sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Chuchú bandéra maquista! Parte I: o grito do APIM-ranga



RACISMO! Começo a ficar farto deste conceito, e do seu reconhecimento como "um problema real", que "existe em toda a parte". Se entender-mos por "racismo" a noção de que A é diferente de B, e ambos diferentes de C, todos diferentes de D, e por aí fora, então somos TODOS racistas - acrescentaria "menos os estrumpfes", se os estrumpfes existissem. Olha que rica analogia que relampejou na minha tempestuosa carola: "O racismo é como os estrumpfes: não existe". Boa. Antes de prosseguir com o que entendo serem as "causas do racismo", ao ponto de haver quem insista ao ponto do desespero que o racismo "existe mesmo, é real!", qual criança em pleno acto de negação após tomar conhecimento da inexistência do Pai Natal, vou falar do que me motiva a debruçar-me sobre este mais que batido, rebatido e reciclado tema, que é tão interessante como o jogo do Galo - assim como neste último ninguém ganha, e é preciso ser extremamente burro para perder, no racismo não só igualmente não há vencedores, como ainda acabam a pairar no ar os miasmas do ressentimento. Foi isto:


Pois é, já sei que esta pseudo-polémica "tem barbas", e que "acordei agora", e "qual é a novidade" e tudo mais, mas agora calem-se lá um bocadinho, ó previsíveis e aborrecidas criaturas - chegou a hora de EU dizer o que penso! E vou fazê-lo não numa, nem ou duas ou três partes, mas em quatro! Ah, ah! Bem sei que ninguém pediu a minha opinião, mas já que antes de mim haveria quem partiu a loiça toda, fica registado o meu ponto de vista, e ainda com a vantagem de não precisar de levar cotoveladas de quem se quer meter à frente e "dizer de sua justiça". Tudo começou a 4 de Janeiro (e pode-se dizer que neste particular 2016 "não podia ter começado melhor" - ou pior, depende), quando numa entrevista ao Hoje Macau, o novo presidente da APIM, Miguel Senna Fernandes, tece considerações sobre a convivência das comunidades portuguesa, chinesa e macaense aqui na capelinha que todos chamam de sua, e que é Macau. 

Ora bem, uma vez que a própria génese de Macau, bem como todas as características que a tornam um local especial, único e objecto apetecível para um "case-study" dedicado ao tema assenta nisso mesmo: no contributo das diferentes culturas e etnografia diversa, dos grupos que se coordenam, completam, e que nada seriam uns sem os outros. Se mesmo assim há um destes actores que se acha melhor que todos os outros e reclama para si a parte de leão no mérito desta feliz combinação de temperos? Claro que sim, quais? Todos, provavelmente, e onde é que isso não acontece, digam-me lá? Neste preciso momento em que escrevo estas linhas, faço-o com a plena convicção de que aquilo que tenho para dizer é a versão definitiva, completa e aperfeiçoada do melhor que foi dito até aqui - e que foi pouco ou nada, até agora, lá está. Somos assim, fazer o quê? A alternativa "pegar em  armas e declarar guerra" tem sido a opção em muitas latitudes onde se verificam estes "problemas" derivados da "diferença", e os resultados são aquilo que se sabe: uma bela merda. Portanto aqui está a controvérsia "du jour", destinada a ser substituída por outra  (e não faltará muito), ou simplesmente olvidada, de tão pífia e irrelevante que é. 

O Miguel Senna Fernandes é um apaziguador, um paz de alma, e toda a gente que o conhece minimamente (o meu caso, que apenas preencho o mínimo das quotas que me habilitem a dizer que "o conheço") sabe disso, e nem o conteúdo "errático" (designe-mo-lo assim) da entrevista em causa beliscará a sua reputação ou o fará cair na consideração de seja quem for. Isto seria grave se o Miguel estivesse a concorrer para a Casa Branca, sei lá, ou lhe fosse retirado algum patrocínio milionário de alguma multinacional vampiresca, daquelas que retira patrocínios "pelo sim, pelo não", como quem prefere não arriscar: "agora diz a trampa toda que te der na gana, que já não é nada connosco". As sensibilidades são uma coisa lixada de se gerir, realmente. Mas nem por isso queria deixar aqui de dar os meus mais calorosos parabéns ao Miguel pela sua entrevista, que contribuiu com carne para encher muito bom "canhão" dos "opinion-makers" cá do burgo, bem sei como por vezes não é fácil arranjar um tópico sobre o qual tecer considerações à razão de uma vez por semana. Sete dias passam depressa, e chegam a passar períodos mais longos que este em que nos apetece é mandar tudo à fava - difícil mesmo é compor mais que uma frase, se esta for "Vão todos à fava". O Miguel teve o dom de lançar as bases para um sem número de refutações, réplicas, tréplicas e mil e uma considerações que dariam para encher uma porrada de fascículos dedicados a uma ou duas ideias que ali...e qual a palavra que aqui melhor encaixa? Ah, "deixou escapar". E nem disse nenhum disparate por aí além, ou alguma inverdade com um fundo maldoso, note-se. Digamos antes que não se entende lá muito bem porque foi ele levantar um morto que não deu lá muito boa conta de si em vida. Façamos então a autópsia desse impertinente "de cujus".


A entrevista conduzida por Filipa Araújo ia navegando num barquinho rio abaixo com uma calma soporífera, centrando-se nos temas da educação, tendo como pretexto a recente indigitação do entrevistado para o cargo de presidente da APIM, do ensino das línguas oficiais, como uma incursão pelo Direito de Macau, e ainda uma crítica (justificada, aliás) à não renovação das comissões de alguns magistrados portugueses, que assim regressam a Portugal, ficando a RAEM a perder em termos de qualidade no que toca aos operadores nos meandros da Justiça. Tudo normal. A certo ponto, mudamos de cenário, e do barquinho à vela que taciturno descia o rio, passamos para o mais célebre dos cruzadores transatlânticos, o Titanic, e logo no momento em que seria testada a sua lendária indestrutibilidade. Os resultados foram igualmente desastrosos, mas pelo menos fica patente a falácia dessa ideia do "racismo" - se não é "de raça", então não é "racismo", uma vez que se exclui o radical que entra na composição da palavra. Eu quando oiço ou leio a palavra "racismo", a imagem que me vem à cabeça é a de uma manifestação de caniches e chihuahuas à porta de uma escola de cães-polícias, alegando discriminação com base na raça. A sério, faz muito mais sentido do que  quando aplicado às pessoas. Entenderam, ó seus...rafeiros!

Este é provavelmente o parágrafo que veio depois a servir de argumento para justificar todos os bifes de indignação e repúdio servidos no banquete aos comensais da opinião - uns bem passados, outros nem por isso, e alguns mesmo crus e pingar sangue. Permitam-me que opte pela alternativa vegetariana, que esta carne aparenta ser demasiado rija para o meu gosto. Li umas três vezes esta resposta do Miguel à pergunta da jornalista do HM, e cheguei à conclusão que a ideia fica mal expressa em tão poucas linhas. Acho que para se fazer entender, seriam preciso...três páginas? O problema aqui não é tanto "o quê", mas "porquê". A primeira situação descrita pelo entrevistado parece quase surrealista, um estereótipos dos "antigos". Dando-lhe o devido benefício da dúvida, pode ser que Miguel Senna Fernandes tenha deparado com 1) alguém que o reconheceu e 1a) não gosta especialmente dele e tentou provocá-lo ou 1b) queria meter conversa mas é demasiado anti-social para o efeito; ou 2) era um pobre diabo, sofrendo de retardação mental profunda, que depois disso apontou para um automóvel e disse "popó" ou ainda 3) estaria alcoolizado ou sob o efeito de estupefacientes. Estas são apenas algumas possibilidades para explicar um incidente cujo grau de improbabilidade é enorme. De facto em Portugal ainda se olha para os chineses e os asiáticos em geral como sendo um pouco "exóticos", e pontualmente pode acontecer um ou outro caso desses, que vendo bem, ficam pessimamente a quem os executa. "Olhar um chinês" não será o mesmo que contemplar uma paisagem, e dificilmente se completa com alguma outra frase de jeito. 

Em relação ao segundo incidente que descreve, este passado com a sua filha, sinto-me inchado de legitimidade para falar, pois faço-o com conhecimento de causa. O meu próprio filho estuda na Escola Portuguesa, e corresponde à definição de macaense mais redutora que existe, digna de constar de um comum dicionário de bolso: mestiço de pai português e mãe chinesa de Macau, 2ª geração de migrantes chineses do continente (vulgo "ou mun ian"), é bilingue e nasceu em Macau - fosse isto "bowling", e era um "strike", limpinho. Curiosamente já o inquiri por mais que uma vez sobre a incidência no que toca a situações como aquela que o Miguel descreve, e a minha curiosidade causa-lhe estranheza - "o que é que o meu cota está para aqui a bramir?", pensará ele com os seus botões. E de facto não é por acaso que a EPM é tida como exemplar no contexto das escolas onde está presente a componente multi-cultural. E aí não posso deixar de concordar com a última parte daquela ideia, e de facto estes "problemas" são mais uma forma que os adultos encontrarem para andar a discutir o que nem devia ter discussão. Outra vez, sinto que terá faltado uma margem mais larga para o Miguel expor os seus pontos de vista de uma forma mais assimilável, e posto assim nestes termos, e viesse de outra pessoa qualquer, e seria considerado "atroz". Não questiono a veracidade do incidente relatado, atenção, e nem me atreveria a afirmar que o convívio entre os diversos grupos, que mesmo entre si têm muito de heterogéneo é apenas e só um "mar de rosas", nada disso. Acredito, isso sim, que a alegada agressora (na forma verbal, entenda-se) da filha do Miguel poderia ter razões pessoais que a movessem contra ela, e como é frequente acontecer nestas situações, optou pela forma mais  minimalista na hora de melindrar a sua "opositora": apontando para o óbvio, para o que qualquer se aperceberia fazendo uso apenas do sentido da visão, e fica ao critério de cada um a "gravidade" inerente a tipo de conduta. "Racismo"? Penso que muitas opiniões se inclinariam antes para a hipótese da "parvoíce", e nunca é demais frisar que casos destes serão muito raros, senão mesmo inéditos, na Escola Portuguesa de Macau. E para terminar...


...uma resposta que também não agradou a certos paladares, além de ter deixado alguns comensais a sofrer de azia. Eu não tenho problema nenhum com as ideias ali expressas, e acho que em parte "se chamam alguns bois pelos nomes", e ainda fica muito mais por dizer nesse particular. Agora, penso que talvez haja ali um ou outro conceito menos adequado às circunstâncias, e não é por ofender ou deixar de ofender alguém - estão incorrectos, apenas isso. Eu não conheci Macau como Colónia, e cheguei em 1993, e a  mesmo a memória do próprio Miguel a esse respeito deve ser longínqua e turva - Macau só foi Província Ultramarina, vulgo "colónia", até aos incidentes do "1,2,3", na alvorada da década de 70 do século passado, e "de facto" após a tal descolonização pós-Abrilesca, para tantos de má memória, mas de que Macau escapou apenas com ferimentos ligeiros, resultado de um estatuto de "território chinês sob Administração Portuguesa" que lhe atingiu de raspão. Do mal o menos, portanto. 

Assim, quando o entrevistado se refere ao "desdém dos portugueses", com maior incidência nos que "estão aqui há muitos anos", notando-se uma melhor integração entre "a nova geração", e agora prestem atenção a isto "QUE NUNCA CONHECERAM MACAU COMO COLÓNIA".  E é aqui que eu detecto no raciocínio do Miguel algo que não tem nada a ver com aquilo que feriu certas sensibilidades patrioteiras. Já agora, e se permitem um pequeno aparte, quer Portugal, quer a sua administração que geriu os destinos do território até 1999 não são jarrões de porcelana nem virgens vestais para não se poder questionar os seus méritos. Fique bem claro. Posto isto, e evitando a provocação na forma da pergunta "quais méritos?!?!" (lá haver houve, mas já se sabe: é um local ermo, distante e fora de mão), deixemos de lado os salteadores da árvore da Pataca que por cá passaram, e que em seu benefício se pode pelo menos afirmar que nunca se prestaram a nenhum outro papel que não esse: o de "mercenário administrativo" - salvo seja, e vejam que os mercenários propriamente ditos orgulham-se do seu ofício. Vieram, viram, levaram...pataca. Ninguém lhes exigiu que escrevessem poemas dedicados a Macau, enquanto lanchavam um "chu pa bao", empurrado com água do Lilau. Quem evidenciou "desdém", ou pelo menos no que se entende como tal, uma indiferença pela diferença, pontuada com desprezo, arrogância e pedantismo, viu o tempo encarregar-se de o meter daqui para fora. Quem não gosta de Macau não se demorou muito, garanto, e se depois se veio a arrepender ou não, isso é outra conversa.

É evidente que por "portugueses", Miguel está a querer referir-se aos macaenses, é lógico. Não tenho a mínima dúvida que era essa a intenção, agora se foi através da projecção no conceito mais alargado de "portugueses de Macau", outra designação para "macaense", ou se o fez indirectamente ou de forma subliminar, desconheço, mas o que ele descreve ali na perfeição são os macaenses, e por "juntar-se com os locais", pressuponho que se esteja a referir à integração da comunidade na nova realidade do território, e estes "locais" serão os elementos da comunidade chinesa, como era conhecida no tempo em que fazia sentido falar da população de Macau de uma forma tripartida. Claro que o estatuto de residente permanente não será para aqui chamado, uma vez que contempla uma plena igualdade de direitos, e quer a origem, quer a ascendência serão completamente irrelevantes. Terá sido desta forma atabalhoada, com "guetos" (?) à mistura e uma referência curiosa aos "reality bites" da portugalidade (sim, a Lusofonia não chega aos calcanhares da Commonwealth, iludiu-se quem pensou o contrário). Pode-se entender aquilo que se quiser das palavras de Miguel Senna Fernandes, mas quem o conhece e/ou o segue há anos na imprensa local, quer na TDM, onde faz parte do painel de comentadores do programa "Contraponto", nunca pode por um segundo que seja duvidar das suas intenções. Terá sido um dia mau, apenas? Todos temos. Eu chego a ter MESES maus, e só a reclusão completa e incondicional evita que diga tudo o que me vai na alma. 

(Continua)

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