quarta-feira, 30 de abril de 2014

Os sons dos 80: In Memoriam (parte I)


Os músicos, apesar de em muitos casos deixarem obra que possa ser considerada "imortal", também morrem, como qualquer um de nós. A década de oitenta foi profícua no desaparecimento de artistas dos mais diversos géneros musicais, ora por acidente, por homicídio, ou por doença. Alguns precocemente - a grande maioria, como seria de esperar - e outros porque havia chegado o seu tempo. Muitos deles deixaram saudades, alguns chegaram mesmo a adquirir o estatuto de mito, e ainda hoje são recordados. Bem-vindo à secção de obituário de "Os sons dos 80", que devido à sua extensão, é dividido em três partes. Gostaria ainda de lembrar que o cantor português António Variações e o brasileiro Cazuza, ambos falecidos nos anos 80, tiveram um "post" dedicado a eles nesta rubrica, pelo que não contam do (extenso) obituário que se segue.


Bon Scott (1946-1980): Ronald Belford Scott nasceu na Escócia, e aos cinco anos foi viver com os pais para a Austrália. Aos 18 anos entra no seu primeiro grupo, os The Specktors, e depois ainda passa pelos The Valentines e Fraternity antes de substituir Dave Evans como vocalista dos AC/DC, em 1974. Com o agrupamento dos irmãos Young obtem finalmente o sucesso que não alcançou noutros actos, e o último álbum em que participa, "Highway to Hell", de 1979, tornou-se um dos grande clássicos da história do "hard-rock". Em 19 de Fevereiro de 1980, quando já estava a gravar o próximo disco do grupo, passou a noite a beber num bar em Londres, e foi encontrado morto no seu Renault 5 no dia seguinte, aos 33 anos. A causa de morte oficial foi "envenamento por consume exagerado de álcool, mas existem outras teorias. Bryan Johnson viria a assumir as funções de vocalista dos AC/DC a partir dessa data, e até hoje.


Ian Curtis (1956-1980): Nascido em Stratford, Lancashire, no Reino Unido, a voz de barítono era o dom de Ian Kevin Curtis, e que serviu a banda de pós-punk Joy Division, onde era ainda o compositor e letrista. Ian sofreu de epilepsia em criança, e imitava os ataques que sofreu nas suas presenças em palco, recorrendo ainda à dança e à mímica, dando à sua música uma expressão corporal pouco comum para a época. Com os Joy Division gravou dois álbums: "Unknown Pleasures" (1979) e "Closer" (1980); canções que remetiam para a desolação,vazio e desespero, de onde ainda assim se salva este "Love Will Tear Us Apart", a mais emblemática das canções do grupo. Maníaco depressivo, enforcou-se na sua casa em Macclesfield, a 18 de Maio de 1980, aos 23 anos.


John Lennon (1940-1980): Foi no dia 7 de Dezembro de 1980 que um homem de nome Mark David Chapman pôs fim a uma lenda. Chapman tinha passado o dia em frente ao edifício Dakota, em Nova Iorque, lendo o livro "À Espera no Centeio", de J. D. Salinger, à espera de John Lennon. Quando este chega, ao final da tarde, Chapman pede-lhe para autografar o novo disco do cantor, "Double Fantasy", ao que Lennon acede. Mais tarde, perto das 11 da noite, Chapman avança novamente sobre o seu alvo e pergunta-lhe: "Você é John Lennon?". Antes que acabasse de responder, Chapman dispara quatro vezes sobre o seu peito, e volta a sentar-se no passeio, quando um transeunte lhe pergunta: "Sabes o que fizeste?", ao que ele responde "Sim...matei John Lennon". Sim, e de facto o antigo letrista, compositor e vocalista dos Beatles morreria vinte minutos depois no hospital Roosevelt, tendo perdido 80% do seu volume de sangue.


Bob Marley (1945-1981): O "rastaman" não devia ter morrido - e não morreu, no fundo. O cantor que tornou o "reggae" conhecido à escala mundial, que transmitiu uma mensagem de paz e de amor entre os povos, que nos deu hinos de fraternidade como "No Woman No Cry", "Is this Love" ou "Redemption Song" foi diagnosticado em Julho de 1977 com um tumor maligno no dedo do pé, e a única solução seria amputar esse dedo. Marley, por motivos sobretudo religiosos, recusou-se a fazê-lo, e batalhou contra a maleita, continuando a gravar canções a dar concertos até 11 de Maio de 1981, quando viria a falecer num hospital em Miami. O seu legado é enorme para os parcos 36 anos que partilhou connosco.


Harry Chapin (1942-1981): O cantor "folk" nova-iorquino que se celebrizou em 1974 com "Cat's in the Cradle", o seu único nº 1 na Billboard, teve uma morte deveras infeliz, aos 38 anos. Envolvido num acidente de automóvel a caminho de um concerto, seria retirado do veículo acidentado ainda com vida, vindo mais tarde a morrer no hospital. Chapin tinha a licença de condução suspensa devido ao seu envolvimento noutro acidente semanas antes, e segundo a sua filha, levava um estilo de vida desregrado, "comendo pouco, e dormindo ainda menos". Nos anos 90 a banda de "hard-rock" Ugly Kid Joe regravou "Cat's in the Cradle", com grande sucesso, chegando ao nº 6 da Billboard.


Elis Regina (1945-1982): Uma das maiores criativas da Música Popular Brasileira, Elis Regina deixou, e deixa, muitas saudades. Um dos gigantes do tropicalismo, com incursões pelo jazz, bossanova e a mais elementar "pop", Elis imortalizou na sua voz os temas "Águas de Março", de António Carlos Jobim, e "Romaria", de Renato Teixeira, que aqui temos o prazer de a ver interpretar ao vivo durante o intervalo do Festival RTP da Canção do ano de 1978. Elis tive uma vida complicada, começando a carreira cedo, aos 16 anos, e aos 25 casou com Ronaldo Bôscoli, e quem teve um filho, e mais tarde com César Camargo Mariano, com quem teve mais dois, sendo a mais jovem Maria Rita, também ela cantora. Foi perseguida pela ditadura militar, e teve problemas com as drogas e com a bebida, vindo a falecer aos 36 anos após uma mistura explosiva de álcool, cocaína e temazepam, uma espécie de ansíoltico. Deixou-nos cedo e com muito por fazer ainda, a "pimentinha", como era conhecida.


Randy Rhoads (1956-1982): Randy Rhoads era um exímio da guitarra, um predestinado, que depois de um início de carreira na banda "hard-rock" Quiet Riot, juntou-se a Ozzy Osbourne na sua carreira a solo, depois de ter saído dos Black Sabbath. Com o "Ozzman" gravou os álbums "Blizzard of Ozz" e "Diary of a Madman", e a química entre ambos era evidente, e muitos consideraram-na a melhor parceria do "hard-rock" ou do "heavy-metal" do início da década de 80. Essa parceria foi tragicamente encurtada a 19 de Março de 1982, quando Rhoads apanhou um avião privado que faria a ligação entre Orlando, na Florida, e Nova Iorque, onde daria mais um concerto com Ozzy, avião esse que se viria a despenhar, provocando a morte dos seus quatro tripulantes. Mais tarde após a realização das autópsias, viria a saber-se que o piloto teria consumido cocaína antes do vôo. Ozzy nunca esqueceu Rhoads, e em 1989 dedicou-lhe um álbum ao vivo em sua homenagem.


Muddy Waters (1915-1983): Muddy Waters foi um dos maiores nomes da música "blues" do século passado. Nascido no Mississippi - como convinha para o efeito - passou pelas "passas do Algarve" que qualquer músico negro, ou qualquer negro em geral passou durante os anos da segregação racial. Depois de muitos anos na oscuridade, gravou o primeiro álbum em 1958, aos 42 anos, e depois disso ganhou seis Grammys para melhor artista de música "folk" e tradicional. Um dos seus maiores êxitos foi este "Hoochie Coochie Man", originalmente gravado em 1954, e aqui interpretado ao lado dos Rolling Stones no Checkerboard Lounge, Chicago, em Novembro de 1981. Muddy Waters, que tinha como nome de baptismo McKinley Morganfield, faleceu a 30 de Abril de 1983 aos 70 anos - passam hoje 31 anos desde o seu desaparecimento.

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