Filho único: a lei impõe, o homem dispõe

Imagem de recém-nascidos, numa clínica em Pequim.

Milhões de crianças são todos os anos escondidas na China pelos pais, para escaparem às imposições da política do filho único. Em 1990, o census nacional registou 23 milhões de nascimentos, mas 10 anos depois existiam 26 milhões de crianças com dez anos de idade - uma diferença de três milhões. Segundo Liang Zhongtang, um demógrafo chinês, "é de esperar que existam mais crianças recém-nascidas do que crianças com dez anos", devido à mortalidade infantil. Liang é membro do Comité Nacional da Família e do Planeamento Familiar, que impõe desde os anos 70 a controversa lei do filho único na RPC.


Mural em Sichuan onde se pode ler: "É proibido discriminar, maltratar ou abandonar bebés do sexo feminino".

A maioria das famílias chinesas que cumprem a política do filho único prefere ter um rapaz, que possa continuar o nome da família e consiga fazer mais dinheiro, uma vez que na China ainda existe uma diferenciação entre os salários auferidos entre homens e mulheres. Por volta de 2020 deverão existir na China mais 30 milhões de homens do que mulheres com menos de 20 anos. Muitos pais recorrem a ultra-soms e ecografias para determinar o sexo da criança. Em muitos casos as mulheres abortam quando descobrem que esperam uma menina, e voltam a tentar até sair um rapaz.


Cartaz em Nangchan onde se pode ler: "Para uma nação mais forte e mais próspera, e para uma família feliz, cumpram as políticas de planeamento familiar".

Fu Yang, de 47 anos, confessa-se como o "maior violador da política do filho único". Fu teve seis filhas nos últimos dez anos. Tal como ele, milhões de chineses escondem os filhos para não se seujeitarem a ameaças, multas e abortos forçados - alguns depois do terceiro mês de gravidez - impostos pela política do filho único. Muitos são denunciados pelos próprios vizinhos. Fu e a mulher, que vivem numa pequena aldeia a sul de Xiamen, tiveram que fugir, e chegaram a viver em três províncias diferentes. "Foram tempos difíceis. Eramos perseguidos e tivemos que viver como cães vadios, como marginais. Não me arrependo de nada", diz Fu.


Guanyin, a deusa da fertilidade, num templo em Danshan, em Sichuan.

A política do filho único foi implementada na China em 1979 para travar o crescimento desenfreado da população. Segundo as autoridades, desde a implementação desta política até ao ano 2000, foram prevenidos 250 milhões de nascimentos. A política é aplicada com mais ou menos rigor em toda a China, com excepção das RAE de Macau e Hong Kong, e no Tibete. Mesmo assim, a China continua a ser o país mais populoso do mundo, com 1300 milhões de habitantes - mais 500 milhões que em 1978. Segundo uma pesquisa realizada em 2005, 76% da população concorda com a política do filho único.