sábado, 20 de dezembro de 2014
Evolvo, revolvo, devolvo
Esta semana no artigo de quinta-feira do Hoje Macau (edição electrónica não disponível) falei de mais uma experiência gratificante com a CTM, essa companhia que faz parte do meu imaginário homicida. Espero que aproveitem bem os feriados, e para quem precisa de trabalhar, bom trabalho, e para todos Boas Festas.
“Se não consegues vencê-los, junta-te a eles”, é o que se pode dizer da decisão de tomei ao perceber que assistimos a um momento de transição na evolução da espécie humana. É que em menos de duas ou três gerações, a totalidade da população estará com os olhos fixados “Smartphone”, enquanto circula na via pública – e alguns ao mesmo tempo que conduzem o seu veículo na estrada, pasme-se. Perante esta evidência, decidi reformatar a postura de “homo erectus” para outra ligeiramente “curvatus” ao nível do “pescoçus”, e adquirir para mim próprio um desses bilhetes para modernidade – afinal é tudo em nome da sobrevivência. Atendendo à solenidade do momento, deleguei a um especialista a responsabilidade de me escolher um aparelho cuja complexidade me permita entender os comandos essenciais logo no primeiro dia. Para mim o “choque tecnológico” dá-se no chão quando as máquinas me fazem esgotar a paciência.
No dia seguinte, ao serão, e enquanto transferia toda a informação contida no meu velhinho telemóvel, pensava naquele milagre do progresso que segurava nas mãos. Dava graças também pelo triunfo do capitalismo e da sociedade de mercado: não fosse pela mão-de-obra semi-escrava que montou aquela pequena maravilha, e seria quase incomportável para mim usufruír da qualidade garantida pela empresa que lhe colou uma etiqueta com a marca. Tivesse Marx vivido na era digital, e com acesso à “world wide web”, o seu manifesto seria publicado em formado PDF e partilhado nas redes sociais. Duvido que alguém fosse ler, mas levava uns quantos “likes” e os amigos diziam-lhe que “davam uma vista de olhos, mais tarde”.
Foi no dia seguinte que a bela teve o seu senão; recebi uma chamada telefónica, uma das funções menos conhecidas do “Smartphone”, e para meu espanto não consigo estabelecer contacto auditivo, e como viria a tomar conhecimento logo a seguir por SMS, também não me fazia escutar. Após alguns testes concluí que o problema era do “speaker”, que contrastava com a majéstica e infalível perfeição do resto do aparelho. Era um génio, mas era surdo, e pensei em chamar-lhe Beethoven. Antes disso fiquei a saber onde podia resolver o problema, ou noutras palavras, onde pedir satisfações aos humanos pela inexplicável falência da máquina. Afinal a aquisição foi feita na CTM, o que me deixou a pensar: “de certeza que só pode ser engano; como é que a CTM ia prestar um mau serviço ou vender um produto defeituoso, Deus meu?”.
E assim, num lindo Sábado depois de almoço, após cancelar um compromisso e adiar outro que me faria perder o final da tarde e início da noite, fui à loja da CTM do NAPE, o único onde há um “service centre” desta marca que me possa resolver este problema que não criei. E o que faria uma companhia que vende um produto CARO, e que mesmo assim levanta dúvidas quanto ao controlo de qualidade, e faz-me perder o Sábado inteiro? Indemniza-me? Implora perdão de joelhos e chama o gerente para me apresentar um pedido formal de desculpas? Pelo menos um “desculpe pelo incómodo”, mesmo sem a oferta de um brinde, ou de uma boleia de regresso a casa, certo? Nada disso! Encontraria mais competência e simpatia devolvendo um DVD pirata marado aos ciganos do mercado do Feijó. Esses davam-me uma cópia do mesmo disco em condições, e ainda ofereciam à minha escolha, e a palavra “desculpe” seria pronunciada, e não da minha boca.
A CTM deixa-me a “secar” uma hora para se certificar que não andei a barrar manteiga ou a tomar banho com o “Smartphone”, e quando confirma que eu não estava a MENTIR, passa-me uma guia para levantar um aparelho novo no andar de baixo. Mostro o papel a um tipo e a uma tipa que a julgar pelo aspecto “trabalham” ali, dizendo (e demonstrando) que estou com pressa, e a seguir a menina tira-me um bilhete com um número e aponta para uma fila onde estavam outros patetas como eu a escolher telefones, mas com uma diferença: EU JÁ PAGUEI! Denotando a expressão homicida bem latente no meu semblante, o outro funcionário leva-me ao balcão de atendimento personalizado (não se iludam pelo nome) onde “só” precisei de esperar mais meia hora. Não agradeci, é um facto, mas para quê? Não fosse agora época festiva e ainda ofendia a cidadania de cada um deles.
Mas vou abster-me de contar mais detalhes dessa fantochada que é o serviço da CTM, mas já agora para a próxima vez – se houver uma – gostaria que me beijassem. Sim, já que sou o elemento passivo nesta relação, e ainda por cima estou a pagar (e não é pouco), uns beijos era o mínimo que me podiam dar enquanto me fo...foi este episódio, quer dizer. Foi este episódio que me deixou também a pensar naquele paradigma do copo meio cheio e do copo meio vazio. Por um lado pode ser que a CTM queira atingir novos patamares de mediocridade para garantir competição justa com o novo concorrente no mercado de telecomunicações, e assim temos o copo meio cheio. Ou então aqueles que aí vêm para competir com a CTM são iguais ou piores, mantendo assim a hegemonia dos actuais detentores do monopólia, e lá está o copo meio vazio. Eu nunca beberia o líquido desse famigerado copo, mas já agora aproveitava para enchê-lo até acima, a atirá-lo nas ventas destes gajos. Ah é verdade, boas festas a todos menos para a CTM.
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