segunda-feira, 5 de setembro de 2016

República Checa: o "mini-bar" da Rússia


Vou começar este artigo com uma confissão: a minha aventura em Praga, capital da República Checa começou mal. Digamos que fomos como aqueles casais que primeiro se odeiam, depois apaixonam-se e eventualmente acabam por se aturar um ao outro - isto quando não se voltam a odiar, mas isso já é outra conversa. Aqui o que se passou foi uma série de mal entendidos para os quais descobri que já não tenho idade. Viemos de comboio de Munique, e depois de uma viagem cansativa apanhei-me numa cidade onde nunca tinha estado, pouca gente fala inglês (pelo menos foi essa a primeira impressão), e logo por azar num Sábado à tarde, quando alguns serviços se encontram encerrados até à segunda feira seguinte. Isto para dizer que não encontrei uma companhia de telecomunicações aberta que me ligasse com o mundo, e no único lugar onde me providenciaram um cartão de Internet,  e apesar da simpatia, a senhora não foi capaz de me orientar no processo de registo. Não que eu precise de Internet para viver, entenda-se, mas vindo "às escuras" para um país desconhecido, convinha ter pelo menos acesso ao Google maps. A cereja azeda no topo deste sórdido e intragável bolo era o facto de na República Checa não se usar o Euro, mas antes a Korune (1€ = 26 Kc), e tratando-se de um "Sobota" à tarde, como já referi, a maior parte das casas de câmbio encontravam-se indisponíveis. Isto não estava a correr mesmo nada bem.


Pode-se dizer que o futebol mudou os ventos nefastos que começavam a soprar de Praga para outros mais bonancosos. Um dos nossos planos  (mais meu, para ser sincero) passava por assistir ao desafio entre o Bohemians 1905 e o Sparta, dois emblemas da capital checa, e que logo por sorte se defrontavam nesse final de tarde, pelas 20:00 no Estádio Dolicek, casa dos primeiros. Perante a minha evidente e crescente irritação, a minha melhor metade acedeu a apanhar um táxi - isto sem antes nos termos aventurado, debalde, pelo metro de Praga, em busca da estação mais próxima do local do evento. Uma corrida de 10 minutos e 300 Kuronas (cerca de dez euros) depois, estávamos no Dolicek, e após lhe passar pela frente o autocarro do Sparta de Praga, o meu filho passou da relutância ao entusiasmo. A partir daqui foi sempre a subir. Metemos-nos na longa fila para adquirir os ingressos, e ali travei conhecimento com um jovem inglês, adepto do Queens Park Rangers, que logo por sorte é um dos três clubes ingleses com que simpatizo desde miúdo  (os outros são o Bristol  City  e o Blackburn Rovers), e era inclusivamente detentor de um "season ticket". Contou que estava de visita a um amigo checo, adepto do Bohemians, e "aproveitou" para ir assistir ao jogo. Chegado o tal amigo, este levou-nos a uma "fila secreta", onde em menos de dois minutos arranjámos os ingressos. Nada como a maltada bola para dirigir as agulhas na direcção certa.


Lá dentro foi o que se vê: um ambiente infernal, com os adeptos do Bohemians a revelarem-se incansáveis no apoio à sua equipa, apesar do encontro ter sido dominado pelo Sparta, que venceria por 2-0.  Achei curioso que se vendesse cerveja à descrição dentro do estádio, e tive a sorte de ficar perto daquela espécie de bar improvisado,  onde um indivíduo recebia o dinheiro, e outro tirava as cervejas, sem parar, num gesto mecânicoe contínuo. Aprendi ali qualquer coisa sobre o idioma checo, também. Não se deixem intimidar pela acentuação esquisita em cima dos "s" e dos  "c" - basta ler as palavras e dar-lhes uma acentuação russa: "Dvě piva, prosím!" - saltam duas cervejas, ó chefe". E assim foi.


Findo o encontro, e depois de atravessar o apertado cordão policial que circundava o Estádio Dolicek, resolvemos ir "atestar", e o que dizer da cozinha checa? Um regalo, e isto que vides aqui na imagem é exactamente o que estais a pensar: bife tártaro. Fazendo o câmbio às tais Korune, fica super barato comer na República Checa. Já aqui referi a cerveja mas passarei a elaborar; nunca tinha bebido cerveja tão boa como aquela que bebi na República Checa. Os alemães podem ter a fama, mas certamente que tanto os checos como os seus visitantes têm o proveito. Só para se ter uma ideia, a palavra "pilsner" tem origem na cidade checa de Plzen, que se lê "pilsen".


Paraos adeptos de outros "inebriantes", e aqui está uma coisa que nem toda a gente sabe, Praga é considerada "a Amesterdão do leste", devido à sua legislação permissiva no que toca ao consumo de cannabis e outras drogas leves. Só para ter uma ideia, a posse de 15 gramas de "erva" habilita apenas ao equivalente a uma multa de trânsito! Apesar da permissividade, não esperem encontrar lá as tais "coffeeshops" que tornaram a capital holandesa localde romagem para os aficionados da passa podem adquirir pastilhas elásticas de cannabis, como aquela ali em cima na imagem, e toda uma panóplia de produtos fabricados com a planta,  desde chocolate a cerveja, passando por rebuçados e até cigarros electrónicos,  mas para adquirir o produto propriamente dito, têm que "cair na marginalidade", e procurá-lo em clubes nocturnos e outros pontos de venda. Quem estiver mesmo interessado, basta-lhe uma consulta na net para saber quais.


O que é legal, isso sim, mas "não é  para meninos" é o absinto, que se pode encontrar nas casas da especialidade um pouco pelo país fora, e ainda com mais facilidade na capital Praga. O licor que inspirou poetas românticos é comercializado numa variedade que difere no sabor e na graduação, chegando alguns a ter um volume de álcool de 90o. Uma "bomba". Dizem que quem abusar do absinto começa a delirar, e a ver "fadas verdes". 


E é assim, a  República Checa, um país de gente simpática e acolhedora, que durante o século XX teve o azar de ficar "entalado" entre a Alemanha nazi e a Rússia soviete. Apesar de ter aderido recentemente à União Europeia, nota-se ainda muito da influência dos últimos, mas os checos são sem sombra de dúvida mais "digeriveis" que os russos . Eu diria que são uma versão da Rússia em "mini-bar", e se querem que vos recomende o que beber, não hesitarei em escolher a cerveja, ou "pivo".  Na zdraví! - que é como quem diz, "à nossa!".


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