quarta-feira, 3 de dezembro de 2014
Quem diria (eles passaram por lá)
Ah, o Festival RTP da Canção, um evento que as novas gerações consideram "brega", ou como se diz na "lango" actual, "pimba". Na verdade praticamente toda a gente considerou o Festival uma "piroseira" durante a juventude, dando-lhes mais tarde uma espécie de nostalgia - talvez derivada da pele mais enrugada, do aparecimento dos primeiros cabelos brancos e da incapacidade de dar uma corrida para apanhar o autocarro sem desatar a tossir feito um tubercoloso. O problema é que nos dias de hoje quem disser que o Festival RTP da Canção "é foleiro" está coberto de razão, independente da sua idade, mas tempos houve em que - pasme-se, isto - o país chegava a parar na hora do concurso, e existisse na época um BetWin ou um Will Hill, seria uma das noites mais agitadas nas bolsas da aposta. Hoje em dia apenas participam cantores médios, medíocres e maus, sem capacidade de entrar no circuito comercial de outro jeito, e eventualmente acabam condenados a cantar em arraiais, festas populares e programas televisivos diurnos de segunda a sexta, com a discografia em ka-7 ("cassete", mas com mais estilo) em "display" nas estações de serviço nas auto-estradas um pouco por esse Portugal de norte a sul.
Mas nem sempre foi assim, e até algures entre os finais dos anos 70 e início dos anos 80 o Festival era uma rampa de lançamento de novos talentos, ou de outros já com experiência, que assim tinham algo especial para juntar ao currículo, obtendo mais tempo no ar nas rádios nacionais, e mais, representariam Portugal no Festival da Eurovisão. Os leitores mais jovens talvez desconheçam este facto, mas até há trinta anos, e talvez até menos, sair de Portugal só queria dizer uma destas três coisas: riqueza, emigração ou qualquer coisa muito especial. Nos tempos do nacional-cançonetismo, cantor que era cantor ia ao Festival; Simone de Oliveira, António Calvário, Paulo de Carvalho, Fernando Tordo, Carlos Mendes, e até Carlos do Carmo, recentemente premiado com um "grammy", fizeram ou consolidaram a sua reputação no Festival - vocês sabem quem eles são, só que talvez os conheçam por "aqueles cotas que cantarolam". Havia ainda a "mascote", um tal Artur Garcia, que foi dos que nunca ganhou quem mais vezes esteve "quase", e nem o facto de não ter ganho o prejudicou em termos de carreira. E à dimensão do concurso nacional, também a Eurovisão produziu estrelas da música mundial, casos dos ABBA, Celine Dion ou Bucks Fizz, dos que ganharam, ou Nana Moskouri, Julio Iglesias ou Cliff Richard, dos que não foram tão felizes - este último ficou duas vezes em 2º lugar.
Mas voltando a Portugal, tivemos artistas que em início de carreira "tentaram" a sua sorte no festival, não foram aí felizes e mais tarde viriam a ter a deusa do sucesso a sorrir-lhes de outra forma. É porque tinham qualidade, afinal. Outros ainda com um nome já feito, mais ou menos famosos, passaram pelo festival numa decisão de carreira que em alguns casos se pode considerar "duvidosa" em termos de gestão. É uma pequena viagem por tudo isto que vos proponho aqui, e garanto que vão ficar supreendidos e dizer: "quem diria...". Sim, também "ele/ela" ou "eles/elas" passaram pelo agora famigerado Festival RTP da Canção. Vou adiantando desde já que a maior parte destas canções são pobrezinhas, e têm apenas o valor de curiosidade. Quem quiser escutá-las segue por sua conta e risco.
João Simão da Silva é um alentejano de Mourão, distrito de Évora, que sob o nome artístico de Marco Paulo vai na sexta década fazendo várias gerações sofrer. As minhas duas avózinhas, entretanto já convertidas em matéria orgânica, sendo esta uma certeza indesmentível (não se esqueçam que sou agnóstico), adoravam este cantor, algo que mais tarde vim a entender melhor como sendo uma daquelas coisas "da idade" - tenho como certo que actualmente Mário Soares é o fã nº 1 de Marco Paulo. Em 1967 participou no Festival RTP da Canção com o tema "Sou tão feliz", que chegou a finalista mas obteve o último lugar entre seis canções, ou seja, a "felicidade" ficou-se pelo título da canção. Foi um ano exigente, com duas meias-finais, e no auge da Guerra Colonial, deu-se preferência ao factor "étnico": Eduardo Nascimento foi vencedor com "O Vento Mudou" e os Duo Ouro Negro ficaram em segundo com "Livro sem Fim". Chegar à final foi já um grande feito, e Marco Paulo regressaria ao festival quinze anos depois com "É o fim do mundo" - não era bem isso, era apenas ele a cantar - e obteve o 11º lugar entre 12 concorrentes. Definitivamente não estava talhado para o Festival RTP da Canção. Ou isso ou alguém teve o bom senso de não o mandar à Eurovisão. Sabe-se lá se aquilo ainda dava em alguma epidemia de extravagantes penteados de permanentes masculinas? Pode ser que não consigam resistir à curiosidade de ver como era Marco Paulo há 47 anos, mas posso adiantar que era a mesma coisa então com 22 anos do que é agora, a pouco mais de um mês de completar 70 primaveras. Ele já nasceu com aquele aspecto, e é assim que vai de frosques qualquer dia.
Agora vou abrir a primeira de duas excepções para falar de uma artista que sairia vencedor pelo menos uma vez. Em 1968 tinhamos este José Cid, aparentemente ainda com os dois olhos (nunca fiquei a saber como perdeu uma das vistas, este Camões da canção nacional, e nem me interessa, senão tinha procurado saber, enfim) e ainda indeciso entre o "rock", o "rock sinfónico" ou a sempre-mesmice do cançonetismo, aparece com "Balada para D. Inês", que temos de admitir, é bastante agradável e original. O problema é que com aquele ar grave e metido naquela fatiota o homem parece o presidente da Sociedade Nacional de Geografia do Panamá. Num ano com concorrência de peso, José Cid terminaria em 3º lugar, atrás de Carlos Mendes, que saíu vencedor com "Verão" (da estação do ano, não do verbo "ver") e de "Fui ter com a Madrugada", tema de Ary dos Santos interpretado por Tonicha, que no pique da "Beatlemania" apareceu vestida de Paul McCartney - faz sentido, uma vez que Ary foi como que um "John Lennon dos festivais", no que toca à escrita das canções. Ai não acreditam? Vejam isto:
Viram? Ah, bem. No entanto José Cid vingava-se em 1980 e levava para a Eurovisão "Um grande, grande amor", que ficou em 7º lugar, a melhor classificação de sempre até 1996. Em 1998 voltaria a vencer com os Alma Lusa, e isto fora os ameaços. É o "senhor festival", o zarolho.
Também em 1968, e classificado logo atrás de José Cid ficou, tchan tchan...Nicolau Breyner! Não é segredo para ninguém que o Nico também canta, e nunca se inibiu de o demonstrar nos programas de humor ao longo da sua já jurássica carreira. A canção chama-se "Pouco Mais", e é uma daquelas "à antiga", com muito mofo, desinteressante e fácil de esquecer. Assim como Marco Paulo, Nicolau é alentejano, mas mais "hardcore", lá do fundo, de Serpa, localidade a que se chegou a canditar à câmara municipal, mas também aí encontrou pela frente um dos Carlos Mendes desta vida. A maior curiosidade deste vídeo, se ousar clicar no "play", prende-se com a barriga, ou neste caso a ausência da mesma. É que numa fase adiantada da sua vida o senhor era anunciado pela sua enorme pança, e alguns minutos depois chegava o resto.
E temos alentejanos a dar com um pau no Festival, e com este fica também representado o distrito de Portalegre em particular, e a raia alentejana em geral. Paco Bandeira, na altura mais conhecido pelos dotes de cançonetista e não tanto pelos casos de violência doméstica em que se tem visto envolvido nos últimos anos, obtém um brilhante segundo lugar em 1972 com "Vamos cantar de pé", que é até um tema bastante jeitoso - pelo menos se compararmos com os restantes neste artigo. E quem impediu o autor de "Ó Elvas, Ó Elvas" (há quem não saiba isto, mas essa canção tem o título "Minha Cidade") de ir ao Reino Unido, mais precisamente à capital escocesa de Edimburgo? Outra vez Carlos Mendes, que vence pela segunda vez, agora com "Festa da vida", um tema muito "flower power", uma moda da época trazida pelo "summer of love" que foi Woodstock três anos antes. Tivesse sido uma cachopa a ganhar, e ali o Paco dava-lhe dois safanões que a metia na linha. Né mêmo compadri? Éi, éi!
Helena Isabel é mais conhecida pela sua faceta de actriz, estreando-se em 1965 aos 13 anos no programa "Riso e Ritmo", de Francisco Nicholson, ficando mais tarde conhecida pela sua colaboração com Herman José em "O Tal Canal" e "Hermanias". Só que a menina também canta, e encanta, participando quatro vezes no Festival RTP da Canção, a primeira delas em 1974 com "Canção Solidão", quedando-se pelo sexto lugar entre dez concorrentes no ano em que o seu futuro marido Paulo de Carvalho saíu vencedor com "E depois do adeus" - e ainda dizem que as mulheres não se sentem atraídas pelo sucesso. Voltaria a participar em 1980, ficando eliminada nas meias-finais, e em 1983 fica em 3º lugar, a sua melhor classificação de sempre. No ano seguinte faz a sua derradeira tentativa como elemento do Quarteto Paulo de Carvalho (duh) e volta a não atingir a final. Apesar de não ter escolhido casar antes com Paco Bandeira, Helena Isabel não se livrou mesmo assim de um ou outro ocasional ensaio de porrada: contava-se que o Paulo de Carvalho gostava de "disciplinar" as esposas (e ainda foram algumas) "à antiga". Eventualmente divorciaram-se, e têm um filho com um aspecto esquisito que alegadamente também canta.
E agora um momento não aconselhável a menores e pessoas sensíveis. Em 1975, em pleno PREC, o Festival sobreviveu, apesar de ser considerado uma forma de entretenimento decadente e apreciada pela burguesia fascista. Bom, se sobreviveu a isto, sobreviverá a tudo, certamente. Uma das alterações teve a ver com o nome do evento, que se viria a chamar "Grande Prémio da Canção", o que gerou alguns mal-entendidos - conta-se que Emerson Fittipaldi demonstrou interesse em participar, mas acabaria por desistir depois de não ter encontrado no mapa nenhum local ou circuito com o nome de "Canção". Nesse ano era proibitivo participar com cantarolices reacionárias e trá-lá-lás dessa estirpe, pelo que todas as canções concorrentes tinham uma letra com um teor que variava entre o comuna e o bastante comuna. Quer dizer, eram de cariz, ahem, "revolucionário", por assim dizer. Posto isto tivemos nomes como José Mário Branco (devia estar com os copos, coitado), que terminou em 5º lugar, e ilustres desconhecidos como Vítor Leitão, Carlos Cavalheiro, Fernando Gaspar e...Jorge Palma. Sim, não é engano, é um Palma em início de carreira e com aspecto de "chungoso", mas é o nosso Palma na mesma. O maior artista da música moderna portuguesa participou com os temas "Viagem", a solo, e "O Pecado Capital", (mal) acompanhado por Fernando Girão, que é um pateta alegre, ficando-se por modestos 8º e 7º lugar respectivamente, entre 10 concorrentes. O vencedor foi Duarte Mendes com "Madrugada", um tema que (valha-nos isso) transmitia um clima de alguma normalidade, e não há imagens desse festival, pelo menos no YouTube. Talvez alguém que se recorde deste certame em tons de vermelho Moscovado me possa iluminar, mas será que isto se deve a alguma teoria de que a recolha de imagens em vídeo era considerado algo de anti-revolucionário? Juro que não faço ideia. E entretanto o que aconteceu com os cançonetistas? E as Simones, os Calvários, os Garcias e quejandos? Foram todos presos num Gulag nas Berlengas ou foram encostados a um muro no Campo Pequeno e fuzilados? Bem, de facto alguns desses alinhados com o antigo regime andaram a "piar fininho" durante uns tempos, o que é sempre mau para um artista com uma agenda por preencher e contas para pagar, mas outros "safaram-se", e dois deles participaram nesse mesmo festival: Paulo de Carvalho, que teve a sorte da canção vencedora no ano anterior e por ele interpretada ter servido de senha na Revolução dos Cravos, e Paco Bandeira, que se disfarçou de baladeiro. Senão vejam:
Eu avisei que esta parte do artigo era especialmente assustadora. Paco Bandeira participou esse ano pela terceira vez com o tema "Batalha-Povo", originalmente intitulado "Batalha-Povo-Revolução-Porrada-na-Companheira-Camaradas", mas esse título era demasiado longo, e nomes compridos são uma coisa própria da burguesia latifundiária a atirar para a realeza. Para alívio das mulheres suecas, Paco Bandeira quedou-se pelo 6º lugar e assim não foi até Estocolmo, onde se realizou nesse ano a Eurovisão.
O Festival voltaria ao "normal" em 1976, ou mais ou menos isso, pois nesse ano todas as seis canções a concurso foram interpretadas pela mesma pessoa: Carlos do Carmo, o "Sr. Grammy" português, acabando por ser "Uma flor de verde pinho" a escolhida para representar Portugal na Eurovisão em Haia, nos Países Baixos. Mas 1977 foi outra vez um ano "bué" psicadélico, com sete canções a irem a Festival, cada uma defendida por dois grupos ou artistas diferentes. Uh? Parece confuso, mas ainda em clima pós-revolucionário e cooperativista, foi o ano dos super-grupos, acabando por sair vencedor o conjunto "Amigos", formado por Fernando Tordo, Paulo de Carvalho e Ana Bola, entre outros, com "Portugal no Coração". Contudo o "cromo" da caderneta nesse ano foi o "Grupo Férias", que defendeu o tema..."Férias". Pois. A outra versão foi interpretada por Paco Bandeira, que andava viciado em festivais. Este Grupo Férias, de curta duração, tinha como um dos seus elementos um angolano de seu nome Pedro Malagueta, cuja voz ficaria mais tarde no imaginário da criançada com o tema de abertura da série animada "Era uma vez no Espaço". Lembram-se? Lá em ciiimaaaa....
E ainda em 1977, que foi sem dúvida um ano que entrou para a história dos festivais, tivemos no 2º lugar a versão dos Green Windows de "Rita, Rita Limão", e cuja versão alternativa ficou a cargo do Grupo Cara ou Coroa, que contava com o actor Joel Branco. Muito "disco-sound", muito foleiro, como a gente gosta no Festival. Uma pérola, este vídeo.
1980 foi o ano em que José Cid obteve o tão merecido reconhecimento com "Um grande, grande amor", que valeria ao Elton John português o sétimo lugar na Eurovisão, a melhor classificação de sempre até então. Nesse ano foram apuradas nove canções finalistas através de três semi-finais, e numa delas participou a actriz Rosa do Canto, mais conhecida pelas suas colaborações em séries de comédia ao lado de Nicolau Breyner e Fernando Mendes. Pela amostra ficamos aliviados que ela tenha desistido da música e abraçado a representação, e ainda bem que levou os gémeos com ela (para bom entendedor...). Outra semifinalista nesse ano que ficou por uma participação discreta foi Lena D'Água. Entende-se, era ainda a fase pré-"Olhó Robô", e a moça andava à procura de um rumo certo.
Em 1981 foi vencedor o saudoso Carlos Paião, com "Playback", mas a concorrência foi de peso. Basta olhar para os artistas classificados logo a seguir: José Cid, vencedor no ano anterior, participando pela 87ª vez, Maria Guinot, que venceria três anos mais tarde, e as Doce, que venciam no ano seguinte, e que tiveram aqui uma pequena mas saborosa vitória sobre as rivais Cocktail, que terminariam no 8º lugar. Mais abaixo, em décimo, ficavam o casal Carlos Alberto Moniz e Maria do Amparo, entretanto cansados de cantar a revolução, tentam fazer o regresso ao planeta Terra via Festival, com o tema "Olá menina, olá". Não correu lá muito bem, mas os dois seriam vingados quinze anos depois pela filha Lúcia, que na Eurovisão obteve "só" a melhor classificação de sempre com "O meu coração não tem cor".
Em 1982, o tal ano em que as Doce venceram sobre "Trocas e Baldrocas" de Cândida Branca-Flor, foi um Festival RTP predominantemente feminino, com Alexandra a obter o 4º lugar e Dina, que venceria dez anos mais tarde, a participar com duas canções. Em 10º lugar, mesmo à frente de Marco Paulo e o tal tema dedicado ao fim do mundo que referi no topo deste artigo ficou uma tal "Fernanda", ou Fernanda Sousa, que faria parte da última formação das Doce e anos mais tarde ficaria célebre com o nome artístico de Ágata e aquela imagem tenebrosa de alternadeira regenerada. Aqui ela interpreta o tema "Vai mas vem", indicando já uma apetência para a temática da dor de corno na sua variante "mulher fácil e leviana que se deixa enganar com facilidade pois também está ela própria longe de ser um exemplo de virtude". Tenham pena da senhora, que pelo aspecto é mais que evidente que passava fominha naquela altura - fominha de comida, entenda-se. Uma mulher de armas, realmente, esta Ágata.
Na edição de 1983, Herman José era um dos favoritos com "A cor do teu baton", um tema de Tozé Brito e Pedro Osório, mas acabaria por se quedar em segundo. Numa encruzilhada entre a música e o humor, a derrota no Festival teve o condão de fazer Herman optar pela segunda via, e assim ganhámos um excelente humorista em vez de um cantor sofrível - há males que vêm por bem. O rótulo de "cantor sofrível", aliás, "cantor medíocre" foi para o vencedor dessa noite, um tal Armando Gama, que nos anos 70 se tinha notabilizado com o grupo de rock progressivo Tantra. Depois da Eurovisão Gama envolveu-se com a locutora de continuidade da RTP Valentina Torres, mais conhecida pelas suas crises de bulimia, e formariam o duo Armando & Valentina. O reportório deste dueto tinha como público alvo pessoas de meia-idade divorciadas e de preferência desesperadas: eternos românticos, para ser mais exacto. Desta forma rivalizaram nesse departamento com os Broa de Mel, outro casal cantadeiro, que esse ano teve também uma das suas muitas participações, acabando num humilde 10º lugar, como foi sempre seu timbre.
Saltando para 1985, ano em que venceu a horrorosa da Adelaide Ferreira com uma gritaria intitulada "Penso em ti (eu sei)", cometeu-se uma das maiores injustiças: a melhor canção ficou em 4º lugar. Uau, e devia estar tudo surdo nessa noite para não ter sido eleito Jorge Fernando com o seu "Umbadá" como grande vencedor. Mas o ex-guitarrista de Amália e um tipo bestial, este Jorge Fernando, venceu o prémio de canção do ano de 2012 com "Desespero", uma parceria com Virgul e Dino d'Santiago. Aqui está um prémio que Adelaide Ferreira nem em sonhos leva para casa.
E 1985 foi um ano muito "colorido" em termos de Festival, com os jovens Nuno e Henrique Feist a terminarem num supreendente terceiro lugar, por exemplo. No entanto o maior paradoxo prende-se com os últimos classificados nessa edição. Uma jovem banda de Cascais com o nome de Delfins seria o elo mais fraco nessa noite, e ninguém dava nada por eles - e com razão, a julgar pelo triste espectáculo que proporcionaram. Mais tarde contudo viriam a provar que afinal o Festival RTP da Canção não era propriamente a sua "Casa na Praia".
Em 1986 a RTP opta por um formato com um pendor acentuadamente regionalista, com as delegações de Lisboa, Porto, Madeira e Açores a levarem três canções cada à grande final. Dessa final foram escolhidas as três melhores, sem anunciar publicamente a votação do júri, e entre nomes fortes como Carlos Alberto Moniz, Lara Li, Gabriela Schaaf ou Luís Bettencourt, chegaram a finalíssima a cantora Dora, que viria a sair vencedora, e dois grupos: os açorianos Rimanço e os tripeiros Trabalhadores do Comércio. Esperem lá, os mesmos Trabalhadores do Comércio que alguns anos antes durante o "boom" do rock português nos trouxeram êxitos como "Chamem a polícia" ou "Táquetinho ou lebas no focinho"? Isso mesmo, mas...o que estavam Sérgio Castro e os seus "muchachos" da invicta a fazer no festival? A gozar com aquilo tudo, como se pode perceber pela letra do seu tema, "Os tigres de Bengala". É só escutarem com atenção e fica tudo explicado. A brincar, a brincar, quase que iam representar Portugal nesse ano em Oslo, na Eurovisão.
Se quisermos apontar uma data para o início da decadência do Festival, penso que 1987 será a mais apropriada. Por acaso recordo-me de ter assistido nessa noite à transmissão em directo do Hotel Casino Park do Funchal, e da votação se ter iniciado depois da meia-noite, após mais de uma hora de imagens da idílica Pérola do Atlântico. Blergh. Foram seis canções, qual delas a mais deprimente, mas o que foi mesmo lamentável foi ver o Mário Mata, celebrizado pelo excelente "Não há nada para ninguém" poucos anos antes terminar no 5º lugar com o tema "É do stress". Os vencedores foram o Duo Nevada com "Neste barco à vela", uma canção recomendada para quem está convalescer de uma lobotomia efectuada recentemente.
Se ficou mal ao Mário Mata o penúltimo lugar em 87, três anos depois os Afonsinhos do Condado repetiram o feito com "Jújú e a sua banda", que terminou em 9º lugar entre dez concorrentes no Festival RTP 1990. Fiquei triste, pois esta é uma das bandas que compõe o imaginário da minha adolescência, e não me surpreendeu quando anunciaram o seu fim no ano seguinte.
Mas nem a desilusão que constituiram os Afonsinhos do Condado serviu para ofuscar a grande revelação dessa noite: um jovem setubalense que dava pelo nome de Toy, que terminou num honroso terceiro lugar atrás da vencedora Nucha e dos Karamuru, banda de Marco Quelhas, que viria a vencer em 2011 - isto para que se veja quão pobre foi o Festival em 1990. No entanto este Toy prometia, e do público ouviam-se os mais rasgados elogios do tipo "que bela voz tem aquele anão efeminado".
Em 1991 o mundo fica a conhecer, mesmo que timidamente, um outro "talento" que viria a rivalizar com Toy nos "charts" da pimbalhada. Emanuel ficou-se pelo último lugar, mas numa altura em que o mundo lusófono ainda não estava preparado para a revolução que o cantor viria a liderar quatro anos mais tarde com o seu clássico "Nós pimba". Humilde começo para aquele que seria um gigante da mini-cassete com etiqueta da Vidisco.
O fascínio de José Cid com o Festival RTP da Canção é um daqueles mistérios para os quais a humanidade ainda não encontrou resposta. Em 1993 lá volta ele à frente de mais um projecto com vista à conquista da Europa, que "ameaçou" treze anos antes com o 7º lugar em Haia. Desta feita faz-se acompanhar por uma "estrela" com origens no fado e em ascensão na altura, o estranhíssimo Paulo Bragança num projecto chamado Cid, Bragança & Cia., defendendo o tema "O Pintor, o Poeta e o Músico". Felizmente ficaram-se pelo 2º lugar atrás de Anabela com "A Cidade até ser dia". Digo "felizmente" porque assim foram cada um foi à sua vidinha, Paulo Bragança seguiu outro rumo (qual também é difícil explicar) e José Cid continuou a ser simplesmente José Cid, sempre de olho - o único que funciona - no festival.
Em 1994 vence uma jovem de origem cabo-verdiana, Sara Tavares, que esteve envolvida numa polémica por ter participado no concurso "Chuva de Estrelas", sendo por isso ineligível para concorrer ao Festival - ou qualquer coisa desse género, não sei. Talvez por isso, e por despeito, se tenha tornado até hoje a única vencedora unânime, obtendo a pontuação máxima dos 22 júris distritais, e deixando a 2º classificado Pedro Miguéis a 84 pontos de distância. Esta foi a segunda excepção que referi para falar de um vencedor, depois do inevitável José Cid, e por uma boa razão: podes ser toda "soul", "gospel", "R&B" e aquilo que quiseres, Sarinha, mas lembra-te que saiste...DO FESTIVAL RTP DA CANÇÃO, UAHAHAHAHAH!!!
As senhoras que têm agora uma idade entre os 35 e os 40 anos (ou até um pouco menos) recordam-se com toda a certeza dos Excesso, uma "boys band" que fez furor em finais dos anos 90, no virar do milénio. Julgo que foram mesmo os tais "Cavaleiros do Apocalipse" de que fala a Bíblia, mas fizeram menos estragos - é preciso ter em conta que a Bíblia foi escrita numa época em que não existia televisão e as condições sanitárias eram deficitárias, portanto andava toda a gente chateada e havia uma tendência para exacerbar os aspectos negativos. Pois é, os Excesso...ai o Melão...ai o Gonzo...ai o Portugal...ai que tenho que ir trocar o "panty shield". E a propósito de Portugal, estaremos a falar de João Portugal? Sim, não é certamente do Luís Portugal, dos Jáfumega. O mesmo João Portugal participou em 1996 no Festival, e foi isto que se viu neste vídeo. A maravilhosa canção acompanhada daquela interpretação fabulosa valeram-lhe um honroso 9º lugar entre dez concorrentes. Quem ficou em último? Não foi uma gravação de um paciente num consultório de dentista a fazer quatro canais sem anestesia, mas podia muito bem ter sido. Depois de "acordar para a vida" e tomar consciência de que não sabia cantar, João Portugal foi fazer o mesmo que muitos outros aspirantes a artista na mesma situação: foi vender o corpo. Mas não da forma que estão a pensar, nada disso; juntou-se a outros "aspirantes" (assim chamados porque as suas vozes fazem os ouvidos suspirar pelo som de um aspirador) e formou os Excesso - com todos os males juntos, dois passinhos de dança e pinta de paneleirotes, lá conseguiram aldrabar umas pitas tontas. Felizmente foi por pouco tempo.
E para acabar em beleza, Axel, aqui no Festival RTP em 1998, dezasseis anos mais jovem e meia tonelada mais leve, interpretando o tema "Só, à tua espera". Ficou em 6º lugar entre 8 concorrentes, mas a música deste gajo é o que seria de esperar de qualquer coisa vinda dele: uma merda. De recordar que este "artista" é filho de Fernando Correia Marques, o Kojak do "pimba".
Eu sei que não gostaram - e não era para gostar. Ficaram enjoados? Foi pior que uma viagem do cacilheiro em dia de ciclone? Impossível, pois com ciclone nunca sairia qualquer cacilheiro, seus tótós. E eu avisei: SIGAM POR VOSSA CONTA E RISCO! Fui.
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