa?), mas e o incesto? Porque podem dois homens ou duas mulheres casarem um com o outro mas o mesmo direito é negado a quem o queira fazer com a mãe/pai/filho/tia/prima? Não que eu esteja a defender o incesto, e apesar de invejar quem teve esse tipo de fantasia, nunca tive uma prima atraente, mas também nem toda a gente que defende o casamento "gay" é necessariamente homossexual, e o princípio subjacente é o mesmo: amam-se. Mas que horror, a consaguinidade pode levar ao nascimento de crianças com deficiências graves! E depois? A cossexualidade leva ao nascimento de crianças nenhumas, e perante esse dilema, adoptam, que é outra das exigências dos casais "gay", ainda em fase de estudo. Penso naquele casal alemão que se amava mais que tudo, mas viu o seu conto de fadas diluir-se depois de descobrir que eram filhos do mesmo pai, e foram impedidos de casar. E aqui o "amor" valeu de alguma coisa na hora de se submeterem à censura da sociedade?
Mas como já disse, já fui contra o casamento "gay", mas não fiz activismo no sentido de o imperdir, não andei por aí com crucifixos ou a cuspir no chão com cara de rufia cada vez que dava de caras com duas florzinhas de mão dada na rua. Sim, os casais "normais" (notem como os próprios partidários do casamento "gay" chamam "normais" aos casais mistos) também se divorciam, o que me leva a pensar se no momento em que se agridem com as panelas lá em casa e chamam nomes à mãe um do outro não se recordam mais daquele dia lindo, em que ela de véu e grinalda, e ele de paletó, saíam da igreja abraçados debaixo da chuva de trinca de arroz dos convidados a caminho da lua-de-mel. Só que a imprensa - esses homófobos sem vergonha - prefere dar mais destaque à Tuxa e ao Fernando, que "lhe deu com as texanas na cara" depois de ter bebido umas Tagus a mais. Vá pedir-lhes satisfações, e guarde para eles esses mimos como "otário preconceituoso" que resvalam na dura carapaça da minha indiferença. Passar bem.
Morte macaca...e porca
Um agricultor de 66 anos foi morto por um touro e depois parcialmente comido por porcos, uma notícia que só poderia ter o selo de qualidade deste tipo de notícias que é dado pelo Correio da Manhã. O homem, de nome Eduardo, proprietário de um terreno junto do cemitério de Queluz, foi na manhã de sexta-feira alimentar o seu touro, "que criou desde vitelo", mas foi subitamente agredido pelo animal e viria a falecer. E ali jazeu inerte, até que uma vara de porcos deu pela sua presença, e comeu parte do cadáver, nomeadamente "as partes inferiores". A PSP ocorreu mais tarde ao local, onde já só encontrou o corpo sem vida e ligeiramente depenicado. A família ficou em choque com o incidente, e diz que Eduardo "sofria de cancro da garganta há alguns anos", de que vinha, bem ou mal, sobrevivendo, e que "é irónico que tenha encontrado a morte desta forma". E é irónico que além do touro que ajudou a crescer o tenha morto antes do cancro que o apoquentava, e que mesmo assim os porcos tenham tido por ele apetite, que tudo se tenha passado perto do cemitério. Bem, o que dizer? Que descanse em paz.
Porto empata na apresentação
O FC Porto apresentou-se ontem aos seus sócios no Estádio do Dragão frente aos franceses do St. Etienne, partida que terminou empatada sem golos. O novo treinador Julen Lopetegui apresentou um onze inicial alternativo, onde deixou de fora muitos dos que farão certamente parte da equipa-tipo, e onde se incluiam os reforços Oliver Torres, Rúben Neves e Sami. No segundo tempo entraram os nomes de "peso", como Quintero, Adrian Lopez, Brahimi ou Casemiro, mas nem isso trouxe mais acutilência ao jogo dos azuis-e-brancos, que fizeram uma exibição pálida, e só evitaram a derrota graças ao guardião Fabiano, que esteve imperial entre os postes. De recordar que o FC Porto entre na época 2014/2015 "a doer" com a discussão do "play-off" de acesso à fase de grupos da Liga dos Campeões.
domingo, 27 de julho de 2014
Que vergonha de táxis
Um grupo de expatriados, portugueses e não só, e a com a participação (cada vez menos tímida) de alguns locais mantém desde o início deste mês um grupo na rede social Facebook a que deu o nome de "Macau Taxi Shame" - em inglês, que assim quase a toda a gente entende. Inicialmente com duas centenas de membros, o grupo conta actualmente com mais de 1300 - um crescimento notável. O motivo desta popularidade é contudo desagradável, pois aqui a finalidade é denunciar taxistas que se pautem por uma conduta deplorável, um problema com que Macau se tem debatido nos últimos anos. Entre os que se recusam a apanhar passageiros, ou que tentam negociar o preço da viagem, cobrando dez ou vinte vezes o preço de uma corrida normal medida pelo taxímetro, há de tudo um pouco neste sortido de comportamentos reprováveis que pouco dignificam a profissão de taxista. A espaços publicam-se algumas histórias de profissionais que se destacam pelo seu comportamento prestável ou pela sua simpatia, tão raros que não redimem os seus colegas que actuam à margem da lei.
Admiro a coragem dos participantes deste fórum do Facebook, que não se inibem de registar em fotografia ou em vídeo alguns episódios que revela o desplante de alguns taxistas, que ignoram por completo a sua função de trasportar quem solicite os seus serviços, seja ele quem for. Lamentavelmente esta coragem é superada pela insolência de muitos destes "piratas" de carro preto, que pouco se importam que os denunciem, pois muitos têm já sistemazido um plano que lhes permite transportar o menor número de passageiros com um lucro muito superior ao que teriam caso passassem o dia a apanhar os passageiros que lhes estendessem a mão. E fazendo de advogado do Diabo por um instante, entende-se que dois ou três passageiros que paguem 400 ou 500 patacas bem cada, é mais convidativo que 20 passageiros que paguem 30 ou 40 por uma tarifa normal - e fica-se com o dia ganho. Mesmo os mais honestos aceitam gratificações de hotéis, saunas e outros locais de entretenimento para levarem lá turistas "indecisos", pelo menos estes não escolhem, e se ganham um bónus por isso, sorte e sua. Assim passa, até se admite.
O que não se admite é que se comportem como mafiosos, o que acaba por acontecer a maior parte das vezes. Para os turistas do continente, é o que sabe, puxam de uma nota de quinhentos quase por impulso mal chegam ao terminal do Porto Marítimo ou das Portas do Cerco. Para quem não conhece Macau ou conhece mal, o que importa é chegar ao destino, e não se olham a despesas: é um misto de ostentação e de elevado pragmatismo, só que um bocado parvo. Mesmo os turistas mais incautos e menos endinheirados arriscam-se a ser "comidos", levados durante meia-hora por curvas e desvios que se calhar se faziam em cinco minutos praticamente numa linha recta. Se lhes serve de consolação, fazem logo à chegada um pequeno "tour" da cidade. Os residentes ficam indignados quando lhes são pedidas 200 patacas por uma corrida que sabem à partida ficar por menos de 50, e claro que se não se tratar de um caso de vida ou de morte, recusam essa espécie de extorsão, e não lhes resta senão ficar a dizer mal da sorte. No caso de urgência, paga-se, que remédio, e apelar à consciência do taxista será tempo perdido - a consciência diluiu-se na ganância.
O Governo, através da Direcção dos Serviços de Tráfico (DST), tem consciência do problema, garante que há fiscalização, mas esta não só é ineficaz como os próprios taxistas consideram que "compensa" ser multado uma ou outra vez. Quando o crime compensa, é sinal que chegámos ao faroeste. As razões deste estado de coisas dariam não só para um dossiê, mas para um enciclopédia em vinte fascículos, dedicados ao preço das licenças dos táxis, da origem obscura de alguns dos taxistas, aos padrões de comportamento variáveis conforme cada turno, e certamente o mais fascinante de todos, essa interpretação tão particular de liberalismo que vigora em Macau, onde impera receio de que uma moderação de certas actividades económicas abra as portas ao comunismo, e esse venha por aí a todo o vapor. Quando se resolverem a meter ordem em tudo isto, nem precisam de uma consulta pública ou de um estudo muito elaborado: basta irem à página do "Macau Taxi Driver Shame", no Facebook.
Ricciardo majéstico entre os magiares
O australiano Daniel Ricciardo venceu o GP da Hungria, realizado esta tarde no circuito de Hungaroring. Foi a segunda vitória da temporada para o piloto da Red Bull, depois do GP do Canadá a 8 de Junho, e também a segunda que não terminou com um dos pilotos da Mercedes no 1º lugar. Ricciardo beneficiou de um problema mecânico no Mercedes de Nico Rosberg na 12ª volta, atrasando o piloto alemão, que voltou a conquistar a "pole-position". O Ferrari de Fernando Alonso ficou em segundo, graças a uma estratégia que o levou a parar nas boxes apenas duas vezes, tal como Lewis Hamilton, que foi terceiro à frente de Rosberg, mas partiu novamente de trás da grelha de partida, depois de mais uma qualificação muito acidentada. Filipe Massa foi desta vez o melhor dos Williams-Mercedes, terminando na quinta posição, enquanto Valtteri Bottas não foi além do oitavo. Pelo meio ficaram o Ferrari de Kimi Raikkonen, que tem feito de "sombra" a Alonso na marca do "cavalinho rampante", e o tetra-campeão mundial Sebastian Vettel, que este ano não tem conseguido tirar do seu Red Bull o mesmo proveito que nos anos anteriores, e parece mais que certo ter de passar o ceptro de melhor do mundo a outro piloto. Jean Éric-Vergne, em Toro Rosso, e Jenson Button em McLaren terminaram nos dois últimos lugares entre os pontuáveis. Após a etapa húngara, Rosberg continua na liderança do mundial de pilotos com 202 pontos, agora mais onze que Hamilton, que soma 191. Mais longe está Ricciardo, com 131, seguido de Alonso com 115, Bottas com 95 e Vettel com 88. Nos construtores o domínio da Mercedes continua incontestado, somando 393 pontos contra os 219 da Red Bull, 142 da Ferrari e 135 da Williams. O mundial de F1 faz agora uma pequena pausa de Verão, regressando a 24 de Agosto com a realização do GP da Bélgica, no mítico circuito de Spa-Francochamps.
O mito da Islamização
Gente (visivelmente) ignorante e desinformada.
Para alguém que como eu não é religioso, ou como muitos outros cidadãos comuns que têm prioridades mais mundanas como pagar as contas, educar os filhos e evitar chatices, faz confusão que se fale, leia, e oiça cada vez mais falar de uma tal de "Islamização". Tanto na net como em alguns media - felizmente poucos, pois aí ainda impera o bom senso - é cada vez mais frequente encontrar opiniões alarmistas no sentido de que a Europa começa a perder a sua identidade, e que um dos responsáveis por essa descaracterização daquele que é chamado "o berço da civilização moderna" é o crescente número de imigrantes oriundos de países onde se pratica a fé muçulmana, do Islão. Alguns destes profetas da desgraça apontam para uma iminente imposição da cultura islâmica nem território europeu, bem como para o risco dos seus cidadãos cederem perante algums imposições dessa cultura e perder assim direitos, liberdades e garantias que lhe são actualmente consagrados. Mas antes que as mulheres comecem todas a usar véu e os homens obrigados a usar barba comprida e ir orar cinco vezes por dia à mesquita, vamos então saber o porquê da difusão desta forma de xenofobia, e quem poderá tirar dele dividendos.
E isto também é propaganda do Hamas?
O estado de Israel, por exemplo, tem razões mais que suficientes para temer que da Europa se deixe de sentir a actual indiferença política para a questão dos territórios palestinianos ocupados. Neste mapa em cima, que não é nenhuma invenção, ao contrário da Islamização, como já vamos ver a seguir, podemos ver a evolução do território de Israel desde 1946 até recentemente. Em 1947, na ressaca do Holocausto que matou dez milhões de judeus europeus (e não só), as Nações Unidas votaram uma resolução no sentido de criar um estado judaico independente e livre na zona do Protectorado Britânico da Palestina e da Cisjordânia. Os países árabes manifestaram de imediato a sua oposição, ficando sem entender o porquê de serem eles a pagar por uma agressão cometida pelos nazis, e não a Alemanha, ou eventualmente a Áustria. O que as Nações Unidas não determinaram foi a expansão do território de Israel, que tem sido feita nos últimos 60 anos através da criação de colonatos, criados e mantidos pelo uso da força e com o apoio dos Estados Unidos, apoio esse que tem causado embaraços diversos à diplomacia norte-americana. Gostava de deixar claro que isto é apenas uma mera constatação, e não uma posição anti-Israel ou anti-semita, nem qualquer demonstração de apoio à Palestina, ao Hamas, ao Hezbollah ou aos governos que incluem nos seus programas políticos "a destruição do estado de Israel". Tudo isso é paralelo ao tema aqui discutido, e reitero desde já que sou contra qualquer forma de violência, especialmente motivada por questões étnicas ou religiosas.
Temam o pior! Escondam-se debaixo da cama! Vem aí a "Eurábia"!
Mas Israel, apesar da evidente preocupação com a possibilidade da vizinhança hostil que actualmente tem se alastrar por dentro das fronteiras da Europa, é uma realidade distante que pouco ou nada tem a ver com os próprios europeus. O que os europeus temem é um conceito que tem servido de tema de campanha a forças políticas conotadas com o nacionalismo e a extrema-direita em países como a Holanda e a França, onde se verifica o maior aumento no número de seguidores do Islão: a "Eurábia". O mapa em cima mostra as áreas de maioria muçulmana dentro das fronteiras do espaço europeu, e como se pode ver, a possibilidade de uma Europa habitada por uma maioria de muçulmanos é ainda uma realidade distante. Ou será mesmo assim?
Ora aqui está a "escalada" do Islão de que tanto se fala.
Aqui temos a evolução da população islâmica na Europa, e como se pode verificar, o seu aumento tem sido significativo, mas longe de se poder alinhar na teoria da "invasão" que fundamenta essa outra mais ampla, a Islamização. Portanto o que temos é uma projecção para quem em 2030 haja uma população de menos 27 milhões de não-muçulmanos e de mais 28 milhões de muçulmanos relativamente a 1990. Interessante esta coincidência, e se estes números representassem exactamente a mesma população, sem que nesses 40 anos tivesse morrido ou nascido ninguém, podia-se falar de "conversão à fé islâmica". Mas não é disso que se trata, pois o crescimento total da população europeia nos últimos 20 anos deve-se em 85% aos imigrantes - os muçulmanos e os outros. Os partidários do perigo que representa esta hipotética "islamização" apresentam números absurdos, que dão conta de que "um em cada três bebés nascidos em França são muçulmanos", ou que "a população da Holanda será 50% muçulmana em 2030". Falso, falso, e falso. A França tem actualmente uma população entre os 6 e 7% de muçulmanos, a Holanda entre os 7 e os 8%, e seguindo a actual tendência de crescimento, nunca será até 2050 que se chegará aos 10%. Claro que para quem tem uma agenda a curto prazo, convém exagerar um pouco, mas isso leva-me a fazer a seguinte pergunta: se querem preservar a identidade, como pensam fazê-lo com taxas de natalidade tão baixas? Querem uma Europa com igrejas e catedrais sem ninguém que as frequente, e com liberdades e direitos sem ninguém que usufrua deles?
A sinagoga é mais abaixo, ao fim da rua.
Mas não se pense que quero com isto dizer que apenas pelo facto de a maioria dos cidadãos nascidos actualmente no continente europeu serem filhos de muçulmanos, que a Europa se tenha que resignar a tornar-se um dia num bastião do Islão. Nada disso. No espaço europeu a liberdade de culto é um direito inalienável, e os seus cidadãos são livres de escolher a sua confissão religiosa, ou de optar por não ter nenhuma. Tanto os filhos dos muçulmanos têm a liberdade de escolher outra religião, e a teoria de que serão apedrejados pelo crime de apostasia dentro do espaço europeu é uma falsa questão, em que apenas os menos informados acreditam. O problema é que as segundas e terceiras gerações de imigrantes oriundos de países islâmicos optam por seguir a via do Islão, e ainda de forma mais radical que os seus pais e avós. Sendo-lhes garantido esse direito por lei, nas mesmas condições em que um europeu filho de pais cristãos pode optar pela conversão ao budismo, ao hinduísmo, ao sexo tântrico e seguir uma daquelas seitas oportunistas como o IURD ou as Testemunhas de Jeová. A causa da rejeição aos princípios da liberdade de culto prende-se sobretudo com a rejeição da sua religião original, ou da religião dos seus pais. Um muçulmano que imigre para a Europa e faça o que lhe compete, ou seja, eduque o seu filho pelos princípios da sua religião, não tem nenhum poder especial para impedir o seu filho de mudar de religião, ou abdicar dos seus preceitos que menos se coadunam com a realidade em que está inserido. Manifestações como aquela que vemos em cima, onde se vê uma cruz suástica pintada numa mesquita em Castres, no sul de França, juntamente com "slogans" do tipo "sieg heil" ou "white power" devem ser no sentido de promover a integração dos imigrantes. Fosse eu o imã daquela mesquita, e chamava o rabi de Castres (se o há) e dizia-lhe: "olha deixaram-te um recado, mas importas-te de dar a tua morada correcta da próxima vez?".
Allah è il più grande, mamma mia!
Portanto pode-se concluir que na perspectiva de serem rejeitados, excluídos, descriminados e guetizados pelos seus compatriotas, os muçulmanos de segunda e terceira geração têm a tendência para o regresso às suas raízes, e seguir os ensinamentos do Corão e dos imãs das várias mesquitas que se encontram espalhadas pela Europa. A maior de todas é esta na imagem, imponente sem dúvida. Mas onde fica? Só pode ser na França ou na Holanda, ou em alternativa na Inglaterra, onde muitas das ex-colónias do império britânico são actualmente países islâmicos. Não, de facto a maior mesquita da Europa fica localizada em Roma, na Itália. Surpreendidos? Sim, porque a Itália não é sequer uma das maiores preocupações dos que fomentam a paranóia da islamização. Os italianos parecem mais preocupados com Cecile Kyenge, uma mulher negra que desempenhou a pasta da integração do governo de Enrico Letta, e que apesar de ser católica-romana, tem uma tez muito mais escura que Cicciolina, essa sim, um exemplo de pureza dentro da boa tradição europeia. Ou ainda com Mario Balotelli, que apesar do nome, tem uma fisionomia semelhante à de uma "pizza" que alguém esqueceu no forno bem além do período ideal de cozedura. A não ser quando realiza um feito muito patriótico, como quando marcou dois golos contra a Alemanha no Euro 2012, ou deu a (única) vitória aos "azzurri" no mundial do Brasil deste ano, ao apontar o golo decisivo frente aos ingleses. Aí sim, é tão italiano como o Sílvio Berlusconi.
A qualidade dos traços terá sido sem dúvida a razão da publicação dos desenhos...
Mas vamos levar isto a sério: é um facto que o Islão é uma religião barbárica, intolerante e que pouco tem a ver com os valores humanistas que são característicos da cidadania europeia. Claro, nem eu gostava de ser obrigado a seguir qualquer prática religiosa, ou seguir códigos que contradizem a minha afiliação religiosa - que é "nenhuma". E como exemplos acabados disso mesmo temos a polémica dos "cartoons" do profeta Maomé, publicados pelo jornal dinamarquês Jylland-Post, e mesmo à revelia da mais elementar ética ou com o respeito pela confissão religiosa alheia em mente, e escudando-se no direito à liberdade de expressão, causou a ira dos seguidores do Islão, que prometeram retaliar, e boicotar os produtos dinamarqueses. Para estas contas pouco ou nada que importa que a maioria dos protestos tenham sido mais acentuados em países islâmicos fora do espaço europeu. Mas pronto, o que dizer? Rendo-me, e de facto o Islão tem um problema com a liberdade de expressão na sua forma plena, aquela que vigora na Europa. Tememos que a tal "Islamização" traga de volta a opressão e a censura que a Inquisição praticava até há pouco mais de 200 anos. Ou será que...
Perdoa-os, ó pai, que eles não sabem o que fazem. Ribbit!
Ah sim, isto. Pois é, aqui está a excepção, não a que confirma a regra, mas a que deita a regra ao chão, pisa e cospe-lhe em cima. Esta escultura, exibida no museu de Balzano, em Itália, foi censurada em 2008 - muito mais recentemente que há 100 ou 200 anos - por ser considerada "blasfema". Se de um lado temos o profeta Maomé representado como terrorista e pedófilo, aqui insulta-se um dos maiores símbolos do cristianismo, religião da maioria dos europeus: o S. Sapo, que com uma caneca de cerveja numa mão, e um ovo cozido na outra, sacrificou-se pelos nossos pecados. Sim, porque só alguém completamente idiota acredita que os romanos inauguraram a prática da crucificação com Jesus Cristo, e depois disso ficaram por aí. A cruz era uma pena aplicada a vários prisioneiros, e já agora porque não adora a igreja os dois ladrões que faziam companhia a Jesus na cruz?
Oink, oink! Olhem que só que "haram" eu sou, ó moirama.
E por falar em idiotas, aqui está Geert Wilders, um deputado do parlamento holandês considerado um exemplo de "coragem" devido às suas provocações constantes ao Islão e a sua declarada intolerância com os estrangeiros em geral. A restante extrema-direita europeia inibe-se de expressar a sua adoração por este indivíduo apenas pelo facto de ele gostar de piça, o que fere de morte a campanha contra outro ódio de estimação deste grupo de extremistas: os homossexuais. Wilders foi notícia há alguns anos após ter recebido ameaças de morte, alegadamente da parte de muçulmanos "intolerantes". E isto "apenas" porque escreveu, realizou e produziu um filme de pouco mais de vinte minutos onde descreve os muçulmanos como sendo selvagens e primitivos. Só isso? Quer dizer, a atitude do Ayatollah Khomeini em condenar à morte Salmon Rushdie devido aos versículos satânicos, onde defende a teoria de que o Islão é uma religião satânica é condenável aos nosso olhos de europeus "tolerantes" e amantes da liberdade de expressão. Por isso é que José Saramago se devia dar por feliz com a simples censura do seu livro "O Evangelho segundo Jesus Cristo", onde apresenta uma perspectiva do martírio de Jesus assente em passagens do evangelho. Podia ser pior, de facto. Mas epá, estou aqui a cometer uma traquinice ao publicar uma fotografia de Geert Wilders onde ele aparece numa pose que dá a entender que é um palerma, e com isso estou a tentar desacreditá-lo. Permitam que me retrate.
Bem, talvez seja mesmo um idiota, coitado. Ou então isto é alguma conspiração islamista para o desacreditar, do tipo: "ó Geert, olha a pilinha tesa!", e ele faz logo uma cara de guloso e de chupão.
Holandês condenado pelo homicídio de outro holandês, julgado pela justiça holandesa, e condenado a prisão perpétua, pena que cumpre actualmente num prisão da Holanda.
Mas e quanto a outros casos de intolerância graves e que tiveram um mediatismo que em nada beneficia a tese de que o Islão é uma religião com qualidades que permitam ser bem recebida no contexto cultural europeu? O caso do homicídio de Theo Van Gogh, por exemplo. De facto o sobrinho-neto de Vincent Van Gogh foi assassinado em Novembro de 2004 por um radical islâmico, Mohammed Bouyeri, por causa do filme "Submission", onde se expunha o tratamento cruel reservado às mulheres no Islão. Acontece que Bouyeri era um cidadão holandês de pleno direito, tal como Theo Van Gogh, nascido em Amesterdão de pais marroquinos, e depois de um julgamento justo foi condenado a prisão perpétua. A mensagem aqui subjacente é esta: os crimes, sejam eles cometidos por locais, imigrantes ou seus descendentes, quer por que motivo seja, são punidos por lei. A fobia da "Islamização" não exclui ninguém dos seus deveres como cidadão, nem o isentam do cumprimento das leis. E penso que quanto a isto está tudo dito.
Fora do País Basco, infiéis!
Mas espera lá, o Leo. E o terrorismo islâmico, essa coisa horrível? Sim, horrível é qualquer terrorismo, e o islâmico não mata mais do que os outros. Os islamófobos acenam com os atentados da estação de Atocha, Madrid, em Março de 2004, e de Londres em Julho de 2005 - ambos reivindicados por células terroristas localizadas fora da Europa. Nem me vou estender muito sobre a razão pela qual os "mártires" se sujeitam a dar a sua vida por uma causa, e que normalmente se trata de indivíduos problemáticos e complexados, instrumentalizados com fins políticos e seduzidos pela ideia de que se tornarão "heróis", e que no Paraíso têm à sua espera não-sei-quantas virgens. Agora, alguém me sabe dizer se o terrorismo da ETA e do IRA, que deixaram o continente europeu em sentido durante décadas terá alguma ligação com a Al-Qaeda? E o terrorista Otelo Al-Saraiva bin Carvalho, era salafista ou wahhabista?
Oi! Preferimos perseguir os judeus. Esses pelo menos não se defendem!
Mas de facto existem muitas manifestações contra a Islamização...nos Estados Unidos, que tanto gostamos de fazer troça pela inferioridade que demonstram em matéria de cultura geral e de civismo, mas que aqui tendemos a imitá-los. Na Europa o descontentamento é expressado normalmente por grupos conotados com a extrema-direita, que estavam muito mais tranquilos quando o alvo do seu racismo eram os judeus, comerciantes de natureza pacífica, que não chateia ninguém. Perante uma oposição à altura, é normal que fiquem chateados, e ironia das ironias, juntam-se aos judeus no combate ao inimigo comum.
Não ao Mesquita! Não ao Salvador! Queremos o major Valentim Loureiro!
O que os islamófobos mais seguidistas não conseguem entender nem à força de se lhes abrir a cabeça com um abre-latas, é que estão a ser instrumentalizados pela extrema-direita, como parte de um "lobby" anti-imigração. Sendo os imigrantes chegados de países islâmicos uma maioria e um alvo mais fácil, devido às diferenças culturais e religiosas, os néscios alinham, temendo que o seu estilo de vida esteja em perigo. Em perigo vai estar caso os extremistas levem a melhor, pois aí vão ser obrigados a construír as suas próprias estradas, pontes e edifícios, limpar as próprias casas e cavar as próprias fossas, pois não existirão imigrantes para o fazer. Pelo menos podem depois ir rezar em paz nas suas igrejas sem ter que passar por uma mesquita no caminho. Políticos como Sarkozy colheram os frutos desta ignorância, e foi preciso uma demonstração da sua tremenda incompetência para que finalmente caisse a máscara. Só que parece que a lição ficou por aprender.
Fresco representando o bazar islâmico de Atenas, início do século XIX.
Do que nos estamos a esquecer aqui é que o Islão esteve presente na Europa praticamente desde a sua existência, a partir do século VII da era cristã. A própria península ibérica esteve ocuipada pelos muçulmanos até ao século XIII, o sul de Espanha até ao século XV, e no resto da Europa nunca faltaram exemplos da presença de comunidades islâmicas, mesmo que a proximidade geográfica tenha tido influência. É lógico que um país quanto mais próximo do norte de África ou do Médio Oriente, mais influência do Islão seja aí sentida, e tivemos até ao início do século XX o Império Otomano, que até à sua secularização por Ahmed Atatürk era uma ameaça muito maior que a insignificante vaga de imigração originária de Marrocos ou da própria Turquia de hoje, onde o Islão é praticado numa versão "descafeinada" do original. Acenar com o fantasma da Islamização é uma forma de nos alienarmos dos problemas que realmente afectama a Europa nos dias de hoje: o desemprego, o descontentamento com as políticas comuns, nomeadamente com a política económica da União Europeia, e no topo de tudo isto a competição de mercados onde o trabalho semi-escravo e a produção em massa contradiz todos os princípios de igualdade e liberdade que serviram de fundamento à construção europeia. Esqueçam lá isso dos véus e das mesquitas, e apontem o dedo a quem realmente se está nas tintas para nós, e procura através deste tipo de confrontação étnico-religiosa distrair-nos do combate ao que é essencial.
A este propósito, e sem paternalismo de qualquer natureza, recomendo a leitura do Livro Branco Sobre o Diálogo Intercultural (versão integral em português), publicado em 2008 pelo Conselho da Europa.