segunda-feira, 18 de novembro de 2013
Grande Prémio, vil e reles meretriz
Não sei bem porquê, mas este fim-de-semana em Macau teve qualquer coisa de diferente. E o outro também. Este mais que o outro. Mas o quê...o quê...deixa-me lá pensar Leocardo Pafúncio da Cruz Peixoto Espírito Santo de Mello Breyner Andersen Pinto & Sotto Mayor...ah já sei, esteve cá a minha prima Francisca! Não, não foi isso, não esteve cá nenhuma prima minha, e nenhuma delas se chama Francisca. Portanto, o que foi, o que foi, o que foi...ah sim, o Grande Prémio! Tivemos a 60ª edição do Grande Prémio de Macau. Rapunzel! Sessenta edições, já? Ainda parece que foi ontem a 46ª. Como o tempo passa. Como foi possível que não tenha dado por isso? Ah pois, é que aprendi a abstrair-me do GP. Não foi preciso sair do território durante o evento, aprender meditação transcendental, yoga, raiki ou tai-chi. Só precisei de não ligar muito a isso. Como diz a malta nova, "kagei". E ainda por cima este ano foram dois fins-de-semana. Tornei-me cinturão preto em estar-me nas tintas para o Grande Prémio, e sem saber como. Sou um natural, acho. Tenho queda para a coisa.
Antes ligava muito aos engarrafamentos provocados pelo fecho de metade dos acessos na peninsula de Macau, à invasão dos turistas do continente e daqueles outros estrangeiros com a mania que são aceleras e vêm p'raí ostentando fatos-macaco com etiquetas da Renault, da Elf ou da Michellin, apesar de não representarem nenhuma dessas marcas. Lembro-me do GP em 1999 quando estava atrás de dois marmanjos portugueses numa caixa ATM na Av. Almeida Ribeiro, esperando pacientemente que um deles levantasse a mesada que a mãezinha mandou. Enquanto o bronco tentava domesticar aquela complicadíssima tecnologia, olhou para trás, fez-me uma careta parva seguido de um sorriso trocista. O outro, um pouco mais pequenote, devia ser o agente passivo da relação, riu-se da piada, e já com vapor a sair-me dos ouvidos e com a hora de almoço a esgotar-se, fiz uma cara séria e disse ao frangote: "olha lá, nã olhes assim para mim que o teu namorado fica com ciúmes". Foi como passear numa floresta repleta de ursos completamente besuntado de mel. Eles eram dois, um deles enorme, eu era apenas um só, e arriscava-me a ficar estendido ali à beira da escada dos correios a escorrer molho. Começaram os dois com um paleio grunho do tipo" tó, tó, epá, quéquefoi pá, olha o respeitinho pá, tó, tó!", mas não passavam disto. Não perdi a compostura, cresci para os dois feito galo-da-India (já sabia que eram dois palermas com mais lígua que bícepes), e as "moças" acabaram por ir embora a resmungar "epá se fosse na blah blah blah ias ver, conheces o Tójó, quando fores à Brandoa fazemos-te a folha", enfim, triste, triste, triste.
Isto foi um episódio que recordo com um carinho especial, porque ainda hoje, passados 14 anos, faz-me rir. Ao contrário destes dois rabetas, os restantes "amantes da velocidade" - muitos deles sem carta - vão arrefecer a carola depois de um dia debaixo do sol escaldante da Guia numa discoteca do território, e acabam por gastar o orçamento destinado a "outras despesas" nas filipinas e nas indonésias que ali se encontram na vitrina. Para estas o Grande Prémio é uma época alta. É como as vindimas da casta do vinho do Porto no Peso da Régua. Elas merecem, coitaditas, depois de mais uma semana a esfregar o chão e a ir levar e buscar os putos chineses à escola. Sábado à noite é vê-las tirar o avental e o véu, passar por duas horas de pintura à pistola, e voilà!, lucram num fim-de-semana mais do que num mês inteiro a bulir para a "mom" e para o "sir". Depois de mais um fim-de-semana a ver os bólides a andar à volta e sem saber muito bem o que se passou, regressam lá à cova de onde rastejaram e nunca deviam ter saído, e quando os restantes Neandertáis lhes perguntam como foi, dizem "é um urinol muito jeitoso, pá. devias comprar uns óculos escuros da OP e ir lá também". "Ver as corridas?", pergunta o outro. "As quê? Ah sim, iá, isso mesmo, corridas", retorque o estupor. Pois é, ia-me esquecendo, isto é o maior acontecimento a nível do desporto em Macau, e que consta do calendário internacional de qualquer coisa, pelo menos.
Quanto às corridas em si, confesso que fiquei desiludido com a minha primeira vez. Eu era inexperiente, um adolescente imberbe, e nesse longínquo ano de 1993 o Grande Prémio era quarentão, mas não sabia o que fazer com um virgem como eu. A vontade estava lá, o libido escorria pelos poros da pele, a vara em ponto de rebuçado, dava para pendurar lá uns bons dez pares de peúgas, mas a experiência foi memorável apenas pela negativa. Quando estava em Portugal e ouvia falar do "Grande Prémio de Macau" pensei que se tratava de algum certame onde os pilotos de topo da Fórmula 1 disputavam alguma corrida amigável, extra-calendário, onde todos menos o vencedor seriam cozidos num caldeirão de sopa de fitas. Nada disso, e agora já sei. É por isso que o nosso primeiro encontro foi tão atrapalhado: era eu que não sabia ao que vinha. Sei lá, ingenuidade minha por esperar mais do que aquilo que vim a encontrar? Pelo menos o Grande Prémio teve pena de mim e deixou-me sair sem pagar. Mantivemos uma relação de saudável distância, mas cumprimentavamo-nos sempre que nos viamos, em Novembro, e sorriamos um para o outro. Em 2005 tive o desplante de ir assistir aos outros a disfrutarem das suas virtudes, e depois de meio-dia a torrar na bancada do reservatório, passei três dias a gel de aloe vera para sarar as queimaduras. E tinha já mais de 50 anos, esta velha meretriz. Ratice não lhe faltava, e eu ainda não tinha pedalada para ela.
Este ano, mais uma vez muito lucrativo, com loas para a organização e promessas de muitos louvoures, a "mama-san" das curvas apertadas e das rectas compridas fez 60 anos. Deixou de ser a MILF que conheci e passou para a categoria de "mature" no site do Redtube nmotorizado. Cheguei a casa no Domingo depois das cinco, e já passavam das seis quando me lembrei: "ena pá, já acabou o Grande Prémio!", e foi aí que percebi que tinha ultrapassado aquele pequeno incidente há 20 anos, aquele episódio sexual desastrado, e tinha-me feito um homenzinho. Liguei a televisão e já estavam a dar um programa do Malato, do tempo em que ainda não era um doente cardíaco. "Ora bolas", pensei eu, "o que aconteceu ao Félix da Costa?", o mesmo pensamento dos restantes portugueses que se estão nas tintas para o Grande Prémio mas cuja verve patriótica recorda que no ano passado foi um tuga a vencer a prova principal do fim-de-semana. Ficou em segundo, coitado. Atrás de um inglês qualquer, um tal Lynn ou lá o que é. O Grande Prémio de Macau é assim, uma amante exigente, traiçoeira, imprevisível. Vai a uma festa com o namorado desavindo à procura da reconciliação, e acaba por sair com outro gajo qualquer que acabou de conhecer. A pêga...
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